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Habilidades de manipulação do aparelho de amplificação sonora open fit por deficientes auditivos idosos

Resumos

Objetivo

avaliar as habilidades de manipulação do AASI do tipo open fit em indivíduos deficientes auditivos idosos, por meio do instrumento denominado Practical Hearing Aid Skills Test (PHAST), traduzido como Teste de Habilidades Práticas com Aparelho Auditivo.

Métodos

no estudo, desenvolvido na Divisão de Saúde Auditiva, participaram 18 idosos (idade entre 60 e 87 anos) deficientes auditivos, sendo 7 homens e 11 mulheres, novos usuários AASI tipo de open fit. Para a metodologia, na primeira etapa a pesquisadora realizou a orientação sobre o AASI aos deficientes auditivos e ao seu cuidador e, na segunda, após aproximadamente 1 mês de uso do dispositivo, foi aplicado o instrumento PHAST, o qual contém 8 questões na forma de tarefas práticas referentes ao manipulação do AASI para classificar a desenvoltura do indivíduo.

Resultados

foi constatado que nas tarefas referentes à limpeza do AASI e ao uso ao telefone, os indivíduos revelaram maior dificuldade de executá-las expondo as menores pontuações, em contrapartida às tarefas referentes à remoção do AASI e à abertura do compartimento de bateria, os indivíduos realizaram com maior facilidade. Quanto aos resultados do desempenho dos participantes a classificação final foi: 33,33% excelente, 22,22% boa, 27,78% satisfatório e 16,67% pobre.

Conclusão

55,55% dos idosos deficientes auditivos realizaram adequadamente as tarefas referentes à manipulação do AASI open fit, obtendo classificação final no instrumento PHAST excelente e boa.

Deficiência Auditiva; Idoso; Auxiliares de Audição


Purpose

to evaluate the skills of handling the type of hearing aids in open fit hearing impaired elderly people, using the instrument called Practical Hearing Aid Skills Test (PHAST).

Methods

in the study, developed in Auditory Health Division, including 18 elderly (aged 60 to 87 years) hearing impaired, 7 men and 11 women, new users of open fit hearing aid type. For the methodology, the first step the researcher carried out the guidance on hearing aids for the hearing impaired and the second, after approximately 1 month of use of the device, applied the instrument PHAST, which contains eight questions in the form of practical tasks regarding the handling of hearing aids to classify the resourcefulness of the individual.

Results

we found that the tasks related to cleaning the hearing aid and the use of telephone, the subjects experienced greater difficulty in exposing them to run with lower scores, however the tasks related to the removal of HA and opening the battery compartment, subjects performed with greater ease. As for the overall performance of the participants, the results were 33,33% excellent, 22,22% good, 27,78% satisfactory and 16,67% poor.

Conclusion

55,55% of hearing impaired elderly performed the tasks for properly handling the open fit hearing aids, obtaining the final ranking instrument PHAST excellent or good.

Hearing Loss; Aged; Hearing Aids


INTRODUÇÃO

O aumento do número de indivíduos idosos na população mundial ocasionou um aumento do número de pessoas com deficiência auditiva e paralelamente, observou-se a evolução tecnológica do Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI), a partir das modificações do panorama das indicações dos tipos de AASI para indivíduos com deficiência auditiva. Antes, os dispositivos de amplificação intra-aurais lançavam-se como opção para os profissionais em resposta a não adaptação do usuário ao tipo retroauricular ou para atender a necessidade estética. Hoje, a tendência é a indicação do tipo open fit aplicado a necessidade estética e acústica1. Kochkin S. MarkeTrak VIII: Mini-BTEs tap new market, users more satisfied. Cover Story: The Hearing Journal. 2011;64(3):17-24..

Os AASIs do tipo open fit são dispositivos mini-retroauriculares, discretos, confortáveis e esteticamente atrativos devido ao formato inovador, inseridos no Conduto Auditivo Externo (CAE) por meio de um microtubo e de uma oliva de silicone.

