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Falhas técnicas dos aparelhos de amplificação sonora individual dispensados pelo Sistema Único de Saúde

Resumos

Objetivo

: investigar quais as principais falhas técnicas dos aparelhos de amplificação sonora individual fornecidos nos serviços do Sistema Único de Saúde.

Métodos

: foram analisadas as falhas técnicas dos aparelhos de amplificação sonora individual em cinco serviços credenciados pelo Ministério da Saúde, entre janeiro e maio de 2009, utilizando-se estatística descritiva.

Resultados

: as principais falhas técnicas encontradas nos dispositivos foram 37.44% de falha no amplificador, seguidas de 25.59% de falha no microfone. Os aparelhos de amplificação sonora individual retroauriculares e de categoria tecnológica A são os que apresentam maior ocorrência de falha técnica. O tempo de vida útil dos aparelhos de amplificação sonora individual sem apresentar defeito foi de 22 meses, em média. Na maior parte da população estudada, o custo para o conserto destes dispositivos foi entre R$500,00 e R$ 1000,00. Dos casos analisados, 51.82% entraram em contato com o serviço de saúde auditiva para buscar atendimento e verificar o problema e em 61% dos casos os aparelhos de amplificação sonora individual ainda estavam no prazo de garantia e foram consertados pela assistência técnica sem custo adicional para o paciente.

Conclusão

: a principal falha encontrada refere-se à falha do amplificador. Os AASI retroauricular e de categoria tecnológica A são os que apresentam maior ocorrência de falha técnica.

Perda Auditiva; Auxiliares de Audição; Reabilitação de Deficientes Auditivos; Sistema Único de Saúde


Purpose

: to investigate about repair issues of hearing aids at National Health System.

Methods

: it was analyzed hearing aids technical failures whose patients had showed complaints concerning the device on five different services considering the period from January to May 2009, analyzed by descriptive statistic.

Results

: the main technical failures found were: 37.44% of failures on amplifier, 25.59% of failures on microphone. Related to the device’s technological sort and category it’s verified that the behind the ear hearing aids and of category A presented higher technical failure incidence. It’s also observable that the devices presented utility life of 22 months on average before presenting any technical failure. In the majority of the population studied, the cost for the repair of these devices was between R $ 500,00 and $ 1000.00. From the perception of hearing aids failure by the patient, 51.82% contacted the service seeking for care and 61% of analyzed hearing aids were still on guarantee term and they were fixed by technical assistance without additional cost to patient.

Conclusion

: the main technical failure found was failures on amplifier. The behind the ear hearing aids and of category A presented higher technical failure incidence.

Hearing Loss; Hearing Aids; Rehabilitation of Hearing Impaired; Unified Health System


INTRODUÇÃO

Desde o final da década passada, a preocupação em relação aos aspectos auditivos da população mundial vem crescendo em todo mundo, visto o aumento nas estimativas da prevalência da perda auditiva nos últimos anos. Neste sentido, a (re)habilitação da deficiência auditiva neurossensorial por meio do uso do aparelho de amplificação sonora individual (AASI) é altamente bem sucedido, ajudando a diminuir as consequências negativas da deficiência auditiva1. Chisolm TH, Johnson CE, Danhauer JL, Portz LJP, Abrams HB, Lesner S, et al. A systematic review of health-related quality of life and hearing aids: final report of the American Academy of Audiology Task Force on the health-related quality of life benefits of amplification in adults. J Am Acad Audiol. 2007;18(2):151-83.. Estes dispositivos, de alto custo, são fornecidos gratuitamente para a população via serviços de saúde auditiva credenciados pelo Ministério da Saúde.

