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Alterações de funções orais na presença de aparelhos ortodônticos fixos com recursos intraorais

Resumos

OBJETIVO: investigar as possíveis alterações de fala, mastigação e deglutição em usuários de aparelhos ortodônticos com recursos intraorais fixos no palato. MÉTODO: foram avaliados 28 pacientes de ambos os sexos, na faixa etária de 10 a 24 anos, em tratamento no Centro de Reabilitação Estética Orofacial em Campinas. Tais pacientes foram avaliados por fonoaudiólogas antes da colocação do aparelho e após trinta dias de uso de aparelho ortodôntico com recurso fixo. Todos os sujeitos foram avaliados previamente por ortodontistas e apresentaram indicação de colocação do recurso intraoral. O exame fonoaudiológico foi composto pela avaliação da mastigação, deglutição e fala, segundo protocolo especifico de motricidade orofacial, e de teste de fala na área de fonética. Os testes estatísticos aplicados foram: Teste de ANOVA, teste T-Student Pareado, Teste de Igualdade de duas proporções e Intervalo de Confiança para a média. Foram considerados significantes associações com p-valor < 0,05 . RESULTADOS: para a amostra analisada, não houve alterações de mastigação e deglutição estatisticamente significantes após um mês de uso dos aparelhos selecionados. Na fala, 64,3% da amostra não apresentou alterações, mas em 25% dos pacientes observou-se a presença de distorção de grupos consonantais na presença de aparelhos do tipo disjuntor. CONCLUSÃO: o uso de aparelhos fixos com recursos intraorais, provoca modificações estatisticamente significantes somente na fala.

Fala; Mastigação; Deglutição; Ortodontia


PURPOSE: to investigate possible changes in speech, chewing and swallowing in users orthodontic appliances with features (intraoral) fixed on the palate. METHOD: a total of 28 patients of both sexes, in the 10-24 age-group, were evaluated. These patients were being treated at the CEREO - Centro de Reabilitação Estética Orofacial (Aesthetic and Orofacial Rehabilitation Center) in Campinas, São Paulo. They were evaluated by speech therapists before they had their orthodontic appliances installed and also 30 days after they were using these appliances with feature. All subjects were previously evaluated by orthodontists from the CEREO and were candidates to the installation of intraoral features. The speech therapist's test was composed of two parts: the first was the evaluation of chewing, swallowing and speech, according to the MBGR protocol and the second was a phonological evaluation of language. The statistical tests applied were: Two Proportions Equality Test, Chi-Square Test for Independence. We considered significant the associations with p-value <0.10. RESULTS: for the sample analyzed, there were no statistically significant changes in chewing and swallowing after one month of use of intraoral features. In speech, 64.3% of the sample did not change, but in 25% of the patients it was observed a distortion of consonant clusters in the presence of circuit breaker type appliances. CONCLUSION: the use of fixed orthodontic appliances with intraoral features causes statistically significant changes only in speech.

Speech; Mastication; Deglutition; Orthodontics


Alterações de funções orais na presença de aparelhos ortodônticos fixos com recursos intraorais

Paloma Rocha NavarroI; Gisele Bernardi de AssisII; Lídia Lange SouzaIII; Eduardo Macluf FilhoIV; Cláudio Rodrigues AzenhaV; Adriana TessitoreVI

IFonoaudióloga; Mestre em Linguística pelo Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas; Especializanda em Motricidade Orofacial pelo Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica

IIFonoaudióloga; Especializanda em Motricidade Orofacial pelo Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica

IIIFonoaudióloga; Especializanda em Motricidade Orofacial pelo Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica

IVOdontólogo; Mestre em Ortodontia; Especialista em Prótese Dentária

VOdontólogo; Mestre em Ortodontia pela Universidade São Leopoldo Mandic; Especialista em Ortodontia, em Radiologia e em Ortopedia Funcional dos Maxilares

VIFonoaudióloga; Doutora em Ciências Médicas pela Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas

Endereço para correspondênciaEndereço para correspondência: Paloma Rocha Navarro Rua Visconde do Rio Claro, 169 Cidade Universitária II - Barão Geraldo Campinas - SP CEP: 13083-650 E-mail: palomarn@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: investigar as possíveis alterações de fala, mastigação e deglutição em usuários de aparelhos ortodônticos com recursos intraorais fixos no palato.

