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Interferência binaural no processo de seleção e adaptação de próteses auditivas: revisão sistemática

Resumos

O tema deste estudo é a interferência binaural e tem como objetivo descrever, por meio de revisão teórica, o fenômeno caracterizado por interferência binaural. Será realizada revisão sistemática por meio de pesquisa nas bases de dados LILACS, MEDLINE, PUBMED e SCIELO. O fenômeno interferência binaural é uma realidade relatada na literatura, que precisa ser investigado. Pode se confirmar por testes específicos de processamento auditivo, o mais descrito foi o dicótico de dígitos.

Perda Auditiva; Auxiliares de Audição; Percepção Auditiva


The background of this study is the binaural interference and the purpose is to describe, by a systematic review of the literature, the phenomenon known as binaural interference. A systematic review of the literature was carried out in electronic databases LILACS, MEDLINE, PUBMED and SCIELO. The binaural interference is a phenomenon reported in the literature which needs to be investigated. This phenomenon can be confirmed by specifics auditory processing tests, the most reported in the literature was the dichotic digit test.

Hearing Loss; Hearing Aids; Auditory Perception


ARTIGOS DE REVISÃO

Interferência binaural no processo de seleção e adaptação de próteses auditivas: revisão sistemática

Milena Manoel AzevedoI; Ana Valéria de Almeida VaucherII; Mariana Teixeira DuarteIII; Eliara Pinto Vieira BiaggioIV; Maristela Julio CostaV

IUniversidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria, RS, Brasil

IIUniversidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria, RS, Brasil

IIIUniversidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria, RS, Brasil

IVUniversidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria, RS, Brasil

VUniversidade Federal de Santa Maria - UFSM, Santa Maria, RS, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Milena Manoel de Azevedo Rua Tamanday, 533, apto 403 Santa Maria - RS. CEP: 97040-540 E-mail: milenamazevedo@gmail.com

RESUMO

O tema deste estudo é a interferência binaural e tem como objetivo descrever, por meio de revisão teórica, o fenômeno caracterizado por interferência binaural. Será realizada revisão sistemática por meio de pesquisa nas bases de dados LILACS, MEDLINE, PUBMED e SCIELO. O fenômeno interferência binaural é uma realidade relatada na literatura, que precisa ser investigado. Pode se confirmar por testes específicos de processamento auditivo, o mais descrito foi o dicótico de dígitos.

Descritores: Perda Auditiva; Auxiliares de Audição; Percepção Auditiva

INTRODUÇÃO

A audição é um dos sentidos primordiais por permitir ao ser humano estabelecer a relação com o que o cerca. Tanto uma criança em processo de desenvolvimento, quanto um adulto que estabelece relacionamentos necessitam desta capacidade para se comunicar. Porém, em alguns casos, ocorre um declínio dessa função por diversas causas.

Quando a perda auditiva é detectada e diagnosticada, surge a necessidade de um recurso para minimizar este prejuízo. Os auxiliares de audição são uma proposta para diminuir esta deficiência1.

O processo natural da audição é binaural, sendo assim, a protetização binaural é mais indicada por possibilitar diversos benefícios. Deste modo, o paciente passaria a usufruir de todas as vantagens das diferenças interaurais, tempo e espectro do estímulo sonoro, o que proporciona pistas para aproximá-lo das experiências auditivas normais1.

O avanço da tecnologia e os recursos empregados nos aparelhos auditivos têm auxiliado profissionais da área a realizarem ajustes, possibilitando a diminuição das queixas de dificuldades de compreensão da fala e restabelecendo a audição mais próxima da normalidade. Contudo, mesmo com todos os recursos à disposição, muitos pacientes, usuários de próteses auditivas, com regulagem adequada para sua perda auditiva e acompanhamento contínuo, demonstram queixas incompatíveis com os achados audiológicos.

Estas queixas podem estar relacionadas a um fenômeno chamado interferência binaural, na qual o paciente refere melhor desempenho e conforto utilizando apenas uma prótese auditiva. Nestes casos, o desempenho comunicativo com o uso de duas próteses é pior do que com uma, pois um ouvido acaba interferindo negativamente no outro e, dessa forma, prejudicando o desempenho do indivíduo como um todo2,3.

