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A comunicação não-verbal na área da saúde

Non-verbal communication in the health area

Resumos

TEMA: a comunicação é a base fundamental das relações interpessoais, podendo ser verbal ou não verbal. A comunicação não-verbal completa, contradiz ou substitui a comunicação verbal. OBJETIVO: realizar uma revisão bibliográfica do uso e do conhecimento da comunicação não-verbal pelos profissionais da saúde. CONCLUSÃO: embora os artigos enfatizem a relevância do conhecimento da comunicação não-verbal para melhorar a percepção do paciente como sujeito e humanizar os atendimentos de saúde, diversos profissionais da saúde e estudantes dessa área demonstraram pouco conhecimento acadêmico e profissional sobre essa forma de comunicação.

Comunicação não Verbal; Pessoal de Saúde; Humanização da Assistência


BACKGROUND: communication is the fundamental basis of interpersonal relationship and it can be verbal or non-verbal. Non-verbal communication completes, contradicts or substitutes verbal communication, improving the perception of the patient as a subject and humanizing health services. PURPOSE: to conduct a bibliographical review on the use and knowledge of non-verbal communication by health professionals. CONCLUSION: although the articles emphasize the relevance concerning the knowledge of non-verbal communication in order to improve the perception of the patient as a subject and humanizing health services, many health professionals and students from this area showed little academic and professional knowledge on this communication mean.

Nonverbal Communication; Health Personnel; Humanization of Assistance


A comunicação não-verbal na área da saúde

Non-verbal communication in the health area

Ana Paula RamosI; Francine Manara BortagaraiII

IFonoaudióloga, Doutora; Professora Adjunto do Curso de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Santa Maria, RS, Brasil

IIFisioterapeuta do Hospital de Caridade de Santa Maria; Mestranda do Programa de Distúrbios da Comunicação Humana do Curso de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Santa Maria, RS, Brasil; Especialista em Fisioterapia Geriátrica e Gerontológica

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Francine Manara Bortagarai R. Appel, 800, apto 210 Santa Maria – RS, Brasil CEP: 97030-015 E-mail: fbortagarai@hotmail.com

RESUMO

TEMA: a comunicação é a base fundamental das relações interpessoais, podendo ser verbal ou não verbal. A comunicação não-verbal completa, contradiz ou substitui a comunicação verbal.

OBJETIVO: realizar uma revisão bibliográfica do uso e do conhecimento da comunicação não-verbal pelos profissionais da saúde.

CONCLUSÃO: embora os artigos enfatizem a relevância do conhecimento da comunicação não-verbal para melhorar a percepção do paciente como sujeito e humanizar os atendimentos de saúde, diversos profissionais da saúde e estudantes dessa área demonstraram pouco conhecimento acadêmico e profissional sobre essa forma de comunicação.

Descritores: Comunicação não Verbal; Pessoal de Saúde; Humanização da Assistência

ABSTRACT

BACKGROUND: communication is the fundamental basis of interpersonal relationship and it can be verbal or non-verbal. Non-verbal communication completes, contradicts or substitutes verbal communication, improving the perception of the patient as a subject and humanizing health services.

PURPOSE: to conduct a bibliographical review on the use and knowledge of non-verbal communication by health professionals.

CONCLUSION: although the articles emphasize the relevance concerning the knowledge of non-verbal communication in order to improve the perception of the patient as a subject and humanizing health services, many health professionals and students from this area showed little academic and professional knowledge on this communication mean.

Keywords: Nonverbal Communication; Health Personnel; Humanization of Assistance

INTRODUÇÃO

O termo comunicar é proveniente do latim – communicare – e significa "colocar em comum1 ".

Entende-se, a partir dessa definição, que comunicação é o intercâmbio compreensivo de significação por meio de símbolos, havendo ou devendo haver reciprocidade na interpretação da mensagem verbal ou não-verbal1. Seja qual for o modo da comunicação, verbal ou não-verbal, ela está sempre presente na cena terapêutica, veiculando conteúdos conscientes e inconscientes, cuja significação está vinculada ao contexto em que ocorre2.

De modo especial, a comunicação não-verbal qualifica a interação humana, imprimindo sentimentos, emoções, qualidades e um contexto que permite ao indivíduo não somente perceber e compreender o que significam as palavras, mas também compreender os sentimentos do interlocutor. Mesmo o silêncio é significativo e pode transmitir inúmeras mensagens em determinado contexto3.

