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Força muscular respiratória, postura corporal, intensidade vocal e tempos máximos de fonação na Doença de Parkinson

Respiratory muscle strength, body posture, vocal intensity and maximum phonation times in Parkinson Disease

Resumos

TEMA: Verificar os achados de força muscular respiratória (FMR), postura corporal (PC), intensidade vocal (IV) e tempos máximos de fonação (TMF), em indivíduos com Doença de Parkinson (DP) e casos de controle, conforme o sexo, o estágio da DP e o nível de atividade física (AF). PROCEDIMENTOS: três homens e duas mulheres com DP, entre 36 e 63 anos (casos de estudo - CE), e cinco indivíduos sem doenças neurológicas, pareados em idade, sexo e nível de AF (casos de controle - CC). Avaliadas a FMR, PC, IV e TMF. RESULTADOS: homens: diminuição mais acentuada dos TMF, IV e FMR nos parkinsonianos, mais alterações posturais nos idosos; mulheres com e sem DP: alterações posturais similares, relação positiva entre estágio, nível de AF e as demais medidas. CONCLUSÕES: Verificou-se nas parkinsonianas, prejuízo na IV e nos parkinsonianos déficits nos TMF, IV e FMR. Sugerem-se novos estudos sob um viés interdisciplinar.

Doença de Parkinson; Respiração; Voz; Postura


PURPOSE: To check the findings on respiratory muscular strength (RMS), body posture (BP), vocal intensity (VI) and maximum phonation time (MPT), in patients with Parkinson Disease (PD) and control cases, according to gender, Parkinson Disease stage (PD) and the level of physical activity (PA). METHODS: three men and two women with PD, between 36 and 63 year old (study cases - SC), and five subjects without neurologic diseases, of the same age, gender and PA level (control cases - CC). We evaluated RMS, BP, VI and MPT. RESULTS: men: a more pronounced decrease of MPT, VI, RMS in Parkinson patients, plus postural alterations in the elderly; women: similar postural alterations, positive relation between stages, PA level and the other measures. CONCLUSIONS: We observed in women with PD, impaired VI; in men with PD deficits in MPT, VI, RMS. We suggest further studies under an interdisciplinary bias.

Parkinson's Disease; Respiration; Voice; Posture


Força muscular respiratória, postura corporal, intensidade vocal e tempos máximos de fonação na Doença de Parkinson

Respiratory muscle strength, body posture, vocal intensity and maximum phonation times in Parkinson Disease

Fernanda Vargas FerreiraI; Carla Aparecida CieloII; Maria Elaine TrevisanIII

IFisioterapeuta; Professora Assistente do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Franciscano/RS; Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana pela Universidade Federal de Santa Maria/RS, Brasil

IIFonoaudióloga; Professora Adjunta do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Santa Maria/RS; Doutora em Lingüística Aplicada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/RS, Brasil

IIIFisioterapeuta; Professora Assistente do Departamento de Fisioterapia e Reabilitação da Universidade Federal de Santa Maria/RS; Mestre em Ciência do Movimento Humano - Área de Fisiologia do Exercício pela Universidade Federal de Santa Maria/RS, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Fernanda Vargas Ferreira Rua Visconde de Pelotas 517, Bairro N. Sra. do Rosário CEP 97010-440 Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil E-mail nandaf_pg@yahoo.com.br

RESUMO

TEMA: Verificar os achados de força muscular respiratória (FMR), postura corporal (PC), intensidade vocal (IV) e tempos máximos de fonação (TMF), em indivíduos com Doença de Parkinson (DP) e casos de controle, conforme o sexo, o estágio da DP e o nível de atividade física (AF).

PROCEDIMENTOS: três homens e duas mulheres com DP, entre 36 e 63 anos (casos de estudo - CE), e cinco indivíduos sem doenças neurológicas, pareados em idade, sexo e nível de AF (casos de controle - CC). Avaliadas a FMR, PC, IV e TMF.

RESULTADOS: homens: diminuição mais acentuada dos TMF, IV e FMR nos parkinsonianos, mais alterações posturais nos idosos; mulheres com e sem DP: alterações posturais similares, relação positiva entre estágio, nível de AF e as demais medidas.

CONCLUSÕES: Verificou-se nas parkinsonianas, prejuízo na IV e nos parkinsonianos déficits nos TMF, IV e FMR. Sugerem-se novos estudos sob um viés interdisciplinar.

