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Compressão de frequências no reconhecimento de fala de idosos com possíveis zonas mortas na cóclea

Resumos

OBJETIVO:

avaliar e comparar o desempenho de idosos sem e com zonas mortas na cóclea em testes de reconhecimento de fala, no silêncio e no ruído, usando próteses auditivas sem e com compressão não linear de frequências.

MÉTODOS:

participaram 38 idosos com perda auditiva de grau leve a moderado e configuração descendente, distribuídos, com base nos resultados da técnica de mascaramento com ruído branco, em: Grupo A - 24 idosos sem indícios de zonas mortas na cóclea; Grupo B - 14 idosos com possíveis zonas mortas na cóclea. Aplicou-se o teste Listas de Sentenças em Português, pesquisando-se os Índices Percentuais de Reconhecimento de Sentenças no Silêncio e no Ruído. As medidas foram obtidas com próteses auditivas, sem e com compressão de frequências.

RESULTADOS:

o grupo A e o B apresentaram melhora significante no silêncio com as próteses auditivas com compressão de frequências; no ruído nenhum grupo apresentou diferença sem e com compressão de freqüências. Comparando-se os grupos, não houve diferença no silêncio sem e com compressão de frequências. No ruído sem a ativação da compressão houve diferença significante, sendo melhor o desempenho do grupo B. No ruído com a ativação do recurso não houve diferença significante.

CONCLUSÃO:

no silêncio, ambos os grupos apresentaram melhor desempenho usando próteses com compressão de frequências. No ruído, não houve diferença entre os resultados sem e com compressão de frequências. Comparando-se os grupos, a medida obtida no ruído com próteses auditivas sem compressão de frequências apresentou diferença, na qual o grupo com zonas mortas obteve melhor desempenho.

Auxiliares de Audição; Perda Auditiva de Alta Frequência; Idoso; Testes de Discriminação da Fala; Percepção da Fala


PURPOSE:

to evaluate and compare the performance of elderly people with and without cochlear dead regions in speech recognition tests, in silence and in noise, using hearing aids with and without the activation of the nonlinear frequency compression algorithm.

METHODS:

38 elderly people with mild to moderate hearing loss and descending configuration, distributed based on the results of the white noise masking technique, in: Group A - 24 elderly people without evidence of cochlear dead regions; Group B - 14 elderly people with evidence of cochlear dead regions. The Lists of Sentences in Portuguese test was applied, seeking the Percentage Index of Sentence Recognition in silence and in noise. The measurements were obtained using the hearing aids without and with nonlinear frequency compression.

RESULTS:

both Group A and Group B showed statistically significant improvement in silence with the hearing aids with the algorithm; in noise no group presented significant difference without and with frequency compression. Comparing the groups, there was no significant difference in silence without and with frequency compression. In noise without the algorithm there was significant difference, Group B being the better of the two. In noise without frequency compression there was no significant difference.

CONCLUSION:

in silence, both groups presented significant improvement in performance using hearing aids with frequency compression. In noise, there was no difference between the results without or with frequency compression. Comparing the groups, the measurement obtained in noise with hearing aids without the algorithm was the only one that presented a significant difference, in which the group with cochlear dead regions presented a better performance.

Hearing Aids; Hearing Loss; High-Frequency; Aged; Speech Discrimination Tests; Speech Perception


Introdução

Considerando-se que a organização tonotópica coclear está disposta de forma que as frequências altas sejam identificadas na região basal da cóclea e as baixas no ápice11. Von Békesy G. Concerning the pleasures of observing, and the mechanics of the inner ear, 1961. In: Nobel Lecture, 1961. Disponível em: http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/1961/bekesy-lecture.pdf.
http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/m...
, é natural e frequente que a perda auditiva neurossensorial afete inicialmente as células responsáveis por detectar as frequências altas, caracterizando-se por uma configuração descendente no audiograma. Sujeitos com essa configuração audiométrica costumam ter seu reconhecimento de fala claramente prejudicado, uma vez que a transmissão de energia acústica dos sons consonantais, relacionados às altas frequências e fundamentais para o reconhecimento de fala22. Russo ICP, Behlau M. Percepção da fala: análise acústica do português brasileiro. São Paulo: Lovise; 1993., está prejudicada.

Em alguns casos, a perda auditiva decorre não apenas de uma diminuição da atividade funcional das células ciliadas internas e/ou neurônios adjacentes da cóclea, mas da não funcionalidade dessas estruturas que levam à ruptura de transmissão da informação gerada na membrana basilar para o Sistema Nervoso Central. Regiões com essas características são chamadas de zonas mortas na cóclea (ZMC) 33. Moore BCJ, Glasberg BR. A model of loudness perception applied to cochlear hearing loss. Auditory Neuroscience. 1997;3:289-311. e quando presentes acabam por defasar ainda mais o reconhecimento de fala dos sujeitos.

Nessas condições, a detecção do som com frequência correspondente à ZMC só poderá ocorrer se for suficientemente intenso para gerar uma vibração na membrana basilar que se propague a regiões vizinhas a ela, onde as células ciliadas permanecem funcionais. Assim, em sujeitos com ZMC é possível que ocorra uma reorganização tonotópica44. Smith MW, Faulkner A. Perceptual adaptation by normally hearing listeners to a simulated "hole" in hearing. J Acoust Soc Am. 2006;120(6):4019-30., a qual pode não se restringir ao nível coclear, levando também à plasticidade cortical. Neste sentido, pesquisas indicam que uma lesão na base da cóclea, causando ZMC nas altas frequências, pode levar a região cortical correspondente à ZMC a se ajustar para responder àquela frequência adjacente que irá ser responsável por sua detecção55. Vestergaard M. Dead regions in the cochlea: implication for speech recognition and applicability of articulation index theory. Int J Audiol. 2003;42(5):249-61. , 66. Moore BCJ, Vinay SN. Enhanced discrimination of low-frequency sounds for subjects with high-frequency dead regions. Brain. 2009;132(2):524-36..

Considerando o percentual de pacientes com ZMC77. Preminger JE, Carpenter R, Ziegler CH. A clinical perspective on cochlear dead regions: intelligibility of speech and subjective hearing aid benefit. J Am Ac Audiol. 2005;16(8):600-13.

8. Hornsby BWY, Dundas JA. Factors affecting outcomes on the TEN (SPL) test in adults with hearing loss. J Am Ac Audiol. 2009;20(4):251-63.
- 99. Cox RM, Alexander GC, Johnson J, Rivera I. Coclear dead regions in typical hearing aid candidates: prevalence and implications for use of high-frequency speech cues. Ear Hear. 2011;32(3):339-48., dos quais muitos apresentam baixo índice de aceitação ao uso de próteses auditivas77. Preminger JE, Carpenter R, Ziegler CH. A clinical perspective on cochlear dead regions: intelligibility of speech and subjective hearing aid benefit. J Am Ac Audiol. 2005;16(8):600-13. , 1010. Eguti EY. Identificação das zonas mortas na cóclea utilizando a técnica do mascaramento com ruído branco [tese]. São Paulo (SP): Universidade Federal de São Paulo; 2002., autores ressaltam que é necessário cautela na amplificação de altas frequências em sujeitos com limiares auditivos superiores a 55dB NA1111. Ching TY, Dillon H, Byrne D. Speech recognition of hearing-impaired listeners: predictions from audibility and the limited role of high-frequency amplification. J Acoust Soc Am. 1998;103(2):1128-40. , 1212. Baer T, Moore BCJ, Kluk K. Effects of low pass filtering on the intelligibility of speech in quite for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2002;110(2):1164-74., uma vez que a amplificação excessiva de sons que não podem ser detectados por suas fibras auditivas correspondentes pode provocar a distorção da informação acústica. Em casos de possíveis ZMC, a indicação é de que a amplificação seja promovida apenas para frequências localizadas até 1,5 a 2 vezes acima daquela identificada com ZMC, caso contrário, o reconhecimento de fala dos sujeitos poderia ser prejudicado1212. Baer T, Moore BCJ, Kluk K. Effects of low pass filtering on the intelligibility of speech in quite for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2002;110(2):1164-74. , 1313. Vickers DA, Moore BCJ, Baer T. Effects of lowpass filtering on the intelligibility of speech in quiet for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2001;110(2):1164-75..

