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Protocolo de avaliação do frênulo lingual para bebês: relação entre aspectos anatômicos e funcionais

Resumos

OBJETIVO: verificar quais características do frênulo da língua influenciam nas funções de sucção e deglutição em bebês nascidos a termo, com a finalidade de propor adequações no protocolo proposto por Martinelli et al (2012). MÉTODO: foi aplicado o protocolo de avaliação do frênulo da língua em 100 bebês saudáveis nascidos a termo. Os filmes obtidos na avaliação foram analisados por duas fonoaudiólogas especialistas em MO, com experiência em avaliação de frênulo lingual. Foram aplicados os testes Qui-quadrado seguido do teste exato de Fisher, além da análise de variância, considerando os dados qualitativos e quantitativos, respectivamente. RESULTADOS: nos 16 bebês que apresentaram alteração do frênulo lingual, verificou-se a relação entre: a tendência do posicionamento da língua durante o choro e o tempo entre as mamadas; a forma da língua quando elevada e o cansaço para mamar; bem como a fixação do frênulo na língua e o movimento da língua na sucção não nutritiva. Pela análise dos dados dos bebês com alteração de frênulo lingual, foi possível definir as características indicativas de alteração, que possibilitaram a adequação do protocolo inicial, e a atribuição de escores. CONCLUSÃO: a forma da língua, quando elevada durante o choro, influencia o movimento da língua durante a sucção não nutritiva, e o ponto de fixação do frênulo na língua influencia o ritmo da sucção durante a amamentação. O novo protocolo com escores é uma ferramenta efetiva para avaliar e diagnosticar alterações anatômicas do frênulo da língua e suas possíveis interferências na amamentação.

Freio Lingual; Protocolos Clínicos; Aleitamento Materno; Comportamento de Sucção; Deglutição


PURPOSE: to observe the lingual frenulum characteristics that may interfere with the functions of suction and deglutition in full-term infants in order to have a final version of the protocol designed by Martinelli et al (2012). METHOD: the lingual frenulum evaluation protocol was administered to a 100 healthy full-term infants. Two speech-language pathologists experienced in lingual frenulum evaluation analyzed the films taken during the evaluation. Chi-squared test, Fisher test and Analysis of Variance test were used considering qualitative and quantitative data respectively. RESULTS: 16 infants had lingual frenulum alteration. It was observed that there was a relationship between: a) tendency of tongue position during crying and time between feedings; b) the shape of the tongue when elevated and fatigue during feeding; c) lingual frenulum attachment to the tongue and the tongue movement during non-nutritive sucking. By analyzing the data of the infants with frenulum alteration it was possible to define the indicating characteristics of alteration. Those characteristics made the re-designing of the protocol and the scores attribution possible. CONCLUSIONS: the shape of the tongue when elevated during crying interferes with the tongue movement during the non-nutritive sucking. The place of frenulum attachment to the tongue interferes with the suction rhythm during breastfeeding. The new protocol with scores is considered to be an effective tool to assess and diagnose anatomical alterations of the lingual frenulum and its possible interference with breastfeeding.

Lingual Frenulum; Clinical Protocols; Breastfeeding; Sucking Behavior; Deglutition


Protocolo de avaliação do frênulo lingual para bebês: relação entre aspectos anatômicos e funcionais

Roberta Lopes de Castro MartinelliI; Irene Queiroz MarchesanII; Giédre Berretin-FelixIII

IFonoaudióloga, Mestre em Ciências, Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Brasil

IIFonoaudióloga, Diretora do CEFAC Pós-Graduação em Saúde e Educação, Doutora em Educação pela UNICAMP, Brasil

IIIProfessora Associada, Departamento de Fonoaudiologia, Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Roberta Lopes de Castro Martinelli Avenida Ângelo Piva, 331 - Centro Brotas - São Paulo CEP: 17380-000 E-mail: robertalcm@gmail.co

RESUMO

OBJETIVO: verificar quais características do frênulo da língua influenciam nas funções de sucção e deglutição em bebês nascidos a termo, com a finalidade de propor adequações no protocolo proposto por Martinelli et al (2012).

