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Evolução fonológica de crianças com desvio fonológico submetidas a diferentes abordagens terapêuticas

Phonological evolution of children with speech disorders submitted to different therapeutic approaches

Resumos

No Português Brasileiro, aproximadamente entre 4 ou 5 anos de idade, a criança já adquiriu todos os fonemas do sistema fonológico adulto. Porém, este processo nem sempre ocorre de acordo com o esperado, verificando-se afastamentos/desvios na aquisição dos sons da fala. O objetivo deste trabalho foi verificar e comparar a evolução do sistema fonológico de crianças com desvio fonológico submetidos à terapia fonológica, acrescida ou não de estimulação das habilidades práxicas orofaciais. A amostra foi composta por seis sujeitos (três meninas e três meninos), com idades entre 5:4 e 7:0 no início da terapia. Os sujeitos foram divididos em três grupos, recebendo todos terapia fonológica, sendo os do grupo estudo tratados com estimulação de habilidades práxicas de face e língua (GFoLFa), e com exercícios de habilidades práxicas de língua (GFoL), e o grupo controle submetido apenas à terapia fonológica (GFo). Todos foram avaliados pré e pós-terapia quanto ao sistema fonológico (Yavas, Hernandorena e Lamprecht, 1991); ao Teste de Praxias Orofaciais (Berzoatti, Tavano e Fabbro, 2007); e ao Teste de Praxias Articulatórias e Bucofaciais (Hage, 2000). Os resultados foram analisados e descritos comparando os três grupos. Os resultados obtidos evidenciaram que todos os grupos apresentaram evoluções no inventário fonético, o GFoLFa obteve evoluções maiores no PCC-R. Conclui-se que os grupos que receberam intervenção práxica obtiveram maiores evoluções fonológicas, porém, sugerem-se novos estudos aplicando este modelo, para que possam ser confirmados esses resultados, com outras amostras.

Fala; Criança; Distúrbios da Fala; Terapia de Fala; Sistema Estomatognático


Approximately between 4 or 5 years old, the child has already acquired all the phonemes of the Portuguese adult phonological system. However, this process does not always occur according to expectations, being noted separations/deviations in the acquisition of speech sounds. This study aimed to verify and compare the phonological evolution of, with phonological deviation submitted to phonological therapy associated with the stimulation or not of oral praxis skills. The sample was composed by six subjects (three girls and three boys) aged between 5:4 and 7:0 at the beginning of therapy. The subjects were divided in three groups, all receiving phonological therapy; to one group was added praxis stimulation of face and tongue (GFoLFa); tongue praxis stimulation (GFoL) to another and the third group was submitted only to phonological therapy (GFo). All of them were evaluated before and after therapy regarding: phonological system (Yavas, Hernandorena and Lamprecht, 1991); Orofacial Praxis Test (Bearzotti, Tavano e Fabbro, 2007) and Bucofacial Articulatory Praxis test (Hage, 2000). The results were analyzed descriptively by comparing the three groups. The results evidenced that all groups presented evolution in the phonetic inventory, the GFoLFa obtained bigger evolution in the PCC-R. At this, new ways of study applying this model are suggested, so that these results can be confirmed.

Speech; Child; Speech Disorders; Speech Therapy; Stomathognatic System


INTRODUÇÃO

A aquisição fonológica ocorre até a estabilização do sistema fonológico de acordo com a comunidade linguística onde a criança está inserida. Quando existe um atraso ou afastamento nesta aquisição, tem-se o Desvio Fonológico, que é caracterizado por omissões ou substituições na produção dos fonemas 1. Vieira MG, Mota HB, Keske-Soares M. Relação entre idade, grau de severidade do desvio fonológico e consciência fonológica. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2004; 9(3):144-50. , 2. Keske-Soares M, Blanco APF, Mota HB. O desvio fonológico caracterizado por índices de substituição e omissão. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2004;9(1):10-8.. Este, afeta a organização linguística da criança, e não a mecânica de produção da fala, dessa forma é entendido que este comprometimento interfere apenas o input da fala e não output da mesma3. Grunwell P. Os desvios fonológicos numa perspectiva linguística. In: YAVAS, M. (org.). Desvios fonológicos em crianças: teoria, pesquisa e tratamento. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1990. p. 53-77..