Apesar de no país ser garantido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) a assistência integral à pessoa com deficiência auditiva, é fato que muitos pacientes atendidos nos serviços de saúde auditiva deixam de usar seus AASI após a adaptação dos mesmos, o que leva ao desperdício de recursos destinados à área. De acordo com estudo desenvolvido a fim de verificar os resultados pós-adaptação de AASI dispensado em serviço de saúde auditiva de Alta Complexidade, 18,52% dos usuários avaliados não estavam fazendo uso do dispositivo na vida diária, sendo que 7,41% não utilizavam o AASI por problemas no funcionamento do mesmo2. Jokura PR, Melo TM, Bevilacqua MC. Evasão dos pacientes nos acompanhamentos nos serviços de saúde auditiva: identificação sobre o motivo e resultados pós-adaptação de aparelho de amplificação sonora individual. Rev CEFAC. No prelo 2012..

Uma das dificuldades encontradas no uso dos AASI pode ser gerada por falhas técnicas dos AASI 3. Mesquita JG. Problemas técnicos dos aparelhos de amplificação sonora individual e as queixas dos usuários: implicações na prática fonoauiológica. [Dissertação]. PUC- SP, São Paulo. 1993.

. Sentieiro CS, Harrison KMP, Moura MC, Bedani BG, Petrosino R, Oliveira DS. Levantamento dos aspectos relacionados ao uso e manutenção do aasi e à terapia fonoaudiológica em crianças e jovens com perda auditiva na cidade de São Paulo. Rev. soc. bras. Fonoaudiol. 2009;14(supl):1464.
-5. Ribas A, Martins J, Dumke C. Estudo sobre as falhas técnicas verificadas em próteses auditivas oriundas do programa de saúde auditiva. Seminário de Políticas Públicas em Saúde Auditiva; Maio 21-22; Bauru, Brasil. São José dos Campos: Pulso Editoria, 2010.. Profissionais e o paciente devem estar atentos aos problemas apresentados pelo AASI, pois qualquer problema que interfira no uso adequado traz prejuízos aos seus usuários.

De acordo com as normativas estabelecidas pelo Ministério da Saúde para seleção e adaptação dos AASI, os dispositivos ofertados pelos serviços de saúde auditiva credenciados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) devem ser cadastrados e registrados junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o que garante, em parte, que dispositivos de qualidade sejam adquiridos pelos serviços de saúde auditiva.

Quanto à indicação de reposição do AASI, são definidas determinadas situações, tais como: perda auditiva progressiva comprovada, em que não há possibilidade de regulagem do AASI anteriormente adaptado; perda ou roubo devidamente comprovado e falha técnica do funcionamento dos componentes internos e/ou externos do AASI, findo o prazo de garantia do dispositivo 6. Brasil. Portaria nº 587, de 7 de outubro de 2004. Determina que as Secretárias de Estado da Saúde dos Estados adotem as providências necessárias à organização e implantação das redes estaduais de atenção à saúde auditiva. Diário Oficial da União. 11 out 2004; Seção 1: 105..

Dessa maneira, quando o problema técnico do AASI é detectado pelo fonoaudiólogo, este deve encaminhar o dispositivo ao serviço técnico para conserto ou o próprio paciente entra em contato com a empresa que irá providenciar os reparos necessários. É definido um tempo de um ano ou dois dependendo do serviço, para a garantia pelas empresas e ao final desse período o próprio paciente deve arcar com as despesas do conserto do dispositivo.

O custo da manutenção desses equipamentos pode variar, dependendo da falha do componente, mas muitas vezes os usuários não podem arcar com essas despesas. Diante desse fato, o que acontece é a reposição dos AASI pelo serviço de saúde auditiva (após o final da garantia), o que eleva os gastos com o fornecimento dos AASI pelo SUS. De acordo com as informações disponibilizadas pelo Ministério da Saúde, por meio do Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS), desde a implantação da Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva, em 2004, até o mês de março de 2010 foram gastos R$ 40.989.125,00 reais para reposição de 45.944 AASI em todo território nacional 7. Brasil. Ministério da Saúde. Datasus. 2010. Disponível em: http://w3.datasus.gov.br/datasus/datasus.php.
http://w3.datasus.gov.br/datasus/datasus...
.

