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Queixas auditivas de trabalhadores de uma indústria cerâmica da cidade de João Pessoa/PB

RESUMO:

Objetivo:

investigar as queixas auditivas de trabalhadores expostos ao ruído ocupacional em uma indústria cerâmica da cidade de João Pessoa/PB.

Métodos:

trata-se de um estudo descritivo, observacional e transversal, feito com 83 trabalhadores dessa indústria, com realização de entrevista sobre queixas auditivas.

Resultados:

dentre os trabalhadores, 14,7% referiram alguma queixa de saúde geral e 56% alegaram ter alguma queixa auditiva relacionada à exposição ao ruído em seu trabalho. As principais queixas auditivas foram desconforto a sons de forte intensidade (30,1%) e zumbido (24%). Houve correlação significante (p < .05) entre o tempo de atuação dos trabalhadores no seu posto de trabalho e as queixas de desconforto a sons de forte intensidade, zumbido, diminuição auditiva e sensação de plenitude auricular.

Conclusão:

os resultados deste estudo apontam para uma associação direta entre tempo de exposição ao ruído e sintomas auditivos, o que permite concluir que melhores políticas de educação em saúde auditiva podem ser necessárias. Além disso, verificou-se que trabalhadores afirmaram conhecer os riscos do ruído para a saúde, mas não compreendem que os sintomas auditivos que apresentam podem estar associados a este importante risco físico, o que pode dificultar as ações de prevenção dos riscos do ruído.

DESCRITORES:
Efeitos do Ruído; Ruído Ocupacional; Audição

ABSTRACT:

Purpose:

to investigate the auditory complaints of workers exposed to occupational noise in a pottery industry, in the city of João Pessoa/PB.

Methods:

this is a descriptive, observational and cross-sectional study with 83 workers from this industry, with conducting interview about hearing complaints.

Results:

among workers, 14.7% reported some general health complaints and 56% claimed to have any auditory complaint related to noise exposure in their work. The main auditory complaints were discomfort to intense sounds (30.1%) and tinnitus (24%). There was a significant correlation (p < .05) between the time of working of the employees in their jobs and discomfort to intense sounds, tinnitus, hearing loss and ear fullness.

Conclusion:

the results of this study show a direct association between time of exposure to noise and auditory symptoms, which suggests that better hearing health education politics may be necessary. In addition, it was found that workers knew the risks of noise on health, but did not comprehend that the auditory symptoms they have may be associated with this important physical risk, which can hinder actions to prevent noise hazards.