A comunicação não-verbal abrange cerca de 93% das possibilidades de expressão, em um contexto de interação social, manifestando-se em 38% das oportunidades por sinais paralinguísticos, tais como a entonação da voz, os grunhidos, os ruídos vocálicos de hesitação, a pronúncia, a tosse e o suspiro provocados por tensão; e, em 55%, pelos sinais silenciosos do corpo, como os gestos, o olhar, a postura, a expressão facial, assim como as próprias características físicas, que individualizam o indivíduo dentro de seu contexto específico4.

Esses sinais não-verbais podem ser utilizados para complementar, substituir ou contradizer a comunicação verbal e também para demonstrar sentimentos2. Em caso de conflito entre a mensagem verbal e a comunicação não-verbal, a mensagem não-verbal prevalecerá5.

Os tipos de sinais não-verbais que podem ser "lidos" durante uma interação de pessoas envolvidas no processo de comunicação são: as ações ou movimentos do corpo, a postura corporal (cinésica), os sinais vocais ou paralinguísticos, o uso do espaço pelos comunicadores (proxêmica), os objetos e adornos utilizados, o tipo de corpo (características físicas) e o momento em que as palavras são ditas2,4,6.

Birdwhistell, nos anos 70, foi considerado o pioneiro na tentativa de compreensão da linguagem do corpo (cinésica), a qual considerou estar contextualizada em seu meio social e cultural4,7. Já Hall, introduziu o termo proxêmico, nos anos 80, a fim de considerar a distância interpessoal como um instrumento expressivo na interação não-verbal7. Em estudos mais atuais, ressalta-se a importância de se estudar o tema em razão do fato de ser aspecto fundamental para a melhora da interação entre o profissional de saúde e o usuário do sistema de saúde, seja público ou privado3,7-12.

Considerando tais pressupostos, este artigo objetiva realizar uma revisão bibliográfica do uso e do conhecimento da comunicação não-verbal pelos profissionais da saúde.

MÉTODO

Para a realização desta pesquisa foram selecionados apenas artigos brasileiros, publicados nos últimos treze anos, de 1996 a 2009, que enfocassem a importância, a função e as implicações da Comunicação não-verbal para o atendimento em saúde e educação. A consulta ocorreu em periódicos das bases de dados: Scielo, Medline, Periódicos Capes e LILACS.

Os descritores utilizados foram: comunicação não-verbal, cinésica, proxêmica e tacêsica. Utilizando-se a palavra cinésica, foram encontrados quinze artigos, sendo sete destes utilizados; com a palavra proxêmica, foram encontrados seis artigos dos quais quatro foram selecionados, e com a palavra tacêsica, foram encontrados dois artigos, dos quais um foi selecionado para este estudo. O critério de seleção obedeceu à demanda pela abordagem da temática no atendimento em saúde. Os artigos não selecionados abordavam o tema do corpo no âmbito da educação. Do resultado destas buscas, aproveitaram-se também teses e artigos citados em suas referências bibliográficas, o que totaliza 35 artigos, duas teses e três livros que atendiam aos critérios citados, sendo os últimos relevantes ao assunto exposto.

REVISÃO DA LITERATURA

Em estudos realizados com profissionais da saúde, verifica-se que estes consideram importante o conhecimento da comunicação não-verbal (CNV)7,11-13, porque sem tal percepção emocional, os problemas do dia a dia e a rotina podem fazer com que os profissionais toquem sem sentir, olhem sem ver e escutem sem ouvir4. Entre os aspectos relevantes para esta análise, encontram-se o uso do espaço (proxêmica), o movimento nesse espaço (cinésica) e a utilização do toque (taxêmica).

O uso do espaço é um meio de comunicação não-verbal e influencia o relacionamento interpessoal4. Nomeado como proxêmica, estuda o significado social do espaço e sua estruturação inconsciente2. Seu estudo tem contado com um número crescente de investigações, inicialmente, na área da antropologia e psicologia e, hoje, encontram-se vários estudos na área da enfermagem. Estudos realizados com sujeitos queimados14, portadores de HIV/AIDS15 e laringectomizados16 demonstram a importância de se observar as relações espaciais – posição e distanciamento, volume de voz e postura corporal – que devem haver entre o profissional de saúde e o sujeito durante a abordagem física deste. Nesses estudos, o volume de voz e o distanciamento dos profissionais frente ao sujeito foram adequados, havendo o predomínio do contato visual durante as interações observadas.