MÉTODO: foi aplicado o protocolo de avaliação do frênulo da língua em 100 bebês saudáveis nascidos a termo. Os filmes obtidos na avaliação foram analisados por duas fonoaudiólogas especialistas em MO, com experiência em avaliação de frênulo lingual. Foram aplicados os testes Qui-quadrado seguido do teste exato de Fisher, além da análise de variância, considerando os dados qualitativos e quantitativos, respectivamente.

RESULTADOS: nos 16 bebês que apresentaram alteração do frênulo lingual, verificou-se a relação entre: a tendência do posicionamento da língua durante o choro e o tempo entre as mamadas; a forma da língua quando elevada e o cansaço para mamar; bem como a fixação do frênulo na língua e o movimento da língua na sucção não nutritiva. Pela análise dos dados dos bebês com alteração de frênulo lingual, foi possível definir as características indicativas de alteração, que possibilitaram a adequação do protocolo inicial, e a atribuição de escores.

CONCLUSÃO: a forma da língua, quando elevada durante o choro, influencia o movimento da língua durante a sucção não nutritiva, e o ponto de fixação do frênulo na língua influencia o ritmo da sucção durante a amamentação. O novo protocolo com escores é uma ferramenta efetiva para avaliar e diagnosticar alterações anatômicas do frênulo da língua e suas possíveis interferências na amamentação.

Descritores: Freio Lingual; Protocolos Clínicos; Aleitamento Materno; Comportamento de Sucção; Deglutição

INTRODUÇÃO

A língua possui em sua face inferior uma pequena prega de membrana mucosa, denominada frênulo da língua, que a conecta ao assoalho da boca. Essa membrana pode limitar os movimentos da língua em graus variados, dependendo da porção de tecido residual que não sofreu apoptose durante o desenvolvimento embrionário1. Esse processo de apoptose pode justificar a grande variação anatômica do frênulo lingual.

Os critérios utilizados para avaliação e classificação do frênulo não são padronizados, o que impossibilita a comparação de resultados entre estudos e pode justificar a grande variação, entre 0,88% e 12,8%, nos índices de incidência2-5. Em 1993, um protocolo para avaliação do frênulo em bebês até seis meses de idade foi proposto, porém não foi validado6. Esse protocolo apresenta vários itens referentes à aparência do frênulo e propõe a avaliação dos movimentos da língua via estimulação de reflexos e da sucção não nutritiva. Entretanto, existem críticas na literatura quanto à sua exequibilidade, confiabilidade e complexidade1,7.

Em 2012, Martinelli et al8 propuseram um protocolo baseado na revisão de literatura considerando as variações anatômicas do frênulo lingual, bem como as funções de sucção e deglutição. A proposta desse protocolo foi um grande avanço para o diagnóstico da interferência do frênulo nos movimentos da língua durante a amamentação. Entretanto, sua aplicação se mostrou muito complexa e longa, indicando necessidade de adequações para se tornar um instrumento rápido e de fácil aplicação.

As funções de sucção e deglutição estão diretamente relacionadas com a amamentação, onde a participação dos movimentos da língua é fundamental. Sendo assim, qualquer restrição à livre movimentação da língua pode resultar no comprometimento dessas funções, dificultando a amamentação.

Com base no exposto, fica evidente a necessidade da criação e validação de protocolos de avaliação do frênulo lingual para bebês, correlacionando aspectos anatômicos e funcionais. A somatória desses aspectos pode contribuir para um diagnóstico correto e indicação de condutas assertivas evitando o desmame precoce e/ou baixo ganho de peso, que podem comprometer o desenvolvimento dos bebês9-18.

O objetivo desse estudo foi verificar quais características anatômicas do frênulo da língua influenciam nas funções de sucção e deglutição em bebês nascidos a termo, com a finalidade de propor adequações no protocolo proposto por Martinelli et al8.

MÉTODO

Este foi um estudo de caráter transversal do qual participaram 100 sujeitos, sendo 44 do gênero feminino e 56 do gênero masculino, nascidos na única maternidade de uma cidade do interior de São Paulo, no período entre setembro de 2011 e abril de 2012.

Foram incluídos nessa pesquisa: bebês saudáveis, nascidos a termo, independentemente do tipo de parto e que estavam sendo amamentados. Os critérios de exclusão considerados foram: prematuridade, complicações perinatais, presença de anomalias craniofaciais, doenças neurológicas, síndromes genéticas visíveis no momento da avaliação e alimentação artificial.