Neste sentido, tornam-se necessários estudos exploratórios com objetivo de investigar a respeito da reposição de AASI por motivo de falha técnica dos componentes do dispositivo e a discussão dos achados, visto que poucos estudos versam sobre o tema no país. Diante do exposto, o objetivo do presente estudo foi identificar: 1) Quais as falhas técnicas dos AASI mais frequentes; 2) Qual tipo e categoria tecnológica de AASI apresentam maior número de falhas técnicas; 3) Quanto tempo de uso dos dispositivos sem apresentar falha técnica; 4) O valor do orçamento do conserto dos dispositivos que apresentaram problemas de funcionamento; 5) Quais as condutas tomadas pelo paciente e pelo serviço a partir da constatação da falha do dispositivo.

MÉTODOS

O estudo se caracterizou como transversal retrospectivo, com base em dados primários, levantados mediante a verificação dos prontuários de usuários de AASI, com idade superior a 18 anos de idade, de diferentes graus de perda de audição e que apresentaram queixa de mau funcionamento do dispositivo, entre os meses de janeiro a maio de 2009, perfazendo um total de 317 casos. Cabe salientar que, a partir do relatório encaminhado pela empresa responsável foi possível definir a causa da falha técnica de 211 dispositivos e no presente estudo serão apresentados os dados dos 211 AASI que tiveram a caracterização da causa da falha técnica.

Esta pesquisa contou com a participação de cinco serviços de saúde auditiva, dos estados de São Paulo, Bahia e Mato Grosso do Sul, habilitados pelo Ministério da Saúde para dar assistência à pessoa deficiente auditiva (um de Média Complexidade e quatro de Alta Complexidade).

A coleta de dados foi conduzida nestes cinco serviços de saúde auditiva participantes, por fonoaudiólogos treinados para realização da coleta. Foi utilizada uma ficha padronizada para a coleta de dados em prontuários de pacientes que compareceram ao serviço nos meses de referência com queixa de falha técnica do AASI, conforme pode ser visualizado na Figura 1.

Figura 1
– Ficha padronizada para coleta de dados

O presente estudo faz parte dos projetos multicêntricos “Indicadores e proposta de avaliação da qualidade dos serviços de saúde auditiva do Sistema Único de Saúde” (CNPq, processo nº 409613/2006-1 e FAPESP, processo nº 2006/51881-3) aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (processo nº 092/2008 e 89/2008, respectivamente).

Após a compilação dos dados, os mesmos foram digitados e armazenados no banco de dados previamente construído no programa Excel e as respostas obtidas foram tabuladas e analisadas utilizando-se de estatística descritiva, programa estatístico STATA, versão 9.0.

RESULTADOS

Durante os meses de coleta foram identificados 317 casos de queixas dos pacientes referente à falha técnica do AASI. Foi possível definir a causa da falha técnica de 211 AASI (66.5%) a partir do relatório encaminhado pela empresa responsável. Serão apresentados os dados dos 211 AASI que tiveram a caracterização da causa da falha técnica.

Considerando o tipo e categoria tecnológica do dispositivo é possível verificar nos dados apresentados pelas Tabelas 1 e 2, respectivamente, que os aparelhos auditivos retroauriculares e de categoria tecnológica do tipo A apresentam maior ocorrência de falhas técnicas.

Tabela 1
- Análise descritiva, em porcentagem, dos tipos de AASI que apresentaram com falhas técnicas.

Tabela 2
- Análise descritiva, em porcentagem, da categoria tecnológica dos AASI que apresentaram com falhas técnicas.

Os resultados referentes ao tempo de uso dos dispositivos que apresentaram falha técnica podem ser observados na Tabela 3. Na Tabela 4 estão descritas as queixas dos pacientes quanto ao AASI.

Tabela 3
- Tempo de uso, em meses, dos dispositivos que apresentaram falha técnica.

Tabela 4
- Relação entre as queixas dos pacientes e a falha técnica dos AASI

De acordo com o relatório encaminhado pela empresa responsável pelo conserto do AASI (orçamento), as falhas técnicas mais frequentes observadas pelos serviços de saúde auditiva podem ser visualizadas na Tabela 5.