Descritores: Doença de Parkinson; Respiração; Voz; Postura

ABSTRACT

PURPOSE: To check the findings on respiratory muscular strength (RMS), body posture (BP), vocal intensity (VI) and maximum phonation time (MPT), in patients with Parkinson Disease (PD) and control cases, according to gender, Parkinson Disease stage (PD) and the level of physical activity (PA).

METHODS: three men and two women with PD, between 36 and 63 year old (study cases - SC), and five subjects without neurologic diseases, of the same age, gender and PA level (control cases - CC). We evaluated RMS, BP, VI and MPT.

RESULTS: men: a more pronounced decrease of MPT, VI, RMS in Parkinson patients, plus postural alterations in the elderly; women: similar postural alterations, positive relation between stages, PA level and the other measures.

CONCLUSIONS: We observed in women with PD, impaired VI; in men with PD deficits in MPT, VI, RMS. We suggest further studies under an interdisciplinary bias.

Keywords: Parkinson's Disease; Respiration; Voice; Posture

INTRODUÇÃO

A Doença de Parkinson (DP) é uma enfermidade neurodegenerativa, decorrente de lesão nos gânglios basais. Ocorre a partir dos 50 anos, em ambos os sexos, com repercussões nos sistemas respiratório, músculoesquelético e estomatognático1-3.

Há redução da capacidade vital e da força muscular respiratória, possivelmente pela rigidez muscular e alterações na coluna vertebral, podendo gerar déficit restritivo na ventilação2-6. A postura do parkinsoniano é a de flexão da cabeça, hipercifose torácica, protração de ombros e flexão dos braços3,4. Os desvios posturais de cabeça limitam os movimentos da mandíbula, interferindo na voz6,7, já que existem relações anatomofuncionais do sistema estomatognático com a região cérvico-escapular3,6,7. Destacam-se, na disartrofonia hipocinética, monotonia de intensidade2,7,8; disprosódia8-10; disfluência9-11 e alteração da velocidade de fala2,8,10,11.

A redução da intensidade vocal tende a tornar a comunicação verbal ininteligível2,7,9,11, sendo que o padrão hipercifótico, frequente na DP, resulta em menor expansão do gradil costal4,5 e em menores volumes pulmonares1,3,5. Ainda, a hipofonia apresenta possível etiologia baseada em alterações na configuração das pregas vocais2,8,11.

Consequentemente, os tempos máximos de fonação (TMF) podem apresentar-se reduzidos10,11, indicando a alteração da dinâmica respiratória e/ou da coaptação das pregas vocais, com desequilíbrio das forças aerodinâmicas respiratórias e mioelásticas da laringe11,12. Fisiologicamente, a IV e os TMF diminuem com o avanço da idade devido a redução do tônus muscular, fraqueza e atrofia da musculatura laríngea e ao decréscimo da força muscular respiratória (FMR)5,12,13.

Acerca da possível relação entre fonação, postura e respiração na DP, esta pesquisa teve como objetivo verificar FMR, PC, IV e TMF, conforme o sexo, estágio da DP e o nível de atividade física.

APRESENTAÇÃO DO CASO

A população da qual foram selecionados os casos a serem estudados compreendeu indivíduos com diagnóstico neurológico de DP, ambos os sexos, entre 35 e 65 anos, falantes do português brasileiro (PB). Os casos de controle foram selecionados a partir de uma população de indivíduos sem DP, ambos os sexos, falantes do PB, pareados de acordo com a idade, o sexo e o nível de atividade física.

Os critérios de exclusão para os casos de estudo (CE) e de controle (CC) foram: déficit cognitivo; avaliação laringológica com anormalidades, que não as alterações laríngeas típicas da DP e ou do envelhecimento; sintomas ou sinais espirométricos de doença pulmonar obstrutiva crônica; estar realizando tratamento fonoaudiológico e/ou otorrinolaringológico; ser profissional da voz; ser tabagista e/ou consumir álcool em excesso; perda auditiva; cantar em coros.

Todos os indivíduos foram submetidos à entrevista semi-estruturada, avaliação otorrinolaringológica, espirométrica e auditiva, por profissionais especialistas. A partir dos resultados dessas avaliações, foram selecionados para o estudo apenas os sujeitos que atenderam aos critérios mencionados.

Para o pareamento quanto ao nível de atividade física, todos os sujeitos responderam ao Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ)14. Dos oito indivíduos que se apresentaram como voluntários, excluíram-se três por perda auditiva.