Outro meio de comunicação não-verbal é o toque ou tacésica. O toque deve estar presente em toda assistência, não deve ser condicionado à realização de procedimentos técnicos científicos e deve ter a finalidade de demonstrar carinho, empatia, segurança e proximidade em relação ao sujeito4.Tal fato pode ser visualizado em estudos que analisaram esse gesto na díade mãe-filho, este portador de HIV17, e na relação enfermeira e pré-parturientes18. Em ambos os estudos, o toque permitiu a intimidade, a segurança e o apoio. Isso também foi verificado em situações na Unidade de Terapia Intensiva, demonstrando o quanto o toque interfere no estado físico e mental do sujeito, podendo gerar segurança e conforto, assim como medo e ansiedade19-21.

Abrangendo muitos dos aspectos anteriormente citados, várias pesquisas suscitam a discussão da importância da compreensão da comunicação não-verbal na interação do terapeuta com usuários de atendimentos de saúde mental22, em programa de hemodiálise23,24, com usuários em estados terminais25, com sedados na Unidade de Terapia Intensiva19,26, com mulheres que amamentavam pós-parto27, com idosos institucionalizados28, com sujeitos surdos29, com sujeitos oncológicos com ostomia30, com crianças autistas31 e com sujeito estrangeiro hospitalizado32. Em todos os estudos, fica evidente a importância da comunicação não-verbal na percepção dos sentimentos dos sujeitos, o que tem papel fundamental para o cuidado em saúde. Um exemplo da importância da CNV para a percepção dos sentimentos dos sujeitos foi a investigação acerca da sexualidade de mulheres residentes em uma área rural, que demonstraram desconforto, de modo não-verbal, diante de questionamentos sobre sua vida sexual6.

Portanto, a competência em comunicação interpessoal – verbal e não-verbal – é uma habilidade fundamental a ser adquirida, a qual possibilita a excelência do cuidar em saúde33. A compreensão da comunicação através de sinais não-verbais é importante principalmente para profissionais cuja ação está intimamente relacionada ao corpo e ao movimento7, uma vez que contribui de forma relevante para melhorar os relacionamentos, sejam eles pessoais ou profissionais3.

Além dessa preocupação relacionada ao sujeito que se comunica, também há pesquisas efetuadas com alunos, futuros profissionais da saúde, sobre suas percepções acerca da comunicação não-verbal emitida pelo sujeito12,34 e até mesmo, a percepção que os estudantes possuem de si próprios em termos de comunicação não-verbal e auto-conhecimento corporal35. Nesses estudos, foram reveladas as dificuldades dos alunos em interpretarem as manifestações do seu próprio corpo e as ações corporais do sujeito em tratamento.

Os profissionais de saúde não devem esquecer que suas mensagens não são interpretadas apenas pela fala, mas também pela forma como se comportam. Dessa maneira, pode-se tornar a comunicação mais efetiva ao tomar consciência da importância da linguagem corporal, principalmente no que diz respeito à proximidade, à postura, ao toque e ao contato visual4.

Quando o profissional se relaciona com o sujeito, primeiramente, aquele deve ouvir o que este fala, em segundo lugar, o que ele não deseja falar e, em terceiro lugar, o que ele não pode falar24. Os profissionais de saúde têm a tarefa de interpretar o significado da comunicação não-verbal que o sujeito envia, com a finalidade de estabelecer um plano de cuidados adequado às necessidades singulares do paciente4. A passividade dos sujeitos em sua relação com o profissional de saúde pode levá-los a se tornarem apenas um número, um caso clínico, uma ferida ou uma lesão diante de um olhar tecnicista6. Por isso, a importância de se considerar a comunicação não-verbal como elo fundamental no processo de cuidado em saúde.

Torna-se impossível o ato do cuidar do enfermeiro, a cura do médico, a reabilitação do fisioterapeuta, a compreensão e o aconselhamento do psicólogo ou qualquer outra ação na assistência ao ser humano, sem haver habilidades de comunicação interpessoal, considerando tal comunicação não apenas um instrumento básico para o relacionamento terapêutico, mas uma competência ou capacidade que deve integrar a formação do profissional da saúde3.

Apesar de 65% de toda a comunicação que ocorre em uma interação ser de caráter não-verbal, sabe-se que em nossa sociedade e, principalmente, em nossas atividades profissionais, a comunicação verbal é a mais difundida e valorizada4,16. Isso talvez porque a comunicação não-verbal é mais demorada e requer que os interlocutores estejam atentos para esse tipo de comunicação16.

Pode ser caracterizada como uma ocorrência iatrogênica a imprudência do profissional relacionada à má utilização da comunicação não-verbal e a percepção inadequada desta durante a interação com o paciente. Essa ação prejudicial, não intencional, pode ser mais cortante que um bisturi afiado ou mais dolorosa que a dor física. Ela pode trazer sequelas psicológicas ao paciente e influenciar de maneira decisiva no compromisso do mesmo com o terapeuta e na evolução do tratamento8.