Tabela 5
- Falhas técnicas mais frequentes observadas pelos serviços de saúde auditiva do estudo

A Figura 2 fornece as informações referentes ao valor do orçamento do conserto dos AASI que apresentaram alguma falha técnica. Nas Figuras 3 e 4 é possível verificar a conduta do paciente e do serviço, respectivamente, a partir da falha técnica apresentada pelo AASI.

Figura 2
– Valor do orçamento do conserto dos dispositivos que apresentaram problemas de funcionamento

Figura 3
– Conduta do paciente a partir da falha técnica apresentada pelo AASI, em porcentagem  (N= 211)

Figura 4
– Conduta do serviço a partir da falha técnica apresentada pelo AASI, em porcentagem (N=211)

DISCUSSÃO

A ocorrência das falhas técnicas dos AASI fornecidos pelos serviços de saúde auditiva habilitados como Média e Alta Complexidade é uma questão que merece destaque, embora pouco discutida em nível nacional. As tendências obtidas, a partir do presente estudo, podem auxiliar os órgãos governamentais responsáveis a iniciarem o debate sobre a necessidade de regulamentação dos serviços de manutenção dos AASI, a partir de bases científicas, visto que se faz necessário redefinir tais normas e buscar um consenso junto aos fabricantes dos dispositivos eletrônicos.

No presente estudo, entre os dispositivos que apresentaram falha técnica a maioria foi dos dispositivos retroauriculares (82.94%) e de categoria A (47.39%) (Tabelas 1 e 2, respectivamente). Porém, este achado pode estar associado ao fato que, a maior porcentagem de adaptação de AASI pelo SUS é de dispositivos de categoria A e modelos retroauriculares. Não é possível afirmar que estes aparelhos são os que apresentam mais problemas em relação aos dispensados pelo SUS devido , a ausência de informações referentes ao número de adaptações de AASI nos serviços analisados no período do presente trabalho. Isto , inviabiliza a verificação do percentual de dispositivos com falha técnica a partir do total de AASI dispensados.

Outro estudo8. Block, M. (2001). Hearing aid repair rates. Retrieved May 23,2007, from www.audiologyonline.com.
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aponta relação entre maior frequência de reparos quando menor a cápsula do AASI, ou seja, na maior parte das vezes o AASI do tipo microcanal é o que apresentou maior frequência de reparo.

Um fator importante na adaptação dos AASI, independente do tipo e tecnologia de AASI adaptado, é a orientação quanto ao manuseio e uso, que deve ser realizada de forma adequada, consistente e constante pelos profissionais dos serviços de saúde auditiva aos pacientes que recebem os AASI, a fim de evitar que quebras ou falhas técnicas dos dispositivos sejam ocasionadas pelo mau uso. Neste sentido, reforça-se a importância do acompanhamento dos pacientes usuários de AASI para verificação do funcionamento destes, permitindo que os pacientes obtenham benefício com a amplificação 9. Bevilacqua MC, Morettin M, Melo TM, Amantini RCB, Martinez MANS. Contribuições para análise da política de saúde auditiva no Brasil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(3):252-9.. Em estudo realizado sobre o uso dos AASI por idosos, encontraram que dos 36 AASI avaliados, 61% estavam com funcionamento inadequado, sendo 59% dos AASI eram do tipo intra-auricular, 32% retroauriculares e 9% intracanais. Os principais problemas estavam relacionados com bateria fraca, qualidade do som e controle de volume quebrado. Para os autores, os profissionais deveriam realizar a inspeção dos AASI para verificar o funcionamento, permitindo a detecção dos problemas 1010 . Thinbodeau LM; Schmitt L. A report on condition of hearing aids in nursing homes and retirements centers. JARA. 1988;21:113-9..