Este tipo de AASI foi projetado para atender ao perfil audiológico com configuração audiométrica descendente, limiares dentro da normalidade nas frequências baixas e rebaixamento desses nas frequências altas. São casos em que a adaptação com o AASI retroauricular ou intra-aural pode ser problemática, pois, em geral, há dificuldade de compreensão de fala em ambientes ruidosos e queixa dos efeitos de autofonia e de oclusão. Esses dispositivos visam à resolução de tais problemas2. Johnson EE. Segmenting dispensers: Factors in selecting open-canal fittings. The Hearing Journal. Special issue: Open-canal fittings. 2006;59(11):58-64..

Dentro desse contexto, o indivíduo idoso é candidato em potencial para a indicação do AASI do tipo open fit, visto que, rotineiramente, apresenta deficiência auditiva com configuração audiométrica descendente e por meio desse dispositivo é possível contemplar o perfil audiométrico e, consequentemente eliminar ou minimizar os entraves acústicos.

Sob outro prisma, a experiência clínica revela que nos idosos há dificuldade de manipulação do AASI independente do tipo selecionado, inclusive, ocasionando o não uso e/ou desmotivação. Tal fato também é baseado em evidências cientificas, pois vários pesquisadores ao estudar os motivos para a rejeição ao uso da amplificação citam como um fator a dificuldade de manipulação do dispositivo3. Franks JR, Beckman NJ. Rejection of hearing aids: attitudes of a geriatric sample. Ear Hear. 1985;6(3):161-6.

. Russo ICP, Almeida K, Freire KGM. A reabilitação auditiva do idoso. In: Almeida K, Iorio MCM. Próteses Auditivas - Fundamentos Teóricos e Aplicações Clínicas. 2 ed. São Paulo: Lovise, 2003, p. 423-7.
-5. Freitas CD, Costa MJ. Processo de adaptação de próteses auditivas em usuários atendidos em uma instituição pública federal - parte I: resultados e implicações com o uso da amplificação. Rev Bras Otorrinolaringol. 2007;73(6):744-51..

Considerando as inúmeras dificuldades sensoriais previstas no indivíduo idoso pela degeneração sensorial global é importante que o perfil audiométrico não seja o único critério de elegibilidade para a indicação do AASI tipo open fit, cabendo ao profissional verificar as questões relacionadas às habilidades sensoriais, com a finalidade de que o usuário receba o máximo benefício com o dispositivo e evite reações de rejeição e/ou desmotivação.

Até o momento na literatura consultada, nenhum estudo se preocupou em avaliar os aspectos relacionados à habilidade de manipulação do AASI open fit. O presente estudo teve como objetivo avaliar as habilidades de manipulação do aparelho de amplificação sonora individual do tipo open fit de indivíduos deficientes auditivos idosos, por meio do instrumento denominado Practical Hearing Aid Skills Test (PHAST)6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76., traduzido como Teste de Habilidades Práticas com Aparelho Auditivo.

MÉTODOS

O estudo de caráter prospectivo, não randomizado e quali-quantitativo foi aprovado pelo CEP sob número 369/2011 e desenvolvido no período de outubro de 2011 a janeiro de 2012 na Divisão de Saúde Auditiva (DSA), unidade do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC) da Universidade de São Paulo (USP), campus de Bauru/SP.

Para compor a amostra foram selecionados idosos deficientes auditivos, os quais atendiam aos seguintes critérios: deficiência auditiva do tipo neurossensorial bilateral ou unilateral, com configuração descendente com limiares tonais até 30 dB NA (decibel nível de audição) nas frequências de 250 Hz (Hertz), 500 Hz e 1000 Hz e até 70 dB NA nas demais frequências, grau da deficiência auditiva leve a moderado, indicação uni ou biaural de AASI com tecnologia digital do tipo open fit de vários modelos, sem experiência prévia com AASI, ambos os gêneros, idade igual ou superior a 60 anos para serem considerados idosos segundo princípios da World Health Organization –WHO- (2007)7. WHO – World Health Organization. Grades of Hearing impairment, 2007 [acesso em 19 de novembro de 2011]. Disponível em: http://www.who.int/pbd/desfness/hearing_impairment_grades/en/index.html.
http://www.who.int/pbd/desfness/hearing_...
e sem alterações significantes de saúde geral, como acidente vascular cerebral, diabetes mellitus, transtornos mentais do tipo esquecimento ou confusões. A ausência de tais problemas de saúde foram verificadas por meio de consulta aos prontuários dos pacientes.

