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Estudo das relações comunicativas no processo de gestão de uma instituição de saúde

Resumos

OBJETIVO: relacionar as estratégias comunicativas adotadas na gestão de uma instituição de saúde com a percepção da comunicação pelos sujeitos participantes. MÉTODO: estudo descritivo-comparativo, com amostra por tipicidade, de recorte transversal. O estudo foi realizado em uma instituição de saúde do estado de Minas Gerais. Foram entrevistados 56 sujeitos de seis setores da instituição por meio de aplicação de questionário com 15 questões fechadas, que abordam desde a identificação do sujeito até as ações de planejamento, execução e avaliação da gestão e a percepção da comunicação e meios utilizados para se comunicar. Foi realizada análise descritiva e utilização do índice Kappa. RESULTADOS: os entrevistados, em sua maioria, relataram que as reuniões nas quais ocorre o planejamento não são exclusivas para tal atividade. Nelas sempre estão presentes as chefias diretas, ao contrário das indiretas. Quanto à execução das ações, observou-se que todos os membros da equipe se responsabilizam pelas atividades e compartilham informações durante o processo de trabalho. Foi relatado ainda que a avaliação ocorre de maneira assistemática e a presença das chefias direta e indireta é semelhante ao que ocorre na etapa de planejamento. Foi encontrado baixo grau de concordância entre as respostas. A percepção dos sujeitos sobre a comunicação foi considerada satisfatória, apontando que não é estabelecida relação direta entre a comunicação e o processo de trabalho. CONCLUSÃO: considera-se que os dados obtidos nesse estudo foram relevantes, de modo que permitiram discutir o papel da comunicação no sistema gestor pesquisado.

Gestão em Saúde; Comunicação; Fonoaudiologia


PURPOSE: to relate the communicative strategies adopted in the management of a health institution with the communication perception of the participants. METHOD: descriptive-comparative and cross-sectional study with a sample defined by type. 56 subjects from six sectors of the institution were interviewed with a closed questions questionnaire. For this study, we analyzed the questions related to stages of management and perception of communication at work. RESULTS: most of the respondents reported that the meetings in which planning occurs are not exclusive to this activity. The direct supervisors are always present, as opposed to the indirect ones. Regarding the implementation of actions, it was observed that all members of the sector take responsibility for the activities and share information during the process. It was reported that the evaluation occurs in an unsystematic way and the presence of direct and indirect leadership is similar to what occurs in the planning stage. It was found a low degree of correlation between the answers. The perception of the subjects about the communication was adequate, noting that no direct relationship is established between the communication and work process. CONCLUSION: it is considered that the data obtained in this study were relevant, so that led to discuss the role of communication in the system manager searched.

Health Management; Communication; Speech, Language and Hearing Sciences


Estudo das relações comunicativas no processo de gestão de uma instituição de saúde

Study of communicative relations in the management process of a health institution

Marcela Cristina FerreiraI; Fernanda Jorge MacielII; Leonardo Assis de CastroIII; Stela Maris Aguiar LemosIV

IGraduanda em Fonoaudiologia da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil

IIFonoaudióloga; Superintendente de Educação da Escola de Saúde Pública de Minas Gerais – ESP-MG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil; Especialista em Gestão de Tecnologias em Saúde e Mestranda em Saúde Pública pela UFMG

IIIGraduando em Fonoaudiologia da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil

IVFonoaudióloga; Professora Adjunto do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil; Doutora em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Marcela Cristina Ferreira Rua Itacolomito, 115 – Santa Tereza Belo Horizonte – MG – CEP: 31015-100 E-mail: marcelacfc@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: relacionar as estratégias comunicativas adotadas na gestão de uma instituição de saúde com a percepção da comunicação pelos sujeitos participantes.

MÉTODO: estudo descritivo-comparativo, com amostra por tipicidade, de recorte transversal. O estudo foi realizado em uma instituição de saúde do estado de Minas Gerais. Foram entrevistados 56 sujeitos de seis setores da instituição por meio de aplicação de questionário com 15 questões fechadas, que abordam desde a identificação do sujeito até as ações de planejamento, execução e avaliação da gestão e a percepção da comunicação e meios utilizados para se comunicar. Foi realizada análise descritiva e utilização do índice Kappa.