Como este fenômeno começou a ser descrito recentemente e apenas de forma consistente, na literatura internacional, tem-se a necessidade de um maior aprofundamento do tema para entender os fatores a ele relacionados. Dessa forma, o objetivo deste estudo foi descrever o fenômeno de interferência binaural, realizando uma revisão sistemática sobre o tema.

MÉTODOS

No presente estudo, foi realizada uma revisão sistemática para levantamento de dados e estudo sobre o fenômeno interferência binaural.

O levantamento bibliográfico foi conduzido em bases de dados eletrônicas, revistas online da área de audiologia, anais de congressos nacionais e bibliografias complementares como livros da área de conhecimento.

Inicialmente, foi realizado um levantamento bibliográfico nas bases de dados LILACS, MEDLINE, PUBMED e SCIELO. Para o levantamento dos descritores, utilizou-se o vocabulário estruturado e trilíngue - Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), criado pela Bireme.

A Figura 1 apresenta as estratégias de busca utilizadas para o levantamento bibliográfico.


Ao realizar os levantamentos bibliográficos nos últimos cinco anos, foram encontrados os seguintes resultados, conforme a Figura 2.


Foi realizada uma análise crítica de cada artigo, baseada no conteúdo do título e resumo, foram excluídos os temas que não tinham relação ao foco do estudo, como por exemplo, perdas auditivas assimétricas, adaptações unilaterais, implantes cocleares, zumbido e alterações neurológicas. Ao final deste levantamento, foram selecionados 28 estudos, que tivessem relação com o tema e objetivo do estudo, interferência binaural e adaptação monoaural e binaural, porém foram excluídos os artigos repetidos, totalizando 21 artigos relevantes para o estudo.

Ao término do levantamento dos estudos, observou-se que faltaram artigos de fundamental importância para o tema em questão e que não seriam localizados utilizando os descritores em Ciências da Saúde. Desta forma, foi realizado um segundo levantamento bibliográfico nas bases de dados LILACS, MEDLINE, PUBMED e SCIELO, utilizando-se como palavras principais "binaural and interference" e como palavras complementares, "bilateral and hearing and aids".

Ao pesquisar as primeiras palavras foram analisados todos os resultados, e foram obtidas 55 publicações. A segunda pesquisa por se tratar de palavras mais amplas, foi investigada nos últimos cinco anos, e encontradas 790 publicações. Sendo incluídas somente 25 publicações, no total, relacionadas com o tema em questão. Foram excluídos os artigos duplicados encontrados anteriormente, totalizando assim 10 estudos relevantes para revisão sistemática.

Além destes, também foram utilizadas como bibliografias complementares, livros da área de conhecimento e alguns artigos de periódicos relacionados com o tema estudado, publicados fora do período descrito.

Os artigos selecionados foram descritos por meio de encadeamento de ideias.

REVISÃO DE LITERATURA

A audição natural ocorre de forma binaural, na qual o sujeito escuta naturalmente pelas duas orelhas, este processo auxilia o indivíduo a melhor localizar a fonte sonora e compreender melhor a fala no ruído. Isto ocorre pela somação binaural, habilidade do processamento auditivo central de integrar as informações quando estas são captadas por ambas as orelhas. Com sensibilidade igual nas duas orelhas, o limiar auditivo binaural é melhor 3 dB do que o monoaural1.

A audição representa para o ser humano o meio mais importante de percepção de informações e permite que ele se relacione com o que o cerca. A perda auditiva está entre as doenças mais incapacitantes, fazendo com que o indivíduo seja privado da comunicação, causando impacto na qualidade de vida, podendo gerar isolamento e depressão4.

Para minimizar as consequências da perda auditiva na vida do paciente, sabe-se que a reabilitação do indivíduo é possível com o uso de auxiliares de audição5. A adaptação de próteses auditivas pode resultar na melhora da qualidade de vida do indivíduo, assim como a saúde mental, a vitalidade e a vida social4.

A amplificação bilateral deve ser indicada para todos os pacientes com perda auditiva simétrica, pois estes apresentam vantagens binaurais, entre elas, melhor localização da fonte sonora, eliminação do efeito sombra, habilidade de separar os sons dos ruídos ambientais, melhor reconhecimento de fala na presença de ruído além da somação binaural, pois o som apresentado em ambas as orelhas é percebido com mais intensidade do que na audição monoaural1-6. Portanto, a menos que exista uma contraindicação, o uso de duas próteses auditivas é sempre a melhor alternativa.