Primeiro, no momento da adaptação os participantes foram orientados sobre os aspectos que envolvem o AASI do tipo open fit, por meio de um roteiro previamente elaborado pela autora, durante aproximadamente 20 minutos. O vocabulário utilizado propõe a fácil assimilação, sem o emprego de terminologia técnica, apoiando-se no manual do AASI disponibilizado pela empresa, a fim de facilitar a compreensão e a retenção das orientações.

Um mês depois de uso do AASI, no momento do acompanhamento fonoaudiológico, foi aplicado o instrumento Practical Hearing Aid Skills Test (PHAST)6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76., traduzido como Teste de Habilidades Práticas com Aparelho Auditivo (Figura 1). A tradução do instrumento ocorreu da seguinte maneira, primeiramente, duas fonoaudiólogas falantes nativas do Português Brasileiro e fluentes em Inglês realizaram duas traduções e adaptações culturais do instrumento PHAST para o Português Brasileiro, em seguida uma versão unificada do instrumento em Português Brasileiro foi realizada pelas duas fonoaudiólogas após a comparação das duas traduções.

Figura 1
Apresentação do instrumento PHAST

Este instrumento destina-se a verificar as habilidades de manipulação em relação ao seu AASI por meio de 8 questões na forma de tarefas práticas executadas na presença da avaliadora, a qual verifica e classifica a desenvoltura do indivíduo, sendo que cada classificação corresponde a uma determinada pontuação que será somada ao final da aplicação e transformada em porcentagem. A seguir detalha-se tal classificação.

  • Excelente (4 pontos): participante completa a tarefa sem erros.

  • Mais do que satisfatória (3 pontos): participante apresenta um erro, mas completa com sucesso a tarefa.

  • Satisfatória (2 pontos): participante apresenta mais do que um erro, mas conclui com sucesso a tarefa.

  • Menos do que satisfatória (1 ponto): participante tenta a tarefa, mas não consegue concluir com sucesso ou usa meios desviantes para completar.

  • Não conseguiu executar (0 ponto): participante não pode executar a tarefa.

A pontuação máxima do instrumento é 32 (8 x 4) e a mínima é 0, porém para esse estudo, a pontuação máxima foi 24 (6 x 4), pois as questões referentes à manipulação do controle de volume (questão 6) e ao programa de redutor de ruído ou microfone direcional (questão 8) não são aplicáveis aos AASIs open fit selecionados. Com relação às questões compostas por dois subitens foi realizada a média ponderada para calcular a pontuação. Além disso, os subitens “limpeza do microfone direcional”;, “ventilação”; da questão 4, referente à limpeza do AASI e o subitem “uso correto da bobina telefônica”; da questão 7, não se aplicaram aos indivíduos participantes, por isso foram desconsiderados na contagem da pontuação do instrumento. Então, na questão 4 avaliou-se apenas o desempenho dos usuários de AASI open fit para a limpeza do AASI de modo geral, englobando a limpeza do dispositivo, da oliva e do microtubo e na questão 7 avaliou-se a colocação do telefone em relação ao aparelho auditivo. Essas adaptações são recomendadas dos autores do PHAST.

A forma de realizar a pontuação final é somar todos os pontos obtidos, adquirindo, assim a pontuação total, sendo que para sua obtenção em porcentagem, deve-se dividir o número obtido pelo número máximo de pontos possíveis, considerando-se o número de tarefas avaliadas, e posteriormente, multiplicá-lo por 100. Na sequência, essa porcentagem é classificada qualitativamente em desempenho excelente, quando a pontuação é de 90% a 100%; boa, quando a pontuação é de 80 a 89%; satisfatória, para a pontuação de 65% a 79%; e pobre quando a pontuação é abaixo de 65%.

RESULTADOS

O instrumento PHAST foi aplicado em 18 indivíduos deficientes auditivos, sendo 7 do gênero masculino e 11 do feminino com faixa etária entre 60 e 87 anos.

