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Proposta de um protocolo de avaliação da atividade elétrica dos músculos masseter e supra-hióideos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação

Resumos

OBJETIVO: apresentar uma proposta de protocolo de avaliação da atividade elétrica dos músculos masseter e supra-hióideos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação. MÉTODO: inicialmente foi realizada uma revisão da literatura nas bases de dados Lilacs e MEDLINE e literatura impressa com o objetivo de identificar protocolos utilizados em estudos nacionais e internacionais sobre a avaliação eletromiográfica em bebês durante a alimentação, priorizando os últimos quinze anos. Foram coletadas informações dos protocolos utilizados em pesquisas com outras populações que pudessem ser usados como base teórica para este estudo. A partir da leitura e análise do material encontrado, foi elaborado um protocolo inicial de avaliação eletromiográfica e este foi aplicado em seis recém-nascidos pré-termo, para verificação da sua viabilidade RESULTADOS: a busca na literatura e testagem na população resultaram em um protocolo composto por subitens com definição de musculatura avaliada, recomendações de preparação da pele, colocação dos eletrodos, posicionamento para a avaliação, normalização do sinal, atividades para a avaliação, além de sugestões de análise e interpretação do sinal. CONCLUSÃO: o estudo mostra a possibilidade de aplicação deste protocolo da eletromiografia na avaliação destes músculos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação. Os músculos masseter e supra-hióideos são recomendados como uma boa opção para o estudo da atividade elétrica de músculos ativados durante a alimentação em pré-termos. O protocolo ainda recomenda procedimentos de normalização do sinal para melhor interpretação dos dados.

Avaliação; Eletromiografia; Músculo Masseter; Prematuro; Protocolos; Recém-Nascido


PURPOSE: present a protocol for evaluating the electrical activity of the masseter and supra-hyoid in newborn preterm infants during feeding. METHOD: the information was gathered from papers catalogued in Lilacs and MEDLINE, and printed literature in order to identify protocols used in national and international studies on electromyographic evaluation in infants during feeding, prioritizing the last fifteen years. Information was also collected from protocols used in research with other populations that could be used as a theoretical basis for this study. From the reading and analyzing the found materials, an initial electromyographic evaluation protocol was drawn up and was applied in six newborn preterm infants, to verify its applicability. RESULTS: the literature search and testing in the population led to a protocol composed by sub-definition of muscles evaluated, recommendations for skin preparation, electrode placement, positioning for evaluation, normalization of the signal for the evaluation activities, and suggestions analysis and interpretation of the signal. CONCLUSION: the study shows the possibility of applying this protocol in the evaluation of muscle electromyography in preterm infants, during feeding. The masseter and supra-hyoid are recommended as a good option for studying the electrical activity of muscles activated during feeding in preterm infants. The protocol also recommended procedures for standardizing the signal for better interpretation of data.

Evaluation; Electromyography; Masseter Muscle; Infant, Premature; Protocols; Infant, Newborn


ARTIGOS ORIGINAIS

Proposta de um protocolo de avaliação da atividade elétrica dos músculos masseter e supra-hióideos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação

Rebeca Domingues RaposoI; Hilton Justino da SilvaII

IFonoaudióloga; Professora da Pós-graduação em Motricidade Orofacial do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira – IMIP; Doutora em Saúde da Criança e do Adolescente pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE

IIFonoaudiólogo; Professor Adjunto do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE; Doutor em Nutrição pela Universidade Federal de Pernambuco

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rebeca Domingues Raposo Rua Jornalista Guerra de Holanda, 161/102 – Monteiro – Recife-PE CEP: 52061-010 E-mail: rebeca_raposo@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: apresentar uma proposta de protocolo de avaliação da atividade elétrica dos músculos masseter e supra-hióideos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação.