A manipulação e manutenção correta dos AASI pelos usuários é um importante fator para o sucesso do uso dos dispositivos. Na maioria das vezes, os novos usuários de AASI recebem muita informação em um período curto de tempo, sendo especialmente difícil para os idosos, por apresentarem déficits de memória, não retém todas as informações necessárias para o uso adequado desse 1111 . Desjardins JL, Doherty KA. Do Experienced Hearing Aid Users Know. Am J Audiol. 2009;18:69-76. e sua adequada manutenção, fatores cruciais para o bom funcionamento dos mesmos, o que podem tornar estes usuários insatisfeitos com os seus dispositivos. No Brasil, a demanda dos serviços de saúde auditiva é composta em grande parte por idosos. O estudo multicêntrico coordenado pelo Departamento de Fonoaudiologia da Universidade de São Paulo de Bauru (FOB/USP), realizado em sete serviços de saúde auditiva do país, demonstrou que nesses serviços, a população idosa refere-se a 55% da população total atendida nesses serviços 9. Bevilacqua MC, Morettin M, Melo TM, Amantini RCB, Martinez MANS. Contribuições para análise da política de saúde auditiva no Brasil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(3):252-9..

O presente estudo mostrou que as principais falhas técnicas encontradas nos dispositivos (37.44% de falha no amplificador, seguidas de 25.59% de falha no microfone) podem ser ocasionadas principalmente, em função da umidade, da oxidação dos componentes por uso de pilhas de má qualidade e os pequenos traumas – quedas 1212 . Branda E, Chalupper J. A New system to protect hearing aids from cerumen and moisture. Hearing Review. 2007;14(4). Disponível em: http://www.hearingreview.com/issues/articles/2007-04_06.asp. Acesso em 12 de abril de 2010.
http://www.hearingreview.com/issues/arti...
,1313 . Hall CM, Croutch C. A Field study on the effect of relative humidity on hearing aid receivers. Hearing Review. 2010;17(1):32-5., além de falhas referentes à gaveta da pilha (6.64%), a problemas com a cápsula (1.42%) e com o gancho do AASI (0.95%), que indicam dificuldades no manuseio do dispositivo. Outro estudo mostra que os principais motivos de reparo é a substituição ou limpeza dos receptores devido ao acúmulo de cerúmen e a troca ou limpeza do microfone devido à oleosidade da pele ou outras impurezas 1111 . Desjardins JL, Doherty KA. Do Experienced Hearing Aid Users Know. Am J Audiol. 2009;18:69-76..

Problemas na gaveta da pilha e com o gancho do AASI foram falhas técnicas encontradas no presente estudo que podem estar relacionadas com a dificuldade de manuseio dos dispositivos. Pacientes que usam seus AASI sem compreender totalmente como usá-los de maneira correta podem não receber o máximo benefício com seus dispositivos e dessa forma rejeitá-los 1111 . Desjardins JL, Doherty KA. Do Experienced Hearing Aid Users Know. Am J Audiol. 2009;18:69-76.. Tais situações de falhas técnicas podem ser minimizadas com orientações em diferentes momentos do atendimento fonoaudiológico 1414 . Vieira EP, Miranda EC, Calais LL, Carvalho LMA, Iorio MCM, Borges ACLC. Proposta de acompanhamento em grupo para idosos protetizados Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;73(6):752-8.. No Brasil, uma das estratégias que poderia fortalecer o vínculo com o paciente usuário de AASI e permitir avaliações constantes do uso do dispositivo é a presença do fonoaudiólogo nas unidades de saúde da atenção básica 1515 . Alvarenga KF, Bevilacqua MC, Martinez MANS, Melo TM, Blasca WQ, Taga MFL. Proposta para capacitação de agentes comunitários de saúde em saúde auditiva. Pró-Fono Revista de Atualização Científica. 2008;20(3):171-6.,1616 . Melo TM, Alvarenga KF, Blasca WQ, Taga MFL. Capacitação de agentes comunitários de saúde em saúde auditiva: efetividade da videoconferência. Pró-Fono R. Atual. Cient. 2010;22(2):139-44.. Tais profissionais podem ser treinados, a fim de atuarem junto à população que recebeu seus dispositivos, minimizando ou até mesmo prevenindo as falhas técnicas decorrentes da dificuldade de manipulação dos AASI pela população.

