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Primeiro registro no Brasil de Erythrina velutina Willd. como hospedeira de Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae)

First Brazilian report of Erythrina velutina Willd. as host of Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae)

Resumos

Os ácaros tetraniquídeos representam importantes pragas para diversas culturas agrícolas em todo o mundo. Durante a prospecção em mudas de Erytrina velutina no distrito de São Cristovão, Estado de Sergipe, Brasil, a ocorrência destes foi observada em 15% das mudas que foram levadas ao laboratório para a caracterização dos danos. As mudas apresentavam sintomas de redução e encarquilhamento do limbo. Foram coletados 100 indivíduos destas plantas, os quais foram montados em lâminas de microscopia para a identificação taxonômica. Os ácaros foram identificados como pertencentes à espécie Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae). Este é o primeiro relato em E. velutina, como hospedeira para T. neocaledonicus no Brasil.

ácaro vermelho; praga florestal; viveiro


Spider mites are important pests to several crops worldwide. During prospecting in Erytrina velutina specimens from São Cristovão District, Sergipe State, Brazil, their occurrence was observed in 15% seedlings, which were taken to the laboratory for description of damages. The seedlings presented leaf blade reduction and crumpling symptoms. One hundred mites were collected from these seedlings and mounted on microscope slides for taxonomic identification. The identified mites belonged to the species Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae). This is the first report of E. velutina as host for T. neocaledonicus in Brazil.

spider mites; forest pest; nursery


NOTA PRÉVIA

Primeiro registro no Brasil de Erythrina velutina Willd. como hospedeira de Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae)

First Brazilian report of Erythrina velutina Willd. as host of Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae)

POderoso, J.C.M.I, * * juliopoderoso@yahoo.com.br ; Ribeiro, G.T.I; Návia, D.II; Passos, E.M.III; Gonçalves G.B.I; Correia-Oliveira, M.E.I; Dantas, P.C.I

IUniversidade Federal de Sergipe, Departamento de Engenharia Agronômica, Av. Marechal Rondon, s/n, CEP: 49100-000, São Cristóvão-Brasil

IIEMBRAPA/ Recursos Genéticos e Biotecnologia, Caixa Postal 02372, CEP: 70770-900, Brasília-Brasil

IIIDepartamento de Engenharia Agronômica, Fitossanidade, Área Entomologia, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Rua Dom Manoel de Medeiros, s/n, Dois Irmãos, CEP: 52171-900, Recife-Brasil

RESUMO

Os ácaros tetraniquídeos representam importantes pragas para diversas culturas agrícolas em todo o mundo. Durante a prospecção em mudas de Erytrina velutina no distrito de São Cristovão, Estado de Sergipe, Brasil, a ocorrência destes foi observada em 15% das mudas que foram levadas ao laboratório para a caracterização dos danos. As mudas apresentavam sintomas de redução e encarquilhamento do limbo. Foram coletados 100 indivíduos destas plantas, os quais foram montados em lâminas de microscopia para a identificação taxonômica. Os ácaros foram identificados como pertencentes à espécie Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae). Este é o primeiro relato em E. velutina, como hospedeira para T. neocaledonicus no Brasil.

Palavras-chave: ácaro vermelho, praga florestal, viveiro

ABSTRACT

Spider mites are important pests to several crops worldwide. During prospecting in Erytrina velutina specimens from São Cristovão District, Sergipe State, Brazil, their occurrence was observed in 15% seedlings, which were taken to the laboratory for description of damages. The seedlings presented leaf blade reduction and crumpling symptoms. One hundred mites were collected from these seedlings and mounted on microscope slides for taxonomic identification. The identified mites belonged to the species Tetranychus neocaledonicus (Acari: Tetranychidae). This is the first report of E. velutina as host for T. neocaledonicus in Brazil.

Key words: spider mites, forest pest, nursery

O gênero Erythrina (Família Fabaceae) é largamente conhecido, com ocorrência nas regiões tropicais e sub-tropicais do mundo. Possui cerca de 110 espécies, das quais 70 são nativas da América (Vasconcelos et al., 2003).

As plantas do gênero Erythrina são conhecidas por produzirem alcalóides, flavonóides, isoflavonóides e outras substâncias. Segundo Amer et al., (1991), essas plantas representam a principal fonte de alcalóides tetracíclicos, possuindo atividade semelhante ao curare (um poderoso veneno) que causa paralisia muscular (Decker et al., 1995). Destacam-se entre as plantas medicinais, pelos efeitos no sistema nervoso central e a utilização como traquilizante. Estudos farmacológicos realizados em diferentes laboratórios brasileiros têm demonstrado atividades antinociceptiva, ansiolítica/sedativa, relaxante muscular e antibacteriana de extratos de Erythrina velutina (Marchioro et al., 2005; Dantas et al., 2004; Vasconcelos et al., 2004; Virtuoso et al., 2005; Santos et al., 2007).

O mulungu, Erythrina velutina Willd. (Leguminosae: Papilionoidae), é árvore brasileira de grande porte, comum na caatinga, com potencial para exploração medicinal e florestal. Essa espécie é originária do nordeste brasileiro e floresce na primavera podendo chegar a 12 metros de altura (Lorenzi, 1992; Neill, 1988). E. velutina apresenta bom desenvolvimento no campo, sendo comum a utilização em programas de recuperação de áreas degradadas. A madeira leve pode ser utilizada na confecção de tamancos, jangadas e palitos de fósforo. Além disso, frequentemente é utilizada como mourões de cerca, pela facilidade de plantio por estacas (Lima, 1989).

Na medicina popular E. velutina é conhecida pela ação sudorípara e sedativa (Rabelo, 2001). A infusão das cascas é empregada como calmante e sedativo para tosses e bronquites, bem como para tratamento de verminoses e hemorróidas. E o decocto é utilizado para acelerar a maturação de abscessos gengivais (Lorenzi & Matos, 2002).