As limitações na amplificação das altas frequências e a sugestão de que, devido à neuroplasticidade, sujeitos com ZMC fariam uso mais efetivo da informação de baixas frequências no reconhecimento de fala55. Vestergaard M. Dead regions in the cochlea: implication for speech recognition and applicability of articulation index theory. Int J Audiol. 2003;42(5):249-61. , 66. Moore BCJ, Vinay SN. Enhanced discrimination of low-frequency sounds for subjects with high-frequency dead regions. Brain. 2009;132(2):524-36., faz pensar que próteses auditivas capazes de mover as informações acústicas de altas frequências para serem percebidas pelas baixas frequências tragam maior benefício à comunicação desses sujeitos.

Nesse contexto, inserem-se as próteses auditivas com compressão não linear de frequências (CNLF), uma tecnologia desenvolvida após vários outros métodos de rebaixamento de frequências que acabavam por causar distorções consideráveis do sinal de fala. Por permitir a escolha de uma frequência de corte (FC), a partir da qual a CNLF começará a atuar, essa tecnologia permite a preservação dos formantes naturais das baixas frequências, as quais não são afetadas pela compressão, mantendo a frequência fundamental da voz humana e causando menor distorção dos sons1414. Glista D, Scollie S, Bagatto M, Seewald R, Parsa V, Johnson A. Evaluation of nonlinear frequency compression: clinical outcomes. Int Jour Audiol. 2009;48(9):632-44. , 1515. Wolfe J, John A, Schafer E, Nyffeler M, Boretzki M, Caraway T. Evaluation of nonlinear frequency compression for school-age children with moderate to moderately severe hearing loss. J Am Acad Audiol. 2010;21(10):618-28..

O benefício proporcionado pela CNLF em pacientes com ZMC ainda não está esclarecido. Estudos com tecnologias que seguem o mesmo princípio da CNLF, como a transposição de frequências e a compressão de frequências de sons fricativos, mostram resultados discrepantes. Ora há melhora da identificação de fricativas, diminuição de erros frequentes e aumento da informação acústica transmitida ao paciente1616. Baskent D, Shannon RV. Frequency transposition around dead regions simulated with a noiseband vocoder. J Acoust Soc Am. 2006;119(2):1156-63.

17. Robinson JD, Baer T, Moore BCJ. Using transposition to improve consonante discrimination and detection for listeners with severe high frequency hearing loss. Int Journ Audiol. 2007;46(6):293-308.

18. Fraga FJ, Prates LPCS, Iorio MCM. Frequency Compression/Transposition of Fricative Consonants for the Hearing Impaired with High-Frequency Dead Regions. Proceedings of the 9th Annual Conference of the International Speech Communication Association (Interspeech); 2008 Sep 22-26; Bresbane, AUS. 2008.
- 1919. Fullgrabe C, Baer C, Moore BCJ. Effect of linear and warped spectral transposition on consonant identification by normal-hearing listeners with a simulated dead region. Int Journ Audiol. 2010;49(6):420-33., ora nenhuma melhora no reconhecimento de fala é observado1616. Baskent D, Shannon RV. Frequency transposition around dead regions simulated with a noiseband vocoder. J Acoust Soc Am. 2006;119(2):1156-63.

17. Robinson JD, Baer T, Moore BCJ. Using transposition to improve consonante discrimination and detection for listeners with severe high frequency hearing loss. Int Journ Audiol. 2007;46(6):293-308.

18. Fraga FJ, Prates LPCS, Iorio MCM. Frequency Compression/Transposition of Fricative Consonants for the Hearing Impaired with High-Frequency Dead Regions. Proceedings of the 9th Annual Conference of the International Speech Communication Association (Interspeech); 2008 Sep 22-26; Bresbane, AUS. 2008.

19. Fullgrabe C, Baer C, Moore BCJ. Effect of linear and warped spectral transposition on consonant identification by normal-hearing listeners with a simulated dead region. Int Journ Audiol. 2010;49(6):420-33.
- 2020. Robinson JD, Stainsby TH, Baer T, Moore BCJ. Evaluation of a frequency transposition algorithm using wearable hearing aids. Int Journ Audiol. 2009;48(6):384-93..

Por todo exposto, tendo em vista o estabelecimento de melhores práticas nos ajustes de próteses auditivas para sujeitos com ZMC, este estudo tem o objetivo de avaliar e comparar o desempenho de idosos sem e com ZMC em testes de reconhecimento de fala, no silêncio e no ruído, usando próteses auditivas sem e com a ativação do algoritmo de compressão não linear de frequências.

Métodos

A presente pesquisa tem caráter quantitativo, do tipo observacional descritivo e de corte transversal. Foi realizada no Laboratório de Próteses Auditivas (LPA) da Instituição de origem, registrada no Gabinete de Projetos com o no 032630 e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição com certificado no 05765712.3.0000.5346. Todos os participantes do estudo receberam uma explicação completa sobre a natureza, objetivo e procedimentos e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Foi realizado um levantamento de dados pessoais e audiológicos de 275 prontuários de sujeitos que chegaram ao Núcleo de Seleção e Adaptação de Próteses Auditivas (NUSEAPA) para dar início ao processo de seleção e adaptação de próteses auditivas no período de agosto de 2012 a janeiro de 2013.

No momento da análise dos prontuários foram considerados como critérios de inclusão da amostra: ter idade entre 19 e 60 anos ou acima 60 anos, considerados adultos e idosos, respectivamente, pela classificação da Organização Mundial de Saúde2121. Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO). [Homepage na Internet]. [acesso em: 2012 jun 11. Disponível em: http://www.who.int/en/.
http://www.who.int/en/...
; apresentar perda auditiva de grau leve a moderado2222. Lloyd LL, Kaplan H. Audiometric interpretation: a manual of basic audiometry. Baltimore: University Park Press, 1978. e configuração descendente2323. Silman S, Silverman CA. Auditory diagnostics: principles and applications. San Diego: Singular, 1997. adquirida no período pós-lingual; apresentar Índice Percentual de Reconhecimento de Fala (IPRF) sem próteses auditivas de, no mínimo, 60% e nunca ter usado próteses auditivas.

Com base nestes critérios, 55 sujeitos, sendo seis adultos, com idade entre 19 e 60 anos, e 49 idosos, com mais de 60 anos de idade foram contatados por telefone para participar da pesquisa e agendar a consulta para as avaliações. A coleta de dados ocorreu no período de outubro de 2012 a março de 2013.

Os adultos passaram por todos os procedimentos previstos para realização da pesquisa, porém devido ao número reduzido de sujeitos desta faixa etária, visando à homogeneidade da amostra e considerando as particularidades atualmente destacadas na adaptação de próteses auditivas em idosos, optou-se por incluir no estudo final apenas sujeitos com idade acima de 60 anos.

Os sujeitos foram submetidos à aplicação do Mini Exame do Estado Mental (MEEM), com o intuito de detectar possíveis alterações cognitivas que pudessem influenciar nos resultados dos exames2424. Folstein MF, Folstein SE, Mchugh PR. Mini-mental state. A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr Res. 1975;12(3):189-98.. A escolha do referido exame justifica-se por ser considerado um instrumento de rastreamento da função cognitiva de fácil e rápida aplicação, não sendo necessário nenhum material específico. Além de fornecer informações sobre diferentes parâmetros cognitivos, é um dos poucos testes validados e adaptados para a população brasileira.

Além disso, todos passaram por anamnese e inspeção visual do meato acústico externo. Ainda, sujeitos que apresentaram perda auditiva neurossensorial com limiares maiores que 90dB NA nas frequências altas e/ou perda auditiva descendente, com diferença entre limiares maior que 50dB por oitava, critérios estabelecidos como indícios de possíveis ZMC2525. Moore BCJ. Dead region in the cochlea: diagnosis, perceptual consequences and implications for the fitting of hearing aids. Trends amplif. 2001;5(1):34., foram avaliados para identificação de ZMC por meio da técnica de mascaramento com ruído branco1010. Eguti EY. Identificação das zonas mortas na cóclea utilizando a técnica do mascaramento com ruído branco [tese]. São Paulo (SP): Universidade Federal de São Paulo; 2002..