KEYWORDS:
Noise Effects; Occupational Noise; Hearing

Introdução

O avanço tecnológico nas indústrias trouxe benefícios para a sociedade, mas também trouxe várias implicações que podem influenciar e também comprometer a saúde física e psicológica dos trabalhadores, como também a sua qualidade de vida11. Siqueira RCL. Análise da exposição ao ruído e dos principais sintomas auditivos e extra-auditivos em motoristas do transporte coletivo de Goiânia. [dissertação] Goiânia (GO): Pontifícia Universidade Católica de Goiás; 2012.. Com isso, os trabalhadores começaram a se deparar com diversos problemas relacionados à saúde, provenientes dos agentes de risco que começaram a surgir nesse meio22. Augusto LSC, Kulay LA, Franco ES. Audição e exposição ao tolueno - uma contribuição para o tema. Int Arch Otorhinolaryngol. 2012;16(2):246-58..PExistem diversos agentes estressores no ambiente de trabalho, como os agentes físicos e químicos, além dos estressores organizacionais, que são os associados à organização do trabalho, como o ritmo, ergonomia e turno. Entre os agentes físicos nocivos, o ruído continua representando o principal desencadeante de perdas auditivas, pois além de se fazer presente no ambiente de trabalho, é frequente na vida cotidiana, na forma de poluição sonora existente nas cidades e também nas diversas atividades de lazer, em que os níveis de pressão sonora elevados são, muitas vezes, iguais ou superiores aos encontrados nas fábricas33. Alves AS, Fiorini AC. A autopercepção do handicap auditivo em trabalhadores de uma indústria têxtil. Distúrb Comun. 2012;24(3):337-49..PO ruído é normalmente definido como energia acústica audível que pode ser prejudicial ao bem estar fisiológico ou psicológico das pessoas, sendo associado a um som indesejável44. Farias VHV, Buriti AKL, Rosa MRD. Ocorrência de perda auditiva induzida pelo ruído em carpinteiros. Rev CEFAC. 2012;14(3):413-22.. É considerado como o fator de maior prevalência das origens das doenças ocupacionais e um dos mais graves problemas de saúde que atingem os trabalhadores brasileiros55. Presado ACO, Peck GMF, Souza MOPM. Prevalência de perda auditiva induzida pelo ruído nas audiometrias realizadas em trabalhadores de uma indústria de cerâmica do sulcatarinense entre o período de julho de 2009 a setembro de 2010. ACM arq catarin med. 2011;40(4):36-41.. PO ruído ocupacional pode provocar inúmeros efeitos na saúde dos indivíduos. Porém, a história natural da perda auditiva desses trabalhadores ainda não é tão definida, existindo grande imprecisão em quantificar o nível de exposição individual ao ruído nas indústrias brasileiras66. Guerra MR, Lourenço PMC, Teixeira MTB, Alvez MJM. Prevalência da perda auditiva induzida por ruído em empresa metalúrgica. Rev Saúde Pública. 2005;39(2):238-44..POs efeitos provocados pela exposição sistemática ao ruído são classificados de duas formas: efeitos auditivos e efeitos extra-auditivos. Ambos podem provocar comprometimentos psicológicos, físicos e sociais nos indivíduos. Dentre os efeitos classificados como auditivos, o zumbido e o incômodo a sons fortes são os mais frequentemente referidos pelos trabalhadores expostos a ruído acima de 85 dBNA. Além desses, são também relatadas queixas de diminuição da audição, dificuldade na compreensão da fala e otalgia77. Silva MC, Orlandi CG, Chang EM, Siviero J, Pinto MM, Armellini PFS et al. Níveis de ruído na lavanderia de um hospital público. Rev CEFAC 2011;13(3):472-8.),(88. Nunes CP, Abreu TRM, Oliveira VC, Abreu RM. Sintomas auditivos e não auditivos em trabalhadores expostos ao ruído. Rev Baiana Saúde Pública. 2011; 35(3):548-55.),(99. Oliva FC, Morata TC, Lacerda ABM, Steinmetz L, Bramatti L, Vivan AG et al. Mudança significativa do limiar auditivo em trabalhadores expostos a diferentes níveis de ruído. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(3): 260-5.. Porém, a percepção destes sintomas pode estar relacionada ao tempo de exposição e à função, ou seja, quanto maior o tempo de exposição, maior tende a ser a ocorrência dos sintomas99. Oliva FC, Morata TC, Lacerda ABM, Steinmetz L, Bramatti L, Vivan AG et al. Mudança significativa do limiar auditivo em trabalhadores expostos a diferentes níveis de ruído. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(3): 260-5..PO ruído também pode ser visto como um agente de risco potencialmente estressor, comumente ligado a uma grande extensa sintomatologia relacionada ao estresse, inserido entre os efeitos extra-auditivos. Entre os demais efeitos classificados como extra-auditivos estão: nervosismo, irritabilidade, cefaleia, insônia, alterações cardiocirculatórias e gastrointestinais, alteração de visão e isolamento social77. Silva MC, Orlandi CG, Chang EM, Siviero J, Pinto MM, Armellini PFS et al. Níveis de ruído na lavanderia de um hospital público. Rev CEFAC 2011;13(3):472-8.),(88. Nunes CP, Abreu TRM, Oliveira VC, Abreu RM. Sintomas auditivos e não auditivos em trabalhadores expostos ao ruído. Rev Baiana Saúde Pública. 2011; 35(3):548-55.),(1010. Brasil. Ministério da Saúde. Perda Auditiva Induzida por Ruído (Pair). Saúde do Trabalhador Protocolos de Complexidade Diferenciada. Brasília: Ministério da Saúde; 2006. Vol. 5..PEm cada país, existem limites de tolerância à exposição ocupacional ao ruído determinados pelas suas entidades governamentais, dependendo da quantidade de horas a que os trabalhadores permanecem expostos. No Brasil, o limite de exposição máxima permitida por 8 horas diárias é de 85dBNA. Desta forma, as empresas com níveis de pressão sonora elevados devem elaborar um Programa de Conservação Auditiva (PCA), contendo ações que se incluem a análise do ambiente de trabalho, controle dos agentes otoagressivos, estudo do perfil auditivo e a implementação de ações educativas e de avaliações de intervenções1111. Meira TC, Ferrite S, Cavalcante F, Corrêa MJM. Exposição ao ruído ocupacional: reflexões a partir do campo da Saúde do Trabalhador. InterfacEHS. 2012;7(3):26-45..P Diante do exposto, a presente pesquisa teve como objetivo investigar as queixas auditivas de trabalhadores expostos a ruído ocupacional em uma indústria cerâmica da cidade de João Pessoa/PB.

