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Caracterização socio-econômico-cultural de raizeiros e procedimentos pós-colheita de plantas medicinais comercializadas em Maceió, AL

Cultural, economic and social characterization of herb sellers and post-harvest procedures of medicinal plants commercialized in Maceió, Alagoas State, Brazil

Resumos

Objetivou-se, com este trabalho, estabelecer o perfil sócio-econômico-cultural de raizeiros, bem como executar um levantamento dos procedimentos pós-colheita para as plantas medicinais comercializadas em feiras e mercados ao ar livre na cidade de Maceió, AL. Foram abordados aspectos sociais, econômicos e culturais de 46 raizeiros, bem como os procedimentos pós-colheita adotados para a conservação das plantas medicinais comercializadas no município. Os raizeiros entrevistados eram, na maioria, naturais de Maceió, católicos, casados e arrecadavam, em geral, mais de um salário mínimo por mês, predominando, com relação à raça, indivíduos pardos e negros. A maior parte trabalhava com ervas medicinais há mais de 10 anos e adquiriram conhecimento sobre as plantas, principalmente através de informações passadas pelos pais e/ou avós. Cerca de 30,43% concluíram o ensino fundamental. A forma de secagem mais adotada foi a exposição ao sol e à sobra, alternadamente. Os tempos máximos de secagem e armazenamento mais encontrados foram quatro dias e um ano, respectivamente. A secagem e o armazenamento geralmente ocorriam na própria barraca, bem como o acondicionamento após o expediente de trabalho. Há falhas no tocante as práticas adotadas, o que pode comprometer a eficicácia dos princípios curativos das plantas.

etnobotânica; saber popular; medicina natural; conhecimento tradicional


The aim of this work was to establish the cultural, economic and social profile of herb sellers, as well as to survey postharvest procedures for medicinal plants commercialized in open-air markets from Maceió, Alagoas State, Brazil. Social, economic and cultural aspects from 46 herb sellers were evaluated, as well as the postharvest procedures adopted for conservation of medicinal plants commercialized in Maceió. Most of the interviewed herb sellers were born in Maceió, catholic, married, predominantly mulatto and black, and usually received more than one minimum wage per month. The majority of them had been working with medicinal plants for more than 10 years and their knowledge on the plants was mainly acquired from parents and grandparents. Around 30.43% concluded elementary studies. The mostly adopted method for plant drying was the alternated exposure to sun and shadow. The maximum drying and storage times were four days and one year, respectively. Drying and storage usually occurred in the seller's tent after work. There are failures regarding the adopted methods, which can compromise the efficacy of the plant curative compounds.

Ethnobotany; folk knowledge; natural medicine; traditional knowledge


Caracterização socio-econômico-cultural de raizeiros e procedimentos pós-colheita de plantas medicinais comercializadas em Maceió, AL

Cultural, economic and social characterization of herb sellers and post-harvest procedures of medicinal plants commercialized in Maceió, Alagoas State, Brazil

Araújo, A.C.I,* * Correspondência para Afrânio César de Araújo - Rua Maria das Mercês Rodrigues, 260, Bairro Presidente Médici, Campina Grande, PB, CEP 58107-970, E-mail: afraniobiologo@hotmail.com ; Silva, J.P.I; Cunha, J.L.X.L.I; Araújo, J.L.O.II

IUniversidade Federal de Alagoas, BR 104 S/N, Rio Largo, AL, CEP 57100-000

IIUniversidade Estadual da Paraíba, Av. das Baraúnas, 351, Campina Grande, PB, CEP 58109-753