Assim, constituiu-se um grupo de CE com três homens e duas mulheres, entre 36 e 63 anos, e um grupo de CC constituído por cinco indivíduos sem doenças neurológicas. Esses sujeitos, pareados em CE e CC, nas idades de 36, 56, 57, 61 e 63 anos, cada par respectivamente, foram submetidos às avaliações para a coleta de dados.

Para os CE, realizou-se a delimitação dos estágios, por meio da Escala de Hohen e Yahr Modificada15.

A avaliação postural foi realizada por uma fisioterapeuta sem conhecimentos sobre os propósitos da pesquisa. O sujeito usou traje de banho, em bipedestação, avaliado nas posições ântero-posterior, póstero-anterior e em perfil. Considerou-se a posição cérvico-escapular e as curvaturas da coluna vertebral16.

A intensidade vocal foi realizada por fonoaudióloga, por meio de um decibelímetro digital (marca Homis, modelo413) posicionado a quatro centímetros da boca do sujeito, em sala acusticamente tratada. Solicitou-se ao sujeito, em bipedestação, que após inspiração profunda, emitisse a vogal /a/ sustentada pelo tempo mais prolongado possível17. Adotaram-se os valores correspondentes à média para indivíduos adultos do sexo feminino de 63,75dB e de 63,01dB para o sexo masculino18 e, para idosos, de 68,9dB19.

As mensurações da Pressão inspiratória máxima (Pimáx) e Pressão expiratória máxima (Pemáx) foram feitas por meio de um manovacuômetro digital (marca Microhard MVD 500). Os indivíduos em bipedestação, tendo as narinas ocluídas com clipe nasal, foram instruídos a exalar até o volume residual (VR) ou inalar até a capacidade pulmonar total (CPT) antes de serem estimulados a inalar/exalar com esforço máximo para mensurar a Pimáx e Pemáx respectivamente. Realizaram-se de três a cinco manobras máximas, com intervalo de descanso de aproximadamente um minuto, sendo registrado o valor mais alto. Adotaram-se os valores referenciais da literatura20.

Os TMF foram coletados por fonoaudióloga, que solicitou ao indivíduo, após uma inspiração máxima, que sustentasse durante toda uma expiração, em tom e intensidade habituais, as vogais, o /e/ áfono e as consoantes /s/, /z/, que foram gravadas digitalmente (marca CABO 4P BK-USB22 "BAK") com o microfone posicionado a quatro centímetros da boca do sujeito17,21 e também cronometradas em segundos (cronômetro digital Technos) para a quantificação do TMF de cada um. Cada fonema foi sustentado por três vezes, sendo escolhido o maior valor em segundos de cada fonema21. Após a coleta dos TMF, foram realizadas as relações s/z, e e áfono/e. Consideraram-se os TMF para adultos do sexo feminino acima de 15 segundos e para o sexo masculino acima de 20 segundos21. Para idosos do sexo feminino, entre 10 e 15 segundos e do sexo masculino, entre 15 e 20 segundos12. Consideraram-se os valores da relação s/z para adultos de 0,99 a 1,2 e para idosos de 0,76 a 0,8222 e para a relação e áfono/e de 0,8 a 1,217, tanto para adultos como para idosos.

Todas as avaliações foram realizadas após a medicação anti-parkinsoniana (período ON).

Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Resolução 196/96 - CNS), sendo o presente trabalho previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição de origem (n 091/2005).

A análise dos dados coletados foi realizada de forma descritiva, observando-se as tendências e possíveis relações apresentadas pelos CE e CC, pareados segundo sexo, idade e nível de atividade física, nas avaliações da FMR, PC, IV e TMF.

RESULTADOS

O grupo de CE foi constituído de cinco indivíduos, três homens e duas mulheres, na faixa etária entre 36 e 63 anos, classificados na Escala de Hohen e Yahr Modificada15, sendo um indivíduo em cada estágio (1,5; 2 e 3) e dois indivíduos no estágio 2,5; pareados segundo idade, sexo e nível de atividade física com cinco indivíduos sem doenças neurológicas (CC), todos submetidos à avaliação FMR, da PC, da IV e dos TMF.

Par a par, observaram-se as seguintes características, como segue.

Caso de Estudo 1 (CE1), sexo feminino, 57 anos, estágio 2,5, irregularmente ativo A, pareada com Caso de Controle 1 (CC1), sexo feminino, 57 anos, irregularmente ativo A (QUADRO 1).