Existem diferentes modelos de intervenção para a adequação do sistema fonológico desviante. O objetivo central destes é a melhora do sistema fonológico, bem como a estimulação de generalizações.

Na literatura são descritos alguns modelos com base fonológica: metaphon (pretende realizar mudanças no sistema fonológico de crianças com desvio fonológico, por meio da utilização de consciência metafonológica), ciclos e ciclos modificado (têm como princípio norteador de tratamento a eliminação de processos fonológicos presentes na fala da criança, a partir da conscientização das características do som-alvo que operam naquele processo fonológico), pares mínimos – oposições mínimas, máximas, múltiplas (buscam melhorar o sistema fonológico desviante por meio da oposição de fonemas, com base nos traços distintivos que os compõem). Ainda, existem alguns modelos com base fonética/ articulatória (que buscam por meio da melhora do sistema fonético a adequação do fonológico).

Nota-se que é pouco descrito na literatura, a diferenciação entre terapia fonológica e articulatória4. Giacchini V. Aplicação de modelos terapêuticos de base fonética e fonológica utilizadas para a superação das alterações de fala. 2009. 110f. Dissertação (Mestrado em Distúrbios da Comunicação Humana) - Universidade Federal de Santa Maria; Santa Maria, 2009., e não se tem trabalhos que abordem o uso de estratégias envolvendo habilidades práxicas orofaciais em crianças com desvio fonológico.

Um autor investigou as habilidades práxicas orofaciais5. Marini C. Habilidades práxicas em crianças com desvio fonológico evolutivo e com desenvolvimento fonológico. 2010. 111f. Dissertação (Mestrado em Distúrbios da Comunicação Humana) - Universidade Federal de Santa Maria; Santa Maria, 2010]. e demais aspectos do controle motor oral de crianças com desenvolvimento fonológico típico e com desvio fonológico. Neste estudo, as crianças com desvio fonológico apresentaram maior número de alterações das praxias orofaciais investigadas, quando comparadas às crianças com desenvolvimento fonológico típico. Assim, é subentendido que a dificuldade em algumas habilidades práxicas orofaciais pode estar co-ocorrendo juntamente com o desvio fonológico. Crianças podem apresentar juntamente com o desvio fonológico, além das dificuldades de organização dos sons da fala, a interferência de dificuldades de habilidades práxicas orofaciais no momento da execução/produção dos fonemas, as quais são sutis.

Assim, a motivação para este trabalho se sustenta na hipótese de que as alterações das habilidades práxicas orofaciais podem interferir na concretização adequada dos fonemas (visto que é imprescindível a coordenação correta destes movimentos para a produção da fala). Considerando esse fato, pode-se pensar que a evolução (melhora) dessas habilidades pode interferir no sistema fonológico da criança (pode-se pensar que adequando o nível articulatório/ práxico pode haver a melhora no nível fonológico da organização linguística).

Devido à carência de estudos envolvendo habilidades práxicas orofaciais durante a terapia fonologia, o objetivo deste trabalho foi verificar e comparar a evolução do sistema fonológico de crianças com desvio fonológico submetidos à terapia fonológica, acrescida ou não de estimulação das habilidades práxicas orofaciais.

APRESENTAÇÃO DOS CASOS CLÍNICOS

Este estudo se caracteriza por ser do tipo qualitativo e longitudinal e foi desenvolvido em laboratório de fala de instituição de Ensino Superior, vinculado a projeto de pesquisa, devidamente registrado e aprovado em CEP e GAP desta instituição de Ensino sob o n° 02010.0.243.000-10. Todos os pais/ responsáveis pelos sujeitos participantes autorizaram a participação dos sujeitos na pesquisa, bem como a publicação dos resultados, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Fizeram parte desta pesquisa seis crianças com idades entre 5:4 e 7:0, no início da terapia sendo três do sexo masculino e três do feminino e com diagnóstico de desvio fonológico, obtido durante a triagem fonoaudiológica prévia.