MÉTODO: inicialmente foi realizada uma revisão da literatura nas bases de dados Lilacs e MEDLINE e literatura impressa com o objetivo de identificar protocolos utilizados em estudos nacionais e internacionais sobre a avaliação eletromiográfica em bebês durante a alimentação, priorizando os últimos quinze anos. Foram coletadas informações dos protocolos utilizados em pesquisas com outras populações que pudessem ser usados como base teórica para este estudo. A partir da leitura e análise do material encontrado, foi elaborado um protocolo inicial de avaliação eletromiográfica e este foi aplicado em seis recém-nascidos pré-termo, para verificação da sua viabilidade

RESULTADOS: a busca na literatura e testagem na população resultaram em um protocolo composto por subitens com definição de musculatura avaliada, recomendações de preparação da pele, colocação dos eletrodos, posicionamento para a avaliação, normalização do sinal, atividades para a avaliação, além de sugestões de análise e interpretação do sinal.

CONCLUSÃO: o estudo mostra a possibilidade de aplicação deste protocolo da eletromiografia na avaliação destes músculos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação. Os músculos masseter e supra-hióideos são recomendados como uma boa opção para o estudo da atividade elétrica de músculos ativados durante a alimentação em pré-termos. O protocolo ainda recomenda procedimentos de normalização do sinal para melhor interpretação dos dados.

Descritores: Avaliação; Eletromiografia; Músculo Masseter; Prematuro; Protocolos; Recém-Nascido

INTRODUÇÃO

A eletromiografia (EMG) pode ser definida como a técnica que registra a atividade elétrica da membrana do músculo em resposta à ativação fisiológica dos músculos esqueléticos. Por meio dela, pode ser estudada a função do músculo estriado, por meio de análise do sinal captado durante o repouso e/ou durante a contração muscular, registrando as variações de voltagem produzidas pela membrana das fibras musculares1.

Nas últimas décadas, a EMG de superfície tem sido utilizada em estudos de diversas disfunções e na avaliação de métodos de alimentação infantil, especialmente para verificar a atividade muscular durante a amamentação e suas possíveis implicações no crescimento das estruturas orais e desenvolvimento funcional2.

Carvalho3 afirma que cerca de 20 músculos participam do mecanismo da ordenha, em que são realizados os movimentos de abaixar, protruir, elevar e retruir a mandíbula, os mesmos que no futuro serão usados na mastigação. Uma grande parte dessa musculatura já foi avaliada durante a função de alimentação: masseter, temporal, orbicular, supra-hióideos (milohioideo, geniohioideo, estilohioideo e digástrico) e bucinador. O masseter demonstrou ser um músculo que participa ativamente na função da sucção, protruindo, elevando e retraindo a mandíbula, assim como os supra-hióideos, os quais participam na movimentação e estabilização da mandíbula e na movimentação da língua3.

Os estudos que utilizaram4-10 a eletromiografia para avaliação da alimentação em bêbes nascidos a termo e pré-termo não mencionam o uso de um protocolo, sendo assim, não permitem comparações entre si devido à falta de semelhança na utilização dos métodos, dos músculos avaliados ou do método de alimentação2.

Dorland11 define protocolo como "um plano explícito, detalhado de uma experiência, procedimento, exame ou teste" (p.1432). A necessidade do uso de protocolos foi aos poucos se tornando clara em todas as áreas de conhecimento e isso não foi diferente na Fonoaudiologia. Com o decorrer do tempo, os profissionais perceberam a importância da utilização de protocolos específicos para que pudessem obter registros mais confiáveis. Os protocolos proporcionam a possibilidade de se fazer relações entre os fatos; adotar atitudes pensadas a partir de episódios que se repetem; permitem ainda determinar o melhor procedimento, além de nortear a avaliação e garantir a qualidade dos dados avaliados, a utilização de protocolos também permite a sua reaplicação12.

Sendo assim, o objetivo deste estudo foi elaborar uma proposta de um protocolo de avaliação da atividade elétrica dos músculos masseter e supra-hióideos, em recém-nascidos pré-termo, que possa ser realizada nos diferentes métodos de alimentação e verificar sua aplicabilidade.

MÉTODO

Esta pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP) e aprovada sob o número 2172-11, por estar de acordo com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Os bebês foram avaliados após a leitura e a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido por seus responsáveis.