MÉTODO: foram avaliados 28 pacientes de ambos os sexos, na faixa etária de 10 a 24 anos, em tratamento no Centro de Reabilitação Estética Orofacial em Campinas. Tais pacientes foram avaliados por fonoaudiólogas antes da colocação do aparelho e após trinta dias de uso de aparelho ortodôntico com recurso fixo. Todos os sujeitos foram avaliados previamente por ortodontistas e apresentaram indicação de colocação do recurso intraoral. O exame fonoaudiológico foi composto pela avaliação da mastigação, deglutição e fala, segundo protocolo especifico de motricidade orofacial, e de teste de fala na área de fonética. Os testes estatísticos aplicados foram: Teste de ANOVA, teste T-Student Pareado, Teste de Igualdade de duas proporções e Intervalo de Confiança para a média. Foram considerados significantes associações com p-valor < 0,05 .

RESULTADOS: para a amostra analisada, não houve alterações de mastigação e deglutição estatisticamente significantes após um mês de uso dos aparelhos selecionados. Na fala, 64,3% da amostra não apresentou alterações, mas em 25% dos pacientes observou-se a presença de distorção de grupos consonantais na presença de aparelhos do tipo disjuntor.

CONCLUSÃO: o uso de aparelhos fixos com recursos intraorais, provoca modificações estatisticamente significantes somente na fala.

Descritores: Fala; Mastigação; Deglutição; Ortodontia

ABSTRACT

PURPOSE: to investigate possible changes in speech, chewing and swallowing in users orthodontic appliances with features (intraoral) fixed on the palate.

METHOD: a total of 28 patients of both sexes, in the 10-24 age-group, were evaluated. These patients were being treated at the CEREO - Centro de Reabilitação Estética Orofacial (Aesthetic and Orofacial Rehabilitation Center) in Campinas, São Paulo. They were evaluated by speech therapists before they had their orthodontic appliances installed and also 30 days after they were using these appliances with feature. All subjects were previously evaluated by orthodontists from the CEREO and were candidates to the installation of intraoral features. The speech therapist's test was composed of two parts: the first was the evaluation of chewing, swallowing and speech, according to the MBGR protocol and the second was a phonological evaluation of language. The statistical tests applied were: Two Proportions Equality Test, Chi-Square Test for Independence. We considered significant the associations with p-value <0.10.

RESULTS: for the sample analyzed, there were no statistically significant changes in chewing and swallowing after one month of use of intraoral features. In speech, 64.3% of the sample did not change, but in 25% of the patients it was observed a distortion of consonant clusters in the presence of circuit breaker type appliances.

CONCLUSION: the use of fixed orthodontic appliances with intraoral features causes statistically significant changes only in speech.

Keywords: Speech; Mastication; Deglutition; Orthodontics

INTRODUÇÃO

As funções orais desempenhadas pelas estruturas rígidas e moles da cavidade oral e regiões circunvizinhas são de importância vital para o ser humano, já que envolve o processo de alimentação1.

Dentre essas funções, a mastigação é o fenômeno que visa à degradação mecânica de alimentos, isto é, a sua trituração e moagem, degradando-os até partículas menores2. É um processo fisiológico complexo que envolve atividades neuromusculares e digestivas3. Pode ser considerada como uma unidade funcional sendo que seus componentes são: dentição, estruturas periodontais de suporte maxilar e mandibular, articulação temporomandibular, musculatura mastigatória e de lábios, bochechas e língua, tecidos moles que revestem essas estruturas, assim como a inervação e vascularização que suprem esses componentes3,4. Para que se desenvolva com eficiência, é importante que todas as estruturas envolvidas nessa atividade estejam íntegras5.

A mastigação bilateral alternada é considerada fisiologicamente como a ideal do ser humano. Este padrão possibilita a distribuição da força mastigatória intercalando trabalho e repouso, promove a sincronia e equilíbrio muscular e funcional, estimula o desenvolvimento e/ou manutenção dos arcos dentários e a estabilidade oclusal2. Porém em pesquisas mais recentes, concluiu-se que indivíduos sãos, isto é, sem qualquer alteração estrutural oral, pode haver preferência mastigatória por um dos lados (direito ou esquerdo) sem que haja um comprometimento em relação ao crescimento facial6.