Para serem incluídos no estudo, os sujeitos deveriam apresentar diagnóstico de desvio fonológico obtido na triagem fonoaudiológica, dois sons ausentes no inventário fonético, audição dentro dos padrões de normalidade para a média tritonal da fala e não apresentarem alterações significantes nas avaliações fonoaudiológicas e complementares, à exceção das avaliações fonológica6. Yavas M, Hernandorena CL, Lamprecht, RR. Avaliação fonológica da criança: reeducação e terapia. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001. e das habilidades práxicas orofaciais7. Hage SVR. Dispraxia articulatória: correlações com o desenvolvimento da linguagem. In: Marcehasan I, Zorzi J. Anuário CEFAC de Fonoaudiologia. Rio de Janeiro: Revinter, 1999/2000. , 8. Bearzotti F; Tavano A, Fabbro F. Developmental of orofacial praxis of children from 4 to 8 years of age. Perceptual and Motor Skills. 2007;104: 1355-66..

Para a confirmação do diagnóstico de desvio fonológico e para descartar outros comprometimentos que pudessem interferir no desenvolvimento da linguagem, os sujeitos foram submetidos às avaliações fonoaudiológicas: anamnese, linguagem compreensiva e expressiva, sistema estomatognático, exame articulatório, discriminação auditiva, processamento auditivo simplificado, consciência fonológica, habilidades práxicas orofaciais e avaliação fonológica. Para este trabalho foram considerados os dados apenas das avaliações fonológicas inicial e após a terapia. Foram considerados os dados da avaliação fonológica no que se refere aos inventários fonético e fonológico e ao Percentual de Consoantes Corretas Revisado (PCC-R).

Para o som ser considerado presente no inventário fonético, o mesmo deveria estar presente em pelo menos duas produções corretas. Para o inventário fonológico, foram considerados os critérios de autor9. Bernhardt B. Developmental implications of nonlinear phonological theory. Clinical Linguistics and Phonetics. 1992;6:259-81. em que um fonema está adquirido quando presente em mais que 80% das possibilidades, parcialmente adquirido quando presente de 40 a 79% das possibilidades e ausente quando presente em menos de 39% das possibilidades.

Após a avaliação fonológica, o desvio fonológico foi classificado quanto à gravidade, por meio do cálculo do Percentual de Consoantes Corretas Revisado (PCC–R) proposto por autor1010 . Shriberg LD; Austin D; Lewis BA; Mcsweeny JL & Wilson DL. The percentage of consonants correct (PCC) metric: extensions and reliability data. Journal of Speech Language and Hearing Research. 1997;40(4):708-22., que se baseia nas produções corretas das consoantes, sem considerar as distorções de sons e é obtido mediante a divisão do número de consoantes corretas (NCC) pelo número de consoantes corretas somado ao número de consoantes incorretas (NCI), ou seja, o número total de consoantes; após este resultado é multiplicado por 100. A partir disto determinou-se a gravidade do desvio fonológico, conforme a classificação proposta pelos autores supracitados: desvio leve (DL), com percentuais entre 86 e 100%; desvio leve-moderado (DML), com percentuais de 66 a 85%; desvio moderado-grave (DMG), com percentuais de 51 a 65% e desvio grave (DG), com percentuais menores que 50%.

Ainda, todos foram submetidos à avaliações complementares: otorrinolaringológica com inspeção do meato acústico externo e avaliação audiológica.

Após as avaliações e a confirmação do diagnóstico de desvio fonológico, bem como a exclusão de sujeitos que não se enquadravam nos critérios de inclusão e exclusão, as seis crianças foram encaminhadas para a terapia e foram divididas em três grupos com mesmo número de participantes: o primeiro grupo recebeu terapia essencialmente fonológica (GFo); o segundo grupo recebeu além da terapia fonológica, exercícios práxicos de língua (GFoL); e o terceiro grupo além da terapia fonológica e de exercícios práxicos de língua teve intervenção sobre as praxias orofaciais (estimulação práxica de face e bochecha - GFoLFa).