Foram realizadas buscas na literatura com o objetivo de identificar protocolos utilizados em estudos nacionais e internacionais sobre a avaliação eletromiográfica em bebês durante a alimentação. Foram consultadas as bases de dados e a literatura impressa, no período entre 1995 e 2011. Para isso foram utilizados os indexadores: Evaluation, Electromyography, Masseter Muscle, Premature, Protocol, Newborn. Coletaram-se também informações dos protocolos utilizados em pesquisas com outras populações que pudessem ser usados como base teórica para este estudo.

Os artigos de interesse foram identificados a partir da realização de uma pesquisa pelo título e resumo. Os artigos cujo tema não era perti­nente à pesquisa foram excluídos, junto com as cartas ao editor e os editoriais. Em um segundo momento, os artigos selecionados foram analisados quanto aos seus objetivos, ao método do estudo, e aos resultados obtidos.

A partir daí, foi criado um protocolo inicial, seguindo os passos descritos nos estudos encontrados sobre a avaliação eletromiográfica em bebês (nascidos pré-termo ou a termo) e das premissas de protocolos já existentes aplicados em crianças e adultos. Construída a proposta inicial, esta foi aplicada, como projeto piloto, em seis recém-nascidos pré-termo com o objetivo de testar e determinar o tamanho e a localização dos eletrodos, os procedimentos de normalização do sinal eletromiográfico e verificar sua aplicabilidade, para a construção final do protocolo.

Nesta fase foram avaliados recém-nascidos pré-termo do Alojamento Canguru do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira – IMIP. Os bebês participantes deste estudo foram aqueles clinicamente estáveis (ausência de suporte respiratório; sem a presença de complicações neurológicas – hemorragia intracraniana graus III e IV e hidrocefalia; ausência de doenças de base grave – cardiopatias congênitas e síndromes genéticas; ausência de malformações graves – craniofaciais e alterações traqueo-esofágicas); tolerando a alimentação enteral; coordenando sucção-deglutição-respiração. Deveriam ainda, ser filhos de mães saudáveis, que pudessem amamentar (sem problemas nos mamilos que dificultassem a pega e sem patologias ou uso de medicações que contra indicassem o aleitamento materno). No momento da avaliação, a média de dias de vida foi de 30 dias (DP= 18 dias), da idade gestacional corrigida foi de 35,5 semanas (DP= 2 semanas) e do peso 1.677g (DP= 196g).

Para a realização da eletromiografia de superfície foi utilizado o aparelho MIOTOOL 200, da marca MIOTEC®, composto por quatro canais, conectado ao notebook de marca HP® e sistema operacional Windows® XP. Um cabo de comunicação USB para conexão entre o eletromiógrafo e o notebook; o software Miograph 2.0, um sistema de aquisição de dados provido da possibilidade de seleção de oito ganhos independentes por canal, no qual foi utilizado o ganho de 1000; filtro passa-banda de 20 a 500 Hz; bateria recarregável de 7.2 V 1700 Ma NiMH com tempo de duração aproximado de 40 horas, que funciona isoladamente da rede elétrica e do computador conectado, todos apoiados sobre uma mesa de madeira. Também foram utilizados dois sensores SDS500 com conexão por garras; cabo de referência (terra) e calibrador também foram utilizados.

Para a análise dos dados, foi realizado um levantamento de cada método utilizado na aplicação da técnica de eletromiografia descritos nos estudos, além de detalhamento de cada passo de aplicação da técnica nos bebês avaliados, constituindo assim a proposta final de protocolo de avaliação da atividade elétrica dos músculos masseter e supra-hióideos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação.