Após essa fase, foram iniciados os procedimentos com o uso das próteses auditivas, que consistiram na verificação dos ajustes das próteses auditivas por meio das mensurações com microfone sonda e aplicação do teste Listas de Sentenças em Português (LSP) 2626. Costa MJ. Listas de sentenças em português: apresentação de estratégias de aplicação na audiologia. Santa Maria: Pallotti.1998..

Considerando a afirmação de que orelhas sem e com ZMC apresentam diferentes respostas a testes de fala66. Moore BCJ, Vinay SN. Enhanced discrimination of low-frequency sounds for subjects with high-frequency dead regions. Brain. 2009;132(2):524-36., uma vez que o LSP foi realizado de forma binaural, optou-se por excluir da amostra sujeitos idosos que apresentaram indícios de ZMC em apenas uma orelha. Assim, foram excluídos do estudo: sujeitos com idade igual ou inferior a 60 anos, com histórico de alteração neurológica, fatores cognitivos e/ou articulatórios que interferissem na avaliação, excesso de cerúmen ou outras alterações no meato acústico externo observado durante a inspeção visual do meato acústico e indícios de presença de ZMC em apenas uma orelha.

Seguindo os critérios estabelecidos e após a identificação de sujeitos com possíveis ZMC, eles foram distribuídos em dois grupos da seguinte forma:

Grupo A: 24 sujeitos sem indícios de ZMC, com idade entre 61 e 83 anos, sendo sete do gênero feminino e 17 do masculino;

Grupo B: 14 sujeitos com indícios de ZMC, com idade entre 69 e 84 anos, sendo cinco do gênero feminino e nove do masculino.

Como estabelecido nos critérios de inclusão, todos os sujeitos apresentaram perda auditiva de configuração descendente (Figura 1).

Figura 1:
Média e desvio padrão dos limiares tonais da melhor orelha dos sujeitos do grupo A e do grupo B

A seguir, serão descritos os procedimentos de classificação dos grupos com a identificação de zonas mortas na cóclea por meio da técnica de mascaramento com ruído branco, a programação das próteses auditivas e a coleta dos dados com a aplicação do teste LSP.

Classificação dos sujeitos nos grupos: identificação das zonas mortas na cóclea utilizando a técnica de mascaramento com ruído branco

Essa técnica1010. Eguti EY. Identificação das zonas mortas na cóclea utilizando a técnica do mascaramento com ruído branco [tese]. São Paulo (SP): Universidade Federal de São Paulo; 2002. apresentou concordância muito forte com os critérios supracitados indicativos de possíveis ZMC2525. Moore BCJ. Dead region in the cochlea: diagnosis, perceptual consequences and implications for the fitting of hearing aids. Trends amplif. 2001;5(1):34. e mostrou que o ruído branco tem efeito similar ao ruído de equalização do limiar (TEN) 2727. Moore BCJ, Huss M, Vickers DA, Glasberg BR, Alcantara JI. A test for diagnosis of dead regions in the cochlea. Br J Audiol. 2000;34(4):205-24., o qual é reconhecido internacionalmente como um método simples e eficaz na identificação de possíveis ZMC. Por isso, o teste de mascaramento com ruído branco é considerado uma alternativa confiável para a identificação de possível presença de ZMC.

As medidas foram realizadas em cabine acusticamente tratada, utilizando um audiômetro digital de dois canais, marca Fonix Hearing Evaluator, modelo FA 12 tipo I e fones auriculares tipo TDH-39P, marca Telephonics.

O teste consiste na apresentação simultânea e ipsilateral de ruído branco ao tom puro, ou seja, os dois sons foram apresentados à mesma orelha, enquanto eram pesquisados os limiares mascarados nas frequências que apresentaram os critérios de indicação de possíveis ZMC. Como indicado pela autora do teste, para torná-lo mais curto e menos cansativo, optou-se por utilizar o nível de apresentação do ruído apenas a 70dB NA1010. Eguti EY. Identificação das zonas mortas na cóclea utilizando a técnica do mascaramento com ruído branco [tese]. São Paulo (SP): Universidade Federal de São Paulo; 2002..

Quando os limiares mascarados obtidos foram, no mínimo, 10dB acima do limiar absoluto e do nível de mascaramento utilizado, o resultado foi considerado indicativo de presença de ZMC2727. Moore BCJ, Huss M, Vickers DA, Glasberg BR, Alcantara JI. A test for diagnosis of dead regions in the cochlea. Br J Audiol. 2000;34(4):205-24..

Programação das próteses auditivas

Considerando o fato de todos os participantes da pesquisa apresentarem perda auditiva descendente bilateral, foram programadas, para cada paciente, duas próteses auditivas sem a ativação do algoritmo de CNLF e duas com a ativação desse recurso. As próteses auditivas utilizadas eram da mesma marca e modelo e se caracterizaram por ser do tipo retroauricular, de tecnologia digital com 6 canais de ajuste, com saída e ganho máximo de 128 dB e 58 dB (acoplador de 2 cc), respectivamente. Essas próteses auditivas possuem recurso de ativação ou desativação da CNLF e disponibilizam dois parâmetros para ajuste, regulados conjuntamente, desse algoritmo: a FC, que pode ser escolhida de 1,5 a 6 KHz e a razão de compressão (RC), a qual varia de 1,5:1 a 4:1.

A programação foi realizada antes da chegada do sujeito para atendimento por meio do acesso ao software da empresa responsável pela fabricação das próteses auditivas utilizadas no estudo. Adotou-se a regra prescritiva NAL-NL1 para definição dos ajustes das próteses auditivas. As regulagens de ganho e saída máxima por frequência, bem como o ajuste da FC e RC referentes à CNLF, foram realizados por meio do ajuste rápido do software, que supõe as melhores regulagens possíveis para as características audiológicas do sujeito em questão. Apenas o recurso de cancelamento de microfonia foi mantido, sendo os demais algoritmos desativados. Assim que ligadas as próteses auditivas foram programadas para funcionar em programa de silêncio e com microfone omnidirecional. Ressalta-se que o único diferencial entre os dois pares de próteses auditivas utilizadas neste estudo foi a ativação ou não da CNLF.

A fim de verificar os ajustes das próteses auditivas e a desativação/ativação do algoritmo de CNLF, foram realizadas mensurações com microfone sonda antes do início dos testes. Além disso, em todos os casos, a adaptação das próteses auditivas foi realizada com moldes auriculares do tipo invisível simples de acrílico e o tamanho da ventilação determinado conforme a configuração audiométrica de cada sujeito.

Teste Listas de Sentenças em Português (LSP)

O LSP2626. Costa MJ. Listas de sentenças em português: apresentação de estratégias de aplicação na audiologia. Santa Maria: Pallotti.1998. é constituído por uma lista de 25 sentenças, sete listas de dez sentenças e um ruído com espectro de fala, estando as sentenças e o ruído gravados em CD, em canais independentes, permitindo sua apresentação tanto no silêncio quanto no ruído. O teste permite a obtenção do Limiar de Reconhecimento de Sentenças no Silêncio (LRSS), do Índice Percentual de Reconhecimento de Sentenças no Silêncio (IPRSS), do Limiar de Reconhecimento de Sentenças no Ruído (LRSR) e do Índice Percentual de Reconhecimento de Sentenças no Ruído (IPRSR).

As medidas foram realizadas em campo livre, em cabine acusticamente tratada, utilizando audiômetro da mesma marca e modelo supracitados. As sentenças foram apresentadas utilizando-se um Compact Disc Player Digital Toshiba, modelo 4149, acoplado ao audiômetro.

Com o intuito de que as condições de apresentação fossem mantidas constantes, antes de iniciar o teste realizou-se a calibração da saída de cada canal do VU-meter do audiômetro, utilizando-se como referência o tom puro presente na primeira faixa do CD. Para calibração do ruído, tanto o tom puro presente no canal um, quanto o ruído presente no canal dois, foram colocados no nível zero.