RESULTADOS: os entrevistados, em sua maioria, relataram que as reuniões nas quais ocorre o planejamento não são exclusivas para tal atividade. Nelas sempre estão presentes as chefias diretas, ao contrário das indiretas. Quanto à execução das ações, observou-se que todos os membros da equipe se responsabilizam pelas atividades e compartilham informações durante o processo de trabalho. Foi relatado ainda que a avaliação ocorre de maneira assistemática e a presença das chefias direta e indireta é semelhante ao que ocorre na etapa de planejamento. Foi encontrado baixo grau de concordância entre as respostas. A percepção dos sujeitos sobre a comunicação foi considerada satisfatória, apontando que não é estabelecida relação direta entre a comunicação e o processo de trabalho.

CONCLUSÃO: considera-se que os dados obtidos nesse estudo foram relevantes, de modo que permitiram discutir o papel da comunicação no sistema gestor pesquisado.

Descritores: Gestão em Saúde; Comunicação; Fonoaudiologia

ABSTRACT

PURPOSE: to relate the communicative strategies adopted in the management of a health institution with the communication perception of the participants.

METHOD: descriptive-comparative and cross-sectional study with a sample defined by type. 56 subjects from six sectors of the institution were interviewed with a closed questions questionnaire. For this study, we analyzed the questions related to stages of management and perception of communication at work.

RESULTS: most of the respondents reported that the meetings in which planning occurs are not exclusive to this activity. The direct supervisors are always present, as opposed to the indirect ones. Regarding the implementation of actions, it was observed that all members of the sector take responsibility for the activities and share information during the process. It was reported that the evaluation occurs in an unsystematic way and the presence of direct and indirect leadership is similar to what occurs in the planning stage. It was found a low degree of correlation between the answers. The perception of the subjects about the communication was adequate, noting that no direct relationship is established between the communication and work process.

CONCLUSION: it is considered that the data obtained in this study were relevant, so that led to discuss the role of communication in the system manager searched.

Keywords: Health Management; Communication; Speech, Language and Hearing Sciences

INTRODUÇÃO

Com a implantação do Sistema Único de Saúde (SUS) na década de 90, não só o atendimento direto à saúde sofreu mudanças, como também a forma de administrar os recursos e políticas de saúde. Para adequar a gestão a esta nova lógica, os órgãos públicos responsáveis, como as Secretarias de Saúde municipais e estaduais, tiveram que reformular as práticas da gestão em saúde1.

Por gestão entende-se administração, otimização da produtividade e tomada de decisões que contribuam para a eficácia/eficiência da organização2. Transpondo esses conceitos para a gestão em saúde, se faz necessário, além de garantir o cumprimento dos princípios universais do SUS, possibilitar a participação popular e profissional nas decisões sobre os serviços de saúde e garantir alta produtividade das ações executadas2. Entretanto, para que esses objetivos sejam alcançados, a gestão dentro dos órgãos públicos de saúde deve seguir determinadas etapas que organizam a execução das ações internas à instituição.

A gestão pode ser dividida em três momentos: planejamento, execução e avaliação das ações. O planejamento deve estabelecer um conjunto coordenado de ações visando alcançar determinado objetivo 3; a execução trata do gerenciamento das ações propostas4; e a avaliação trata do acompanhamento, a prestação de contas sobre o resultado alcançado5. Porém, para que essas três etapas sejam realizadas da maneira proposta, é preciso que se estabeleça um processo comunicativo efetivo entre todas as esferas de poder dentro da organização, de modo que as ações finais sejam de conhecimento de todos os envolvidos.

No campo da administração, a Escola de Relações Humanas6 introduz a comunicação como elemento que integra trabalhadores que ocupam posições distintas na organização. Esta teoria aborda a importância da "comunicação entre as posições" e da "participação nas decisões". Isso significa que todos os níveis de trabalhadores de uma organização devem ter participação ativa e acesso a todas as ações desempenhadas. Para que isso aconteça, é importante que não exista uma departamentalização exacerbada das atividades e que haja, também, uma descentralização das informações. No campo da saúde no Brasil, a gestão comunicativa proposta por Rivera5 apresenta um contraponto entre a Teoria da Ação Comunicativa de Habermas7 e o Planejamento Estratégico Situacional de Carlos Matus8, enfatizando a importância da comunicação como estratégia para o busca da democracia radical. Nesse contexto, a comunicação, dentro do modelo de gestão em saúde, se torna ferramenta de trabalho e componente da gestão.

Sendo a gestão comunicativa o modelo ideal de gestão do SUS5, se faz importante o estudo de como se estabelecem as relações comunicativas dentro de um órgão gestor de saúde. Essas relações podem ser determinantes no conjunto final das políticas de saúde formuladas pela instituição. Dessa forma, o objetivo do presente estudo é relacionar as estratégias comunicativas utilizadas nos três momentos da gestão com a percepção da comunicação de trabalhadores de uma instituição gestora do Sistema Único de Saúde.