Em pesquisa com estudantes de Medicina, concluiu-se que embora eles considerem importante o conhecimento da comunicação não-verbal para ampliar o vínculo com o paciente e melhorar a compreensão deste, demonstraram não dominar os conceitos, sendo a relação interpessoal com o sujeito predominantemente verbal12. Justificando ou não esse resultado, encontra-se o dilema de identidade da medicina, na escolha entre o paradigma da frieza da atual sofisticação tecnológica e impessoal e aquele da interação secular e mágica, da arte do cuidar terapêutico8.

Em outra pesquisa com profissionais da Educação Física, Medicina e Psicologia, por meio da análise das entrevistas semiestruturadas, foi possível evidenciar que esses profissionais consideram que o conhecimento e a experienciação dos sinais não-verbais podem torná-los mais habilidosos na percepção e interpretação de estados subjetivos, contribuindo, assim, para melhorar a eficiência e competência profissional7. Esses resultados foram também obtidos com a construção de um programa sobre comunicação não-verbal para enfermeiros aplicarem em sujeitos hospitalizados 36.

Há uma preocupação do fisioterapeuta que atua com sujeitos portadores de deficiência mental e que não oralizam, no que diz respeito à interação com esses sujeitos, uma vez que a formação desses profissionais está mais centrada na promoção do desenvolvimento motor e na reabilitação motora13.

Além desses profissionais, o fonoaudiólogo também deve extrapolar os limites dos meros sintomas apresentados pelos sujeitos com dificuldade ou ausência de oralização, buscando o sentido e a interpretação da linguagem manifestada por eles. Sob esta perspectiva, na análise das habilidades verbais e não-verbais efetuada com crianças autistas, com atraso de linguagem, durante uma interação, houve predomínio da linguagem gestual em detrimento dos meios vocais e verbais. Esse fato demonstra que os gestos podem expressar intenções dos sujeitos31.

Logo, ressalta-se a importância de formação sobre a CNV junto a profissionais da saúde, já que a linguagem corporal, integrante desta forma de comunicação, ainda não é um tema muito discutido na formação profissional11. Nesse sentido, há a necessidade de se superar a visão puramente instrumental nas práticas educativas acerca da gestualidade e dos cuidados com o corpo37. Os profissionais da área de saúde, que são realmente preocupados com o ser humano, devem procurar desenvolver meios, instrumentos, técnicas, habilidades, capacidade e competência para oferecer ao paciente a oportunidade de uma existência mais digna, mais compreensiva e menos solitária2.

Para a prestação da assistência ao sujeito, é necessário a demonstração de carinho e atenção: ouvir, expressar um olhar atencioso, tocar e reconfortá-lo; tais ações apresentam contribuição essencial à segurança, proteção e auto-estima de uma pessoa1. Visto que, ao estabelecer uma boa comunicação com os outros, contribui-se para a diminuição de conflitos e mal-entendidos, tornando as relações mais harmônicas e alcançando os objetivos terapêuticos com mais eficiência e satisfação21. Para poder fazer isso, o profissional de saúde necessita dominar os aspectos envolvidos na CNV.

Além da área da saúde, a CNV também tem sido considerada importante na área de marketing e recursos humanos em empresas5 e em academias, nas quais os critérios estão cada vez mais relacionados aos canais de comunicação não-verbal como aparência, vestuário, aspecto físico e carisma para a admissão de funcionários. Políticos e executivos também se preocupam com seus gestos, expressões faciais e posturas, para serem mais eficientes ou convincentes em suas comunicações7.

Percebe-se, a partir dos artigos revisados, que nos últimos anos, com o desenvolvimento dos estudos voltados para a comunicação, esta se tornou o veículo para os mais belos discursos de humanização em saúde. A ênfase do toque não-técnico, do olhar não direcionado à busca de patologias, da aproximação sincera e fraterna, quando não amorosa, tem resgatado valores humanos que ficaram em algum lugar no tempo e no espaço da história do homem que, por sua vez, desenvolveu novos modos de adoecer38.

Uma vez que a comunicação incide sobre a qualidade da assistência prestada ao sujeito, para alcançar uma comunicação satisfatória é preciso que o profissional da saúde deseje envolver-se e acredite que sua presença é tão importante quanto a realização de procedimentos técnicos1,2-4,7,11. Para tanto, deve assumir uma visão de saúde mais holística, na qual não há um divórcio entre corpo e mente38,39 .

