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Novas perspectivas em comunicação suplementar e/ou alternativa a partir da análise de periódicos internacionais

New perspectives in augmentative and alternative communication in international journal analysis

Resumos

TEMA: A Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA) é uma área do conhecimento da prática clínica, educacional e de pesquisa que favorece a qualidade de vida de seus usuários e familiares. OBJETIVO: propor diretrizes de intervenção e pesquisa na área de CSA a partir da identificação e síntese descritiva de artigos publicados em periódicos indexados em bases de dados eletrônicas internacionais, quanto à temática comunicação suplementar e/ou alternativa, abrangendo pesquisas experimentais, relatos de atendimento individual e/ou em grupo, estudos de casos que incluíssem sujeitos com paralisia cerebral ou com problemas neurológicos não definidos e/ou com retardo mental. CONCLUSÃO: A individualização das práticas quanto ao design, relevância e velocidade do processamento da informação e o processo de inclusão da família e demais parceiros conversacionais são fundamentais ao sucesso na intervenção, generalização e manutenção de uso da prancha de comunicação suplementar e/ou alternativa em contextos formais e informais. A prescrição individualizada dos recursos da área de CSA conforme características físicas, mentais, psíquicas, cognitivas e lingüísticas do usuário tem impacto positivo na sua qualidade de vida e na de seus familiares. Portanto, recomenda-se a introdução o mais breve possível dos recursos terapêuticos da área da comunicação suplementar e/ou alternativa para sujeitos com oralidade restrita e/ou ausente.

Linguagem; Paralisia Cerebral; Comunicação


BACKGROUND: Augmentative and Alternative Communication (AAC) is a knowledge area of clinical, educational and research practice that favors the quality of life of its users and their relatives. PURPOSE: to propose intervention and research guidelines in AAC based on the identification and descriptive synthesis of articles published in indexed journals, in international electronic databases on AAC. Inclusion criteria were experimental research, reports of individual and/or group treatment, case studies, including subjects with cerebral palsy or with non-defined neurological diseases and mental retardation. CONCLUSION: individualization of the practices as for the design, relevance and speed of information processing and the process of including the family and other conversational partners are essential to a successful intervention, generalization and maintenance of AAC communication board within formal and informal contexts. Individual prescription of AAC resources according to physical, mental, psychic, cognitive and linguistic characteristics have a positive impact on the quality of life of users and their relatives. Therefore, it is recommended that AAC therapeutic resources are introduced as soon as possible for subjects with restricted and/or absent orality.

Language; Cerebral Palsy; Communication


Novas perspectivas em comunicação suplementar e/ou alternativa a partir da análise de periódicos internacionais

New perspectives in augmentative and alternative communication in international journal analysis

Carla Ciceri CesaI; Ana Paula Ramos-SouzaII; Themis Maria KesslerIII

IFonoaudióloga; Docente do curso de Fonoaudiologia da Faculdade Nossa Senhora de Fátima, Caxias do Sul, RS; Docente do curso de Pós-Graduação do Instituto Superior de Educação Ivoti, Instituto de Desenvolvimento Social Brava Gente, Porto Alegre, RS; Terapeuta domiciliar em Porto Alegre, RS; Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de Santa Maria

IIFonoaudióloga; Docente e Supervisora Clínica do curso de Graduação em Fonoaudiologia e do Programa de Pós-Graduação em Distúrbios da Comunicação Humana da Universidade Federal de Santa Maria, UFSM, Santa Maria, RS; Doutora em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

IIIFonoaudióloga; Docente, Supervisora Clínica e Coordenadora do curso de Graduação em Fonoaudiologia da Universidade Federal de Santa Maria, UFSM, Santa Maria, RS; Doutora em Letras pela Universidade Federal de Santa Maria

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Carla Ciceri Cesa Av. Prof. Paula Soares, 315 ap. 302 CEP: 91220-450 Porto Alegre - RS E-mail: carlacesafga@yahoo.com.br

RESUMO

TEMA: a Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA) é uma área do conhecimento da prática clínica, educacional e de pesquisa que favorece a qualidade de vida de seus usuários e familiares.