Para pesquisa do LRSS e do LRSR, a aplicação do material foi realizada por meio do procedimento denominado "estratégia sequencial, adaptativa ou ascendente-descendente" 2828. Levitt H, Rabiner LR. Use of a sequential strategy in intelligibility testing. J Acoust Soc Am. 1967;42(3):609-12., que permite determinar o limiar de reconhecimento de fala, ou seja, o nível necessário para o sujeito identificar corretamente em torno de 50% dos estí mulos de fala apresentados em uma determinada condição. Seguindo essa estratégia, quando o sujeito é capaz de reconhecer corre tamente o estímulo de fala apresentado, a intensi dade desse é diminuída, caso contrário, sua intensidade é aumentada. Uma resposta só é considerada correta quando o sujeito repetir, sem nenhum erro ou omissão, toda a sentença apresentada.

Os intervalos de apresentação das sentenças recomendados na literatura2828. Levitt H, Rabiner LR. Use of a sequential strategy in intelligibility testing. J Acoust Soc Am. 1967;42(3):609-12. são de 4 dB nas primeiras frases, até a primeira mudança no tipo de resposta, posteriormente são de 2 dB. Contudo, o equipamento utilizado para esta pesquisa não apresentava a possibilidade de intervalos de 4 e 2 dB, portanto, foram utilizados intervalos de 5 e 2,5 dB respectivamente. Os valores de apresentação de cada frase foram anotados no protocolo de exame, para, então, serem calculadas as médias com base nas intensidades de apresentação das sentenças a partir da primeira mudança no tipo de resposta.

Como foi observada pela autora do material a existência de uma diferença de 7 dB entre a fala e o ruído (fala abaixo do ruído), adotou-se, como procedimento para o cálculo do LRSS e LRSR, a subtração de 7 dB dos valores de fala registrados e observados no dial do equipamento.

Esse procedimento foi utilizado tanto para a pesquisa dos limiares no silêncio como no ruído. No teste com ruído compe titivo, esse foi mantido constante em 65 dB NPS (A).

É importante salientar que os LRSS e LRSR foram pesquisados apenas para servir de referência para determinar a intensidade na qual seriam pesquisados os IPRSS e IPRSR.

Para obtenção dos IPRSS e IPRSR, a intensidade de apresentação das sentenças foi mantida fixa no limiar encontrado na pesquisa do LRSS e do LRSR de cada indivíduo quando esse estava usando as próteses auditivas sem a ativação do algoritmo de CNLF. Uma lista de sentenças foi apresentada em cada condição e, durante a aplicação do teste, as respostas dos indivíduos foram anotadas em um protocolo que permitiu a análise dos índices considerando como erro somente a(s) palavra(s) omitida(s) ou repetida(s) de maneira incorreta. Dessa forma, uma vez que cada palavra dentro de cada lista corresponde a uma porcentagem de acerto, totalizando 100% em cada lista, os resultados dos índices são expostos em termos percentuais2929. Costa MJ, Santos SN, Lessa AH, Mezzomo CL. Nova proposta de cálculo do índice percentual de reconhecimento de sentenças. CoDAS. No prelo2014..

Todas as medidas do teste LSP foram realizadas com uso de próteses auditivas, sendo pesquisado o LRSS, LRSR, IPRSS, IPRSS primeiro com as próteses auditivas sem CNLF e, após, pesquisados o IPRSS e IPRSR com as próteses com CNLF. Para maior esclarecimento, as medidas que se referem àquelas realizadas com as próteses auditivas sem a ativação da CNLF serão seguidas das iniciais SC, sendo as realizadas com próteses auditivas com a ativação do algoritmo representadas pelas letras CC.

Inicialmente os sujeitos foram avaliados com as próteses auditivas sem a ativação da CNLF. Antes de dar início à avaliação propriamente dita, foi realizado treinamento para familiarização com o teste por meio das cinco primeiras sentenças da lista 7B sem a presença de ruído competitivo. Para facilitar o reconhecimento da primeira sentença de cada lista, a fim de garantir a compreensão do teste, a intensidade inicial de apresentação das sentenças no silêncio para treinamento foi de 10 a 20 dB acima do Limiar de Reconhecimento de Fala (LRF) 3030. Henriques MO, Miranda EC, Costa MJ. Limiares de reconhecimento de sentenças no ruído, em campo livre: valores de referência para adultos normo-ouvintes. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(2):188-92.. A seguir, as dez primeiras sentenças da lista 1A foram utilizadas para a pesquisa do LRSS SC. Com a intensidade fixa no valor encontrado no LRSS SC, foi procedida a pesquisa do IPRSS SC com a aplicação da lista 1B.

Ainda usando as próteses auditivas sem a ativação da CNLF, foram obtidas as medidas na presença de ruído competitivo a uma intensidade constante de 65dB NPS (A). As cinco últimas sentenças da lista 7B foram aplicadas como treinamento com a presença de ruído competitivo. A intensidade inicial de apresentação das sentenças nesse caso foi de 10 a 20 dB acima do ruído. Após o treinamento, a lista 2B foi apresentada para a pesquisa do LRSR SC. Com a intensidade fixa no valor encontrado no LRSR SC, o IPRSR SC foi pesquisado por meio da lista 3B.

Em seguida, as medidas foram realizadas, seguindo os mesmos parâmetros para avaliação com as próteses auditivas com a ativação da CNLF. O treinamento foi realizado com as mesmas sentenças, tanto no silêncio quanto no ruído já que, por tratar-se de um treinamento, a repetição das sentenças não influenciaria nos resultados. Portanto, após o treinamento no silêncio, procedeu-se a pesquisa do IPRSS CC, utilizando-se a lista 4B. A fim de manter a mesma intensidade de teste da condição sem a ativação da CNLF e posterior comparação entre resultados, o IPRSS CC foi pesquisado na intensidade encontrada na pesquisa do LRSS SC. A seguir, foi realizado o treinamento na condição de ruído para, então, obter-se o IPRSR CC por meio da apresentação da lista 6B. Da mesma forma que no silêncio, para obtenção do IPRSR CC, a intensidade foi fixada no valor encontrado no LRSR SC.

A fim de evitar efeitos de rotulação semelhantes aos efeitos placebo, realizou-se cegamento da amostra quanto às próteses auditivas que estavam sendo avaliadas em cada momento, ou seja, o sujeito não sabia se estava sendo avaliado com próteses auditivas com ou sem a ativação da CNLF, apesar de o examinador ter conhecimento dessas informações.

Análise dos dados

Os dados foram analisados descritivamente e receberam tratamento estatístico, utilizando o programa Statistica versão 9.0. Para verificar a normalidade das variáveis, foi aplicado o teste Shapiro-Wilk.

Dois tipos de análises foram realizadas: comparação entre os grupos A e B, separadamente e entre si nas condições CC e SC. Para análise dos grupos separadamente, foram utilizados os testes T pareado para duas amostras dependentes ou Wilcoxon, de acordo com a normalidade apresentada pela variável. Já para a análise entre os grupos, utilizou-se o Teste t para variáveis independentes.

Considerou-se nível de significância estatística de p< 0,05 (5%), sendo os resultados que mostraram significância assinalados por um (*) asterisco. Para enriquecimento da discussão do estudo, níveis de significância de 0,5< p < 0,1 (10%) foram tratados como tendência estatística, tendo sido destacados com dois (**) asteriscos.

Resultados

Na Tabela 1, são apresentadas as medidas descritivas e testes comparativos dos IPRSS e IPRSR dos sujeitos do grupo A usando próteses auditivas SC e CC.

Tabela 1:
Distribuição dos indivíduos do grupo a (sem ZMC) quanto aos resultados do índice percentual de reconhecimento de sentenças no silêncio e no ruído usando próteses auditivas sem e com compressão de frequências

O grupo A (sem ZMC) apresentou tendência estatística de diferença no desempenho entre os IPRSS obtidos usando próteses auditivas SC e CC, sendo as últimas as que proporcionaram melhores resultados. No entanto, não houve diferença estatisticamente significante entre o uso de próteses auditivas SC e CC na tarefa de reconhecimento de fala no ruído.