RESUMO

Objetivou-se, com este trabalho, estabelecer o perfil sócio-econômico-cultural de raizeiros, bem como executar um levantamento dos procedimentos pós-colheita para as plantas medicinais comercializadas em feiras e mercados ao ar livre na cidade de Maceió, AL. Foram abordados aspectos sociais, econômicos e culturais de 46 raizeiros, bem como os procedimentos pós-colheita adotados para a conservação das plantas medicinais comercializadas no município. Os raizeiros entrevistados eram, na maioria, naturais de Maceió, católicos, casados e arrecadavam, em geral, mais de um salário mínimo por mês, predominando, com relação à raça, indivíduos pardos e negros. A maior parte trabalhava com ervas medicinais há mais de 10 anos e adquiriram conhecimento sobre as plantas, principalmente através de informações passadas pelos pais e/ou avós. Cerca de 30,43% concluíram o ensino fundamental. A forma de secagem mais adotada foi a exposição ao sol e à sobra, alternadamente. Os tempos máximos de secagem e armazenamento mais encontrados foram quatro dias e um ano, respectivamente. A secagem e o armazenamento geralmente ocorriam na própria barraca, bem como o acondicionamento após o expediente de trabalho. Há falhas no tocante as práticas adotadas, o que pode comprometer a eficicácia dos princípios curativos das plantas.

Palavras-chave: etnobotânica, saber popular, medicina natural, conhecimento tradicional

ABSTRACT

The aim of this work was to establish the cultural, economic and social profile of herb sellers, as well as to survey postharvest procedures for medicinal plants commercialized in open-air markets from Maceió, Alagoas State, Brazil. Social, economic and cultural aspects from 46 herb sellers were evaluated, as well as the postharvest procedures adopted for conservation of medicinal plants commercialized in Maceió. Most of the interviewed herb sellers were born in Maceió, catholic, married, predominantly mulatto and black, and usually received more than one minimum wage per month. The majority of them had been working with medicinal plants for more than 10 years and their knowledge on the plants was mainly acquired from parents and grandparents. Around 30.43% concluded elementary studies. The mostly adopted method for plant drying was the alternated exposure to sun and shadow. The maximum drying and storage times were four days and one year, respectively. Drying and storage usually occurred in the seller's tent after work. There are failures regarding the adopted methods, which can compromise the efficacy of the plant curative compounds.

Key words: Ethnobotany, folk knowledge, natural medicine, traditional knowledge.

INTRODUÇÃO

De acordo com Rodrigues & Guedes (2006), as dificuldades financeiras e a busca constante por melhores condições de vida por parte da população de baixa renda são elementos que podem estar diretamente associados à ampla divulgação das propriedades curativas de algumas plantas. Segundo os mesmos autores, as plantas medicinais são, em muitos casos, a única alternativa possível para boa parte da população, já que os medicamentos convencionais geralmente têm preço elevado e, por isso, tornam-se inacessíveis para muitos. Desta forma, um número cada vez maior de pessoas busca as plantas para a cura de suas doenças, seja pelo baixo custo ou pela facilidade de aquisição. Segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 80% da população mundial confia nos medicamentos fitoterápicos (Gottlieb & Kaplan, 1993) e aproximadamente 80,00% das pessoas em países subdesenvolvidos dependem destes medicamentos para as suas necessidades básicas de saúde (Rodrigues & Guedes, 2006).

Descendentes de povos indígenas e africanos, conhecedores de inúmeros recursos de nossa flora, vêm tentando perpetuar ao longo das gerações o saber de seu povo. Este saber, empírico e fruto da observação da natureza, vem sendo, ainda, transmitido de modo verbal, não escrito, mas persiste e é, pouco a pouco, incorporado a Ciência. Conforme o PNUMA (2001), conhecimento tradicional é "um corpo de conhecimento construído por um grupo de pessoas através de sua vivência em contato próximo com a natureza por várias gerações. Ele inclui um sistema de classificação, um conjunto de observações empíricas sobre o ambiente local e um sistema de auto-manejo que governa o uso dos recursos".

Atualmente, o comércio de plantas medicinais em mercados abertos muitas vezes é impulsionado apenas por desemprego e ausência de quaisquer outras alternativas de renda. Desta forma, nem sempre aqueles que comercializam as plantas medicinais detêm, de fato, conhecimento de suas aplicações, interações entre espécies distintas e modos corretos de uso.

Fatores como manejo das culturas, colheita e, principalmente pós-colheita, não são tratados como deveriam e a qualidade do produto é afetada com a perda dos princípios ativos ou diminuição da eficácia.

A solução para estes problemas pode estar na troca de informações entre o raizeiro e o pesquisador, quando a partir das informações transmitidas pelo primeiro pode-se dimensionar o problema e discutir as melhores formas de otimizar os procedimentos envolvidos em toda a cadeia produtiva.