Para os profissionais da área, a indicação do uso binaural é uma segurança, pois além de todas as vantagens relatadas, evita a privação auditiva, descrita como uma redução nos índices de reconhecimento de fala, decorrente da perda auditiva sem o uso de amplificação, e consequente privação sensorial. A deterioração gradativa ao longo do tempo no desempenho auditivo está associada à redução da informação acústica disponível, que ocorre independente do envelhecimento auditivo1,7,8.

Porém, mesmo após as orientações profissionais, muitos pacientes optam por usar somente um aparelho auditivo, ou por questões estéticas, ou financeiras, ou mesmo por questões de manejo com os moldes e aparelhos1,9. Estudo atual mostra que 25% da população usuária de próteses auditivas bilateralmente prefere usar somente um aparelho2,8,10.

Pacientes relatam que com o uso dos auxiliares de audição, a dificuldade não está em ouvir e sim em entender, principalmente em ambientes ruidosos 11, sendo de responsabilidade do profissional, orientar e usar estratégias para minimizar os problemas na comunicação e controlar a expectativa do paciente, gerando uma relação verdadeira e de confiança12.

Estudos tem relacionado pacientes protetizados de forma adequada e com queixas incompatíveis aos achados audiológicos, com alterações de processamento auditivo central, que se refere a dificuldade no processo perceptual da informação no sistema nervoso central, resultado do desempenho inadequado de uma ou mais habilidades auditivas, ou até mesmo a ocorrência da interferência binaural13.

O processamento auditivo diz respeito não simplesmente a ouvir e sim a entender o que se está escutando. É necessário integridade do sistema auditivo e do sistema nervoso central, para processar a informação, analisar as características dos estímulos auditivos e interpretá-los14,15.

Na década de 90, Jerger descreveu o fenômeno chamado interferência binaural, condição na qual o desempenho com dois aparelhos auditivos é mais prejudicado do que o desempenho com um. Tal fenômeno foi identificado a partir de relatos de caso, nos quais os pacientes demonstraram melhor desempenho em situações comunicativas na condição de amplificação monoaural. Para o autor, este fenômeno está relacionado a uma alteração no processamento auditivo, resultando em uma piora na capacidade de compreensão de fala, podendo acometer de 8 a 10% da população16.

Para verificar a ocorrência da interferência binaural, profissionais da área têm utilizado, num primeiro momento, o teste de reconhecimento de fala. Aplica-se o Índice Percentual de Reconhecimento de Fala (IPRF), medida supraliminar, que determina a habilidade do ouvinte em compreender a fala em condições ideais de escuta, 17 verificando o comportamento auditivo dos sujeitos em situações de comunicação 18 primeiramente em uma orelha, após na outra orelha e depois em ambas19.

A avaliação audiológica básica, composta por audiometria tonal liminar, logoaudiometria e imitanciometria, não nos possibilita identificar, mesmo em casos de perda auditiva simétrica, se o paciente terá benefícios com adaptação mono ou binaural.

Considerando que a interferência binaural foi descrita como uma alteração de processamento auditivo, se faz necessário uma avaliação específica para auxiliar no diagnóstico audiológico. Assim, para avaliar uma das habilidades do processamento auditivo central relacionada à interferência binaural, a literatura tem descrito o teste dicótico de dígitos8,9,20,21-23.

Este teste avalia a integração binaural, com o objetivo de verificar a habilidade de agrupar componentes do sinal acústico em figura-fundo e identificá-los, e a separação binaural, que possibilita avaliar a escuta direcionada para cada orelha separadamente20,24. Aplica-se na situação de atenção livre, na qual o indivíduo tem que repetir quatro estímulos e depois, na situação de atenção direcionada, na qual as habilidades auditivas envolvidas são de integração e separação binaural24.

Para os autores10, são necessários mais estudos específicos para identificar o desempenho de reconhecimento de fala em tarefas dicóticas, que indicam alteração de processamento binaural, podendo estar diretamente ligado a rejeição da adaptação binaural.