As alterações mais comuns encontradas na mastigação são: boca aberta, presença de ruídos, excesso de participação da musculatura periorbicular, interposição de lábios, tempo mastigatório, entre outras.

Após a mastigação, inicia-se o processo de deglutição, que tem como papel a propulsão do bolo alimentar ou de líquidos da cavidade oral para o estômago1,6. É uma atividade neuromuscular muito complexa que inicia-se de maneira consciente e ao longo do processo há a integração do sistema nervoso central, organizando os impulsos nervosos no centro da deglutição6. Divide-se a deglutição de acordo com as características anatômicas e funcionais. É classificado respectivamente como oral, farínge e esôfago-gástrico. A fase oral da deglutição, que foi a fase avaliada nessa pesquisa, pode ser subdividida nos estágios de preparo, qualificação, organização e ejeção 7,8. O preparo é o momento em que o alimento é insalivado e triturado pela mastigação; a qualificação inicia-se em associação com o estágio de preparo, e é aqui que o organismo identifica o bolo em seu volume, consistência, densidade, grau de umidificação e inúmeras outras características físicas e químicas que importam para adequada interação com o bolo alimentar. Durante a organização, este bolo é usualmente posicionado sobre o dorso da língua. As estruturas osteomúsculo-articulares, responsáveis pela morfofuncionalidade da boca, organizam-se para a ejeção que se cumpre pelo ajustamento das paredes bucais e projeção posterior da língua, gerando pressão propulsiva, conduzindo o bolo e transferindo pressão para a faringe6-9.

As alterações encontradas na fase oral da deglutição eram classificadas como atípicas6. Porém atualmente, considera-se que a deglutição pode ser atípica ou adaptada. Quando há alguma alteração anatômica, as estruturas se adaptam para que possa ocorrer a deglutição. Então se há alguma maloclusão, o sistema estomatognático mantém as funções, porém se adéquam as mudanças existentes. Portanto na deglutição adaptada, a deglutição estará "alterada" de acordo com alguma alteração física, presença de hábitos e padrões familiares do paciente. Se a alteração não se justifica como conseqüência de outros fatores que interferem na deglutição (respiração, idade, maloclusão, hábitos e padrões familiares, entre outros), será considerada apenas como um hábito inadequado, e, portanto, classificada como deglutição atípica6,9.

Já a fala é uma função atribuída como característica exclusiva do ser humano. Resulta da interação complexa entre as capacidades biológicas inatas e a estimulação ambiental. É uma atividade complexa que inclui a participação do sistema nervoso central e um sistema fonoarticulatório de natureza neuromuscular, sendo que o sistema estomatognático desempenha papel fundamental nesse processo10,11. Portanto, alterações nesse sistema (independente das causas), poderão influir na qualidade e precisão articulatória dos sons, e tais fatores etiológicos causarão alterações fonéticas. Em contrapartida, em um estudo com realizado com crianças que apresentavam apinhamento dentário e alimentação com pastosa refere que as distorções na fala não estão relacionadas com a oclusão11. Tal estudo concordava com pesquisas anteriores, que relacionavam maloclusão e alterações na fala.

Se a presença de alterações físicas na cavidade oral pode gerar modificações nas funções orais, como se observa até aqui, a presença de aparelhos ortodônticos com recursos intraorais fixos no palato também podem acarretar em modificações na mastigação, deglutição e fala. Os recursos como a barra Transpalatina (fio de aço que contorna o palato duro, presa ou encaixada nas bandas dos molares), disjuntor (principal função é corrigir a atresia maxilar) e expansor (dispositivo fixo, que promove a expansão lenta dos processos alveolares)12, são muito utilizados durante os tratamentos ortodônticos, e nessa pesquisa foram os que apresentaram maior ocorrência.

Artigos recentes que trataram sobre a fala com uso de aparelhos (brackets linguais e placa palatina)12-19 relatam que após, no máximo, sete dias de uso dos aparelhos, as alterações de fala, com exceção de alguns fonemas, foram sanados. Outros já relatam que quanto maior o tempo do tratamento ortodônticos, maior é a tendência de alterações na mastigação, sendo que o mesmo não é válido para a fala e deglutição17.