MÉTODO

Trata-se de estudo de delineamento descritivo-comparativo, com amostra por tipicidade, de recorte transversal, realizado em uma instituição de saúde do estado de Minas Gerais. Dentre um total de 18 setores da instituição, seis setores foram incluídos nesse estudo, selecionados aleatoriamente, sendo entrevistados 56 sujeitos, selecionados por sorteio (30% por setor). Os dados foram coletados de setembro de 2008 a abril de 2010.

Foi utilizado um questionário com questões fechadas sobre os recursos utilizados na comunicação, sobre a dinâmica do planejamento, execução e avaliação das ações em saúde e sobre a percepção dos sujeitos da pesquisa quanto à comunicação em seu trabalho. Após o sorteio, cada participante foi convidado por e-mail e/ou telefone, e após o aceite, foi assinado o termo de consentimento livre e esclarecido.

As entrevistas ocorreram com base em roteiro estruturado, elaborado pelas pesquisadoras (figura 1). Nesse estudo, foram consideradas apenas as questões relativas aos três momentos da gestão e à percepção dos sujeitos da pesquisa quanto à comunicação em seu trabalho.


Essa pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética da Universidade Federal de Minas Gerais (Parecer nº ETIC 74/08) e contou com financiamento da FAPEMIG.

A entrada, o processamento e a análise quantitativa dos dados foram realizados por meio do programa SPSS (versão 16). Para análise estatística foi utilizado o Indice Kappa, que é uma medida de concordância usada em escalas nominais. Tal índice fornece uma idéia do quanto as observações se afastam das esperadas, fruto do acaso, indicando assim o quão legítimas são as interpretações. Com o objetivo de verificar a concordância entre as respostas dos sujeitos relativas às três etapas da gestão e a percepção da comunicação, aplicou-se o Indice Kappa, considerando a classificação dos graus de concordância sugerida por Landis e Koch9. Os testes foram considerados estatisticamente significantes quando p-valor < 0,05. O valor de kappa de 0,80 a 1,00 foi classificado como concordância excelente, de 0,61 a 0,80, como concordância boa, de 0,41 a 0,60 como concordância moderada, de 0,21 a 0,40 como concordância razoável e de 0,20 a –1,00 como concordância pobre. Para análise descritiva utilizou-se as frequências absoluta e relativa.

RESULTADOS

Dos 56 sujeitos participantes do estudo, 82,1% possuíam ensino superior completo, a maioria eram servidores concursados da instituição (85,7%) e 58,9% nunca haviam atuado no serviço público anteriormente. Quanto ao cargo de ocupação, 14% possuíam cargo de ensino médio, 58% de ensino superior, 10,7% cargo de coordenação e 16,1% apresentavam outro tipo de cargo, que, em sua maioria se referem a cargos de coordenação ou assessoria em setores não existentes na estrutura organizacional formal. Isso se deve, muitas vezes, à complexidade das ações realizadas pelos setores formais, o que gera muitas vezes a necessidade de criação de departamentos informais com lideranças também informais na instituição. Cada setor incluído no estudo foi identificado por uma letra, para a análise dos dados e apresentação dos resultados. A distribuição da amostra nos setores ocorreu da seguinte forma: 6 sujeitos nos setores A e C, 8 no setor D, 10 nos setores B e E, 16 no setor F.

Na análise de como se dá o processo comunicativo na etapa de planejamento (tabela 1), observou-se que todos os setores referiram baixa periodicidade ("nunca ou raramente") para sua realização por meio de reuniões com pauta pré-determinada. Ainda assim, em 5 dos 6 grupos analisados, a maioria dos sujeitos afirmou que o planejamento é feito por meio de reuniões periódicas "as vezes ou sempre". Entende-se por reunião periódica uma reunião pré-agendada, que faz parte de um cronograma e acontece com frequência determinada. Em todos os grupos, o planejamento é realizado predominantemente de forma assistemática, seguindo diretrizes externas ao setor (com exceção do grupo E).

Quanto à participação no momento de planejamento, na maioria dos setores, toda a equipe participa "às vezes ou sempre". Nota-se que quase 100% dos entrevistados em todos os grupos consideram que a chefia direta está presente com grande frequência nessa etapa da gestão, sendo que o mesmo não se dá em relação à chefia indireta.