OBJETIVO: propor diretrizes de intervenção e pesquisa na área de CSA a partir da identificação e síntese descritiva de artigos publicados em periódicos indexados em bases de dados eletrônicas internacionais, quanto à temática comunicação suplementar e/ou alternativa, abrangendo pesquisas experimentais, relatos de atendimento individual e/ou em grupo, estudos de casos que incluíssem sujeitos com paralisia cerebral ou com problemas neurológicos não definidos e/ou com retardo mental.

CONCLUSÃO: A individualização das práticas quanto ao design, relevância e velocidade do processamento da informação e o processo de inclusão da família e demais parceiros conversacionais são fundamentais ao sucesso na intervenção, generalização e manutenção de uso da prancha de comunicação suplementar e/ou alternativa em contextos formais e informais. A prescrição individualizada dos recursos da área de CSA conforme características físicas, mentais, psíquicas, cognitivas e lingüísticas do usuário tem impacto positivo na sua qualidade de vida e na de seus familiares. Portanto, recomenda-se a introdução o mais breve possível dos recursos terapêuticos da área da comunicação suplementar e/ou alternativa para sujeitos com oralidade restrita e/ou ausente.

Descritores: Linguagem; Paralisia Cerebral; Comunicação

ABSTRACT

BACKGROUND: Augmentative and Alternative Communication (AAC) is a knowledge area of clinical, educational and research practice that favors the quality of life of its users and their relatives.

PURPOSE: to propose intervention and research guidelines in AAC based on the identification and descriptive synthesis of articles published in indexed journals, in international electronic databases on AAC. Inclusion criteria were experimental research, reports of individual and/or group treatment, case studies, including subjects with cerebral palsy or with non-defined neurological diseases and mental retardation.

CONCLUSION: individualization of the practices as for the design, relevance and speed of information processing and the process of including the family and other conversational partners are essential to a successful intervention, generalization and maintenance of AAC communication board within formal and informal contexts. Individual prescription of AAC resources according to physical, mental, psychic, cognitive and linguistic characteristics have a positive impact on the quality of life of users and their relatives. Therefore, it is recommended that AAC therapeutic resources are introduced as soon as possible for subjects with restricted and/or absent orality.

Keywords: Language; Cerebral Palsy; Communication

INTRODUÇÃO

A Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA) tem-se apresentado como importante área de conhecimento na prática clínica, educacional e de pesquisa, favorecendo sujeitos com impedimentos ou limitações para a produção oral de fala, de modo especial em quadros clínicos como a encefalopatia crônica infantil, mais comumentemente denominada de paralisia cerebral, a deficiência mental, dentre outros distúrbios de linguagem e desenvolvimento. Tal importância é evidenciada em um estudo demográfico realizado no estado norte-americano da Pensilvânia 1, que identificou 12% de usuários de CSA na população pré-escolar, de diversas raças e etnias, e com vários distúrbios de linguagem e/ou desenvolvimento.

Apesar do considerável uso desse recurso na população infantil, ainda há pouca formação especializada sobre o tema no meio acadêmico. Esta afirmativa pode ser constatada em um estudo recente, de 2008 2, realizado através do envio de questionários para todos os centros de formação de terapeutas de linguagem e educadores especiais nos Estados Unidos da América (EUA). Os pesquisadores observaram que apenas 29% dos cursos possuem especialista no tema, embora 73% ofereçam ao menos um curso específico nesta área. Em relação à pesquisa, os foram encontradas apenas 120 teses e 55 dissertações. Apesar da afirmativa dos autores de que houve um crescimento percentual de estudo do tema naquele país, relacionado às novas exigências para a certificação clínica da American Speech-Language-Hearing Association (ASHA), ainda consideram deficitárias a difusão e as práticas laboratoriais na formação clínica especializada no tema (cerca de 50% dos cursos oferecem práticas em laboratório).

A realidade socioeconômica de países do primeiro mundo viabiliza recursos da área de CSA de alta tecnologia em tratamentos terapêuticos e educacionais, como se observa no programa assistencial do governo inglês, que assegura o acesso educacional e a intervenção clínica específica para fala e linguagem a sujeitos com necessidades especiais até os seus 19 anos, conforme aponta estudo realizado 3.