A Tabela 1 apresenta os resultados da pontuação do desempenho dos usuários de AASI open fit, quanto à questão 1: remoção do AASI; questão 2: manipulação do compartimento de pilha e questão 3: manipulação da pilha.

Tabela 1
Distribuição do desempenho dos usuários de AASI open fit, quanto à remoção do AASI (Q.1), manipulação do compartimento de pilha (Q.2) e manipulação da pilha (Q.3)

Em relação à questão 1 do instrumento PHAST, a qual se refere à remoção do AASI, observou-se que a maioria dos indivíduos apresentou desempenho excelente no subitem “ajuda para segurar o AASI/destreza”; e todos os indivíduos obtiveram desempenho excelente no subitem retirar o aparelho da orelha”;.

No que diz respeito à questão 2, a qual se refere à abertura do compartimento de pilha, constatou-se que a maioria apresentou atuação excelente para “achar a abertura”; e “abrir o compartimento”;. Apenas um indivíduo não achou a abertura do compartimento de pilha e dois não conseguiram abrir.

A questão 3 é sobre a troca de pilha do AASI, na qual os resultados foram diversificados, mas mesmo assim a maioria dos participantes conseguiu obter desempenho excelente, tanto para “retirar a pilha velha”; indivíduos, como para “colocar a pilha nova”; .

A Tabela 2 apresenta os resultados da pontuação do desempenho dos usuários de AASI open fit, quanto à questão 4: limpeza do aparelho auditivo; questão 5: inserção do AASI na orelha; questão 7: uso do telefone com o AASI.

Tabela 2
Distribuição do desempenho dos usuários de AASI open fit, quanto à limpeza do aparelho auditivo (Q.4), inserção do AASI na orelha (Q.5) e uso do telefone com o AASI (Q.7)

Quanto à questão 4, referente à limpeza do AASI, avaliou-se apenas o desempenho dos usuários de AASI open fit para a limpeza do AASI de modo geral, englobando o dispositivo, a oliva e o microtubo. Nessa tarefa, novamente, verificou-se resultados diversificados.

No tocante à questão 5, relativa à “inserção do AASI na orelha”;, a maioria dos participantes obteve pontuação excelente para “ajuda para segurar/destreza”;, já quanto ao “encaixe na orelha”;, a pontuação excelente foi obtida por metade da casuística.

A questão 7 relaciona-se ao uso do telefone com o AASI, 12 indivíduos participaram, pois 6 utilizavam a outra orelha para falar ao telefone, que apresentava limiares auditivos melhores e não usava AASI. Em relação ao subitem “colocação do telefone em relação ao aparelho auditivo”;, a maioria dos indivíduos, obteve desempenho menos do que satisfatório.

Para obtenção da pontuação total do PHAST, dada em porcentagem, é necessário dividir o número obtido pelo número máximo de pontos possíveis, considerando-se o número de tarefas avaliadas e posteriormente, multiplicá-lo por 100. Assim, realizou-se este cálculo para cada indivíduo do estudo. A média da pontuação dos indivíduos no PHAST foi de 78,7%, enquanto que a porcentagem mínima foi de 35% e a máxima foi de 100%. Na sequência, essa porcentagem foi classificada qualitativamente em desempenho excelente, bom, satisfatória e pobre, sendo esta a classificação final.

A Tabela 3 apresenta a distribuição das pontuações obtidas pelos indivíduos deficientes auditivos por cada questão, total, total em porcentagem e classificação final no PHAST.

Tabela 3
Distribuição das pontuações obtidas pelos indivíduos deficientes auditivos por cada questão, total, total em porcentagem e classificação final no PHAST

Na Figura 2 consta a classificação final dos indivíduos no PHAST, sendo que 33,33% indivíduos apresentaram desempenho excelente, 22,22% boa, 27,78% satisfatório e 16,67% pobre.