Uma estratégia para melhorar os resultados e benefícios com a amplificação, pode ser a necessidade de identificar alteração de processamento auditivo antes da adaptação. Deste modo, uma vez que muitos casos de insucesso podem estar relacionados à presença da interferência binaural, sua identificação pode ser determinante para o sucesso no processo de seleção e adaptação de próteses auditivas.

Em um estudo de caso, um paciente com queixa de dificuldade de comunicação, principalmente em ambientes ruidosos, foi avaliado com o teste dicótico de dígitos. Ao final da avaliação, foi verificada alteração na integração binaural, uma vez que o desempenho na atenção à direita foi de 65%, na atenção à esquerda foi de 69% e na integração, quando o estímulo foi apresentado de forma binaural, foi de 8%. Neste caso, seria indicado adaptação monoaural, pois quando as duas orelhas tiveram que trabalhar em conjunto, o desempenho não foi satisfatório25.

Em pesquisa realizada com 100 pacientes, utilizando o teste dicótico de dígitos, aqueles que tiveram resultados apresentando três desvios padrão abaixo da média, demostraram interesse por adaptação unilateral26. Isto pode se justificar, pois à medida que aumenta a perda auditiva, aumenta o grau de alteração do processamento auditivo21.

Em outro estudo com 28 idosos, portadores de perda auditiva neurossensorial e simétrica, foi aplicado o teste de reconhecimento de fala no ruído. A avaliação foi realizada em três momentos: com prótese auditiva na orelha direita, com prótese na orelha esquerda e em ambas as orelhas. O autor concluiu que nem sempre a adaptação binaural é uma vantagem para o idoso, principalmente em situaçoes de ruído. Dessa forma, ressalta a necessidade de avaliar cada caso de forma individual27.

O uso de testes com fala no silêncio e no ruído, juntamente com a aplicação de questionários, também são descritos como sugestão para avaliação antes da reabilitação auditiva, verificando reconhecimento de fala e possíveis queixas que possam nortear uma melhor conduta frente à escolha ou não da adaptação binaural8,16,23,28.

Por meio de testes subjetivos e questionários, foi pesquisada a aceitação de um ou dois aparelhos auditivos em 214 pacientes, avaliados no período de experiência; 93% dos indivíduos preferiram adaptação binaural, enquanto 7%, unilateral. Os que referiram melhora com o uso de dois aparelhos, demonstraram muitos benefícios, exceto em relação aos sons fortes6,29.

Em outro estudo, foram avaliados 94 sujeitos com perda auditiva neurossensorial simétrica, de graus leve a moderado. Destes, 46% preferiram utilizar somente uma prótese, e os que optaram por adaptação em ambas as orelhas, foram os que apresentaram melhor desempenho em situação de vida diária22.

Pesquisadores realizaram um estudo aplicando logoaudiometria em pacientes com adaptação monoaural e binaural, após a aclimatização. Os resultados mostraram que houve diferença de desempenho entre o grupo de usuário monoaural, evidenciando que a orelha protetizada apresenta melhor desempenho, mas a não protetizada, possível privação auditiva. Os autores sugerem que privação auditiva e aclimatização são aspectos relevantes para futuras pesquisas30.

Entre 20 usuários de próteses auditivas binaurais, após avaliação do reconhecimento de fala no ruído, 80% deles apresentou melhor desempenho para reconhecimento de fala com adaptação binaural e apenas 20%, com monoaural28.

A falta de benefício com a amplificação binaural entre os idosos têm sido associada com o déficit de processamento auditivo. Grande parte dos pacientes, que comparecem para atendimento de seleção e adaptação de próteses auditivas com perda auditiva simétrica, são adaptados com dois aparelhos, porém, as pesquisas tem mostrado que em caso de idosos, o desempenho é pelo menos tão bom, se não melhor, com adaptação unilateral3,23,26,31.

No processo de envelhecimento, ocorre uma diferença de desempenho entre as orelhas, mostrando uma melhora no desempenho da orelha direita, o que justifica em alguns casos, a preferência do paciente em fazer uso de auxiliar de audição somente em uma orelha23,31.