Caso de Estudo 2 (CE2), sexo feminino, 56 anos, estágio 1,5, ativa, pareada com Caso de Controle 2 (CC2), sexo feminino, 56 anos, ativa (QUADRO 2).


Caso de Estudo 3 (CE 3), sexo masculino, 63 anos, estágio 2,5, muito ativo, pareado com Caso de Controle 3, (CC3), sexo masculino, 63 anos, muito ativo (QUADRO 3).


Caso de Estudo 4 (CE4), sexo masculino, 59 anos, estágio 3, sedentário, pareado com Caso de Controle 4, (CC4), sexo masculino, 59 anos, sedentário (QUADRO 4).


Caso de Estudo 5 (CE5), sexo masculino, 36 anos, estágio 2, ativo, pareado com Caso de Controle 5, (CC5), sexo masculino, 36 anos, ativo (QUADRO 5).


DISCUSSÃO

Neste estudo, três indivíduos eram do sexo masculino e dois do sexo feminino, dos quais quatro apresentaram sinais e sintomas em torno da quinta década de vida, em concordância com estudos que apontam discreta predominância nos homens, a partir dos 50 anos1,3,11.

Quanto aos estágios da DP, os dados evidenciaram que a maioria dos indivíduos encontrou-se nos estágios intermediários, convergindo com outros estudos11,23.

Apenas um sujeito foi classificado como sedentário, possivelmente por estar no estágio de DP mais avançado, concordando com a afirmação de que à medida que a doença evolui, os parkinsonianos se exercitam com menor freqüência1,3-5.

Ao se verificar a relação entre os pares de CE e CC no sexo feminino, os resultados dos TMF, das Pimáx e Pemáx e das relações e áfono/e e s/z apresentaram-se similares ou próximos. Possivelmente, a melhor performance nas avaliações decorre da associação entre os menores estágios da DP e o maior nível de atividade física.

Como o envelhecimento gera alterações como perda de massa muscular, menor expansão do gradil costal e encurtamento do diafragma, com conseqüente prejuízo nas capacidades respiratórias3,20, seria esperada uma repercussão negativa no desempenho desses sujeitos.

Uma possível justificativa, além dos estágios iniciais da DP nas parkinsonianas, procede também da atividade física que incrementa a FMR pelo estímulo à flexibilidade do diafragma. Os exercícios físicos aumentam o tônus dos abdominais que servem de apoio ao deslocamento céfalo-caudal do diafragma4,5. A atividade física tende a otimizar as funções cardiorrespiratórias, refletindo-se no fluxo expiratório4,5,24.

A relação e áfono/e, semelhante à relação s/z, evidencia a coordenação entre o sopro expiratório e as pregas vocais durante a fonação, e a sustentação da vogal áfona /e/ constitui um indicador clínico do controle da saída do ar, exclusivamente por meio do suporte respiratório, ocorrendo o mesmo com a sustentação do fonema /s/. Na emissão sustentada de /z/ e de /e/, observa-se o papel da fonte glótica no controle do ar expiratório à fonação 17,21.

Notou-se que as parkinsonianas e os seus CC exibiram a relação s/z dentro do esperado12,22, contrário à literatura, já que o envelhecimento e a DP tendem a prejudicar a FMR e TMF, conseqüência da incoordenação neuromuscular presente nos sistemas fonatório, articulatório e respiratório2,7,10-13. Uma possível justificativa para esse achado é o controle do fluxo expiratório, conforme as performances nas Pimáx e Pemáx, pois presumivelmente houve substrato respiratório. Além disso, os TMF isolados de /s/ e de /z/ apresentam o controle articulatório como um fator mascarante; e o fato de estarem rebaixados nas parkinsonianas, resultam numa relação matemática em torno de 1, o que não significa equilíbrio entre o aporte respiratório e o funcionamento glótico à fonação, e sim, um viés matemático da medida.

Porém, na relação e áfono/e, tanto nas parkinsonianas quanto nos seus CC, verificou-se alteração com valores abaixo ou próximos do limiar inferior17, possivelmente por hipercinesia compensatória a partir da falta de resistência glótica no caso da DP e por comportamento vocal incorreto no caso dos CC17,21.