Na Tabela 2, são apresentadas as medidas descritivas e testes comparativos dos IPRSS e IPRSR de sujeitos do grupo B usando próteses auditivas SC e CC.

Tabela 2:
Distribuição dos indivíduos do grupo b (com ZMC) quanto aos resultados do índice percentual de reconhecimento de sentenças no silêncio e no ruído usando próteses auditivas sem e com compressão de frequências

O grupo B (com ZMC) apresentou tendência estatística de diferença no desempenho entre os IPRSS obtidos usando próteses auditivas SC e CC, sendo as últimas as que proporcionaram melhores resultados. No entanto, não houve diferença estatisticamente significante entre o uso de próteses auditivas SC e CC na tarefa de reconhecimento de fala no ruído.

As Figuras 2 e 3 apresentam os IPRSS e IPRSR de cada indivíduo, do grupo A e do grupo B, usando próteses auditivas SC e CC.

Figura 2:
Comparação entre o índice percentual de reconhecimento de sentenças no silêncio de cada indivíduo, do grupo A e B, usando próteses auditivas sem e com compressão de frequências

Figura 3:
Comparação entre o entre o índice percentual de reconhecimento de sentenças no ruído de cada indivíduo, do grupo A e B, usando próteses auditivas sem e com compressão de frequências

Na Tabela 3, são apresentadas as medidas descritivas dos IPRSS e IPRSR, obtidas usando próteses auditivas SC e CC, dos grupos A e B, bem como os resultados dos testes comparativos entre os grupos em cada medida.

Tabela 3:
Comparação dos indivíduos dos grupos A e B quanto aos resultados do índice percentual de reconhecimento de sentenças no silêncio e no ruído usando próteses auditivas sem e com compressão de frequências

Comparando-se o os resultados do grupo A (sem ZMC) e B (com ZMC) nas medidas obtidas por meio do LSP realizadas usando próteses auditivas SC e CC, observou-se que não houve diferença estatisticamente significante de desempenho entre os grupos no IPRSS SC e no IPRSS CC. Já o IPRSR SC apresentou diferença estatisticamente significante entre os grupos, sendo o desempenho do grupo B (com ZMC) melhor do que do grupo A (sem ZMC). Os resultados do IPRSR CC não apresentaram diferença estatisticamente significante entre os grupos.

Discussão

Sabe-se que, no cotidiano da prática clínica de audiologistas, os testes para identificação de ZMC não fazem parte da bateria clássica de procedimentos a serem realizados. Ainda assim, muitos desses profissionais atentam para as características do audiograma de seus pacientes que, se apresentarem indícios de possíveis ZMC, como limiares auditivos acima de 90 dB NA, podem interferir na escolha das regulagens das próteses auditivas a serem adaptadas.

Desse modo, para que não ocorra simplesmente a perda das informações acústicas de altas frequências, pela não amplificação dessa região, nos casos de sujeitos com ZMC, pode ser considerada a utilização de métodos de rebaixamento de frequências para que o sinal de altas frequências seja percebido por aquelas com melhores limiares auditivos.

No presente estudo, verificou-se que, em situação de silêncio, a CNLF apresentou tendência estatística para favorecer o reconhecimento de fala em sujeitos com perda auditiva de configuração descendente de forma geral, independentemente de eles apresentarem ou não ZMC (Tabela 1 e 2). Esses resultados concordam com estudos realizados em sujeitos sem e com ZMC, nos quais a audibilidade e o reconhecimento de monossílabos, consoantes, plural e/ou fricativos no silêncio apresentaram melhores resultados com o uso de técnicas de rebaixamento de frequências1414. Glista D, Scollie S, Bagatto M, Seewald R, Parsa V, Johnson A. Evaluation of nonlinear frequency compression: clinical outcomes. Int Jour Audiol. 2009;48(9):632-44. , 1515. Wolfe J, John A, Schafer E, Nyffeler M, Boretzki M, Caraway T. Evaluation of nonlinear frequency compression for school-age children with moderate to moderately severe hearing loss. J Am Acad Audiol. 2010;21(10):618-28. , 1717. Robinson JD, Baer T, Moore BCJ. Using transposition to improve consonante discrimination and detection for listeners with severe high frequency hearing loss. Int Journ Audiol. 2007;46(6):293-308. , 1818. Fraga FJ, Prates LPCS, Iorio MCM. Frequency Compression/Transposition of Fricative Consonants for the Hearing Impaired with High-Frequency Dead Regions. Proceedings of the 9th Annual Conference of the International Speech Communication Association (Interspeech); 2008 Sep 22-26; Bresbane, AUS. 2008. , 2020. Robinson JD, Stainsby TH, Baer T, Moore BCJ. Evaluation of a frequency transposition algorithm using wearable hearing aids. Int Journ Audiol. 2009;48(6):384-93.. Destaca-se ainda que o n da corrente pesquisa foi estabelecido por meio de cálculo amostral, tendo como base artigos internacionais, que na sua maioria possuem amostras menores1414. Glista D, Scollie S, Bagatto M, Seewald R, Parsa V, Johnson A. Evaluation of nonlinear frequency compression: clinical outcomes. Int Jour Audiol. 2009;48(9):632-44. , 1515. Wolfe J, John A, Schafer E, Nyffeler M, Boretzki M, Caraway T. Evaluation of nonlinear frequency compression for school-age children with moderate to moderately severe hearing loss. J Am Acad Audiol. 2010;21(10):618-28. , 1717. Robinson JD, Baer T, Moore BCJ. Using transposition to improve consonante discrimination and detection for listeners with severe high frequency hearing loss. Int Journ Audiol. 2007;46(6):293-308. , 2020. Robinson JD, Stainsby TH, Baer T, Moore BCJ. Evaluation of a frequency transposition algorithm using wearable hearing aids. Int Journ Audiol. 2009;48(6):384-93. do que a do estudo que se apresenta.

Em relação a esses resultados, o que se constatou foi que a maior audibilidade proporcionada pelo aumento da informação acústica transmitida ao paciente, decorrente da compressão das altas frequências para serem percebidas pelas baixas frequências, fez com que os sujeitos, sem e com ZMC, tivessem percentuais mais altos no reconhecimento de fala do que os obtidos com a amplificação convencional.

No caso dos pacientes sem ZMC, essa vantagem observada com o uso do algoritmo pode estar relacionada a uma série de limitações apresentadas pelas próteses auditivas convencionais, como a restrita largura na banda de frequências possíveis de serem amplificadas, limitações de ganho e saída máxima, além do risco de microfonia ou relato de desconforto1515. Wolfe J, John A, Schafer E, Nyffeler M, Boretzki M, Caraway T. Evaluation of nonlinear frequency compression for school-age children with moderate to moderately severe hearing loss. J Am Acad Audiol. 2010;21(10):618-28. , 3131. Bohnert A, Nyffeler M, Kelmann A. Advantages of a non-linear frequency compression algorithm in noise. Eur Arc Otorhinolaryngol. 2010;267(7):1045-53.. Com o uso da CNLF, esses aspectos são superados, e os sinais de altas frequências tornam-se audíveis, apesar do algoritmo provocar o surgimento de certos artefatos que levam à distorção de determinados sons1717. Robinson JD, Baer T, Moore BCJ. Using transposition to improve consonante discrimination and detection for listeners with severe high frequency hearing loss. Int Journ Audiol. 2007;46(6):293-308. , 2020. Robinson JD, Stainsby TH, Baer T, Moore BCJ. Evaluation of a frequency transposition algorithm using wearable hearing aids. Int Journ Audiol. 2009;48(6):384-93. , 3232. Simpson A, Hersbach AA, Mcdermott HJ. Frequency-compression outcomes in listeners with steeply sloping audiograms. Int J Audiol. 2006;45(11):619-29.. Ainda assim, no silêncio essas distorções parecem não influenciar no benefício proporcionado pelo algoritmo.