Os bebês foram agendados para participarem do estudo quando completassem 30 dias de vida, garantindo que os mesmos já estivessem adaptados ao processo de amamentação.

Para a coleta de dados foi aplicado nos bebês o protocolo de avaliação do frênulo lingual proposto por Martinelli et al8, próximo à hora da mamada, por uma única avaliadora. Sua aplicação foi filmada por um profissional treinado para esse fim.

Ao término da avaliação, as filmagens foram vistas e analisadas, em separado, por duas fonoaudiólogas especialistas em Motricidade Orofacial, com vasta experiência em avaliação do frênulo lingual. Foram considerados os resultados consenso entre as duas avaliadoras.

Os dados obtidos por consenso entre as duas fonoaudiólogas foram submetidos à análise estatística utilizando o teste Qui-quadrado de Pearson, seguido do teste exato de Fisher, para as variáveis qualitativas. Os dados quantitativos foram submetidos à análise de variância (ANOVA), seguida do teste de Tukey. Para a análise estatística dos dados coletados, foi adotado o nível de significância de 5% (p<0,05).

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo, sob o número 113/2011. Todas as mães dos bebês participantes foram informadas sobre os procedimentos a serem realizados e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

Dos 100 bebês avaliados, em 29 não foi possível visualizar o frênulo lingual, pois o mesmo estava recoberto por cortina de mucosa. Dos 71 bebês nos quais foi possível realizar a aplicação completa do protocolo, foram identificados 16 bebês (22,54%) com características anatômicas que restringiram o movimento da língua na sucção nutritiva e não nutritiva, sendo os 55 restantes considerados normais.

A análise estatística evidenciou a presença de relação entre características anatômicas do frênulo de língua com o gênero, bem como com a sucção nutritiva e não nutritiva, como apresentado nas Tabelas 1 e 2.

Tabela 1 - Apresentação dos resultados obtidos por meio da aplicação do teste Qui-Quadrado de Pearson em relação aos dados da história clínica, avaliação anatômica e avaliação funcional para os bebês estudados

Tabela 2 - Apresentação dos resultados obtidos quanto ao ritmo da sucção e tempo da pausa entre os grupos de sucção, bem como os valores encontrados por meio da aplicação do teste ANOVA, seguido do teste de Tukey, considerando o formato da língua durante o choro para os bebês estudados

Assim, foi possível identificar que os aspectos do protocolo "tendência do posicionamento da língua durante o choro, forma da língua quando elevada, fixação do frênulo na língua e no assoalho da boca, tempo entre as mamadas, cansaço para mamar, movimento da língua na sucção não nutritiva e tempo da pausa entre grupos de sucções" permitem detectar a interferência do frênulo lingual nos movimentos da língua.

A partir da experiência clínica com a aplicação desse instrumento em 100 bebês, das queixas relatadas pelas mães e dos resultados obtidos com o tratamento estatístico, foram propostas modificações no protocolo.

Na história clínica, foram incluídas as seguintes questões: mama um pouco e dorme; vai soltando o mamilo e "morde" o mamilo.

Na avaliação anatomofuncional, foi acrescentada mais uma alternativa para a postura da língua: "língua na linha média com elevação das laterais". No que se refere ao frênulo lingual, foi acrescentado o item "visualizado com manobra", bem como a explicação para realização da mesma.

Foram incluídas pontuações para cada aspecto apresentado no protocolo. Os escores foram atribuídos aos 16 bebês com alteração de frênulo lingual, sendo que os resultados encontrados estão descritos na Tabela 3.

Tabela 3 - Resultados obtidos por meio da aplicação do protocolo modificado com atribuição de escores para os 16 bebês identificados com alteração do frênulo lingual

A partir dos resultados encontrados com a aplicação do protocolo com escores modificado, nos casos alterados, foi possível definir as pontuações indicativas de anormalidades, sendo então definidos os escores parciais e o escore total.