A IV depende da interação periférica entre a pressão de ar subglótica, a quantidade de fluxo aéreo, a resistência glótica e as mudanças na configuração do trato vocal7,10,12,17. Neste estudo, a IV das parkinsonianas, independente do estágio da doença, apresentou-se em piores condições quando comparadas aos CC, que também se encontraram inferiores à literatura22. Provavelmente, essa medida mostrou-se mais prejudicada nas parkinsonianas do que nas idosas pela rigidez dos músculos respiratórios, visto que a expansão da caixa torácica e os volumes pulmonares são a base respiratória para a IV1,4,5,14,25. Também é possível afirmar que a musculatura laríngea apresenta-se afetada na DP, sendo que algumas pesquisas sugerem hiperexcitabilidade dos músculos tireoaritenóideo e cricotireóideo8,9. Outras apontam redução nos potenciais de ação1,21, sendo esperada a diminuição da IV, comum no discurso do parkinsoniano2,9,11,13.

No entanto, as medidas de Pimáx e Pemáx, bem como algumas medidas de TMF e a relação s/z mostraram-se próximas aos valores esperados para idosas5,12,13,21,25, mesmo na presença da DP2,9,21. Assim, sugere-se que as idosas, com e sem DP, ainda evidenciaram coordenação pneumofonoarticulatória.

É necessário considerar que as alterações funcionais ocorrem em maior número, freqüência e gravidade de acordo com a evolução da DP,15,24 e ponderar que os fenômenos da voz variam em complexidade e extensão8-10, podendo ocorrer nas fases iniciais2,11, podendo justificar a diminuição da IV sem prejuízo evidente de TMF e da relação s/z, como neste estudo.

Quanto à PC, não houve substanciais diferenças entre os CE e CC femininos, pois ocorreu um encurtamento seletivo dos músculos flexores, adutores e pronadores, gerando a postura em flexão, tanto no envelhecimento (CC) quanto na DP (CE)4,16,24.

Quanto ao sexo masculino, os parkinsonianos, em geral, exibiram resultados inferiores nos TMF, na IV e na FMR em relação aos CC, aparentemente sem relação com a idade, o nível de atividade física e o estágio da DP. Possivelmente, pelos efeitos do envelhecimento no aparelho fonador e no sistema respiratório5,12,13,25, acentuados pelas limitações da DP2,9,21.

Com base nesses achados, pode-se supor a deterioração da inter-relação entre as forças expiratórias e mioelásticas da laringe, uma vez que os decréscimos dos TMF e da IV indicaram a diminuição de eficiência laríngea e do controle expiratório11,17,21. Entretanto, as relações s/z e e áfono/e mostraram-se normais para os parkinsonianos, comparando-se aos CC e aos valores esperados para a senilidade12,22, sinalizando que ainda há certa coordenação pneumofônica, em discordância das demais medidas como os TMF, a FMR e a IV que se apresentaram alteradas. Deve-se ressaltar que as relações s/z e e áfono/e, resultantes da investigação dos TMF, são parte da avaliação quantitativa da voz17,21,26, sendo interpretadas em conjunto, já que TMF /s/ e /z/ alterados podem resultar numa relação s/z matematicamente normal e levar a falsos-negativos26.

A restrição da IV, comum no processo de envelhecimento17,21,27 e na DP9-12, apresentou-se acentuada nos parkinsonianos em comparação aos CC, que, por sua vez, a apresentaram diminuída em relação à literatura para idosos22. A senescência e a DP geram diminuição do controle da atividade motora da musculatura laríngea1,7,12,28 e dos músculos respiratórios, dificultando o controle da fonação, além do enrijecimento costal, limitando os movimentos torácicos e as capacidades respiratórias4,5,25,28, com diminuição senil da IV, piorada pela DP.

Outra justificativa para tais achados pode ser a hipertonia dos músculos abdominais, devido à manutenção da postura em flexão, tanto nos parkinsonianos quanto nos idosos, com o tronco anteriorizado e com encurtamento desses músculos, prejudicando a FMR6,16,23. Ainda, o sexo masculino apresenta maior declínio da FMR28-30, justificando também tais resultados.

Um comentário importante refere-se ao indivíduo de 36 anos com DP, com déficits similares aos outros parkinsonianos em quase todas as medidas, com uma performance negativa nos TMF, IV e na relação e áfono/e possivelmente pelo "parkinsonismo de início precoce", com tendência à sintomatologia mais grave3,24.