O presente trabalho teve como objetivo inspecionar mensalmente as mudas de mulungu, identificar possíveis pragas e caracterizar os danos causados por estas. As mudas foram produzidas no viveiro de espécies florestais nativas da Universidade Federal de Sergipe, foi feito isolamento das mudas danificadas e o agente dos danos.

As mudas de mulungu foram inspecionadas mensalmente, ao longo de um ano de avaliação, no viveiro de espécies florestais nativas da Universidade Federal de Sergipe, em São Cristovão (10º 55' 50" S, 37º 06' 18" W), Sergipe. E em janeiro de 2005, verificou-se a presença de ácaros em mudas de mulungu.

Foram preparadas lâminas de machos e fêmeas, separadamente, sendo as fêmeas montadas em grupos de cinco, em posição dorso ventral, e os machos isoladamente, em posição lateral.

A identificação foi realizada em microscópio de contraste de fase e as estruturas de maior importância taxonômica fotografadas, com um sistema de captura de imagens, composto por câmara digital acoplada ao microscópio e ao microcomputador. Dentre as estruturas fotografadas pode-se citar o eupatídio do tarso da fêmea e o edeago do macho. Com o eupatídio do tarso, as fêmeas tecem teia e a proporção entre largura e o comprimento dessa estrutura é de grande importância para a identificação de espécies de Tetranychus. De modo semelhante, cada espécie da família apresenta o edeago com forma diferente, por isso essa característica é também de extrema importância taxonômica (Figura1).


No início da infestação as folhas apresentaram pontos cloróticos e, posteriormente, encarquilhamento (Figura 2). Plantas com alta infestação apresentaram desfolha. Aproximadamente 15% das mudas de mulungu de 415 plantas estavam infestadas. Os ácaros foram identificados como Tetranychus neocaledonicus André, 1933 (Tetranychidae).


Os ácaros de coloração vermelha carmim na região lateral do corpo e alaranjados na região dorso-central, formavam colônias na superfície inferior das folhas, onde produziam grande quantidade de teias e depositaram ovos amarelos globosos (Figura 3).


Os Tetranychidae são uma importante família de ácaros pertecentes a ordem Prostigmata, que engloba algumas espécies que causam perdas significativas tanto em cultivos agrícolas como em plantas ornamentais. Estes organismos possuem desenvolvimento rápido, fácil dispersão e colonização devido a numerosa população (Bonato & Gutierrez, 1999; Othman & Zhang, 2003). A espécie T. neocaledonicus foi inicialmente descrita em algodoeiros de Nova Caledônia (Oceania) e atualmente é relatada em cerca de 430 hospedeiros, com ampla distribuição geográfica em áreas tropicais e subtropicais do mundo, sendo também considerada uma importante praga em cultivos na Índia (Goff, 1986; Bonato & Gutierrez, 1999). No Brasil é de comum ocorrência em algodão e mamona, sobretudo no Nordeste. Porém, também tem sido relatada em diversas plantas ornamentais e frutíferas. Este é o primeiro relato de mulungu como hospedeira de T. neocaledonicus; entretanto, três outras espécies do gênero - E. cristagalli L., E. cubensis C. Wright e E. fusca Lour - já haviam sido relatadas como hospedeiras desse mesmo ácaro (Flechtmann, 1970). Apesar da ampla gama de hospedeiros conhecidos desta espécie de ácaro dentre as espécies produzidas no viveiro florestal da UFS onde se encontravam Enterolobium contortisiliquum Vell. Morong. (Leguminosae-Mimosoideae), Inga uruguensis Hook & Arn. (Fabaceae), Lonchocarpus sericeus (Poir.) Kunth (Fabaceae) Sapindus saponaria L. (Sapindaceae), Caesalpinia echinata Lam. (Leguminosae), Caesalpinia férrea L. (Leguminosae), Tapirira guianensis Aubl. (Anacardiaceae), Schinus terebinthifolius Raddi. (Anacardiaceae), Cassia grandis L.f. (Leguminosae) apenas em mudas de E. velutina foram encontrados ácaros.

Uma hipótese que pode justificar a ocorrência desses ácaros fitófagos em viveiro é a redução de inimigos naturais, principalmente os ácaros predadores, fato que pode ser atribuído à aplicação incorreta de inseticidas, fungicidas cúpricos e acaricidas. Condições climáticas favoráveis aos ácaros fitófagos e adubações de nitrogênio inadequadas para a planta também podem favorecer direta e indiretamente a explosão populacional desses ácaros (Flechtmann, 1983).

Os danos causados por T. neocaledonicus observados nesta pesquisa, evidenciam a necessidade de estudos na área florestal, visando o manejo desse ácaro. Além disso, os conhecimentos sobre a ação seletiva ou tóxica dos agrotóxicos usados no controle de pragas no viveiro de mudas nativas da Universidade Federal de Sergipe devem ser sempre revisados, a fim de optar-se por práticas de manejo que favoreçam a preservação e atuação de artrópodes benéficos, realizando assim um possível controle biológico. Por tratar-se de espécie nativa, com grande aplicação na área medicinal, é importante a rápida detecção de novas pragas que possam ameaçar o cultivo.

Recebido para publicação em 30/10/2008

Aceito para publicação em 15/05/2010

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      30 Out 2008
    • Aceito
      15 Maio 2010
    Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais, Revista Brasileira de Plantas Medicinais, Universidade Estadual de Maringá, Departamento de Farmácia, Bloco T22, Avenida Colombo, 5790, 87020-900 - Maringá - PR, Tel: +55-44-3011-4627 - Botucatu - SP - Brazil
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