Ao longo da história, o corpo foi associado à alma (Platão, Demócrato, Santo Agostinho), limitado a fluidos corporais (Hipócrates), locus dos defeitos e pecados (Idade Média) e seccionado da sua relação com a mente, sendo a religião e a filosofia detentora do estudo da mente e o estudo do corpo, visto como uma máquina, objeto de estudo da medicina (Descartes). O rompimento dessa visão mecanicista do corpo do homem foi introduzido com a teoria psicanalítica de Freud e, mais tarde, com a introdução do termo psicossomático por Heinroth e Alexander, o que denota uma visão mais holística devido à inseparabilidade dos aspectos biológicos e psicológicos40.

Na atualidade, o corpo mantém um status de beleza calcado no estereótipo musculoso para os homens e magro para as mulheres35. Ele é julgado na superficialidade, pelo seu exterior, seja nas relações interpessoais quanto em uma avaliação nas diferentes áreas da saúde. A leitura do seu silêncio e a grandeza de suas manifestações e interpretações são pouco conhecidas pelos profissionais da saúde2,4,7,11,12. Esse fato pode ser observado a partir dos resultados desta revisão.

Retomando a perspectiva holística, a subjetividade do usuário é considerada e a comunicação não-verbal passa a ter um papel importante na cena terapêutica, como elemento de acesso, assim como a linguagem verbal, aos valores culturais e pessoais do paciente4. Tais aspectos são considerados relevantes no estabelecimento de uma boa relação interpessoal, com a finalidade de humanizar o atendimento em saúde40. Parece, no entanto, um paradoxo falar em humanização do atendimento de saúde, visto que ninguém racionalmente pensaria que tal atendimento pudesse ser desumano.

A realidade demonstra que o curso da especialização em saúde e a forma como ela foi conduzida a partir de um modelo de ensino médico baseado na racionalização científica, com a crença naquilo que é visível, palpável, que possa ser dissecado e delimitado numericamente, produziu uma fragmentação do sujeito, que recebe, nessa concepção, a denominação de paciente40. Por isso, o pouco interesse em observar as manifestações não-verbais desse sujeito4,7,8,10 e a ausência de reflexão sobre o papel do corpo do terapeuta12,33-35.

A fragilidade do ensino e da aprendizagem da CNV demonstrada pelos graduandos da saúde demonstra a importância de disciplinas voltadas para o conhecimento teórico e prático desse tema12,34. Os currículos das escolas dos futuros profissionais da saúde valorizam pouco os conteúdos relacionados à humanização da assistência, enquanto há hipervalorização dos conteúdos técnicos relacionados exclusivamente aos aspectos biológicos do ser humano12,35. No entanto, à medida que se amplia a percepção do futuro profissional da saúde através da reflexão do fazer e do entender o usuário, surgem novos elementos para a melhoria da qualidade dos serviços de saúde através da competência e excelência do atendimento7 e a CNV é uma das temáticas relevantes n esse processo de ampliação.

CONCLUSÃO

A aprendizagem da comunicação não-verbal não só é possível, como necessária, em vista da sua importância para as interações intersubjetivas, em todos os níveis de nossa vida: pessoal, social, profissional dentre outros e permite a ampliação da atuação em saúde para uma perspectiva promocional.

Durante a busca de artigos e estudos referentes à temática aqui abordada, a área que mais concentrou pesquisas brasileiras da CNV foi a de Enfermagem, confirmando a "supremacia" do cuidar e a busca da qualidade no atendimento.

A promoção de uma assistência holística que envolva as necessidades bio-psico-sócio-espirituais e emocionais deve passar por um processo comunicativo eficaz entre terapeuta-sujeito.

Diferente das demais áreas, a Enfermagem, desde a década de 50, vem desenvolvendo inúmeros estudos sobre a arte do cuidar e seu aperfeiçoamento. Dentre os cuidados pesquisados, está a interpretação da comunicação não-verbal do sujeito.

Trabalhos sobre a CNV, realizados por fisioterapeutas e fonoaudiólogos, foram escassos. Logo, sugere-se que o termo "cuidar" seja aderido pelos demais profissionais atuantes na saúde, obtendo alcance semelhante ao que este tem na enfermagem. Sugere-se, também, que novos estudos sejam realizados pelos profissionais que trabalham não somente com a patologia, mas com sujeitos que apresentam queixas, desejos e demandas.

Recebido em: 26/11/2010

Aceito em: 24/02/2011

Conflito de interesses: inexistente

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      Fev 2012

    Histórico

    • Recebido
      26 Nov 2010
    • Aceito
      24 Fev 2011
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