No presente estudo 29.67% dos casos analisados deixaram de usar os AASI em função do problema e 0.96% dos pacientes aguardou o atendimento do retorno para comunicar sobre a falha do dispositivo. Isto evidencia também uma dificuldade do paciente atendido pelo SUS em expressar seu direito como cidadão 1717 . Bevilacqua MC, Melo TM, Morettin, Lopes AC. A avaliação de serviços em Audiologia: concepções e perspectivas. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(3):421-6., que não consegue entrar em contato com o serviço de saúde auditiva em busca de solucionar o seu problema. Neste sentido, destaca-se novamente a importância do acompanhamento audiológico dos pacientes, pois neste momento o paciente tem a oportunidade de relatar suas opiniões e queixas quanto ao AASI, para que o profissional possa auxiliá-lo na intervenção auditiva 9. Bevilacqua MC, Morettin M, Melo TM, Amantini RCB, Martinez MANS. Contribuições para análise da política de saúde auditiva no Brasil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(3):252-9.,1818 . Manoel RR, Motti TFG, Andrade ABS. A orientação continuada aos novos usuários de AASI. INES – Arqueiro. 2006;14(2):11-6..

No que se refere à qualidade dos AASI concedidos no SUS, no Brasil, em seis de julho de 2005 foi publicada a Portaria 387, que estabeleceu que as empresas legalmente constituídas que tenham como ramo de atividade a comercialização de AASI devem encaminhar à coordenação-geral da Média e Alta Complexidade solicitação de validação da classificação de seus aparelhos, para posterior análise e aprovação pela Câmara Técnica de Atenção à Saúde Auditiva, com registro já efetivado junto à ANVISA. Nesse mesmo documento ficou estabelecido que a empresa deve fornecer garantia de no mínimo um ano, em caso de problemas técnicos e danos do circuito e partes plásticas.

Com relação ao tempo de uso dos dispositivos antes dos mesmos apresentarem algum defeito, o intervalo de tempo mais frequente no presente estudo (moda) foi de 24 meses pós-adaptação, variando um tempo mínimo de um mês a 84 meses (sete anos) para apresentar algum tipo de falha técnica. A durabilidade dos dispositivos foi maior, do que o tempo coberto pela garantia do AASI, mas um tempo consideravelmente pequeno para apresentar problemas. Este fato levanta questões a serem refletidas, tais como o alto custo da manutenção em alguns casos, impedindo o conserto pelos usuários, levando ao não uso dos dispositivos e a reposição dos dispositivos pelos serviços de saúde, após pouco tempo de adaptação, aumentando os custos do governo no tratamento da população deficiente auditiva.

No caso do problema técnico ser inerente ao próprio dispositivo, dentro de um ano, para a maioria dos serviços de saúde auditiva, a garantia do fabricante cobre o conserto e quando não estão dentro desse período, os custos são, ou deveriam ser cobertos pelo próprio usuário. Na maior parte da população estudada, o custo para o conserto destes dispositivos foi entre R$500,00 e R$ 1000,00. Por apresentar componentes eletrônicos delicados, os custos para reparação dos danos podem ser elevados 1919 . Coulson S. Hearing aid component protection. Hearing Review. 2010;17(4):52., variando de acordo com a falha técnica apresentada pelo dispositivo.

O valor mínimo encontrado nos orçamentos analisados foi de R$ 100,00, o que nos leva a refletir que pode haver casos de não uso dos AASI por falta de condição dos usuários em cobrir tal despesa. Tal fato ocorre, pois a maioria dos pacientes atendidos nos serviços de saúde auditiva do SUS não consegue arcar com um conserto de um valor razoável, em função da característica sócio-econômica dos mesmos – na sua maioria idosa – (que dependem de aposentadoria para seu sustento) e com nível de escolaridade reduzida 2020 . Armigliato ME, Prado DGA, Melo TM, Martinez MANS, Lopes AC, Amantini RCB et al. Avaliação de serviços de saúde auditiva sob a perspectiva do usuário: proposta de instrumento. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(1):32-9..