Todas as crianças do estudo receberam terapia fonológica pelo modelo de Pares Mínimos/ Oposições Máximas1111 . Gierut JA. Maximal opposition approach to phonological treatment. J Speech Hear Dis. 1989;54:9-19., de acordo com as modificações propostas em um estudo1212 . Bagetti T, Mota HB, Keske-Soares M. Modelo de oposições máximas modificado: uma proposta de tratamento para o desvio fonológico. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2005 Jan-mar;10(1):36-42.. O modelo sugere o contraste de dois fonemas maximamente opostos (oposição de mais de dois traços distintivos).

A intervenção práxica para movimentos de língua (para os grupos GFoL e GFoLFa) foram baseados em resultados de um estudo1313 . Fonseca RP, Dornelles S, Ramos APF. Relação entre a produção do /r/ fraco e as praxias linguais na infância. Pró-Fono Rev Atual Cient. São Paulo, set-dez 2003;15(3): 229-40. e os exercícios práxicos para a face (para o GFoLFa) foram extraídos de avaliação de praxias orofaciais7. Hage SVR. Dispraxia articulatória: correlações com o desenvolvimento da linguagem. In: Marcehasan I, Zorzi J. Anuário CEFAC de Fonoaudiologia. Rio de Janeiro: Revinter, 1999/2000. , 8. Bearzotti F; Tavano A, Fabbro F. Developmental of orofacial praxis of children from 4 to 8 years of age. Perceptual and Motor Skills. 2007;104: 1355-66..

Os sujeitos foram atendidos em sessões terapêuticas individuais, com frequência de duas sessões semanais e duração de 45 minutos cada sessão. As sessões iniciaram e acabaram com o bombardeio auditivo e a prática de participação dos pais sempre foi orientada. Os exercícios práxicos de língua e/ ou face foram realizados sempre no início da sessão terapêutica (após o bombardeio auditivo) com a duração aproximada de 20 minutos (foram realizados 30 repetições de cada exercício/ sequência). Em caso de fadiga, o sujeito foi orientado a descansar e retomar a série posteriormente.

Após 25 sessões para os grupos GFoL e GFo, e 20 sessões para o grupo GFoLFa, foi realizada a reavaliação do sistema fonológico e os dados foram tabulados de maneira qualitativa comparando a avaliação fonológica inicial e final.

RESULTADOS

Sendo este um estudo qualitativo, os resultados deste estudo serão apresentados em forma de figuras (quadros e ilustrações).

Na Figura 1 estão apresentados o número de sons presentes e ausentes no inventário fonético dos sujeitos da pesquisa nas avaliações fonológicas inicial e final.

Figura 1
– Número de sons presentes e ausentes do inventário fonético dos sujeitos nas avaliações fonológicas inicial e final

A Figura 2 detalha os inventários fonéticos antes e após a terapia dos sujeitos da pesquisa.

Figura 2
– Inventário fonético detalhado dos sujeitos nas avaliações inicial e final

Todos os sujeitos apresentaram a ausência de pelo menos dois sons em seus inventários fonéticos no início do tratamento, sendo este um dos critérios de inclusão neste estudo. Após a terapia, todos os sujeitos apresentaram evolução em seus inventários fonéticos, apresentando-os completos em um período de 20 a 25 sessões.

Evidencia-se que S1 e S4 foram os que apresentaram maior ampliação de seus inventários fonéticos (adquirindo os cinco sons que estavam ausentes), seguidos pelo S3 (aumento de quatro sons no inventário). S6 adquiriu três sons e, por último, S2 e S5 adquiriram os dois sons que não estavam estabelecidos antes da terapia.

Na Figura 3 está apresentado o comparativo de fonemas presentes no inventário fonológico, bem como o diferencial (diferença entre as avaliações final e a inicial) de número de fonemas adquiridos nas avaliações fonológicas iniciais e finais.

Figura 3
– Número de sons presentes no inventário fonológico e diferencial do número de fonemas adquiridos nas avaliações fonológicas inicial e final

A Figura 4 ilustra os fonemas adquiridos, parcialmente adquiridos e ausentes do inventário fonológico nas avaliações fonológicas iniciais e finais.

Figura 4
– Fonemas adquiridos, parcialmente adquiridos e ausentes do inventário fonológico nas avaliações fonológicas inicial e final

O grupo GFoLFa foi o que obteve a maior média de fonemas adquiridos no inventário fonológico (7,5 fonemas), seguido pelo GFoL que obteve média de três fonemas adquiridos. O GFo obteve a menor média de fonemas adquiridos (2 fonemas).