Apesar dos limites socioeconômicos que dificultam o acesso à alta tecnologia assistiva em países em desenvolvimento, como o Brasil, é importante conhecer as possibilidades dessa tecnologia, assim como é fundamental saber explorar do melhor modo possível o uso de recursos de baixa tecnologia. Há diferentes tipos de pranchas de comunicação que variam desde baixa, média a alta tecnologia. Destaca-se que mesmo uma prancha de comunicação sendo de baixa tecnologia, não significa que tem pouca efetividade na sua função, que é a de proporcionar um espaço dialógico intersubjetivo do sujeito usuário deste recurso da área de CSA com o seu interlocutor.

Considerando, portanto, a necessidade de maior difusão acadêmica, clínica e educacional na área da CSA, este artigo se propõe a indicar diretrizes de intervenção e pesquisas a partir da identificação e síntese descritiva de artigos publicados em periódicos indexados em bases de dados eletrônicas internacionais da última década, quanto a temática CSA, abrangendo pesquisas experimentais, relatos de atendimento individual e/ou em grupo, estudos de casos que incluíssem sujeitos com paralisia cerebral ou com problemas neurológicos não definidos e/ou com retardo mental.

MÉTODOS

Para a realização da revisão de literatura foram realizadas buscas em bases de dados eletrônicas visando somente artigos científicos internacionais, por estes exporem um delineamento de pesquisa com critérios mais exigentes.

Os seguintes critérios iniciais de busca foram utilizados:

- Estudos no período de 1997 a 2008, faixa temporal em que houve maior difusão científica da CSA;

- Estudos publicados em periódicos indexados em bases de dados eletrônicas (A nacional a A internacional): MEDLINE (via Bireme), SciELO, Cochrane e ASHA (Journal of Speech, Language and Hearing Research, American Journal of Speech-Language Pathology, e no Language, Speech and Hearing Services in Schools). Através da ASHA, foi possível ainda localizar diversos periódicos que, mesmo não sendo publicações suas, foram contemplados nesta busca: Communication Disorders Quarterly, The Journal of Rehabilitation, Topics in Language Disorders, Journal of Special Education, Topics in Early Childhood Special Education, Child: Care, Health and Development, Research and Practice for Persons with Severe Disabilities e o Applied Behavior Analysis.

Os unitermos escolhidos para a busca foram cerebral palsy, augmentative alternative communication, language therapy ou intervention.

Nesta primeira etapa resultaram um total de 319 artigos, os quais foram submetidos a um refinamento através de seleção manual (segunda etapa), levando-se em consideração os seguintes critérios de seleção: artigos que abordassem a inclusão de pesquisas experimentais, relatos de atendimento individual e/ou em grupo, estudos de casos que incluíssem sujeitos com paralisia cerebral ou com problemas neurológicos não definidos e/ou com retardo mental. Em uma terceira etapa, foi realizado outro refinamento manual, selecionando-se pesquisas que abordassem os processos de seleção, criação, confecção, introdução, intervenção, expansão (atualização do recurso), manutenção e generalização do uso do recurso da área da CSA em diferentes e, além disso que considerassem o foco no usuário e/ou neste com seus parceiros conversacionais (Tabela 1). Dessa consulta resultaram 26 artigos.

A partir da leitura dos 26 artigos selecionados, foram criadas duas categorias de análise, dividindo-as em princípios e, destas, foram ainda realizadas subcategorizações, conforme descrito abaixo:

1. Princípios na seleção da CSA que abrangessem aspectos que relacionassem design e acessibilidade;

2. Princípios relacionados às estratégias terapêuticas de introdução, manutenção e generalização da CSA que contemplassem três subcategorias: estratégias focadas somente no usuário (2.1), estratégias centradas na relação entre o usuário e seus parceiros conversacionais, tais como família, professores, terapeutas, etc. (2.2) e aspectos linguísticos abordados na implementação dos recursos da área de CSA (2.3).

Dos 26 estudos selecionados, nove são estudos de grupo, sendo sete experimentais e dois descritivos, oito são de revisão de literatura, sete estudos de caso(s) e dois de formação profissional. Todos estes estão sintetizados na Figura 1.