Figura 2
Distribuição da classificação final no PHAST dos indivíduos deficientes auditivos usuários de AASI open fit

DISCUSSÃO

Há muito tempo existe a preocupação em verificar a efetividade do uso do AASI e até os dias atuais esse tema vem sendo pesquisado pela comunidade científica. Os autores pioneiros em pesquisar os fatores que conduzem os indivíduos deficientes auditivos a não usarem efetivamente ou rejeitarem o AASI, observaram que um dos fatores responsáveis por esse problema é a dificuldade de manipulação do dispositivo3. Franks JR, Beckman NJ. Rejection of hearing aids: attitudes of a geriatric sample. Ear Hear. 1985;6(3):161-6..

A dificuldade de manipulação está relacionada a todos os tipos de AASI e envolve todas as populações, mas, especificamente, em indivíduos idosos e usuários do AASI tipo open fit esta dificuldade pode ser mais evidente, pois requer do usuário destreza manual e acuidade visual satisfatórias para manipulá-lo devido ao fato de seus componentes serem pequenos. Os indivíduos idosos apresentam degeneração sensorial, que ocasiona tremor nas mãos e deterioração da visão8. Matsudo S, Matsudo V. Prescrição e benefício da atividade física na terceira idade. Rev Bras Ciência e Movimento,1992; 6:19-30.. Verificar nos indivíduos idosos a desenvoltura para a manipulação do AASI open fit é oportuno.

Muitas vezes, o fonoaudiólogo questiona ao indivíduo se há dúvidas ou dificuldades quanto à tarefa de manipulação e, frequentemente a resposta é negativa. Porém, na prática o indivíduo realiza essa tarefa de modo equivocado ou não consegue realizá-la. Sendo assim, apenas o questionamento ao indivíduo, muitas vezes não é suficiente para garantir que a manipulação do AASI é satisfatória.

Além disso, o trabalho com o deficiente auditivo idoso deve apresentar programas enfocando o conceito de deficiência auditiva e suas implicações para o indivíduo, modo de funcionamento e cuidados com o AASI, exercícios práticos sobre a inserção, remoção e manipulação do dispositivo9. Russo ICP. Reabilitação Auditiva de Idosos. In: Bevilacqua MC, Martinez MAN, Balen SA, Pupo AC, Reis ACMB, Frota S. Tratado de Audiologia. São Paulo: Santos, 2011, p. 775-8.. Paralelo a isso, existem estudos que constataram a necessidade de estratégias que facilitem e melhorem a retenção dessas informações1010 . Geraldo T, Ferrari DV, Bastos BG. Orientação ao usuário de prótese auditiva: retenção da informação. Arq. Int. Otorrinolaringol. 2011;15(4):410-7.

Dentro desse contexto, surgiu a preocupação em investigar a habilidade de manipulação do AASI tipo open fit em indivíduos idosos, pois os serviços públicos destinados à saúde auditiva, recentemente, apresentam uma porcentagem significante de indivíduos idosos usuários de AASI open fit, pois é amplamente indicado por atender ao perfil audiométrico correspondente a essa população e pelo fato de que no processo de adaptação de AASI, a orientação quanto às questões referentes à manipulação do AASI open fit ocorrerem em um tempo reduzido, pois o tempo de atendimento nos serviços públicos geralmente é limitado. Os indivíduos idosos necessitam de um tempo maior para orientação, pois se ela não acontecer ou não for suficiente para o usuário assimilar todas as informações poderá desencadear o abandono ao uso do AASI4. Russo ICP, Almeida K, Freire KGM. A reabilitação auditiva do idoso. In: Almeida K, Iorio MCM. Próteses Auditivas - Fundamentos Teóricos e Aplicações Clínicas. 2 ed. São Paulo: Lovise, 2003, p. 423-7..

No serviço de saúde auditiva, no qual foi realizada esta pesquisada, a demanda é extensa abarcando 7.795 indivíduos idosos adaptados com AASI e desses 625 estão com o tipo open fit. Acrescido a isso, sabe-se por dados demográficos, que a tendência é o aumento populacional dos indivíduos da faixa etária acima de 60 anos, pois a população mundial está em processo de envelhecimento1111 . Veras RP. Em busca de uma assistência adequada à saúde do idoso: revisão da literatura e aplicação de um instrumento de detecção precoce e de previsibilidade de agravos. Caderno Saúde Pública. 2003;19(3):705-15..