Quanto aos escores parciais, ficou estabelecido que quando a soma dos itens da história clínica for igual ou maior que 4, pode-se considerar a interferência do frênulo na movimentação da língua. Para estabelecer o valor mínimo de 4 pontos foram considerados como itens de alteração: tempo entre as mamadas de 1 hora ou menos (2) e "morde" o mamilo (2). Na avaliação anatomofuncional, quando a soma dos itens 1,2 e 3 for igual ou maior que 4, pode-se considerar a interferência do frênulo na movimentação da língua. Para estabelecer o valor mínimo de 4 pontos foram considerados como itens de alteração: língua baixa ou na linha média com elevação das laterais (2) e ligeira fenda no ápice (2). Ainda na avaliação anatomofuncional, quando a soma do item 4 for igual ou maior que 3 pode-se considerar a interferência do frênulo lingual na movimentação da língua. Para estabelecer o valor mínimo de 3 pontos foram considerados como itens de alteração: frênulo espesso (2) e fixação do frênulo no assoalho da boca visível a partir da crista alveolar inferior (1). Quando a soma da avaliação da sucção não nutritiva e nutritiva for igual ou maior que 2 pode-se considerar a interferência do frênulo lingual na movimentação da língua. Para estabelecer o valor mínimo de 2 pontos foram considerados como itens de alteração: movimento de língua inadequado (1) e poucas sucções com pausas longas (1).

Foi estabelecido também que, quando a soma apenas do exame clínico for igual ou maior que 9, pode-se considerar a interferência do frênulo lingual nos movimentos da língua. Para estabelecer o valor mínimo de 9 pontos foram considerados como itens de alteração: na avaliação anatomofuncional, a tendência do posicionamento baixo da língua (2) ou língua na linha média com elevação das laterais durante o choro (2), o ápice com ligeira fenda (2), o frênulo espesso (2) e a fixação do frênulo no assoalho da boca visível a partir da crista alveolar inferior (1); e na avaliação da sucção não nutritiva e nutritiva na amamentação foram considerados o movimento de língua inadequado durante a sucção não nutritiva (1), assim como poucas sucções com pausas longas (1).

Foi estabelecido, ainda, que quando a soma da história e do exame clínico for igual ou maior que 13 pode-se considerar a interferência do frênulo lingual nos movimentos da língua. Para estabelecer o valor mínimo de 13 pontos foram considerados como itens de alteração: na história clínica, as respostas afirmativas para morde o mamilo (2) e tempo igual ou menor que uma hora entre as mamadas (2); na avaliação anatomofuncional, a tendência do posicionamento baixo da língua (2) ou língua na linha média com elevação das laterais durante o choro (2), o ápice com ligeira fenda (2), frênulo espesso (2), e fixação do frênulo no assoalho da boca visível a partir da crista alveolar inferior (1); e na avaliação da sucção não nutritiva e nutritiva foram considerados o movimento de língua inadequado durante a sucção não nutritiva (1) e poucas sucções com pausas longas, durante a amamentação (1).

Desta forma, quanto ao escore total, zero a 8 foi considerado como normalidade, e 25 o máximo de alteração a ser encontrada, sendo 8 como o pior resultado da história clínica, 12 da avaliação anatomofuncional e 5 da avaliação da sucção não nutritiva e nutritiva na amamentação.

Portanto, a partir da experiência da aplicação do protocolo em 100 bebês, bem como dos resultados obtidos por meio da análise estatística, foram propostas modificações julgadas necessárias, sendo obtida a versão final do protocolo de avaliação do frênulo lingual, com escores, para bebês (Figuras 1 a 4).

Figura 1 - Protocolo de Frenulum para Bebês - História Clínica

DISCUSSÃO

Esse estudo encontrou 22,54% de alteração de frênulo no grupo pesquisado sendo, portanto, maior que os estudos anteriores, que variaram de 4,8% a 12,8%2,4. Provavelmente a maior incidência encontrada nesse estudo pode ser atribuída ao fato da avaliação ter levado em consideração os aspectos anatomofuncionais, bem como a avaliação da sucção não nutritiva e nutritiva (na amamentação), que diferem das metodologias usadas nos estudos anteriores.