No que se refere à etapa de execução das ações planejadas (tabela 2), todos os setores apontaram que geralmente cada membro da equipe assume uma determinada atividade, ainda que todos também sejam responsáveis por todas as ações executadas. Os seis grupos revelaram que as informações sobre as atividades realizadas são compartilhadas entre todos da equipe de forma frequente ("às vezes/sempre").

Na etapa de avaliação das ações (tabela 3), apenas 2 grupos referiram sua ocorrência predominantemente por meio de reunião com pauta pré-determinada. O processo de avaliação ocorre, em sua maioria, de forma assistemática para 5 grupos e por meio de reunião periódica para apenas 2 grupos. A chefia direta participa dessa etapa em todos os setores, sendo que a participação da chefia indireta ocorre predominantemente apenas para 2 grupos.

Ao se verificar o grau de concordância (Índice Kappa) entre as respostas relativas às três etapas da gestão entre os 56 sujeitos entrevistados, foi verificada pequena concordância (Kappa< 0,4) ou até mesmo discordância (Kappa <0) em todas as questões. Isso significa que o modo como ocorre o planejamento e a avaliação das ações não é semelhante, segundo os sujeitos entrevistados. Na etapa de execução das ações, ainda que a maioria dos sujeitos afirme que as informações são compartilhadas entre todos os membros da equipe e que todos se responsabilizam pelas ações, foi verificada discordância entre a percepção dos participantes da pesquisa.

Quanto à percepção dos sujeitos em relação ao processo comunicativo, à comunicação interna e com outros setores ou superintendências, bem como com a direção superior e outras instituições foi considerada satisfatória pela maioria dos participantes. Houve também auto-avaliação positiva por parte de 92,9% dos entrevistados (Figura 2).


DISCUSSÃO

A análise dos resultados referentes à etapa de planejamento evidenciou um contraste entre a baixa periodicidade de reuniões com pauta pré-determinada e a alta periodicidade de reuniões periódicas. Esse dado pode nos sugerir a ocorrência de um "planejamento sem planejamento", ou seja, as reuniões com pauta pré-determinada seriam um indício da existência de um espaço/tempo reservado para planejar. Assim, conforme preconizado pela literatura, tais ações demonstrariam que se deve considerar o planejamento como etapa fundamental no processo de trabalho, na perspectiva da organização comunicante10. O que parece acontecer, segundo os entrevistados, são reuniões periódicas internas ao setor para discutir o planejamento permeado a outros temas. Dessa forma, o momento de planejamento é dividido com outras atividades, não ocupando um papel relevante na agenda dos setores.

Outro dado importante encontrado na etapa de planejamento foi a maior participação da chefia direta em relação à indireta nesse momento de trabalho. Isso pode sugerir autonomia e descentralização de poder, pois os chefiados são os sujeitos mais atuantes na etapa de execução. Entretanto, pode levar a pensar, também, em uma fragmentação do planejamento institucional, pressupondo que a chefia indireta estaria envolvida com ações de outros níveis de complexidade. Essa realidade contraria os princípios do planejamento comunicante11-13 que valoriza a diversidade dos atores participantes no ato de planejar. Assim, seria importante que lideranças de diferentes níveis se fizessem presentes e ativas no processo de planejamento14.

Quanto à etapa de execução, os dados demonstram que, na maioria das vezes, cada membro da equipe assume o desempenho de determinada atividade, embora, também na maior parte dos casos, todos se responsabilizem pelas atividades do setor de maneira geral. Isso sugere o estabelecimento de relações comunicativas eficientes dentro dos setores durante a execução dos projetos, corroborando o desempenho integrado das ações. Uma vez que o processo de execução é o momento em que as ações planejadas são colocadas em prática, é natural que nele se mostre mais evidente a utilização da comunicação como ferramenta de trabalho.

Nestas circunstâncias a etapa de execução vivenciada pelos entrevistados apresenta características da gestão participativa ou de co-gestão, evidenciando características tais como: autonomia, corresponsabilização e participação coletiva nos processos decisórios15.