REVISÃO DA LITERATURA

1. Princípios na seleção da CSA: design e acessibilidade

Nesta categoria, foram incluídos os artigos que abrangessem aspectos como o design do recurso para viabilizar a acessibilidade. Seis estudos indicam os principais aspectos encontrados:

- Intervenção inicial com crianças pequenas: a seleção direta do vocabulário é mais eficaz do que a varredura 4 e, quando utilizada, deve ser animada 5,6. O rastreamento com animação reduziu o número de sessões 7, mas não deve ser utilizado na forma automática com crianças espásticas e não deve ser apresentado no design step (em níveis) para crianças com atetose 8.

- Intervenção com adultos: um estudo 9 demonstrou que o acesso ao teclado é melhor com atalhos via abreviaturas do que com o mouse.

- Considerando todas as faixas etárias, um estudo de revisão realizado 8 afirma a necessidade de programação individual dos recursos tecnológicos tanto em relação à varredura quanto ao acesso e feedback. Quanto ao acesso à tela do monitor do computador (display), os autores recomendam preferencialmente o uso de cadeiras especiais, cunhas, bancos e/ou cavaletes do que o uso de um aparato adaptado denominado sidelyer, o qual posiciona a criança em decúbito lateral. Já quanto à iconicidade das simbologias gráficas, o referido estudo 8 afirma ainda que o Pictogram Ideogram Communication (PIC) favorece mais a aquisição e generalização do que o BLISS e a ortografia.

2. Estratégias terapêuticas de introdução, manutenção e generalização da CSA

Um estudo de cunho geral 10 nesta categoria aborda a revisão de 50 estudos, com 232 comparações, nas quais são analisadas as fases de intervenção, generalização e manutenção da CSA. Concluem que a intervenção e a generalização são mais bem sucedidas do que a manutenção, possivelmente porque muitos estudos têm foco menor na interação usuário-parceiro, como será visto nas próximas duas categorias.

2.1 Estratégias focadas no usuário

Observa-se que as estratégias focadas no usuário visam conjugar a introdução e uso dos recursos da área de CSA em contexto informal e formal, favorecendo, deste modo, o processo de generalização.

No contexto informal, o ensino do uso dos diversos tipos de recursos da área da CSA através de vídeos feitos em restaurantes de fast-food foi efetivo para que dois dos três alunos com deficiência de moderada a grave pudessem ter a capacidade de fazer pedidos após uma sessão. O terceiro aluno conseguiu após duas sessões 11.

Em outro estudo considerando o mesmo contexto informal 12, a CSA deu suporte e treinamento a seis sujeitos para que pudessem aumentar suas oportunidades de emprego. Os participantes melhoraram suas habilidades na busca de emprego, aprimoraram o uso de tecnologia de informação, permitindo lidar melhor com os seus distúrbios no ambiente de trabalho, o que se traduziu em aumento salarial em quatro dos seis sujeitos pesquisados

Ao revisar a literatura sobre as práticas de ensino de tecnologia assistiva para bebês e crianças pequenas, foi constatado que, embora sejam encontrados resultados positivos, as evidências da efetividade do uso de recursos de tecnologia assistiva são limitadas em termos de número de relatos, áreas de conteúdo e nível de evidências 13.

Além desses estudos, outros, que serão mencionados na seção 2.3, apresentam estratégias focadas no usuário 5,14,15.

2.2 Estratégias focadas na relação usuário-família e demais parceiros conversacionais

Vários estudos apresentam consenso sobre a importância da inclusão familiar 3,16-23 no processo terapêutico para que a generalização, ou seja, que o uso dos recursos da área de CSA seja efetivo fora do espaço terapêutico.

Em uma pesquisa de revisão 16, foram analisados 13 artigos de 1985 a 2005, com sujeitos de até 21 anos, sendo observado, através de uma escala de qualidade de vida familiar (QVF), o impacto das práticas com recursos da área da CSA na QVF. Os autores observaram que cinco domínios revelam tal impacto: interação familiar, bem-estar físico e material, exercício da função parental, suporte ao distúrbio e promoção do bem-estar emocional ao usuário e familiares.

Outro artigo abordou estratégias focadas na família, a partir da criação de contextos hipotéticos de situações cotidianas na relação comunicacional entre profissionais, pais e sujeitos, concluindo que a intervenção deve ser adaptada individualmente, além de se considerar a família como unidade de serviço 17.