Na questão referente à “remoção do AASI”;, observou-se que essa foi uma das tarefas que grande parte dos indivíduos obteve desempenho excelente, resultados já descritos em estudos anteriores 6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76.,1212 . Campos K. Construção de um material educativo na orientação do deficiente auditivo idoso. [Dissertação]: Faculdade de Odontologia de Bauru. Universidade de São Paulo, 2011.. Essa tarefa é indispensável para um usuário de AASI, pois terá que realizá-la mais de uma vez ao longo do dia. Exercícios práticos sobre a inserção/remoção e manipulação do AASI para o deficiente auditivo idoso devem ser sempre reforçados9. Russo ICP. Reabilitação Auditiva de Idosos. In: Bevilacqua MC, Martinez MAN, Balen SA, Pupo AC, Reis ACMB, Frota S. Tratado de Audiologia. São Paulo: Santos, 2011, p. 775-8.. O subitem “ajuda para segurar o AASI/destreza”; obteve menor porcentagem em relação ao subitem “retirar o aparelho da orelha”;, pelo fato dessa tarefa exigir maior habilidade manual, pois o idoso precisa apresentar firmeza para conseguir segurar o dispositivo e como muitos participantes apresentaram tremor nas mãos, isso afetou o desempenho na tarefa.

Quanto à questão “abertura do compartimento de pilha”;, constatou-se que esses resultados corroboram com a literatura, em cuja tarefa os indivíduos não apresentam dificuldade 6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76.,1212 . Campos K. Construção de um material educativo na orientação do deficiente auditivo idoso. [Dissertação]: Faculdade de Odontologia de Bauru. Universidade de São Paulo, 2011.. O fato que nos chama atenção é que um indivíduo não achou a abertura do compartimento de pilha e dois não conseguiram abrir, facilmente justificado pela característica da população envolvida, pois essa tarefa requer do idoso não só habilidade manual, como também acuidade visual e sensibilidade tátil, pois o envelhecimento acarreta alterações na saúde geral8. Matsudo S, Matsudo V. Prescrição e benefício da atividade física na terceira idade. Rev Bras Ciência e Movimento,1992; 6:19-30..

Para a “troca de pilha do AASI”;, os resultados foram diversificados, e os participantes apresentaram mais dificuldades no subitem “colocar a pilha nova”;. Vale salientar que todos os AASI open fit utilizam pilhas de número 312 ou 10, que são as menores pilhas disponíveis, dificultando ainda mais a manipulação. Em outro estudo, 5% dos participantes apresentou classificação menos do que satisfatória ou não conseguiu realizar6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76.. Os idosos usuários de AASI com problemas de destreza manual, dificuldade visual e/ou sensibilidade tátil alterada terão dificuldades quanto troca de pilhas, cabendo ao fonoaudiólogo selecionar o modelo de AASI mais adequado a essas dificuldades4. Russo ICP, Almeida K, Freire KGM. A reabilitação auditiva do idoso. In: Almeida K, Iorio MCM. Próteses Auditivas - Fundamentos Teóricos e Aplicações Clínicas. 2 ed. São Paulo: Lovise, 2003, p. 423-7..

A questão referente à limpeza foi à tarefa que os indivíduos apresentaram mais dificuldade, fato que era esperado, pois requer habilidade manual fina. Essa dificuldade também é deparada em estudos anteriores 6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76.,1212 . Campos K. Construção de um material educativo na orientação do deficiente auditivo idoso. [Dissertação]: Faculdade de Odontologia de Bauru. Universidade de São Paulo, 2011..

Com referência à inserção do AASI na orelha, a tarefa “encaixe na orelha”; requer mais habilidade manual, o que justifica tais achados. Estudos também apontam tais resultados, o subitem “encaixe na orelha”; os participantes apresentaram menores pontuações1212 . Campos K. Construção de um material educativo na orientação do deficiente auditivo idoso. [Dissertação]: Faculdade de Odontologia de Bauru. Universidade de São Paulo, 2011. e apenas 2% dos participantes apresentaram classificação menos do que satisfatória ou não conseguiu realizar a tarefa proposta6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76..