No caso dos pacientes com ZMC, alguns autores afirmam que a amplificação convencional de altas frequências pode não trazer benefícios ou até mesmo prejudicar seu reconhecimento de fala77. Preminger JE, Carpenter R, Ziegler CH. A clinical perspective on cochlear dead regions: intelligibility of speech and subjective hearing aid benefit. J Am Ac Audiol. 2005;16(8):600-13. , 1212. Baer T, Moore BCJ, Kluk K. Effects of low pass filtering on the intelligibility of speech in quite for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2002;110(2):1164-74. , 1313. Vickers DA, Moore BCJ, Baer T. Effects of lowpass filtering on the intelligibility of speech in quiet for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2001;110(2):1164-75.. Como o presente estudo não realizou medidas sem o uso de próteses auditivas, não se pode assegurar que os efeitos proporcionados por esse tipo de amplificação foram benéficos ou maléficos aos sujeitos com ZMC. De qualquer forma, analisando-se os achados, acredita-se que, na maioria dos casos, tanto a amplificação convencional quanto a com CNLF forneceram algum grau de melhora no reconhecimento de fala dos sujeitos, sendo esse maior com o uso do algoritmo.

Os resultados obtidos são coerentes com a afirmação de que, para pacientes com ZMC, a amplificação deve ser promovida preferencialmente para frequências localizadas até 1,5 a 2 vezes acima da primeira frequência identificada com ZMC1212. Baer T, Moore BCJ, Kluk K. Effects of low pass filtering on the intelligibility of speech in quite for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2002;110(2):1164-74. , 1313. Vickers DA, Moore BCJ, Baer T. Effects of lowpass filtering on the intelligibility of speech in quiet for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2001;110(2):1164-75.. É nessa faixa de frequências que o sinal acústico passa a ser detectado após ser comprimido, promovendo, no silêncio, bons resultados para o reconhecimento de fala.

No ruído (Tabela 1 e 2), os achados indicaram que não houve diferença estatisticamente significante de desempenho usando próteses auditivas sem e com CNLF, tanto no grupo A (sem ZMC) quanto no grupo B (com ZMC), concordando com a literatura da área1515. Wolfe J, John A, Schafer E, Nyffeler M, Boretzki M, Caraway T. Evaluation of nonlinear frequency compression for school-age children with moderate to moderately severe hearing loss. J Am Acad Audiol. 2010;21(10):618-28. , 2020. Robinson JD, Stainsby TH, Baer T, Moore BCJ. Evaluation of a frequency transposition algorithm using wearable hearing aids. Int Journ Audiol. 2009;48(6):384-93. , 3232. Simpson A, Hersbach AA, Mcdermott HJ. Frequency-compression outcomes in listeners with steeply sloping audiograms. Int J Audiol. 2006;45(11):619-29. , 3333. Kuk F, Keenan D, Korhonen P, Lau CC. Efficacy of linear frequency transposition on consonant identification in quiet and in noise. J Am Acad Audiol. 2009;20(8):465-79.. Nessa condição, os resultados obtidos com o uso da CNLF podem ter sido limitados pelo fato de o algoritmo não tornar audível apenas os sinais de fala, mas também o ruído de altas frequências1515. Wolfe J, John A, Schafer E, Nyffeler M, Boretzki M, Caraway T. Evaluation of nonlinear frequency compression for school-age children with moderate to moderately severe hearing loss. J Am Acad Audiol. 2010;21(10):618-28.. Com isso, pode-se pensar que a relação S/R promovida ainda não é suficiente para melhorar o reconhecimento de fala desses sujeitos. Com base nos resultados, acredita-se que esses efeitos afetem igualmente sujeitos sem e com ZMC.

Analisando-se a Figura 2, que representa os resultados individualmente obtidos no silêncio, considerando inicialmente os sujeitos sem ZMC, dois idosos tiveram desempenho semelhante usando próteses auditivas sem ou com a ativação da CNLF, 12 idosos melhoraram e dez pioraram com a ativação da CNLF. Os dados obtidos com os 14 sujeitos com ZMC no mesmo teste tiveram a mesma proporção de indivíduos (dois) que apresentaram desempenho semelhante sem ou com a ativação da CNLF, nove idosos melhoraram e três pioraram com o uso do algoritmo.

Ressalta-se que foi realizada uma análise dos dados referentes à pontuação obtida na triagem cognitiva, à escolaridade e ao tempo da perda auditiva, mas nenhuma diferença significante foi encontrada entre os grupos.

Em ambos os grupos, 50% ou mais dos sujeitos melhoraram seu reconhecimento de fala em algum nível com o uso de próteses auditivas com CNLF e em nenhum caso a piora ultrapassou 20%. No caso de pacientes com ZMC, a extensão da melhora observada foi considerável para alguns sujeitos, estando os achados compatíveis com a ideia de que pacientes com essas características tendem a habituar-se à CNLF mais rapidamente do que os sujeitos sem ZMC2020. Robinson JD, Stainsby TH, Baer T, Moore BCJ. Evaluation of a frequency transposition algorithm using wearable hearing aids. Int Journ Audiol. 2009;48(6):384-93.. Os resultados e a afirmação acima se explicam pelo fato de que sujeitos com ZMC já estão diariamente expostos a um rebaixamento de frequências natural, uma vez que a detecção de sinais de entrada com frequência correspondente às ZMC é realizada por regiões vizinhas, enquanto o grupo sem ZMC teria de se acostumar com o novo processamento do sinal.

Além disso, considerando o fato da melhora já ser percebida em metade dos sujeitos de forma imediata, acredita-se que o percentual de idosos beneficiados com o uso da CNLF no presente estudo possa, após algum tempo de aclimatização, ser ainda maior, conforme já observado em estudos anteriores1414. Glista D, Scollie S, Bagatto M, Seewald R, Parsa V, Johnson A. Evaluation of nonlinear frequency compression: clinical outcomes. Int Jour Audiol. 2009;48(9):632-44. , 3333. Kuk F, Keenan D, Korhonen P, Lau CC. Efficacy of linear frequency transposition on consonant identification in quiet and in noise. J Am Acad Audiol. 2009;20(8):465-79. , 3434. Wolfe J, John A, Schafer E, Nyffeler M, Boretzki M, Caraway T et al. Long-term effects of non-linear frequency compression for children with moderate hearing loss. Int J Audiol. 2011;50(6):396-404..

Na situação de ruído (Figura 3), dos 24 sujeitos do grupo A (sem ZMC), dois apresentaram resultados semelhantes com a amplificação convencional e com CNLF, 13 melhoraram e nove pioraram com a ativação do recurso. Considerando os sujeitos do grupo B (com ZMC), seis melhoraram e oito pioraram com o uso de CNLF.

O percentual de sujeitos que apresentaram algum grau de melhora no IPRSR se manteve semelhante ao verificado no IPRSS, cerca de 50%, mas o que se observou foi que a extensão de melhora foi menor do que a observada no silêncio, especialmente no grupo B (com ZMC), em que um sujeito teve percentual relevante de piora.

Deve-se destacar que, além da questão previamente comentada quanto ao aumento da audibilidade tanto dos sinais de fala quanto do ruído após o uso da CNLF, neste estudo deve-se levar em consideração o fato de a amostra ser composta exclusivamente de idosos. Indivíduos dessa faixa etária apresentam naturalmente maior dificuldade no reconhecimento de sinais distorcidos e/ou em meio a ruído de fundo, decorrente de modificações no processamento auditivo das informações3535. Janse E. Processing of fast speech by elderly listeners. J Acoust Soc Am. 2009;125(4):2361-73. , 3636. Gonçales AS, Cury MCL. Avaliação de dois testes auditivos centrais em idosos sem queixas. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77(1):24-32.. Os achados do presente estudo concordam com a consideração acima exposta, visto que, mesmo com o sinal distorcido, os idosos conseguiram beneficiar-se do aumento da informação acústica transmitida pelo uso da CNLF no silêncio, mas isso não ocorreu no ruído.