Pesquisa realizada para avaliar reconhecimento de fala no ruído entre adultos e idosos sem perda auditiva, os idosos exigiram mais recursos cognitivos e de processamento auditivo para entender a fala no ruído32. A preferência e o benefício relatado com um ou dois auxiliares de audição não estão relacionados ao nível de tecnologia dos aparelhos auditivos6-22. Nem mesmo a idade é fator limitante para obter benefícios com tecnologia digital33. Contudo, o benefício pode estar associado com uso regular das próteses34. Independente da tecnologia utilizada, as regulagens dos algoritmos e a prescrição do aparelho devem estar bem adequadas para cada paciente 35.

Dessa forma, é recomendado que pacientes com adaptação binaural, apresentando queixas em situações de ruído competitivo, façam uso de somente um dos aparelhos (nessas situações específicas), utilizando preferencialmente a prótese do lado direito23.

O grande desafio para os profissionais que trabalham com próteses auditivas são os pacientes que parecem ser candidatos ao uso de dois aparelhos, mas preferem usar apenas um. No entanto, aqueles que apresentam melhores resultados, produto da somação e fusão binaural, são propensos a escolher dois aparelhos22.

Com bases nesses achados, a adaptação em ambas as orelhas passa a ser repensada, de forma que não seja generalizada para todos os portadores de perdas auditivas bilaterais22. Estudos tem mostrado provável alteração de processamento auditivo central nos idosos, o que pode resultar na presença da interferência binaural, afetando processos relacionados com a organização perceptual da informação auditiva16,36. A alteração destes processos pode ser considerada uma contra indicação para este tipo de adaptação9.

O treinamento auditivo pode ser um recurso para melhorar o desempenho das habilidades do processamento auditivo e diminuir o grau de dificuldade apresentado pelos pacientes37,38. Nos casos de adaptação unilateral, em que ocorre privação auditiva na orelha não profetizada, é indicado o treinamento auditivo para após, realizar a adaptação da prótese auditiva39.

COMENTÁRIOS FINAIS

Frente a este fenômeno, que tem se tornando cada vez mais frequente e que pode ser a causa do insucesso na adaptação de próteses auditivas, cabe ao profissional investigá-lo, a fim de esclarecer/ confirmar a sua presença, uma vez que isto vai auxiliá-lo na melhor conduta em particular.

Em casos de perda auditiva simétrica, com queixas de dificuldades acentuadas de reconhecimento de fala, a adaptação binaural deve ser vista com cautela. Testes específicos de avaliação devem ser utilizados, entre eles sugere-se o de monossílabos, que apesar de ter sido encontrado somente uma referência na literatura, parece estar sendo utilizado na prática clínica e com maior número de citações, o teste de processamento auditivo, dicótico de dígitos. Estes são os dois testes encontrados para verificar a ocorrência do fenômeno interferência binaural.

Assim sendo, parece consenso entre os autores analisados que nas situações nas quais for detectada a presença deste fenômeno, a protetização em apenas uma orelha pode ser uma opção associada a estratégias de treinamento auditivo para melhorar o desempenho com a prótese auditiva e minimizar as queixas do paciente.

Salienta-se que a estratégia de treinamento auditivo melhora o desempenho da orelha protetizada e estimula a orelha não protetizada, evitando a privação auditiva. Em casos em que a privação auditiva já foi detectada, a reabilitação é possível por meio deste treinamento auditivo, com o objetivo de adaptar ambas as orelhas quando possível.

Todo relato do paciente deverá ser levado em consideração, lembrando que cada paciente terá queixas específicas, portanto deverá ser avaliado de forma individual.

CONCLUSÃO

O fenômeno interferência binaural é um fato que vem se confirmando na prática clínica, porém, ainda pouco relatado tanto na literatura nacional quanto internacional, mostrando a necessidade de mais investigação sobre o tema. A forma de avaliação mais descrita na literatura para avaliar este fenômeno é o teste de processamento auditivo dicótico de dígitos.

Mesmo com inúmeros estudos sobre o questionamento de adaptação monoaural versus binaural, permanece a necessidade de estudos para esclarecer este fenômeno e desenvolver um protocolo de avaliação cuidadosa das capacidades auditivas de cada paciente.

Enfatiza-se a importância do uso de testes de processamento auditivo antes de iniciar o processo de seleção de próteses auditivas, principalmente nos casos em que a avaliação audiológica básica ou as queixas do paciente indiquem qualquer alteração que seja questionável a adaptação binaural.

Recebido em: 04/07/2012

Aceito em: 20/11/2012

Conflito de interesses: inexistente

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013
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