RESULTADOS

Nas buscas realizadas na literatura, foram localizados seis artigos5-10 sobre a utilização da eletromiografia na avaliação de bebês durante a alimentação. (Figura 1). Foi observada uma grande variedade de músculos avaliados, com objetivos diversos. A maioria dos artigos não mencionou o ambiente e posicionamento dos indivíduos avaliados e a preparação para o exame (higienização da pele e descrição e colocação de eletrodos). Nenhum dos artigos revisados referiu à utilização de protocolos de avaliação, alguns descreveram, de forma mais detalhada, a realização do exame, outros apenas citaram o material utilizado. Todos realizaram as análises sem a normalização do sinal eletromiográfico.


Estudos sobre a eletromiografia na avaliação do sistema estomatognático revelaram que para uma melhor definição de protocolos utilizados na musculatura de cabeça e pescoço e em funções orais são recomendadas a definição precisa de músculos e a definição de procedimentos de normalização do sinal eletromiográfico13,14.

A partir da revisão da literatura e da aplicação da proposta inicial do protocolo, foram definidos:

- Em relação aos eletrodos, os estudos realizados com bebês não descrevem quais os modelos e tamanhos dos eletrodos utilizados. Para definição do tamanho foram testados eletrodos pediátricos recortados, por não terem sido encontrados eletrodos neonatais. Estes foram recortados em formatos arredondados e quadrados, com tamanho de 1,5 centímetros, para evitar o cross-talk (captação do sinal de músculos vizinhos). Os recortados no formato quadrado apresentaram melhor aderência na pele, sendo esse formato o escolhido.

- Para a colocação do eletrodo no direcionamento das fibras foram estimulados o reflexo de mordida fásica (estimulando-se a região alveolar lateral) para a palpação e visualização da região mais robusta do masseter e o reflexo de sucção para palpação do músculo milohióideo e a colocação do eletrodo da região supra-hióidea. (Figuras 2, 3, 4 e 5).





- Dentre os procedimentos de normalização descritos na literatura, verificou-se a possibilidade de utilização, na avaliação eletromiográfica desta população, alguns procedimentos descritos a seguir. Normalização a partir do repouso (em que o valor encontrado durante o repouso é utilizado como referência), normalização em relação ao pico máximo (no qual é usado o maior valor do sinal eletromiográfico encontrado no movimento ou ciclo estudado) e normalização em relação à máxima atividade reflexa (utilizado como referência o maior valor encontrado em uma contração isométrica máxima).

Os resultados da aplicação da proposta inicial do protocolo estão descritos na figura 6. As médias da atividade elétrica muscular (AEM) captadas durante a avaliação eletromiográfica em µV foram normalizadas (transformadas em valores percentuais do valor de referência) pelos diferentes procedimentos, para cada sujeito e em cada músculo.


Os resultados (descritos na figura 7) demonstram que para o Músculo Masseter os valores normalizados a partir do pico variam entre 0,20% e 38,69%; em relação ao pico variam entre 16,56% e 94,60% e em relação à MAR entre 28,61% e 100,74%. Em relação aos Supra-hioideos, os valores normalizados a partir do pico variam entre 0,65% e 13,16%; em relação ao pico variam entre 65,59% e 94,65% e em relação à MAR entre 7,72% e 102,84%.


Como resultados finais foram elaborados o protocolo de avaliação da atividade elétrica dos músculos masseter e supra-hióideos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação, com as suas etapas (Figura 8), e a ficha de computação dos dados do protocolo de avaliação eletromiográfica da alimentação do recém-nascido pré-termo. (Figura 9)



DISCUSSÃO

Para a avaliação da atividade elétrica, por meio da EMG de superfície, fazem-se necessários: um sistema de captação do sinal (eletrodos), circuitos de condicionamento do registro (amplificadores e filtros), mídia de saída do registro (um simples alto-falante – saída sonora, saída em papel térmico, saída na tela do monitor de vídeo), notebook com um sistema operacional e um software para processamento do sinal. Por ser captado como um sinal analógico (contínio no tempo), o sinal eletromiográfico precisa ser convertido em sinal digital (definido somente para certos intervalos de tempo), para conseguir ser reconhecido pelo computador, para isso é preciso ainda um conversor15.