De acordo com Guarim Neto et al. (2000), o uso dos recursos vegetais é uma prática bastante presente na cultura popular e transmitida ao longo das gerações tanto em populações tradicionais quanto contemporâneas. Conforme Rezende & Ribeiro (2005), o conhecimento tradicional, no tocante ao uso de plantas medicinais, tem grande importância no que diz respeito ao surgimento de inovações para a indústria farmacêutica, tanto na identificação de novas plantas como na sugestão de sua eficácia.

Desta forma, o presente trabalho teve como objetivo estabelecer o perfil sócio-econômico-cultural dos raizeiros, bem como executar um levantamento dos procedimentos pós-colheita para as plantas medicinais comercializadas em feiras e mercados ao ar livre na cidade de Maceió, AL.

MATERIAL E MÉTODO

Maceió (AL) tem uma população de 896.965 habitantes (IBGE, 2008) e um território de, aproximadamente, 511 km². Apresenta altitude e temperatura médias de 7,00m e 25,1ºC, respectivamente. Situa-se entre o Oceano Atlântico e a Lagoa Mundaú, tendo esta última, relevante importância econômica para os pescadores ribeirinhos. Estende-se entre os paralelos 09º21'31" e 09º42'49" de latitude sul e os meridianos 35º33'56" e 35º38'36" de longitude oeste. O clima é do tipo quente e úmido As, de Köppen. A umidade relativa do ar é, em média, de 79,20% e o índice pluviométrico é sempre superior a 1.410 mm ano-1.

Sua vegetação é herbácea e arbustiva, com poucas e espaçadas árvores, apresentando ainda remanescentes da floresta ombrófila secundária.

O estudo foi realizado no período de fevereiro a setembro de 2007, com 46 raizeiros que comercializam plantas medicinais na cidade de Maceió. Destes, 24 eram do sexo masculino e 22 do sexo feminino. Foram visitadas 30 bancas de venda de ervas medicinais alocadas no Mercado Central e em outras imediações do Centro de Maceió. As demais bancas estavam distribuídas pelos bairros Benedito Bentes (nove) e Jacintinho (sete). A escolha destes locais para a condução do estudo se deu em função de serem os pontos de maior concentração de raizeiros na cidade.

As informações foram obtidas através de entrevistas que ocorreram no próprio ponto de trabalho dos entrevistados, em momentos de pouco movimento de clientes. Foram utilizados formulários pré-estruturados que permitiram o levantamento de informações relacionadas a aspectos sociais, econômicos e culturais dos raizeiros, bem como dos procedimentos pós-colheita utilizados para a conservação das plantas. No formulário constavam questões relacionadas ao local de trabalho, sexo do raizeiro, residência, estado civil, naturalidade, raça, religião, escolaridade, renda mensal, tempo de profissão e forma de aquisição do conhecimento acerca das plantas medicinais. Foram abordadas ainda, questões concernentes ao local onde as plantas são secas e materiais de proteção e suporte para a realização deste procedimento, forma e tempo de secagem das plantas, forma e tempo de armazenamento após a secagem, possibilidade de contato entre plantas de espécies diferentes quando armazenadas e forma como são guardadas as plantas após o expediente de trabalho.

RESULTADO E DISCUSSÃO

Os valores obtidos neste trabalho indicam os católicos como sendo a maioria no ramo da comercialização das plantas medicinais em Maceió (41,30%), seguidos dos evangélicos (34,78%), espíritas kardecistas (10,87%) e adeptos de outras religiões (13,05%). Além da maior parte dos brasileiros se dizer católica (cerca de 75,00%), grande parte dos antigos "mateiros" detentores do conhecimento das plantas no Brasil eram adeptos desta religião, inclusive os descendentes de povos indígenas e de escravos de origem africana.