A preocupação dos profissionais envolvidos nesse campo deve voltar-se para as possíveis alterações funcionais que poderão ocorrer durante o tratamento ortodôntico quando há utilização dos recursos intraorais citados anteriormente.

Como há controvérsias na literatura, esse estudo teve como objetivo investigar as possíveis alterações de fala, mastigação e deglutição em usuários de aparelhos ortodônticos com recursos intraorais fixos no palato.

MÉTODO

A presente pesquisa caracteriza-se como prospectiva longitudinal, em que foram avaliados 28 pacientes de ambos os sexos, na faixa etária de 10 a 24 anos, em tratamento no Centro de Reabilitação Estética Orofacial em Campinas - CEREO. Tais pacientes foram avaliados por fonoaudiólogas antes da colocação do aparelho, e após trinta dias de uso de aparelho ortodôntico com recurso intraoral fixo. Nessa pesquisa os sujeitos utilizaram os seguintes recursos: barra transpalatina (BTP), arco lingual, disjuntor, expansor e grade lingual com esporão.

Como critérios de inclusão os sujeitos deveriam ser pacientes desta mesma instituição e apresentar no planejamento dos casos indicação do ortodontista de colocação do recurso intraoral.

Como critérios de exclusão: pessoas portadoras de quaisquer déficits auditivos, neurológicos e cognitivos, e pacientes com ausência de elementos dentários frontais (incisivos).

O exame fonoaudiológico foi composto pela avaliação da mastigação e deglutição utilizando as características de alterações do protocolo específico de motricidade orofacial - MBGR20 (Figura 1), e verificando a presença ou não destas alterações.


Figura 1 - Exame fonoaudiológico - Protocolo MGBR

A fala foi avaliada por meio de uma lista de palavras e figuras retiradas do protocolo ABFW21.

Na avaliação da mastigação, foi utilizado o alimento sólido, BIS (bolacha wafer coberta com chocolate ao leite) seguindo o mesmo protocolo, em que foi oferecido porções de tamanho padronizados do mesmo alimento, orientando que mastigassem de maneira natural. A escolha desse alimento deu-se pelo baixo custo, de fácil aceitação entre os sujeitos, maior tempo de conservação, sem modificação de suas propriedades3.

Observaram-se os seguintes itens: incisão, trituração, número de ciclos, fechamento labial, padrão mastigatório, velocidade, ruídos, contrações musculares atípicas e lado preferencial.

O exame da deglutição foi realizado inicialmente com a deglutição de BIS, observando diversos itens, tais como vedamento labial, postura de língua, posição do lábio inferior, contração do músculo orbicular, mentual e da musculatura cervical e movimento de cabeça.

Em seguida foi oferecido líquido, sendo que na primeira prova deveria ser deglutido de forma habitual e a segunda prova, dirigida (com orientação verbal para colocar o líquido na boca, tirar o copo da frente dos lábios e então deglutir). Realizamos tais provas, para uma melhor visualização da deglutição.

Toda a avaliação, tanto do antes como do depois, foi documentada em vídeo, em que a câmera (máquina utilizada foi uma câmera fotográfica e filmadora SONY com lente CARL ZEISS de 7.2 MEGA PIXELS) ficou a um metro e meio de distância do paciente e apoiada em tripé. Portanto, foi realizada uma avaliação observacional dos vídeos por pelo menos duas fonoaudiólogas com experiência em Motricidade Orofacial.

Foram consideradas alterações, todas as características presentes nas funções observadas, que não correspondem ao padrão de normalidade. Na deglutição a projeção da cabeça, contração excessiva da musculatura periorbicular, interposição de lábios e/ou língua, inflar as bochechas e barulho excessivo. Na mastigação, as alterações observadas foram o não verdamento labial, a presença de contração excessiva da musculatura periorbicular, mastigação bilateral simultânea ou unilateral, amassamento com a língua, número de ciclos mastigatórios reduzido.

Na fala foi utilizado o teste ABFW, para avaliação fonética dos sujeitos, foi utilizado a lista de palavras do protocolo ABFW, para avaliação fonética em que o paciente realizou imitação, nomeação e conversa espontânea21. Foram consideradas como alterações na fala as omissões, substituições e distorções de fones.