Segundo Basmajian e DeLuca16 a execução da avaliação eletromiográfica deve ser precedida de uma padronização, na qual serão pré-estabelecidos: musculatura avaliada, equipamento utilizado, preparação para o exame, posicionamento dos eletrodos, postura do paciente e atividades realizadas (sequência de movimentos). Moraes13 e Pernambuco14 complementam afirmando a importância da definição precisa de músculos e dos procedimentos de normalização do sinal eletromiográfico. A utilização de um protocolo é importante para que o registro da atividade eletromiográfica represente, com fidelidade, o sinal elétrico do músculo em estudo.

O primeiro passo, antes do início da avaliação, é a definição dos músculos, ou grupos musculares a serem analisados. Os músculos devem ser selecionados de acordo com o objetivo do estudo e movimentos a serem realizados. Os estudos referenciados5-10 avaliaram uma enorme gama de músculos ativados durante a função de alimentação: masseter, temporal, orbicular, supra-hióideos (milohioideo, geniohioideo, estilohioideo e digástrico) e bucinador, com diferentes objetivos.

Durante a ordenha, são realizados quatro movimentos distintos da mandíbula, abertura, protrusão, fechamento e retrusão. Cinco pares de músculos mandibulares controlam esses movimentos: depressores da mandíbula (pterigoideo lateral e digástrico); protrusores da mandíbula (masseter e pterigoideo medial); elevadores (masseter, temporal e pterigoideo medial); e os retrusores (os músculos masseter e temporal)17.

Neste protocolo, os músculos escolhidos para a avaliação da sucção (ordenha no peito materno) em pré-termos foram o masseter e os supra-hióideos. O masseter, por ser um músculo que participa ativamente na função da sucção, protruindo, elevando e retruindo a mandíbula. Tem a vantagem de ser menos profundo, permitindo um acesso mais fácil, diferentemente do pterigoideo lateral e medial. Os supra-hióideos (milohioideo, geniohioideo, estilohioideo e digástrico) foram escolhidos por participarem da movimentação e estabilização da mandíbula e movimentação da língua.

Após preparação do equipamento e definição da musculatura, o passo seguinte é a avaliação eletromiográfica. Alguns fatores podem influenciar o sinal eletromiográfico: os intrínsecos relacionados às características anatômicas e fisiológicas dos músculos e os extrínsecos, relacionados ao eletrodo e sua fixação. Os fatores intrínsecos não podem ser modificados, mas os extrínsecos sim. Sendo assim, são necessários cuidados na tentativa de minimizar e padronizar as questões que podem influenciar a coleta dos dados eletromiográficos18.

Em relação aos eletrodos, devem ser levados em consideração: o tamanho, o formato e a distância intereletrodos (distância de centro a centro entre as áreas condutivas). O tamanho, por estar diretamente relacionado à amplitude do sinal detectado, quanto maior o tamanho, maior o sinal e menor o ruído elétrico gerado na interface entre a pele e a superfície de detecção do eletrodo. No entanto, ele deve ser pequeno o bastante para se evitar o cross-talk (captação do sinal de músculos vizinhos). A distância entre os eletrodos afeta a frequência e a amplitude do sinal19,20. Sendo assim, neste protocolo propôs-se a utilização de eletrodos de superfície pediátricos, descartáveis e recortados, ficando com o tamanho aproximado de 1,5 cm.

Os membros do Surface EMG for a non-invasive assessment of muscles (SENIAM) recomendam que alguns cuidados devam ser tomados para a diminuição da influência da impedância da pele19,21, a preparação da pele. Antes da colocação dos eletrodos é preciso realizar a limpeza da pele (retirada da oleosidade e sujeira), e/ou remoção dos pelos (tricotomia) e leve abrasão para a remoção das células mortas da pele19,21. No protocolo aqui proposto, é recomendada, para limpeza da pele do bebê, a utilização de algodão ou gaze embebida em álcool 70º sem, no entanto, friccionar a pele sensível do bebê.