Com relação à renda mensal, mais de 67,39% dos raizeiros disseram arrecadar mais de um salário mínimo por mês, apenas com a venda de plantas medicinais, enquanto que os 32,61% restantes afirmaram que o rendimento bruto mensal não chega a um salário mínimo de R$ 380,00. Um dos entrevistados afirmou que há semanas em que o arrecadado com as vendas chega a R$ 400,00, apesar da grande concorrência, pois há locais onde vários raizeiros dividem a mesma área de comércio. No dizer dos raizeiros, o que se ganha com a venda das plantas "dá pra levar a vida". Por outro lado, a falta de informações da população e, de certa forma, a resistência de alguns produtores e comerciantes com relação a certos cuidados com as plantas acaba afugentando a clientela. Além do mais, procedimentos pré e pós-colheita inadequados, bem como, a manipulação incorreta das plantas, inclusive no próprio ponto de venda, impedem que os princípios químicos atuem com eficiência e também contribuem para o aumento da desconfiança do cliente mais observador.

O percentual de raizeiros casados, cerca de 47,83% dos indivíduos, é bem superior ao de solteiros, que foi de 19,56% e de divorciados, 13,04%. Os valores percentuais correspondentes a viúvos e indivíduos que se encontram em outras situações são 8,69 e 10,87%, respectivamente.

No que diz respeito à raça do entrevistado, foi constatado que 43,48% dos raizeiros são pardos, 34,78% são negros e 19,56% são brancos. Apenas 2,17%, ou seja, um único indivíduo, afirmou apresentar ascendência indígena. Somando-se o número de indivíduos negros, pardos e de origem indígena totaliza-se 80,43%, valor em acordo com o fato de que boa parte dos que detém o conhecimento das plantas medicinais originou-se de povos indígenas e africanos.

A aquisição do conhecimento sobre as plantas para 56,54% dos raizeiros se deu através de informações passadas através dos pais ou avós. A contribuição de livros e revistas foi pequena, sendo citada por cerca de 6,50% dos entrevistados (Figura 1A).



Em trabalho desenvolvido por Pinto et al. (2006) em comunidades rurais da Bahia, observou-se que menos de 30,00% das pessoas tinham o hábito de passar seus conhecimentos aos jovens de sua família. Indivíduos mais jovens, em geral, não se interessavam pela fitoterapia ou manifestavam desconfiança em relação à sua eficiência. Pilla et al. (2006) demonstraram que indivíduos com mais de 40 anos apresentavam um conhecimento sobre plantas medicinais cerca de 80% maior em relação àqueles com idade inferior no distrito de Martim Francisco, Mogi-Mirim, SP. O desinteresse das gerações mais novas poderá representar um sério risco de perda de informações valiosas no tocante aos recursos vegetais medicinais da flora brasileira.

Boa parte dos raizeiros espalhados por Maceió, sendo descendentes de moradores de comunidades tradicionais detentoras de algum conhecimento da medicina popular, obtiveram destes últimos as informações concernentes às plantas medicinais.

Os números referentes ao grau de escolaridade dos raizeiros indicaram que 8,70% dos indivíduos concluíram o ensino fundamental e 19,56% haviam concluído o ensino médio (Figura 1B). No tocante ao grau de analfabetismo, 28,26% das pessoas eram analfabetas ou semi-analfabetas. Estes dados diferem dos encontrados por Dantas & Guimarães (2006) em Campina Grande, PB onde o índice de analfabetismo entre os raizeiros chegou a 55,80%.

Na Figura 2 pode-se verificar a distribuição dos percentuais de indivíduos entrevistados em relação ao tempo de trabalho com plantas medicinais. Em torno de 78,00% dos raizeiros de Maceió trabalham com ervas medicinais há mais de 10 anos, o que está de acordo com a noção de que o acúmulo de experiências adquiridas pelo raizeiro no trato com as plantas o capacita para a prática da comercialização destes vegetais.


Apesar de todos os entrevistados residirem em Maceió, a cidade de origem dos raizeiros variou bastante; no entanto, a grande maioria, cerca de 67,00% da amostra, é natural da capital alagoana. Outros 30,43% (14 pessoas) procedem de outras cidades do estado e os 2,17% restantes representam um único indivíduo natural de Garanhus, PE.