Através de entrevistas semi-estruturadas com seis familiares de sete crianças usuárias de recursos da área de CSA, um estudo 18 salientou que as expectativas, os facilitadores, as barreiras e os benefícios do uso do recurso devem ser analisados caso a caso com a participação familiar. Os autores afirmam que o excesso de estresse familiar está relacionado ao tempo de uso do recurso e, por isso, o uso de comunicação corporal é preferido ao uso dos recursos da área de CSA.

A abordagem centrada na família também é investigada em outro estudo 19, visando desenvolver e implementar o uso dos recursos da área de CSA, resultando em altos níveis de satisfação da mesma com o conhecimento e sensibilidade do instrutor e relevância do treinamento, mas ainda algum desconforto para o uso do recurso, demonstrando que esta é uma questão para pesquisas futuras.

Pesquisadores afirmam que o foco duplo na criança e família, além de diferentes parceiros conversacionais, é o mais indicado, embora a efetividade das abordagens terapêuticas deva sofrer processo de aprimoramento considerando os critérios dos estudos baseados em evidências 3,20,21. Do mesmo modo, estudos realizados demonstram que, apesar das esparsas evidências, o posicionamento corporal de parceiros conversacionais e crianças para a interação, a criação de oportunidades de comunicação e a responsividade aos sinais comunicativos pela criança são índices importantes a serem analisados durante o processo de intervenção 3,21. De modo especial, as modificações que o parceiro pode fazer para facilitar o processo comunicativo, como frequência de perguntas abertas, proporção de perguntas e respostas, etc.

Outro estudo também corrobora a importância do foco no usuário em conjunto com o parceiro ao analisar a adequação contextual, pois a conversação e seu contexto verbal e não-verbal é um saber compartilhado pelos parceiros conversacionais 22.

Por fim, para ilustrar a importância da unidade família na perspectiva de atuação com recursos da área da CSA, 25 mães de sujeitos com distúrbios da comunicação foram investigadas, visando descrever as crenças de auto-eficácia materna e classificação por parte da mãe das habilidades linguísticas de seus filhos 23. Os resultados demonstram que as mães acreditam ter alta auto-eficácia, embora os filhos tenham dificuldades de comunicação.

2.3 Aspectos linguísticos abordados na implementação dos recursos da área de CSA

Em relação ao domínio de vocabulário, vários estudos demonstram que, do ponto de vista pragmático, a contextualização na apresentação do mesmo é fundamental para sua aquisição e generalização a outros espaços além do terapêutico, sobretudo no caso de crianças 5-7.

Considerando a aquisição sintática, um estudo analisou a eficácia da instrução gramatical de categorias sintáticas distintas para dois adultos usuários dos recursos da área de CSA14. Ambos aprenderam, observando-se que um generalizou e outro necessitou ser retreinado para generalizar para contextos fora da sessão terapêutica.

Dada a relevância dos aspectos pragmáticos, pesquisas também foram realizadas nesta perspectiva de análise 24,25. Em ambos os estudos, foi estudado o conflito entre máximas conversacionais de relevância (quantidade de informação relevante para a comunicação) e velocidade de veiculação da informação. Houve o julgamento de cenas, manipuladas com níveis distintos de ambas as variáveis, efetivado por 96 vendedores que visualizaram as situações de uso dos recursos da área de CSA durante compra e venda encenada por atores. Um estudo 24 concluiu que a velocidade e a relevância devem se combinar para permitir o uso dos recursos da área de CSA, embora a velocidade fosse considerada mais importante pelos juízes nesse estudo. Já o outro estudo 25, a relevância foi escolhida como fator mais importante. Nesse, a ordem de preferência de combinação entre velocidade e relevância na veiculação da mensagem foi: mensagem lenta e altamente relevante com aviso, seguida de mensagem lenta e altamente relevante sem aviso, posteriormente foi considerada mensagem rápida parcialmente relevante e, por fim, mensagem rápida sem relevância.

Em relação à aquisição da habilidade de falar, um artigo de revisão 26 analisou 23 estudos, de 1975 a 2003, abrangendo 67 sujeitos e concluíram que, para 55 sujeitos, a fala foi favorecida pelo uso dos recursos da área de CSA, e decaiu apenas para cinco sujeitos. Em outro estudo 20, as pesquisadoras afirmam que a inteligibilidade de fala do sujeito é fator preditivo para a interação social, observando que as mães procuram compensar tais dificuldades de interação através de altos níveis de iniciação e diretividade da conversação.