Métodos

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal da Paraíba sob número 2005893.1.0000.5188. P A pesquisa foi realizada com 83 operários de uma indústria cerâmica, que lida com o segmento industrial de louças sanitárias, localizada no Distrito Industrial de João Pessoa/PB. Os participantes são do sexo masculino e apresentam jornada média de trabalho de 8 horas diárias e exposição a ruído de intensidade superior a 85dB, de acordo com o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) da empresa. O estudo foi realizado de novembro de 2013 a fevereiro de 2014. Os sujeitos apresentaram tempo de exposição a ruído que variou de 5 a 64 meses de trabalho.PComo critério de exclusão, foi considerada a exposição a níveis elevados de pressão sonora fora do ambiente de trabalho da empresa em questão, a exemplo de atuação como DJ, garçom ou exposição extra-ocupacional como atuação em banda de música profissional ou não. Foram excluídos, ainda, cinco sujeitos que referiram trabalho sob exposição a ruído intenso em empresa anterior. Mesmo não se tratando de critério de exclusão, nenhum dos participantes referiu histórico de alteração otológica e uso de drogas ototóxicas. PA empresa possui um PCA contendo medidas técnicas e administrativas que visa à proteção dos trabalhadores, incluindo o uso de equipamentos de proteção individual (EPI) por todos os trabalhadores que estão expostos ao ruído.

Como instrumento de coleta de dados, foi aplicada uma entrevista semi-estruturada, adaptada de Macêdo e Andrade1212. Macêdo EMB, Andrade WTL. Queixas auditivas de disc jockeys da cidade de Recife. Rev CEFAC. 2011;13(3):452-9., com respostas que indicam frequência de ocorrência das queixas relatadas em uma escala do tipo likert, de cinco pontos, onde 0 corresponde a "nunca", 1 a "raramente", 2 a ,às vezes", 3 a "frequentemente" e 4 a "sempre". A entrevista constou de 10 perguntas e foi aplicada pelos pesquisadores na sala disponibilizada para os fonoaudiólogos da empresa, antecedendo os exames audiométricos periódicos. Todos os sujeitos foram informados verbalmente e por escrito acerca do estudo e atestaram sua participação por meio da assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

Os resultados obtidos na pesquisa foram armazenados em uma planilha do Microsoft Excel 2010 e analisados por meio do software Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 16.0. Foram utilizadas estatísticas descritivas e inferenciais, usando-se o coeficiente de correlação de Pearson (r), sendo considerado p < ,05 como nível de significância estatística.

Figura 1:
Entrevista com os participantes

Resultados

Quanto à caracterização da amostra, os participantes do estudo têm 28,9 anos de idade média, com desvio padrão de 8,17 anos. O grupo etário mais frequente é aquele formado por trabalhadores dos 18 aos 25 anos (40% da amostra). 89% dos respondentes têm 39 anos ou menos (Tabela 1).

Tabela 1:
Distribuição dos trabalhadores pesquisados segundo a idade (João Pessoa, 2013/2014)

No que diz respeito ao tempo na função, os trabalhadores com até 12 meses no posto de trabalho constituem o grupo mais frequente da amostra (52%). 69% dos sujeitos pesquisados têm até 24 meses de atuação no seu posto de trabalho (Tabela 2). No período do estudo, esses trabalhadores referiram ficar expostos ao ruído no seu espaço laboral durante uma média de 7,9 horas/dia (DP = 1,03) e 5,1 dias/semana (DP = 0,45).