Os dados obtidos nessa pesquisa estão apresentados em forma de gráficos.

Todos os indivíduos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Esta pesquisa foi avaliada e aprovada com o número 058 /09 pelo Comitê de Ética do CEFAC - Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica.

Os testes estatísticos aplicados foram: Os testes estatísticos aplicados foram: Teste de ANOVA, teste T-Student Pareado, Teste de Igualdade de duas proporções e Intervalo de Confiança para a média. Foram considerados significantes associações com p-valor < 0,05.

RESULTADOS

A média de idade da amostra foi de 14,50, com um desvio padrão de 3,51. E dentre os sujeitos, 17 eram do gênero feminino e 11 do gênero masculino.

A Figura 2 representa a distribuição de tipos de aparelhos.

Figura 2 - Distribuição de tipo de aparelho

Legenda: BTP: Barra Transpalatina; DJ: Disjuntor; EX: Expansor; AL: Arco Lingual; GLE: Grade Lingual com esporão

Abaixo, apresentamos a Tabela 1, em que podemos observar as comparações da avaliação de fala antes da colocação do recurso intraoral e após trinta dias de uso.

Table 1 - Questionnaire used in the assessment of the Cybertutor

Legenda: SA: Sem alteração; DPP: distorção de fonemas plosivos posteriores; DFAD: distorção fonemas fricativos anteriores dentais; DG: distorção grupo; DFA: distorção de fonemas anteriores.

Existe diferença estatística entre os momentos para a distribuição de Distorção e de SA. Para as distorções houve aumento de 0% para 14,3% e em SA houve uma redução de 100% para 67,9%. Ambas as diferenças são estatisticamente significantes.

A seguir, os resultados para a distribuição de Alteração Mastigação (Tabela 2).

Tabela 2 - Compara Momentos para Distribuição de Mastigação

Legenda: CMA: Contrações Musculares Atípicas; FL: Fechamento labial; I: Incisão; PM: Padrão mastigatório; R: Ruídos; T: Trituração; V: Velocidade; R0: 1º. Momento; R1: 2º. Momento.

Para finalizar com a caracterização dos resultados das variáveis qualitativas, observa-se a distribuição das alterações de deglutição, na primeira, segunda e terceira prova (Tabelas 3, 4 e 5).

Tabela 3 - Compara Momentos para Distribuição de Deglutição 1ª Prova

Legenda: FL: Fechamento Labial; PLI: Postura do Lábio Inferior;CA: Contenção do Alimento; CO: Contração do Orbicular; CM: Contração do Mentual; CMC: Contração da Musculatura Cervical; MC: Movimento de Cabeça; R: Ruído; C:Coordenação.

Tabela 4 - Compara Momentos para Distribuição de Deglutição 2ª Prova

Legenda: C:Coordenação; CL: Contenção de Líquidos; CM: Contração do Mentual; CMC: Contração da Musculatura Cervical; CO: Contração do Orbicular; FL: Fechamento Labial; MC: Movimento de Cabeça; PLI: Postura do Lábio Inferior; R: Ruído; R0: 1º. Momento; R1: 2º. Momento.

Tabela 5 - Compara Momentos para Distribuição de Deglutição 3ª Prova

Legenda: C: Coordenação; CL: Contenção de Líquidos; CM: Contração do Mentual; CMC: Contração da Musculatura Cervical; CO: Contração do Orbicular; MC: Movimento de Cabeça; PLI: Postura do Lábio Inferior; R: Ruído; RI: Ritmo; VL: Volume do Liquido; R0: 1º. Momento; R1: 2º. Momento.

Observa-se que não existe diferença estatística entre os momentos nas distribuições da freqüência relativa para os parâmetros dos exames de Deglutição e Mastigação.

A Tabela abaixo aponta a relação dos recursos intra-orais com as alterações presentes nas funções da mastigação e de deglutição (1ª, 2ª. e 3ª. provas).

Tabela 6 - Compara Aparelhos para Média do Ganho Total

Legendas: BTP: Barra Transpalatina; DJ: Disjuntor; EX: Expansor

Embora existam diferenças médias entre os aparelhos para o ganho do total em todos os exames, as mesmas (diferenças) não podem ser consideradas estatisticamente significantes.