Assim, a soma da distorção do sinal de fala, do ruído competitivo e da maior dificuldade de idosos em reconhecer o sinal de fala nessas situações pode ter limitado o benefício da CNLF no reconhecimento de fala no ruído dos idosos deste estudo. Por isso, deve ser levada em consideração no momento da escolha pela amplificação convencional ou com CNLF, a qual deve ser realizada cuidadosamente.

Ressalta-se ainda que o p-valor encontrado nas análises (p<0,1) e a variabilidade de resultados apresentados entre os sujeitos sugerem a necessidade de realização de novos estudos, preferencialmente com amostras maiores, para que possa ocorrer uma possível inferência e generalização de resultados.

Partindo para a comparação dos resultados do grupo A com o grupo B (Tabela 3), observou-se que não houve diferença estatisticamente significante entre o desempenho dos grupos na condição IPRSS SC, ou seja, ambos os grupos apresentaram resultados semelhantes usando próteses auditivas sem CNLF. Esses resultados vão ao encontro de estudos que afirmam que a amplificação convencional de altas frequências pode trazer benefícios tanto para sujeitos sem, quanto para sujeitos com ZMC, apesar desses benefícios serem mais evidentes para os do primeiro grupo99. Cox RM, Alexander GC, Johnson J, Rivera I. Coclear dead regions in typical hearing aid candidates: prevalence and implications for use of high-frequency speech cues. Ear Hear. 2011;32(3):339-48. , 3737. Mackersie CL, Crocker TL, Davis RA. Limiting high-frequency hearing aid gain in listeners with and without suspected cochlear dead regions. J Am Acad Audiol. 2004; 15(7): 498-507..

Um dos fatores que pode ter contribuído para o resultado positivo apresentado, principalmente pelo grupo de sujeitos com ZMC, pode estar relacionado à regra prescritiva utilizada no presente estudo. Pensando-se na adaptação de próteses auditivas em pacientes com perda auditiva de configuração descendente acentuada, a NAL-NL1 é uma regra que se difere das outras por prescrever mínima amplificação às altas frequências3838. Martin RL. How much do you amplify a severely damaged zone? Hear J. 2001;54(4):88-90., baseada em achados de estudos que indicaram que a amplificação excessiva de altas frequências não contribui para o reconhecimento de fala de sujeitos com tais configurações audiométricas1111. Ching TY, Dillon H, Byrne D. Speech recognition of hearing-impaired listeners: predictions from audibility and the limited role of high-frequency amplification. J Acoust Soc Am. 1998;103(2):1128-40. , 1212. Baer T, Moore BCJ, Kluk K. Effects of low pass filtering on the intelligibility of speech in quite for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2002;110(2):1164-74..

Dessa forma, a NAL-NL1 prescreve amplificação àquelas frequências que ainda podem auxiliar no reconhecimento de fala, ou seja, às frequências sem indícios de ZMC e, ao mesmo tempo, não fornece amplificação excessiva às frequências com possíveis ZMC, o que poderia prejudicar o reconhecimento de fala dos sujeitos.

Quanto às medidas obtidas no silêncio com os sujeitos usando próteses auditivas com CNLF (IPRSS CC), como ambos os grupos beneficiaram-se significantemente do uso do algoritmo quando comparado à amplificação convencional, não foi observada diferença estatisticamente significante entre os grupos. No silêncio, ao que tudo indica, de forma geral, a aplicação da CNLF não é indicada somente aos sujeitos com ZMC, mas também pode trazer benefícios aos sujeitos sem ZMC3333. Kuk F, Keenan D, Korhonen P, Lau CC. Efficacy of linear frequency transposition on consonant identification in quiet and in noise. J Am Acad Audiol. 2009;20(8):465-79..

Levando-se em consideração o relato de que sujeitos que não obtém bons resultados em testes de reconhecimento de monossílabos, com o sinal convencional, tendem a mostrar melhor desempenho quando o estímulo encontra-se comprimido3939. Turner CW, Hurtig RR. Proportional frequency compression of speech for listeners with sensorineural hearing loss. J Acoust Soc Am. 1999;106(2):877-86., pode-se pensar que a adaptação de próteses auditivas com algoritmos de rebaixamento de frequências deve ser considerada uma alternativa a pacientes com perda auditiva de configuração descendente que não apresentaram benefício satisfatório com a amplificação convencional. Assim, o aumento da transmissão da informação acústica promovido pelo algoritmo poderá proporcionar maior audibilidade e reconhecimento de fala a esses sujeitos, especialmente em situações de silêncio.

Comparando-se os resultados de ambos os grupos nas medidas obtidas na presença de ruído competitivo, observou-se diferença estatisticamente significante de desempenho no IPRSR SC, ou seja, os sujeitos do grupo B (com ZMC) apresentaram melhores resultados com a amplificação convencional de altas frequências do que o grupo A (sem ZMC).

Os resultados do presente estudo contradizem o relato de pesquisas anteriores que indicam que a amplificação de altas frequências em sujeitos com ZMC pode não trazer benefícios e até mesmo prejudicar o reconhecimento de fala, especialmente em situações de ruído77. Preminger JE, Carpenter R, Ziegler CH. A clinical perspective on cochlear dead regions: intelligibility of speech and subjective hearing aid benefit. J Am Ac Audiol. 2005;16(8):600-13. , 1212. Baer T, Moore BCJ, Kluk K. Effects of low pass filtering on the intelligibility of speech in quite for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2002;110(2):1164-74. , 1313. Vickers DA, Moore BCJ, Baer T. Effects of lowpass filtering on the intelligibility of speech in quiet for people with and without dead regions at high frequencies. J Acoust Soc Am. 2001;110(2):1164-75.. Por outro lado, um estudo verificou que a amplificação de altas frequências pode auxiliar sujeitos com ZMC a melhorarem seu reconhecimento de fala, desde que em níveis baixos de ruído3737. Mackersie CL, Crocker TL, Davis RA. Limiting high-frequency hearing aid gain in listeners with and without suspected cochlear dead regions. J Am Acad Audiol. 2004; 15(7): 498-507..

De qualquer maneira, devido à singularidade dos resultados encontrados, optou-se por verificar se havia diferença significante de algumas características entre os grupos sem e com ZMC, que poderiam de forma indireta influenciar nos resultados obtidos no ruído. Assim, além da análise dos dados referentes à pontuação obtida na triagem cognitiva, à escolaridade e ao tempo da perda auditiva, como citado anteriormente, foi comparada ainda a ocupação/profissão dos sujeitos que compuseram os grupos, porém, assim como observado nas variáveis analisadas anteriormente e como esperado, por tratar-se de pacientes atendidos em um serviço público de atenção à saúde auditiva, as ocupações eram semelhantes entre todos os sujeitos da amostra e relacionavam-se predominantemente à atividade rural ou serviços gerais.

Considerando o fato dos aspectos acima citados não apresentarem influência sobre os achados dos grupos, verificou-se que autores que obtiveram resultados semelhantes em outras pesquisas sugeriram uma explicação plausível para esses: uma reorganização a nível cortical a qual ocorreria em sujeitos com ZMC em altas frequências.

Um dos trabalhos avaliou 22 adultos e idosos com perda auditiva, sendo que metade deles apresentou resultados indicativos de possíveis ZMC no teste TEN. Os sujeitos foram avaliados usando suas próprias próteses auditivas e os estímulos utilizados foram monossílabos, manipulados com filtros passa-baixo, sendo o teste realizado no silêncio. Observou-se que os sujeitos com ZMC obtiveram melhores resultados do que os sujeitos sem ZMC, principalmente quando o nível de apresentação dos estímulos estava baixo55. Vestergaard M. Dead regions in the cochlea: implication for speech recognition and applicability of articulation index theory. Int J Audiol. 2003;42(5):249-61..