No tocante à forma de secagem adotada, 31,71% dos entrevistados disseram secar os vegetais à sombra, enquanto 24,40% afirmaram encaminhar as plantas para secagem ao sol (Figura 3A). A secagem ao sol de plantas tidas como fitoterápicas é, de modo geral, inadequada, pois a exposição direta das plantas aos raios solares provoca, segundo Hertwig (1986), endurecimento da camada superficial das células, perda de óleos essenciais e descoloração. O mesmo autor afirma que rizomas e raízes podem, inicialmente, serem expostos ao sol, no entanto, após algumas horas, estas devem ser encaminhadas para a sombra ou para uma estufa onde o processo deve ser concluído.




As perdas dos princípios ativos após a colheita ocorrem, principalmente, devido à degradação por processos metabólicos, hidrólises, degradação pela luz, ação enzimática, oxidação, fermentação, calor e contaminação microbiológica (Fraceli et al., 1999). O mal aspecto das plantas, que rapidamente murcham em função da perda de água, tornando-se depositórios de microorganismos, afugentam os clientes. A secagem torna-se, pois, fundamental para a manutenção dos princípios químicos úteis das ervas. O problema é que grande parte dos raizeiros tradicionais ainda mantém a idéia errônea de que a secagem ao sol, pelo fato de ser mais rápida, é mais eficiente.

No tocante ao local de secagem das plantas, 32,61% dos raizeiros de Maceió afirmaram que geralmente as plantas são penduradas na própria barraca para secar. Tal procedimento não é, segundo Martins et al. (2003), indicado para plantas cujas folhas caem durante a secagem, como o manjericão (Ocimum sp.). Dentre os entrevistados, 21,74% disseram colocar as plantas sobre as bancadas da própria barraca e 21,74% afirmaram espalhar as plantas sobre uma lona plástica em local próximo à sua residência (Figura 3B). Conforme Martins et al. (2003), as plantas devem ser secas em uma bandeja com moldura de madeira e fundo em tela plástica ou aço inoxidável em ambiente seco, arejado e protegido de insetos e outros animais que possam comprometer a qualidade do produto.

Quando arguidos a respeito do tempo necessário para a secagem das plantas, a maioria dos entrevistados, 30,43%, respondeu que quatro dias são suficientes para a desidratação do material, enquanto que 28,26% afirmaram que as plantas completam a secagem em três dias. Por outro lado, 10,47% afirmaram que o material está pronto para a comercialização depois de cinco dias de secagem (Figura 3C).

Quando a secagem é muito lenta o material pode ser alterado por atividade enzimática, ataque de fungos, fermentações e oxidações. Fatores como temperatura e umidade relativa do ar são fundamentais para a secagem natural.

A secagem natural, adotada por todos os raizeiros incluídos na pesquisa, inclusive os que apontaram a estufa como principal meio de secagem, é um processo lento, somente indicado para locais em que as condições climáticas são favoráveis.

Com relação ao tempo de armazenamento do material após a secagem, 75,00% dos raizeiros afirmaram que as plantas são estocadas por até um ano, enquanto que 25,00% alegaram que o tempo de estocagem é menor que este período. Segundo Martins et al. (2003), não há muitas informações acerca do tempo máximo de conservação de plantas medicinais, o que pode ainda variar de espécie para espécie. No entanto, um fator essencial para a manutenção dos princípios químicos viáveis por um maior espaço de tempo são as condições do local de armazenamento.

De acordo com Máthé & Franz (1999), o ambiente para armazenamento deve ser seco, arejado e com pouca variação de temperatura. Da mesma forma, deve-se manter o local protegido da luz, poeira, insetos, pássaros e de roedores. Em Maceió, como em outras cidades brasileiras, o armazenamento das plantas medicinais, pelo menos quando já estão sob os cuidados dos raizeiros, ocorre, em geral, na própria banca de venda, local que não reúne as condições mínimas para a preservação das suas propriedades terapêuticas.