O uso do texto como unidade a ser considerada na intervenção é confirmado em outra pesquisa 15 que afirma que o trabalho com palavras isoladas não produziu generalização para a leitura de textos. Neste estudo, cinco sujeitos, três com retardo mental e dois com paralisia cerebral, foram submetidos a programa centrado em tarefas de consciência fonológica. Três desenvolveram a rota fonológica de leitura e quatro passaram a ler livros com dificuldade.

Observa-se, ao término desta revisão, que é vasta a literatura científica sobre o design dos recursos da área de CSA, como iconicidade, cores e tamanhos de símbolos, disposição do layout, seleção, velocidade e demanda de esforço para acessar o recurso, além de diversas abordagens sobre a tecnologia assistiva de alta complexidade para viabilizar uma expressão comunicativa por parte do sujeito. Entretanto, ainda são em pequeno número as pesquisas clínicas ou experimentais na área de conhecimento da CSA na fonoaudiológica que valorizem a investigação e aplicação de práticas estratégicas na relação entre usuário e família (foco duplo) e demais parceiros conversacionais.

Realizada a revisão de literatura criou-se um esboço de hierarquização (Figura 2), apresentando uma síntese dos aspectos considerados mais relevantes para uma adequada implementação dos recursos da área de CSA, através dos processos de seleção, criação, confecção, introdução, intervenção, expansão, generalização e manutenção dos recursos da área da CSA.


Percebe-se, então, que os desafios para que se viabilize um uso realmente funcional dos recursos da área de CSA no cotidiano do usuário e demais parceiros conversacionais são de natureza variada. Desta forma, criou-se quatro diretrizes para nortear o planejamento e execução destes processos:

1. Incluir o usuário, a família e demais parceiros conversacionais em todas as etapas, da seleção do design, do conteúdo linguístico e no processo de intervenção, para que ocorra o sucesso na generalização e manutenção do uso dos recursos da CSA em todos os espaços de vida do seu usuário. Para tanto, não só os familiares mais diretos (pais, irmãos, avós) como os menos diretos (tios, primos, etc.) e outros parceiros (colegas, professores, demais terapeutas, prestadores de serviços) devem ser incluídos;

2. Atentar ao impacto do recurso na qualidade de vida do usuário e da família. Para isso, devem-se fomentar práticas clínicas nas quais as escolhas dos recursos sejam compartilhadas, dialogadas com o próprio usuário e com a família, e não eleitas unilateralmente pelo terapeuta;

3. Considerar aspectos como velocidade de intercâmbio e a relevância da informação comunicativa na seleção de design e acessibilidade aos recursos da área de CSA e do conteúdo linguístico que ela veicula. Destaca-se que as temáticas linguísticas devem necessariamente atender às demandas temáticas do usuário e da família;

4. Favorecer o aprendizado do recurso da área de CSA e, consequentemente, sua manutenção e generalização conjugando contextos formais (escola, clínica) e informais (restaurantes, parque, vida social), assim como em contextos estruturados ou semi-estruturados de uso.

CONCLUSÃO

A individualização das práticas quanto ao design, relevância e velocidade do processamento da informação e o processo de inclusão da família e demais parceiros conversacionais são fundamentais ao sucesso na intervenção, generalização e manutenção de uso da prancha de comunicação suplementar e/ou alternativa em contextos formais e informais.

A prescrição individualizada dos recursos da área de CSA conforme características físicas, mentais, psíquicas, cognitivas e lingüísticas do usuário tem impacto positivo na sua qualidade de vida e na de seus familiares, portanto, recomenda-se a introdução o mais breve possível dos recursos terapêuticos da área da CSA para sujeitos com oralidade restrita e/ou ausente.

RECEBIDO EM: 22/08/2009

ACEITO EM: 31/05/2010

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:

    Carla Ciceri Cesa
    Av. Prof. Paula Soares, 315 ap. 302
    CEP: 91220-450 Porto Alegre - RS
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Abr 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Recebido
      22 Ago 2009
    • Aceito
      31 Maio 2010
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