No corrente estudo, assim como o supracitado, também foi verificado melhor desempenho do grupo de sujeitos com ZMC, apesar de diferenciar-se o fato de que, dessa vez, os resultados foram observados no ruído e sem a manipulação dos estímulos utilizados. Outra concordância entre as pesquisas foi a de que o grupo de sujeitos com ZMC obteve melhores resultados quando o nível de apresentação dos estímulos estava fraco. Por conta de o IPRSR ter sido pesquisado com o valor fixo em que o LRSR foi encontrado, o qual corresponde a aproximadamente 50% de acertos das sentenças, pode-se dizer que a percepção do sujeito avaliado em relação à intensidade de apresentação das sentenças era a de que estava relativamente fraca.

A pesquisa ainda vai ao encontro de outro estudo nesse sentido, o qual avaliou 12 sujeitos com perda auditiva neurossensorial, totalizando 11 orelhas de pacientes com ZMC. Aplicaram-se testes de discriminação de frequências, detecção de modulação de amplitude e identificação de consoantes que passaram por filtro passa-baixo. Os resultados do estudo apontaram melhor desempenho das orelhas com ZMC nos testes66. Moore BCJ, Vinay SN. Enhanced discrimination of low-frequency sounds for subjects with high-frequency dead regions. Brain. 2009;132(2):524-36..

Ressalta-se que no presente estudo, ambos os grupos não apresentaram diferença significante entre os limiares auditivos de 250 a 2000 Hz, portanto, nenhuma diferença entre os limiares dessas frequências pode ter repercutido nos resultados.

O que se sugere é que, no caso de pacientes com ZMC, as lesões na membrana basilar seriam mais focadas, fazendo com que o resto da cóclea assumisse uma função melhor77. Preminger JE, Carpenter R, Ziegler CH. A clinical perspective on cochlear dead regions: intelligibility of speech and subjective hearing aid benefit. J Am Ac Audiol. 2005;16(8):600-13.. Essa afirmação é coerente com o fato de outras regiões da cóclea vizinhas à ZMC, assumirem a função de detecção dos sons com entrada de frequência correspondente a ZMC quando estes são suficientemente intensos.

Entretanto, essa reorganização coclear parece se refletir a nível cortical. Os achados de que pacientes com ZMC parecem usar as informações de baixas frequências de maneira mais efetiva que os sujeitos sem ZMC, podem indicar que, após um determinado tempo de privação auditiva associada à ZMC, as áreas cerebrais que antes normalmente respondiam às altas frequências (com ZMC) passam a detectar e reconhecer as baixas frequências66. Moore BCJ, Vinay SN. Enhanced discrimination of low-frequency sounds for subjects with high-frequency dead regions. Brain. 2009;132(2):524-36.. A diferença entre a estimulação cortical de sujeitos sem e com ZMC é que nos primeiros, apesar de a área cortical correspondente àquela frequência que apresenta perda auditiva estar sendo menos estimulada, ela continua apresentando alguma atividade, ainda que mínima. Já, nos sujeitos com ZMC, a região cortical correspondente à ZMC simplesmente não é estimulada, permitindo que a área vizinha, correspondente à região que passa a detectar essa frequência a nível coclear "se aproprie" daquela área cortical.

Apesar de os resultados que foram favoráveis aos pacientes com ZMC neste estudo não se tratarem de estímulos que foram modificados por filtros passa-baixo, como nos trabalhos anteriores, com base nos estudos até hoje desenvolvidos nesse campo de conhecimento, acredita-se que a hipótese de reorganização cortical apresenta-se como a explicação mais plausível aos achados de melhor desempenho de sujeitos com ZMC se comparados aos sujeitos sem ZMC no IPRSR SC.

Alguns poderiam questionar o fato de se tratar de pacientes idosos, entretanto, lembra-se que, apesar de ser mais lento nos sistemas nervosos maduros, o processo de neuroplasticidade persiste ao longo da vida4040. Allum-Mecklenburg D, Babighian G. Cochlear performance as a indicator of auditory plasticity in humans. In: Salvi RJ, Henderson D, Fiorino F, Colletti V., editors. Auditory system plasticity and regeneration. New York: Thieme Medical Publishers; 1996. p. 395-404..

Ainda assim, uma vez que os sujeitos com ZMC passam a ter maior habilidade de usar as informações de baixas frequências, o esperado seria que eles apresentassem melhor desempenho no IPRSR CC, visto que a principal função da CNLF é justamente fazer com que as altas frequências sejam percebidas pelas baixas frequências. Apesar disso, tais resultados não ocorreram no presente estudo.

Pensando-se em uma possível explicação para esses achados, acredita-se que no IPRSR SC, apesar de o ruído também estar presente, a amplificação fornecida às altas frequências não foi suficiente para tornar os ruídos dessas frequências audíveis ou pelo menos não foi suficiente para interferir no reconhecimento de fala dos sujeitos com ZMC. Já, no IPRSR CC, como já citado anteriormente, os ruídos relacionados às altas frequências tornam-se audíveis uma vez que passam a ser percebidos pelas baixas frequências.

Alguns métodos de transposição/compressão de frequências que identificam e atuam unicamente sobre as consoantes fricativas e/ou africadas podem auxiliar a diminuir esse efeito da percepção do ruído causada quando a CNLF atua incondicionalmente1717. Robinson JD, Baer T, Moore BCJ. Using transposition to improve consonante discrimination and detection for listeners with severe high frequency hearing loss. Int Journ Audiol. 2007;46(6):293-308. , 1818. Fraga FJ, Prates LPCS, Iorio MCM. Frequency Compression/Transposition of Fricative Consonants for the Hearing Impaired with High-Frequency Dead Regions. Proceedings of the 9th Annual Conference of the International Speech Communication Association (Interspeech); 2008 Sep 22-26; Bresbane, AUS. 2008.. Um desses estudos realizados em sujeitos normo-ouvintes com simulação de ZMC, verificou que esse novo recurso promoveu melhora na identificação de fricativas na posição inicial da sílaba, ainda que os testes tenham sido realizados no silêncio1818. Fraga FJ, Prates LPCS, Iorio MCM. Frequency Compression/Transposition of Fricative Consonants for the Hearing Impaired with High-Frequency Dead Regions. Proceedings of the 9th Annual Conference of the International Speech Communication Association (Interspeech); 2008 Sep 22-26; Bresbane, AUS. 2008..

Por todo exposto, considerando os achados deste estudo e a literatura da área, acredita-se que ainda não seja possível generalizar a indicação ou não do uso de rebaixamento de frequências em pacientes sem e com ZMC. Sugere-se que, do ponto de vista da pesquisa, novos estudos sejam realizados para que ocorra o desenvolvimento/aprimoramento desses algoritmos a fim de minimizar os efeitos negativos da CNLF no ruído, bem como para aprofundar as possíveis modificações corticais envolvidas nos pacientes com ZMC.

Para a prática clínica, sugere-se que, quando possível, sejam considerados os efeitos das ZMC no reconhecimento de fala dos indivíduos para que os recursos e algoritmos disponíveis nas próteses auditivas sejam aplicados da maneira mais adequada a cada caso.

Conclusão

No silêncio, o uso de próteses auditivas com CNLF apresentou tendência a proporcionar maiores benefícios ao reconhecimento de fala de idosos do que o uso de próteses auditivas sem a ativação da CNLF. Essa vantagem das próteses auditivas com CNLF foi verificada tanto para o grupo de idosos sem ZMC quanto para o grupo com ZMC. No ruído, nenhum dos grupos apresentou melhora do desempenho com o uso de próteses auditivas com CNLF, mantendo-se os resultados semelhantes aos encontrados com amplificação convencional.

Comparando-se os resultados dos grupos sem e com ZMC no silêncio, o desempenho entre eles foi semelhante quando testados com próteses auditivas sem CNLF. O mesmo fato ocorreu quando avaliados com de próteses auditivas com CNLF. No ruído, o grupo de sujeitos com ZMC apresentou melhores resultados com o uso de próteses auditivas sem CNLF do que o grupo sem ZMC. Já os resultados obtidos no ruído com o uso de próteses auditivas com CNLF foi semelhante entre os grupos.

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  • Fonte de auxílio: Bolsa concedida pela Coordenação de aperfeiçoamento a pessoal de nível superior (CAPES).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2015

Histórico

  • Recebido
    20 Fev 2014
  • Aceito
    18 Maio 2014
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