Ao analisar a conduta do serviço frente à falha técnica verifica-se que em 61% dos casos analisados os AASI ainda estavam no prazo de garantia e foram consertados pela assistência técnica sem custo adicional para o paciente, enquanto que somente 8% dos casos foram consertados pelo próprio usuário. Desta forma, 31% dos casos receberam a indicação da reposição do AASI pelo serviço de saúde auditiva, sendo tal achado também encontrado em estudo anterior 4. Sentieiro CS, Harrison KMP, Moura MC, Bedani BG, Petrosino R, Oliveira DS. Levantamento dos aspectos relacionados ao uso e manutenção do aasi e à terapia fonoaudiológica em crianças e jovens com perda auditiva na cidade de São Paulo. Rev. soc. bras. Fonoaudiol. 2009;14(supl):1464., em que 37% dos AASI que apresentaram falhas foram substituídos em um serviço de saúde auditiva do SUS.

Os gastos empregados na reposição dos AASI, mesmo em casos que o conserto do dispositivo não ultrapassaria a R$ 100,00, podem evitar que novos usuários sejam beneficiados com o tratamento 6. Brasil. Portaria nº 587, de 7 de outubro de 2004. Determina que as Secretárias de Estado da Saúde dos Estados adotem as providências necessárias à organização e implantação das redes estaduais de atenção à saúde auditiva. Diário Oficial da União. 11 out 2004; Seção 1: 105.. Discussões entre representantes do governo e das empresas fornecedoras de AASI para o SUS devem ser retomadas buscando rever e estabelecer normas mais específicas para a reposição dos AASI pelo SUS e buscar soluções para os casos em que o conserto é viável economicamente.

Cabe ressaltar que as tendências aqui apresentadas não podem ser generalizadas para todos os serviços de saúde auditiva habilitados pelo Ministério da Saúde, em território nacional, pois as mesmas foram analisadas em um período curto de tempo (janeiro a maio de 2009) e em um número limitado de serviços. Desse modo, a esta análise deve ser realizada por todos os serviços do país, visando gerar informações a respeito das falhas técnicas encontradas mais frequentemente nos AASI e qual a conduta do serviço. Além disso, as informações deste estudo se limitaram ao grupo de pacientes adultos, mas informações referentes ao uso dos AASI pelas crianças devem ser investigadas, visto a importância dos AASI no desenvolvimento dessa população.

CONCLUSÃO

Neste estudo identificou-se que:

1. As principais falhas técnicas encontradas nos dispositivos foram 37.44% de falha no amplificador, seguidas de 25.59% de falha no microfone;

2. Os AASI retroauricular e de categoria tecnológica A são os que apresentam maior ocorrência de falha técnica, contudo, ambos apresentam maior quantitativo de dispensação pelo SUS;

3. Em 50% dos casos analisados, a falha técnica ocorreu até 16 meses pós-adaptação do AASI;

4. Na maior parte da população estudada, o custo para o conserto destes dispositivos foi entre R$500,00 e R$ 1000,00.

5. 50.24% dos casos analisados entraram em contato com o serviço de saúde auditiva para buscar atendimento e verificar o problema com o AASI e em 61% dos casos os AASI ainda estavam no prazo de garantia e foram consertados pela assistência técnica sem custo adicional para o paciente.

Considerando os dados encontrados e as limitações do presente estudo, sugere-se que sejam realizadas pesquisas científicas mais abrangentes com esta temática.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão de apoio financeiro para o desenvolvimento do projeto “Indicadores e Proposta de Avaliação da Qualidade dos Serviços de Saúde Auditiva do Sistema Único de Saúde” (processo nº 409613/2006-1).

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2014

Histórico

  • Recebido
    01 Maio 2012
  • Aceito
    20 Set 2012
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