Dos 16 bebês identificados com alteração do frênulo lingual por meio da avaliação, 3 eram do gênero feminino e 13 do gênero masculino. Esses achados corroboram com estudos anteriores, que relatam a prevalência da alteração do frênulo no gênero masculino2,7,12,13. Houve relação estatisticamente significante entre o sexo e a fixação do frênulo no assoalho da boca. Uma possível explicação para tal relação pode ser o fato de que todos os bebês com alteração do frênulo lingual apresentaram fixação do frênulo na crista alveolar inferior, sendo a maioria deles do gênero masculino.

Por meio da avaliação clínica realizada, não foi possível visualizar o frênulo lingual de 29 dos 100 bebês avaliados, pois o mesmo estava recoberto por uma cortina de mucosa. Este tipo de frênulo, também denominado frênulo submerso ou posterior é pouco descrito na literatura19,20. Na presença dessa variação anatômica, sugere-se não indicar intervenção cirúrgica e fazer o acompanhamento do bebê até ser possível visualizar o frênulo abaixo da cortina de mucosa, durante o primeiro ano de vida.

Posteriormente à realização desse estudo, na tentativa de visualizar os frênulos submersos, durante a avaliação de bebês com o protocolo apropriado para esse fim, foi desenvolvida uma manobra de elevação e posteriorização da língua21, a qual permitiu visualizar em grande parte dos bebês os frênulos que estavam submersos. Essa manobra foi incorporada ao protocolo modificado já publicado em inglês22. A manobra proposta poderá contribuir para o desenvolvimento de estudos longitudinais acerca dessa variação anatômica, verificando a possível interferência do frênulo na livre movimentação da língua, na alimentação e na fala.

A análise estatística evidenciou relação entre a tendência do posicionamento da língua durante o choro (elevada, na linha média ou baixa), com o tempo entre as mamadas; a forma da língua quando elevada (redonda, ligeira fenda na ponta ou formato de "coração") com o cansaço para mamar; e a fixação do frênulo na língua (no terço médio, entre o terço médio e o ápice ou no ápice) com o movimento de língua na sucção não nutritiva. Esses dados sugerem que a alteração do frênulo limita os movimentos da língua durante o choro e a amamentação. Embora a literatura afirme que o ciclo de alimentação dos bebês fica comprometido quando há alteração do frênulo lingual, não foram encontrados estudos que correlacionassem as variáveis aqui citadas 4,11,12.

A análise dos dados também demonstrou existir relação entre o ritmo de sucção e o tempo da pausa com o formato da língua no choro (redonda, fenda, coração). Apesar de tais relações não terem alcançado significância estatística em decorrência do pequeno número de sujeitos em cada subgrupo de alteração de frênulo, o tratamento estatístico demonstrou que quanto pior a configuração da ponta da língua quando elevada durante o choro (fenda e formato de coração), menor o número de sucções. O tempo da pausa mostrou-se prolongado nos bebês com formato da ponta da língua com fenda quando elevada durante o choro. Novamente não foram encontrados estudos comparando essas variáveis. Uma possível hipótese para tais achados se deve ao fato de que, na presença de um frênulo que limita os movimentos da língua durante a sucção, possa ocorrer fadiga da musculatura pelo maior esforço, uma vez que há um impedimento mecânico à livre movimentação. Com isso, os bebês fazem pausas mais longas para descansar.

Não foram encontradas relações entre alguns aspectos do protocolo, tais como: postura dos lábios em repouso e fixação do frênulo no assoalho da boca. No entanto, esses itens não foram retirados do protocolo, pois quando analisados em conjunto com os demais, auxiliam na identificação da alteração do frênulo. O conjunto de características anatomofuncionais relacionado com as funções de sucção e deglutição leva ao diagnóstico da limitação do movimento da língua causada pelo frênulo lingual.

Assim, a partir da experiência clínica com a aplicação do protocolo, das queixas maternas e dos resultados obtidos por meio da aplicação dos testes estatísticos foram realizadas as adequações no protocolo. As modificações possibilitaram a aplicação rápida por meio de provas não invasivas, baixo risco para o bebê e a identificação dos sinais e sintomas de uma possível interferência das alterações do frênulo na amamentação, avaliação da sucção nutritiva durante a amamentação e a utilização de escores indicativos de alteração. O novo protocolo diferiu da publicação de Hazelbaker6, com relação aos itens para inspeção visual, bem como na maneira de avaliar os movimentos da língua e a sucção não nutritiva.