O local e o posicionamento dos eletrodos são fatores que também podem causar interferência na qualidade do sinal eletromiográfico. O SENIAM sugere que o eletrodo deve ser alinhado no sentido das fibras musculares, já que a trajetória do potencial de ação segue o mesmo sentido, e que seja colocado entre o ponto motor e o tendão distal do músculo avaliado19. O eletrodo é posicionado numa configuração bipolar, na região do ventre muscular do músculo escolhido, disposto longitudinalmente às fibras musculares. Para a localização da região em que o eletrodo é fixado, é estimulada uma atividade deste músculo, para a palpação e visualização da sua região mais robusta, ou seja, a linha média do ventre muscular. Isso deve acontecer em todos os músculos a serem avaliados14,22. Neste protocolo, para a localização da região em que o eletrodo masseter será fixado, é sugerida a estimulação do reflexo de mordida fásica para a palpação e visualização da região mais robusta do masseter. O eletrodo da região supra-hióidea é fixado por meio da palpação do músculo milohióideo.

A colocação dos eletrodos deve obedecer a uma padronização, iniciando pelo eletrodo de referência ou "terra", que é utilizado para minimizar interferências do ruído elétrico externo. O mesmo é colocado em um ponto distante do local de registro dos músculos avaliados22, sendo aqui convencionado o olécrano da ulna (cotovelo). Em seguida, são fixados os demais eletrodos. Em algumas situações, faz-se necessária a utilização de fita adesiva para melhor fixação dos eletrodos. É importante que esta seja hipoalérgica para a diminuição do risco de irritação na pele do bebê.

A colocação dos sensores com garras obedece a mesma ordem de colocação dos eletrodos. Finalizado este processo, é verificada a configuração e habilitação dos canais no software, seguindo uma disposição predeterminada, que no atual protocolo é: canal 1 – músculo masseter e canal 2 – músculos supra-hióideos. Os canais não utilizados devem ser devidamente desabilitados.

Finalizados todos os procedimentos, é iniciada a avaliação da atividade elétrica dos músculos durante a alimentação. A atividade elétrica muscular (AEM), definida como a média dos potenciais de ação das unidades motoras de um grupo muscular, obtidos a partir do sinal eletromiográfico expresso em microvolts (µV)19, é captada durante um período da alimentação, sendo considerada para análise a média em µV do momento em que há maior estabilização do sinal. Depois de captado, o sinal eletromiográfico é amplificado, filtrado e convertido de analógico para digital18.

Para que o sinal eletromiográfico possa ser analisado e comparado em diferentes indivíduos, músculos e estudos, e ao longo do tempo, é necessária a utilização de técnicas de normalização, nas quais os valores em µV da atividade são expressos como uma porcentagem de atividade do músculo durante a contração muscular, obtida em condições padronizadas e reprodutíveis. A normalização é pré-requisito para qualquer análise comparativa dos sinais da EMG18,23.

A análise do sinal eletromiográfico é realizada considerando um valor de referência em porcentagem (%), normalizado. Todos os outros sinais são analisados em termos de porcentagem deste valor de referência, para cada sujeito. A normalização do sinal eletromiográfico segue as recomendações da International Society of Electrophysiology and Kinesiology (ISEK)24.

Na literatura são encontradas algumas formas de realizar a normalização do sinal eletromiográfico13,23. Uma delas é a normalização em relação ao pico máximo do sinal, onde é usado o maior valor do sinal eletromiográfico encontrado no movimento ou ciclo estudado23.

Outra maneira de se realizar a normalização é por meio do valor médio do sinal eletromiográfico como referência, onde é usado o valor médio do sinal da contração. Um valor fixo do sinal também pode ser utilizado para a realização da normalização, onde o valor de referência é uma contração submáxima ou uma contração isométrica submáxima24.

A normalização também pode ser realizada pela Máxima Atividade Voluntária Resistida (MAVR), o maior valor encontrado em uma contração isométrica máxima, para o músculo em questão, ou ainda pela média do sinal obtido durante uma atividade dinâmica13,23,24. O repouso foi utilizado em algumas pesquisas como procedimento de normalização, contudo, não foram encontrados registros na literatura sobre estudos que o tenham utilizado como referência.