A Figura 5 aponta o PCC-R e o diferencial deste nas avaliações fonológicas inicial e final.

Figura 5
– Resultados do PCC-R e o diferencial deste nas avaliações fonológica inicial e final

O grupo que apresentou maior aumento do PCC-R foi o grupo GFoLFa, em que o diferencial foi de 28,51%, seguido pelo grupo GFo ( que obteve diferencial de 10,90%). O grupo que teve um menor aumento em seu PCC-R foi o GFoL (média de 9,30%).

DISCUSSÃO

No inventário fonético, as classes prejudicadas inicialmente eram das líquidas e fricativas (para todos os sujeitos) e plosivas (para S1, S3 e S6). Todos os sujeitos apresentavam em seu inventário fonético a classe das nasais presentes, sendo esse dado concordante com estudos relatados na literatura1414 . Barberena LS, Keske-Soares M, Mota HB. Generalização baseada nas relações implicacionais obtida pelo modelo “ABAB-Retirada e Provas Múltiplas. Rev Soc Bras Fonoaudiol, 2008;13(2):143-53. , 1515 . Barberena LS, Keske-Soares M, Mota HB. Generalização no tratamento com o /R/ em um caso de desvio fonológico médio-moderado. Rev Soc Bras Fonoaudiol. São Paulo, 2004;9(4): 229-36.. Ainda, nenhum dos sujeitos apresentava problemas com as africadas [tS] e [dZ].

Todas as classes de sons que apresentavam problemas na avaliação inicial obtiveram aquisições: S1, S3 e S6 apresentaram estabelecimento das classes das líquidas, plosivas e fricativas e S2, S4 e S5 apresentaram aquisições nas classes das fricativas e líquidas. Em geral, as classes das líquidas e fricativas são as mais afetadas no desvio fonológico, por serem de aquisição mais complexa16.

A classe das fricativas é a terceira a ser adquirida (após as plosivas e nasais), sendo que as fricativas labiais são de aquisição inicial, e as demais consideradas de aquisição tardia. A classe das líquidas é a última a ser estabelecida no Português Brasileiro e, dentro desse grupo de fonemas, as laterais são adquiridas antes das não-laterais 1616 . Lamprecht RR. Sobre os desvios fonológicos. In: Lamprecht R. R. Aquisição Fonológica do Português. Perfil de desenvolvimento e subsídios para a terapia. Porto Alegre: Artmed, 2004..

A terapia fonológica com base no Modelo de Oposições Máximas/Empty Set foi eficiente para os inventários fonéticos dos sujeitos deste estudo, concordando com outros estudos já realizados envolvendo este mesmo modelo 1717 . Mota HB, Keske-Soares M, Bagetti T, Ceron MI, Filha MGC. Análise comparativa da eficiência de três diferentes modelos de terapia fonológica. Pró-Fono: Rev Atual Cient, 2007;19(1):67-74..

Estudo1818 . Pagliarin KC, Mota HB, Keske-Soares M. Análise da eficácia terapêutica em três modelos fonológicos de abordagem contrastiva. Pró-Fono Rev Atual Cient. 2009;21(4):297-302. buscou comparar a efetividade de três modelos de terapia fonológica com abordagem contrastiva. As autoras verificaram que os Modelos de Pares Mínimos – Oposições Mínimas e Oposições Máximas/ Empty Set favoreceram maior número de aquisições no inventário fonético dos sujeitos com desvio fonológico de graus moderado-grave e grave. Esse estudo concorda com o presente trabalho, visto que o sujeito que apresentou maior número de sons estabelecidos no inventário fonético (S1) apresentava desvio moderado-grave.

Os sujeitos que mais apresentaram evoluções no inventário fonético (S1, S3 e S4) foram tratados com a terapia associada – terapia fonológica acrescida de estimulação práxica de face e língua (GFoLFa e GFoL). Nenhum dos sujeitos no início do tratamento apresentava capacidade articulatória de produção do som [R] e todos foram estimulados com este som durante a terapia, dessa forma, todos apresentaram o estabelecimento deste som no inventário fonético (com no mínimo duas produções do mesmo, sendo este o critério para considerar um som presente no inventário fonético).