Entretanto, este parkinsoniano apresentou a Pimáx superior ao seu CC, o que se justificaria pela modificação gradativa da FMR somente a partir das 3ª e 4ª décadas de vida, mantendo-se estável ou com reduções pouco significativas25,28-30, mesmo na presença de DP de início precoce, uma vez que as alterações da DP são assistemáticas1,3,7,10.

Existem poucos estudos que relacionam as características clínicas ao início da DP, contudo, quanto mais idoso o parkinsoniano, mais adversa é a evolução da patologia1,3,23. Ainda, a resposta terapêutica individual à levodopa tende a melhorar parâmetros como a IV e a FMR5,10 podendo justificar o resultado da Pimáx do parkinsoniano jovem.

Outras explicações advêm de mecanismos que se deterioram à proporção que a idade avança, como o trofismo muscular, o número de unidades motoras, alterações endócrinas, e fatores nutricionais28-30. Ainda, pode-se considerar que essas modificações atingem seu pico em torno dos 30 anos, decrescendo progressivamente a partir da 5ª década de vida, o que pode justificar o resultado positivo na FMR do parkinsoniano de 36 anos com nível de atividade física ativo.

O CC jovem também apresentou desempenho abaixo do esperado para a faixa etária adulta nas mesmas medidas (TMF, IV e e áfono/e), embora superiores ao CE. Sugere-se que o CC jovem do sexo masculino tenha apresentado um comportamento fonatório ilustrado por hipercinesia na relação e áfono/e, como já mencionado anteriormente17,21.

Em relação aos TMF e à IV, que são habilidades dependentes da FMR e cujos valores se mostraram inferiores ao esperado20 para o CC jovem, fatores como a quantidade de fibras musculares tipo I e II, nutrição e índice de massa corporal29,30, podem ter interferido nos resultados abaixo do esperado para o CC jovem.

As alterações posturais típicas da DP3,23 foram mais pronunciadas nos parkinsonianos na faixa entre 50 e 65 anos, supondo-se que a perda de tônus muscular e os afrouxamentos ligamentares, comuns no envelhecimento23,24, podem ter modificado as curvaturas vertebrais, ocasionando as alterações encontradas, uma vez que a DP tende a agravar tais distúrbios.

O CE jovem, em comparação com o CC, exibiu menor número de mudanças posturais e o mesmo número de alterações posturais dos demais CC masculinos, o que não era esperado. Uma justificativa decorre do próprio conceito de postura corporal, visto que recebe influências do estado emocional e dos hábitos de vida16,23, pois esse sujeito, além de jovem, apresentou nível ativo de atividade física.

Todos os sujeitos tomados como CC apresentaram FMR abaixo do esperado, possivelmente pelo envelhecimento das estruturas, ainda que o desenvolvimento e grau de deterioração dependam de cada indivíduo, por fatores raciais, hereditários, alimentares, sócio-ambientais, e nível de atividade física5,14,20,24,27-30.

Ainda, a complexidade neurofisiopatológica da DP, ilustrada por mudanças objetivas ao longo da doença, no mesmo sujeito e em grupos de sujeitos, instiga a realização de estudos prospectivos com amostras maiores que permitem verificar características constantes e comuns, de acordo com as variáveis estudadas, extraindo generalizações e, consequentemente, fornecendo mais subsídios tanto para fins de avaliação quanto de tratamento, uma vez que seus resultados possibilitam prever as manifestações da DP, conforme as variáveis envolvidas na doença.

CONCLUSÕES

No presente estudo, observou-se que, no sexo feminino, o menor estágio da DP e o maior nível de atividade física refletiram-se positivamente sobre as medidas de TMF, a FMR e a relação s/z. A IV mostrou-se rebaixada, porém, mais prejudicada nas parkinsonianas; as alterações posturais foram similares em todos as mulheres.

Os parkinsonianos, independentemente da idade, do estágio da DP e do nível de atividade física, apresentaram prejuízos nos TMF, na IV e na FMR. O parkinsoniano jovem apresentou a Pimáx superior ao seu CC. Os achados de alterações posturais foram maiores nos parkinsonianos de maior idade, independentemente do nível de atividade física.

Verificou-se que todos os CC deste trabalho apresentaram FMR abaixo do previsto para o sexo e a idade, evidenciando que outros fatores podem interferir nesta medida.

RECEBIDO EM: 16/01/2010

ACEITO EM: 16/04/2010

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:

    Fernanda Vargas Ferreira
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Abr 2012

    Histórico

    • Recebido
      16 Jan 2010
    • Aceito
      16 Abr 2010
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