Por meio dos escores, foi possível definir as pontuações indicativas de anormalidades. O uso de escores nos protocolos de avaliação tem sido proposto na literatura, pois facilita a avaliação da gravidade da disfunção apresentada nos diferentes distúrbios miofuncionais orofaciais, além de possibilitar a padronização da avaliação, favorecendo a comparação de achados de diferentes centros de estudo 23-25.

No protocolo foram estabelecidos escores parciais e escore total. Os escores parciais são importantes, pois na impossibilidade da aplicação completa do protocolo, é possível fazer a indicação de cirurgia somente com a avaliação anatomofuncional, a qual pode ser realizada ao nascimento. Quanto aos itens 1 a 3 da avaliação anatomofuncional, considerou-se a pontuação mínima 4. Com relação ao item 4 da avaliação anatomofuncional, ficou definida a pontuação mínima de 3, correspondendo também à menor pontuação apresentada pelos bebês com alteração do frênulo lingual. Na avaliação da sucção não nutritiva e da nutritiva, optou-se pela pontuação mínima de 2, considerando os dados que alcançaram significância estatística, concordando com o menor escore parcial obtido nesse item para os bebês estudados.

Com relação à história clínica, definiu-se a pontuação mínima de 4, a qual corresponde à menor pontuação apresentada pelos bebês com alteração do frênulo lingual.

Quanto ao escore total, definiu-se que, quando for possível realizar tanto a história clínica quanto o exame clínico, e a soma de ambos for igual ou maior que 13, pode se considerar a interferência do frênulo nos movimentos da língua. Para os casos em que o levantamento da história clínica não for realizado, será considerada a interferência do frênulo nos movimentos da língua quando a soma for igual ou maior que 9.

Portanto, o diagnóstico da alteração de frênulo lingual deve levar em consideração os aspectos anatomofuncionais e sua interferência nos movimentos da língua durante a sucção. A soma dos aspectos relacionados à língua e ao frênulo, considerando forma, fixação e espessura, em conjunto com a avaliação das possibilidades de movimentos da língua, bem como a sucção não nutritiva e a nutritiva, contribuem para um diagnóstico preciso.

Na literatura, foram encontradas divergências de opiniões quanto às consequências de um frênulo alterado, bem como quanto à necessidade de intervenção cirúrgica. A frenotomia, também conhecida como "pique na língua", ainda é motivo de grande discussão quanto a sua indicação, quando deve ser realizada e qual profissional estaria habilitado para realizar o procedimento1,2,13,15,17,27-33.

A existência de um protocolo consistente pode diminuir o número de controvérsias relacionadas ás possíveis alterações do frênulo da língua e sua interferência nas funções orofaciais, evidenciando ou não a indicação da frenotomia. Desta forma, a utilização de protocolos específicos permite atuar de forma planejada, documentando procedimentos para sustentar as práticas clínicas com evidências.

A primeira etapa de validação desse protocolo foi constituída da análise das relações existentes entre os aspectos anatômicos e funcionais. A comparação com um protocolo padrão ouro não poderá ser realizada porque não foram encontrados protocolos validados de avaliação do frênulo lingual para bebês já publicados. Outros estudos são necessários para completar esse processo, incluindo a aplicação por diferentes examinadores devidamente treinados e calibrados, além dos retestes, possibilitando analisar a concordância inter e intra-examinadores.

CONCLUSÃO

Os resultados obtidos permitiram identificar que a forma da língua, quando elevada durante o choro, e a fixação do frênulo na língua são as características anatômicas do frênulo lingual que influenciam o movimento da língua durante a sucção não nutritiva e o ritmo da sucção durante a amamentação.

A partir dos resultados obtidos e da experiência da aplicação do instrumento de avaliação, foi possível propor modificações no protocolo de avaliação do frênulo da língua para bebês e inserir escores, possibilitando diagnosticar as variações anatômicas do frênulo lingual que podem interferir na sucção e deglutição durante a amamentação.

Recebido em: 21/09/2011

Aceito em: 19/01/2012

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:
    Roberta Lopes de Castro Martinelli
    Avenida Ângelo Piva, 331 - Centro
    Brotas - São Paulo
    CEP: 17380-000
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      21 Set 2011
    • Aceito
      19 Jan 2012
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