Os quase 70% dos raizeiros que disseram armazenar parte das plantas na própria barraca, amontoadas umas sobre as outras, afirmaram que cobrem o material com uma lona plástica durante o período noturno ou nos dias em que não trabalham, o que não impede a absorção de umidade e, conseqüentemente, a maior vulnerabilidade ao ataque de fungos. A estocagem das plantas frescas ou secas sobre a bancada de madeira da barraca onde são expostas foi citada por 39,13%. Os materiais citados pelos raizeiros para a estocagem foram: sacos plásticos, mencionados por 73,91% dos entrevistados, caixas de papelão, 26,01%, sacos de papel, 26,09%, caixas de plástico, 15,21% e latas, 13,04%. Cestos de palha e caixas de madeira também foram citados (Figura 4A). O material que pode ser utilizado para acondicionamento e estoque das plantas já desidratadas varia de acordo com o volume e o tempo que se pretende armazena-las, podendo-se utilizar tonéis de madeira não-aromática, potes de vidro, sacos de polietileno, polipropileno ou de juta (Martins et al., 2003).



Os vegetais medicinais comercializados pelos raizeiros de Maceió dificilmente eram embalados para estoque e/ou venda. Ao contrário, ficavam expostos sobre bancadas, sujeitos às variações de temperatura e umidade e ao contato com impurezas. O ideal seria que as plantas fossem acondicionadas em potes de vidro ou saquinhos plásticos rotulados, para somente então, serem guardadas em caixas de papelão. Fraceli et al. (1999) concluíram que a qualidade pós-colheita de Achillea millefolium, Origanum vulgare e Petroselinum crispum, é mais bem preservada em embalagens de vidro por um período de até um ano.

Quando questionados sobre a forma como são guardadas as plantas após o expediente de trabalho 46,00% dos raizeiros afirmaram organiza-las em caixas de papelão para, no dia seguinte, serem expostas novamente à venda (Figura 4B).

Caixas de papelão não impedem a absorção da umidade do ar atmosférico pelas plantas já desidratadas durante a noite. Além do mais, a forma como as plantas eram guardadas favorecia o contato entre vegetais de espécies distintas, comprometendo ainda mais a manutenção das suas propriedades. Com relação a este aspecto, 48,50% dos entrevistados afirmaram que o contato existe na maioria das vezes. De acordo com Dantas & Guimarães (2006), o contato entre plantas de espécies distintas favorece a interferência e a interação entre os compostos ativos voláteis que, submetidos a mudanças de temperatura, podem modificar os seus efeitos fitoterápicos.

Se faz necessário um trabalho de conscientização junto aos raizeiros de Maceió quanto à necessidade de adoção de práticas mais adequadas no preparo e armazenamento das plantas medicinais de modo a manter a eficicácia dos seus princípios curativos.

Há necessidade de maior divulgação da eficiência dos medicamentos tradicionais, o que traria benefícios à sociedade, em especial, à parcela de baixa renda, que passaria a conhecer melhor as vantagens do uso das plantas medicinais, bem como aos próprios raizeiros, que anseiam por uma maior valorização do seu produto.

Deve-se estimular a implantação de áreas de cultivo de algumas espécies de plantas medicinais por parte dos raizeiros e pequenos produtores.

CONCLUSÃO

A maior parte dos raizeiros de Maceió era de cor parda, católica, apresentava, no mínimo, o ensino fundamental incompleto e a renda mensal, obtida com a venda das plantas medicinais, ultrapassava um salário mínimo;

A tradicional transmissão oral de conhecimentos dos pais para os filhos foi a mais representativa forma de aquisição de informações acerca das plantas medicinais em Maceió;

As formas como eram guardadas as plantas após o expediente de trabalho não eram adequadas, pois favoreciam tanto o ataque de fungos quanto o contato entre plantas de espécies diferentes.

AGRADECIMENTO

A todos os raizeiros de Maceió que gentilmente aceitaram participar das entrevistas, proporcionando a realização deste trabalho e a José Bruno da Silva França, pelo apoio em algumas das entrevistas.

Recebido para publicação em 24/03/2008

Aceito para publicação em 19/08/2008

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    Correspondência para Afrânio César de Araújo - Rua Maria das Mercês Rodrigues, 260, Bairro Presidente Médici, Campina Grande, PB, CEP 58107-970, E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      19 Ago 2008
    • Recebido
      24 Mar 2008
    Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais, Revista Brasileira de Plantas Medicinais, Universidade Estadual de Maringá, Departamento de Farmácia, Bloco T22, Avenida Colombo, 5790, 87020-900 - Maringá - PR, Tel: +55-44-3011-4627 - Botucatu - SP - Brazil
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