Vale ressaltar que para as análises de relações, não será mostrado todos os níveis de respostas, pois muitos aparelhos possuíam amostragem extremamente baixa, como 1, 2 ou 3 ocorrências. Assim, foi selecionado somente os níveis com mais prevalência.

DISCUSSÃO

Um dos preceitos da Ortodontia contemporânea é diminuir a necessidade de colaboração do paciente, desenvolvendo aparelhos que atuem de maneira mais eficiente na correção ortodôntica/ortopédica, com um menor desconforto e melhor custo/benefício22. Para a seleção do aparelho mais adequado ao tratamento ortodôntico, o ortodontista avalia, principalmente, o potencial de crescimento do paciente e seu possível grau de cooperação durante o tratamento. Assim, com a correta escolha dos dispositivos para a correção ortodôntica, o tratamento é desenvolvido de maneira mais eficiente22.

Seguindo essa linha de pensamento, o ortodontista, de acordo com cada caso, utiliza-se de recursos intraorais, sendo que estes podem gerar alterações de fala, mastigação e deglutição.

Maciel et al23 avaliou a necessidade de intervenção fonoaudiológica nos pacientes em tratamento na clínica ortodôntica da Universidade Federal de Juiz de Fora e apresentou, como resultado, que 92% dos examinados tinham alterações na mastigação e na deglutição, e 52% apresentaram alguma disfunção na fala. Quanto maior o tempo de tratamento ortodôntico, maior é a tendência dos pacientes a apresentarem alterações de mastigação, o mesmo já não é válido para a deglutição e para a fala.

Usuários de placa acrílica17,18 e de aparelhos fixos linguais14, 15apresentaram alterações de fala durante o primeiro mês de uso, pois houve modificações da configuração anatômica da cavidade oral, bem como nos pontos de articulação dos fonemas consonantais. A placa palatina, por exemplo, pode mudar até mesmo a postura e os movimentos dos músculos intrínsecos da língua e, portanto, alteram também a mobilidade de língua (vibração e estalo). O único fonema que continuou alterado após o primeiro mês de uso de aparelhos fixos linguais foi o vibrante [r].

O mesmo ocorre com usuários de aparelhos ortopédicos funcionais19. Há alterações de fala e de deglutição durante o uso dos aparelhos e, em alguns casos, verificou-se a necessidade de adaptações funcionais para a realização da fala e da deglutição.

Até mesmo os brackets (lingual e labial) dos aparelhos ortodônticos apresentam desconforto aos seus usuários13. Queixas como feridas na língua, bochecha e lábios, dificuldades em comer, falar e cuidados orais, período de adaptação e problemas gerais foram analisadas. Os pacientes com aparelhos linguais apresentaram maior dificuldade, com feridas na língua e dificuldades na fala, que não desapareceram em pelo menos 23% após o período de três meses de tratamento. Enquanto que no grupo de aparelhos labiais, esses problemas estavam presentes também, mas desapareceram em cerca de 30 dias.

Stamm et al14 comparou a influência de dois sistemas de bráquetes linguais em relação ao conforto oral, fala, mastigação e higiene oral. Para tanto, 42 falantes nativos de alemão preencheram questionários imediatamente após a inserção dos bráquetes linguais, depois de 24 horas de uso do aparelho e três meses depois. Desse grupo, 18 pacientes foram tratados com bráquetes pré-fabricados e 24 com bráquetes customizados. O grupo de bráquetes customizado teve menos problemas de fala, mastigação, espaço para língua e higienização, além de ser menos relatado nesse grupo a presença de feridas e lesões na língua.

Outro estudo tinha como objetivo comparar o desconforto oral entre dois grupos que utilizavam diferentes técnicas de posicionamento de bráquetes linguais. Para tanto, aplicaram um questionário em um período de 24 horas de uso do aparelho e três meses depois. Nesse questionário foram avaliados os seguintes itens: desconforto oral, dificuldades nas funções orais, e qualificações profissionais. Ambos os grupos relataram problemas de espaço na cavidade oral para a língua, bem como a frequente ferida na mesma. Também relataram dificuldades na fala, mastigação e deglutição, mas que houve melhora significante em um período de três meses15.