Foi verificado que o GFoLFa foi o que obteve a maior média de fonemas adquiridos no inventário fonológico, seguido pelo GFoL, e por último o GFo que obteve a menor média de fonemas adquiridos, porém é importante salientar que este grupo também obteve melhoras em seus inventários fonológicos.

Este resultado obtido concorda com outros estudos que verificaram evoluções quanto a aquisições no inventário fonológico a partir da terapia fonológica. Em estudo1818 . Pagliarin KC, Mota HB, Keske-Soares M. Análise da eficácia terapêutica em três modelos fonológicos de abordagem contrastiva. Pró-Fono Rev Atual Cient. 2009;21(4):297-302., as autoras encontraram que os sujeitos tratados pelos modelos com abordagem contrastiva apresentaram mudanças significantes em seus inventários fonológicos, corroborando com o presente trabalho.

Pode-se verificar que houve aumento do PCC-R para todos os grupos. Esse achado já poderia ser esperado, uma vez que a terapia tem o objetivo de organizar o sistema fonológico da criança, dessa forma, quando há uma organização deste sistema, ocorre também um aumento do PCC-R. Esse achado concorda com estudo no qual foi pesquisado em um corpus de 66 sujeitos a eficácia do tratamento em três diferentes modelos de terapia quanto às mudanças no sistema fonológico destes, foi verificado que o PCC aumenta com a terapia de fala (e a supressão das trocas na fala)2020 . Keske-Soares M, Brancalioni AR, Marini C, Pagliarin KC, Ceron MI. A eficácia da terapia para desvios fonológicos com diferentes modelos terapêuticos. Pró-Fono: Rev Atual Cient. 2008;20(3):153-8..

Ainda, o presente estudo concorda com outro2121 . Almost D, Rosenbaum P. Effectiveness of speech intervention for phonological disorders: a randomized controlled trial. Developmental Medical Child Neurology. 1998;40:319-25., que verificou a eficácia da intervenção fonoaudiológica no desvio fonológico severo em 30 crianças, com idade escolar, durante oito meses. As crianças foram divididas em dois grupos: o primeiro recebeu tratamento durante os quatro primeiros meses e o segundo, durante os quatro últimos meses. Os resultados mostraram haver diferença estatisticamente significante no PCC, após os quatro primeiros meses, apenas para o primeiro grupo. Após os oito meses, verificou diferença estatisticamente significante entre os dois grupos, na qual o primeiro continuou mostrando maior PCC.

Esse resultado é concordante ainda com outro estudo2222 . Pagan LO, Wertzner HF. Intervenção do distúrbio fonológico por meio dos pares mínimos com oposição máxima. São Paulo. Pró-Fono: Rev Atual Cient. São Paulo, 2002;14:313-24. onde as autoras afirmam que os sujeitos obtiveram melhoras no PCC com a intervenção terapêutica, sendo o aumento de produções corretas significante.Apesar de todos os grupos terem apresentado evoluções significantes no PCC-R, pôde-se verificar que o grupo que obteve maior média foi o GFoLFa, sugerindo assim que a estimulação práxica de face e língua auxilia na produção dos fonemas.

CONCLUSÃO

Ao final deste estudo, o qual buscou verificar a evolução do sistema fonológico de crianças com desvio fonológico submetidos a abordagem contrativa, acrescida de estimulação das habilidades práxicas a análise dos resultados obtidos para a amostra estudada, permitiram as seguintes conclusões: o modelo de Pares Mínimos – Oposições Máximas Modificado/ Empty Set foi efetivo para a ampliação do inventário fonético de todos os sujeitos, pois permitiu a ampliação do número de sons estabelecidos.

O GFoLFa (Grupo Fonológico com estimulação práxica de face e língua) foi o que apresentou maiores escores no que se refere a: PCC-R e número de sons adquiridos.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 08 2012
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2014

Histórico

  • Recebido
    30 Jun 2011
  • Aceito
    09 Jan 2012
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