Na análise referente ao momento de avaliação, notou-se uma relação entre a baixa periodicidade de reuniões com pauta pré-determinada e a ocorrência de avaliação de forma assistemática. Assim como a etapa de planejamento, a de avaliação não é realizada de forma programada, com espaço/tempo destinado exclusivamente para isso. Nesse caso, em especial, a maioria dos entrevistados relatou que a avaliação é feita de maneira informal, sem registro sistemático (em atas de reuniões, por exemplo). Neste contexto, pode-se entender que a avaliação não é vista como uma ferramenta importante no processo de trabalho ou como mecanismo orientador para a criação de uma nova estratégia de intervenção, conforme descrito pela literatura16,17. O princípio da responsabilidade5 estabelece que dentro de uma instituição todos os atores estão sujeitos a pedir e prestar contas sobre os compromissos planificados. A ligação entre esses dois momentos, planejamento e avaliação, formam um ciclo5, no qual todas as ações propostas e executadas pela instituição são interligadas. Deve-se considerar que a não valorização da avaliação quebra esse ciclo, o que poderia diminuir a efetividade da gestão.

Vale lembrar que para a análise da gestão participativa deve-se pensar no grau de democratização do ambiente interno das instituições18.

Assim, no presente estudo, na discussão das relações entre equipes e entre chefias cabe problematizar a própria gestão do processo de trabalho e a configuração da gestão adotada pelos setores da instituição.

O baixo grau de concordância obtido em relação às respostas dadas pelos entrevistados pode refletir o perfil comunicativo da instituição. Há discordância entre respostas de entrevistados pertencentes a um mesmo setor, bem como entre os diversos setores pesquisados. Entende-se, então, que as etapas de gestão que deveriam ser seguidas para a realização do processo de trabalho não são padronizadas pela instituição ou sequer são respeitadas pelos setores.

A literatura mostra que a organização do trabalho, quando delimita as qualificações e as relações entre sujeitos envolvidos no processo, produz um modelo sobre o que os sujeitos apreendem e pensam sobre si mesmos19.

É possível relacionar as respostas referentes à percepção e auto-percepção dos sujeitos sobre o processo comunicativo com os dados relativos ao processo de gestão. A percepção dos entrevistados em relação à comunicação estabelecida com as diversas esferas de poder dentro da instituição e também com órgãos externos foi, em sua maioria, considerada satisfatória. A questão auto-avaliativa foi a que obteve maior índice de satisfação. Esses resultados apontam que os entrevistados não estabelecem uma relação direta entre a comunicação e o processo de trabalho, tendo em vista a contradição entre a percepção positiva das relações comunicativas e o baixo índice de concordância entre as respostas das outras questões, além da prevalência de respostas desfavoráveis ao que se espera do funcionamento de uma gestão comunicante20. Pode-se dizer, então, que os entrevistados não vêem a gestão e a comunicação como duas ações entremeadas. Dessa forma, eles não identificam, em loco, o problema ou nem mesmo têm a consciência de sua existência.

Ao analisar os resultados obtidos com a realização do presente estudo, nota-se aproximação dos mesmos com dados encontrados na literatura. Diversos autores destacam a importância da comunicação como ferramenta de suporte para o processo de gestão5,10,11. O presente estudo mostra que a gestão do SUS, da forma como ocorre na instituição pesquisada, ainda não está adaptada ao modelo de gestão comunicativa5.

A literatura destaca ainda que a comunicação pode ser compreendida como um processo que sofre interferência do contexto no qual os interlocutores estão inseridos e é influenciada pela sua concepção de gestão15.

A pesquisa contou com uma amostra pequena em relação ao número total de funcionários da instituição, dado que a amostragem aqui utilizada contou apenas com a inclusão de seis setores dos quatorze da instituição em questão. Uma análise com número maior de indivíduos, abrangendo todos os setores da organização, permitirá de forma mais precisa a compreensão do tema pesquisado e maior robustez na análise descritiva e estatística dos dados.

CONCLUSÃO

Os dados obtidos no estudo se mostraram relevantes dentro do campo da Saúde Coletiva. Por meio dos resultados, foi possível identificar as estratégias de gestão adotadas pela instituição pesquisada e o papel da comunicação nesse sistema gestor.

A análise das respostas dos entrevistados mostrou que não é estabelecida por eles uma relação direta entre o processo de gestão e a percepção e autopercepção da comunicação. Isso pode sugerir a necessidade de utilização na instituição estudada de dispositivos de gestão que privilegiem o caráter dialógico e intersubjetivo, o que contribuirá para uma gestão mais participativa.

Recebido em: 18/01/2012

Aceito em: 17/05/2012

Fonte de Auxílio: Bolsa de Iniciação Científica – PROBIC da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG)

Conflito de interesses: inexistente

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  • Endereço para correspondência:

    Marcela Cristina Ferreira
    Rua Itacolomito, 115 – Santa Tereza
    Belo Horizonte – MG – CEP: 31015-100
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      18 Jan 2012
    • Aceito
      17 Maio 2012
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