Estudos recentes vêem comprovando que os bráquetes linguais individualizados, lançados recentemente, proporcionam maior conforto e facilidade na fala, se comparados com os bráquetes tradicionais da técnica lingual. Nota-se, de acordo com os autores, que a técnica lingual apresenta algumas desvantagens como a restrição do espaço e posição da língua, mastigação e higiene oral24.

Assim como esses estudos que encontraram alterações na fala, mastigação e deglutição de pacientes usuários de aparelhos ortodônticos/ortopédicos, e que após um mês de uso a grande maioria dos pacientes avaliados já não apresentavam alterações, a presente pesquisa corrobora com tais resultados. Foi possível observar que a maior parte dos sujeitos avaliados não apresentou nenhuma alteração de fala, deglutição e mastigação após 30 dias de uso do recurso intraoral.

Todos os aparelhos intraorais utilizados por ortodontistas produzem modificações nas funções orais, pois se comportam como um corpo estranho dentro de um sistema já constituído19. Isso acontece porque o aparelho passa a ocupar um espaço dentro da cavidade oral, diminuindo a dimensão vertical intraoral, prejudicando os movimentos da língua17. Logo, os usuários de aparelhos deverão adaptar-se a esses recursos e, como foi possível observar, é o que ocorre após o primeiro mês de uso.

É possível, observar também que 25% da presente amostra eram usuários de disjuntor e, portanto, são aparelhos grandes, que prejudicam a articulação dos fonemas, bem como a mastigação e deglutição.

Dentre as funções orais, a fala foi aquela que apresentou maior número de alterações, mais especificamente nos usuários de disjuntor. Isso porque durante a fala, em especial na produção das consoantes, são necessários movimentos finos e precisos dos articuladores ativos (língua, lábios e véu palatino) na cavidade oral. Na presença de um corpo estranho, esses movimentos são diminuídos, por exemplo, o tipo de alteração mais encontrado foram as distorções de grupos consonantais. Esses são encontros de duas consoantes sem a presença de vogais intermediárias, ou seja, para sua produção são necessários movimentos muito precisos e seguidos, então quando são utilizados aparelhos que se encontram em pontos de articulação de tais segmentos consonantais, haverá distorção do mesmo, corroborando com os resultados encontrados nessa pesquisa.

Em relação às outras funções orais, foram encontradas poucas alterações no período de 30 dias de uso de recurso intraoral, observando-se, assim, uma adaptação das estruturas do sistema estomatognático à presença do aparelho. Portanto, as funções de mastigação e deglutição mantiveram-se inalteradas em relação à primeira avaliação.

Em um trabalho interdisciplinar entre odontologia e fonoaudiologia, a meta é a resolução dos problemas das pessoas que procuram o tratamento, especificamente, do sistema estomatognático25. Assim, diversas vezes, são encaminhados pacientes usuários de tais recursos para fonoaudiólogos. Portanto, aí está a importância de se estudar se realmente há alterações, quais seriam elas e se há adaptação do sistema estomatognático diante da presença dos aparelhos intraorais.

Acredita-se na importância de novas pesquisas envolvendo tipos específicos de recursos (tais como o expansor e disjuntor), coleta de dados imediatamente e/ou poucos dias após a colocação do aparelho para que se possa identificar o tempo de adaptação e as alterações que cada recurso intraoral pode gerar.

Com isso, a Fonoaudiologia poderá contribuir com um protocolo de intervenção e/ou orientação a pacientes e ortodontistas, antecipando as possíveis alterações que irão ocorrer durante o processo de adaptação e o tempo médio para que esta ocorra. Deveriam ser adotadas medidas de aconselhamento e orientação antes da colocação do recurso intraoral nas primeiras semanas de uso, em especial, sobre as possíveis mudanças e alterações na fala. Isso fará com que o paciente não crie expectativas falsas e o impacto sentido será melhor aceito.

CONCLUSÃO

Mediante os resultados obtidos conclui-se que:

1. Houve alterações estatisticamente significantes na fala somente na presença do Disjuntor.

2. Não houve alterações estatisticamente significantes nas funções de mastigação e de deglutição.

Recebido em: 08/12/2011

Aceito em: 06/08/2012

Conflito de interesses: inexistente

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Out 2013

    Histórico

    • Recebido
      08 Dez 2011
    • Aceito
      06 Ago 2012
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