Quanto ao uso do telefone com o AASI, num estudo a maioria do grupo experimental apresentou pontuação excelente, em contrapartida 28,6% do grupo controle obteve essa mesma pontuação1212 . Campos K. Construção de um material educativo na orientação do deficiente auditivo idoso. [Dissertação]: Faculdade de Odontologia de Bauru. Universidade de São Paulo, 2011.. Todavia, 80% da casuística obtiveram desempenho menos do que satisfatório ou não conseguiu realizar a tarefa, resultados que corroboram com os do presente estudo6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76.. Essa tarefa deve ser mais treinada pelos profissionais, pois é uma tarefa que não exige muita habilidade manual. Esses resultados podem ser justificados pelo fato dos indivíduos idosos apresentarem dificuldades para evocar informações referentes a eventos ou fatos, memória episódica1313 . Kussels RPC. Patient’s memory for medical information. J. Roy. Soc. Med. 2003; 96:219-22., bem como ao fato da orientação sobre os cuidados e manipulação do AASI ocorrerem num período relativamente curto1414 . Watson PWB, Mickinstry PA. Systematic review of interventions to improve recall of medical advice in healthcare consultations. J. R. Soc. Med, 2009;(102):235-43..

Verificou-se que em média os indivíduos obtiveram uma classificação final satisfatória, sendo esses achados semelhantes aos descritos na literatura, na qual a média da pontuação final foi de 78,6% 6. Desjasrdins JL, Doherty KA. Do experienced hearing aid users know to use their hearing aids correctty? Am. J. Audiol. 2009;18(1):69-76. e o grupo controle obteve uma média de 77,8% e o grupo experimental 77,2%1212 . Campos K. Construção de um material educativo na orientação do deficiente auditivo idoso. [Dissertação]: Faculdade de Odontologia de Bauru. Universidade de São Paulo, 2011..

O AASI do tipo open fit surgiu com perspectivas promissoras para atender ao perfil audiométrico reduzindo ou eliminando o indesejável efeito de oclusão e para as finalidades estéticas. Sem dúvidas, esse tipo de AASI é eficaz, proporcionando satisfação ao uso e melhora da qualidade de vida como comprovado nos estudos de 1. Kochkin S. MarkeTrak VIII: Mini-BTEs tap new market, users more satisfied. Cover Story: The Hearing Journal. 2011;64(3):17-24.,1515 . Zacare CC. Qualidade de vida e benefício com amplificação: um estudo em idosos novos usuários de próteses auditivas em adaptação aberta. [Dissertação]: São Paulo, Universidade Federal de São Paulo, 2010., 1616 . Picolini MM, Blasca WQ, Campos K, Mondelli MFCG. Adaptação aberta: avaliação da satisfação dos usuários de um centro de alta complexidade. Rev. CEFAC. 2010;12(3):33-42..

Além do progresso da qualidade de vida e da satisfação, o profissional ao selecionar o AASI open fit, deve apresentar como principal objetivo minimizar a desvantagem e/ou incapacidade relacionada à diminuição na sensibilidade auditiva que compromete, sobretudo, o processo de comunicação verbal, assim como recomendar o modelo de fácil manipulação. Também é indispensável ter consciência que, apesar da sofisticação dos AASIs e das melhorias alcançadas, o processo de adaptação do dispositivo deve ser individualizado, considerando as necessidades auditivas e não auditivas do candidato à amplificação e sua real habilidade para o uso do dispositivo.

CONCLUSÃO

A maioria dos idosos deficientes auditivos idosos usuários de do aparelho de amplificação sonora individual do tipo open fit participantes do estudo realizou adequadamente as tarefas referentes à manipulação do AASI open fit, avaliadas por meio do instrumento Practical Hearing Aid Skills Test (PHAST) - Teste de Habilidades Práticas, obtendo classificação final no instrumento PHAST excelente e boa.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2014

Histórico

  • Recebido
    09 Abr 2012
  • Aceito
    06 Dez 2012
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