O atual protocolo propõe três procedimentos de normalização: o pico máximo; a máxima atividade voluntária resistida (MAVR) com algumas adaptações, e o repouso. No pico máximo, é utilizado como referência para a normalização o maior valor do sinal eletromiográfico, em µV, encontrado durante o período de alimentação.

O conceito da MAVR é proposto como procedimento de normalização, no entanto são necessárias algumas adaptações uma vez que, a população avaliada não realiza qualquer atividade voluntária, apenas reflexa. Assim, as atividades voluntárias são substituídas por atividades reflexas, passando a ser Máxima Atividade Reflexa (MAR) dos músculos, onde deve ser eliciado o reflexo da atividade do músculo ou grupo muscular a ser avaliado.

Neste protocolo, na MAR do masseter é utilizado o reflexo de mordida fásica (por meio da estimulação da região lateral da gengiva e como resposta o bebê apresenta uma mordida) para a manutenção da oclusão em contração. Para a MAR dos músculos supra-hióideos é utilizado o reflexo de sucção (por meio da estimulação da sucção não nutritiva com o dedo enluvado). São consideradas para análise as médias intermediárias do teste, em µV, momento em que há maior estabilização do sinal. A estimulação do reflexo é repetida, com intervalos entre cada contração14,22.

No repouso (Rp), o protocolo propõe para a normalização a utilização como valor de referência um único registro em posição habitual, com os lábios unidos, sem a realização de nenhuma atividade durante o período de captação do sinal. Também é considerada para análise a média intermediária do teste, em µV.

As médias da atividade elétrica muscular (AEM) obtidas durante a alimentação em µV são normalizadas (transformadas em valores percentuais do valor de referência) para cada sujeito e em cada músculo. A fórmula para o cálculo do percentual é (X /valor de referência) x 100, onde X = média da atividade elétrica muscular (AEM) na tarefa solicitada (µV); valor de referência em µV. A análise do sinal eletromiográfico é realizada considerando um valor de referência em %, normalizado. Todos os outros sinais são analisados em termos de porcentagem deste valor de referência, para cada sujeito.

Os resultados da avaliação eletromiográfica dos seis bebês avaliados neste estudo mostram uma ampla variação numérica dos valores dos sinais quando normalizados pelos diferentes procedimentos sugeridos pelo protocolo. Não há referências na literatura sobre a normalização do sinal eletromiográfico nos estudos com esssa população. Os estudos realizados analisaram o sinal em µV. Isto indica a necessidade de um estudo mais aprofundado para compreender a causa ou causas dessa variação. Se há uma influência das características da população estudada ou se há um procedimento mais adequado para a normalização do sinal eletromiográfico nesta população.

CONCLUSÃO

O estudo mostra a possibilidade de aplicação protocolo proposto na avaliação eletromiográfica destes músculos em recém-nascidos pré-termo durante a alimentação. Os músculos masseter e supra-hióideos são recomendados como uma boa opção para o estudo da atividade elétrica de músculos ativados durante a alimentação em pré-termos.

A padronização proposta neste protocolo tenta auxiliar a avaliação dos registros eletromiográficos em recém-nascidos pré-termo, proporcionando aos estudos sobre este tema métodos semelhantes, permitindo assim a comparação entre os resultados alcançados. Ao mesmo tempo, possibilita que os dados coletados possam ser mais bem analisados e que a partir destas análises, condutas mais eficientes possam ser instituídas. A segunda fase deste trabalho compreenderá a pesquisa expe­rimental e a análise estatística dos dados.

O protocolo ainda recomenda procedimentos de normalização do sinal para melhor interpretação dos dados.

Recebido em: 14/05/2012

Aceito em: 07/4/2013

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:

    Rebeca Domingues Raposo
    Rua Jornalista Guerra de Holanda, 161/102 – Monteiro – Recife-PE
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Set 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 2013

    Histórico

    • Recebido
      14 Maio 2012
    • Aceito
      07 Abr 2013
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