Tabela 2:
Distribuição dos trabalhadores pesquisados segundo o tempo na função (João Pessoa, 2013/2014)

Quando questionados sobre o conhecimento pessoal sobre os riscos do ruído para a saúde, 76% dos trabalhadores afirmam conhecer esses riscos, tanto para a saúde geral, quanto para a saúde auditiva (Tabela 3).

Tabela 3:
distribuição dos trabalhadores segundo conhecimento dos riscos do ruído (João Pessoa, 2013/2014)

Perguntados de forma geral sobre sua condição de saúde e sobre alguma queixa que pudesse ser associada à exposição ao ruído, 14,7% dos trabalhadores mencionaram um tipo de queixa ou mais. Contudo, quando confrontados com queixas auditivas específicas, o percentual de trabalhadores que relataram ao menos uma queixa subiu para 56%. Destes, 30,1% dos trabalhadores referem desconforto a sons de forte intensidade; 24% sentem zumbido; 22,9% se queixam de plenitude auricular; 21,6% relatam diminuição auditiva e 13,2% referem otalgia após exposição ao ruído em forte intensidade e alguns mencionaram mais de uma queixa (Tabela 4).

Tabela 4:
Distribuição dos trabalhadores segundo a prevalência de queixas auditivas relatadas (João Pessoa, 2013/2014)

Avaliando a possível relação entre o tempo de exposição ao ruído e a frequência relatada de vivência de sintomas auditivos, foram observadas associações moderadas e positivas, estatisticamente significantes, entre o tempo de exposição a ruído e as queixas de zumbido (p < ,05), plenitude auricular (p < ,05), desconforto a sons de forte intensidade (p < ,01) e diminuição auditiva (p < ,05) (Tabela 5). Percebe-se, portanto, que há uma associação direta entre o tempo de exposição ao ruído e a ocorrência tais queixas auditivas nos trabalhadores pesquisados.

Tabela 5:
Coeficientes de correlação de Pearson (r) entre o tempo de atuação na função e frequência de ocorrência de queixas auditivas (João Pessoa, 2013/2014)

Discussão

A pesquisa foi realizada com 83 trabalhadores do sexo masculino, o que pode ser observado em outros estudos88. Nunes CP, Abreu TRM, Oliveira VC, Abreu RM. Sintomas auditivos e não auditivos em trabalhadores expostos ao ruído. Rev Baiana Saúde Pública. 2011; 35(3):548-55.),(1313. Lopes AC, Nelli MP, Lauris JRP, Amorim RB, Melo ADP. Condições de saúde auditiva no trabalho: investigação dos efeitos auditivos em trabalhadores expostos ao ruído ocupacional. Arq Int Otorrinolaringol. 2009;13(1):49-54.),(1414. Lopes AC, Santos CC, Alvarenga KF, Feniman MR, Caldana ML, Oliveira NA. Alterações auditivas em trabalhadores de indústrias madeireiras do interior de Rondônia. Rev Bras Saúde Ocupacional. 2009;34(119):88-92.),(1515. Andrade IFC, Russo ICP. Relação entre os achados audiométricos e as queixas auditivas e extra-auditivas dos professores de uma academia de ginástica. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):167-73.),(1616. Azevedo NA, Bernardo LD, Shing SCAC, Santos JN. Perfil auditivo de trabalhadores de um entreposto de carnes. Rev CEFAC. 2010;12(2):223-34. com trabalhadores que estão expostos ao ruído ocupacional, sendo este o sexo mais ocorrente.

Foi encontrada uma idade média de 28,9 (± 8,17) anos entre os trabalhadores, sendo evidente que é uma população jovem. Outros estudos99. Oliva FC, Morata TC, Lacerda ABM, Steinmetz L, Bramatti L, Vivan AG et al. Mudança significativa do limiar auditivo em trabalhadores expostos a diferentes níveis de ruído. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(3): 260-5.),(1616. Azevedo NA, Bernardo LD, Shing SCAC, Santos JN. Perfil auditivo de trabalhadores de um entreposto de carnes. Rev CEFAC. 2010;12(2):223-34. identificaram idade média também próxima de 30 anos entre os trabalhadores expostos a ruído superior a 85dBNA.

No período do estudo, os trabalhadores declararam que ficam expostos ao ruído no seu espaço laboral por uma média de 7,9 horas diárias, também de forma semelhante aos trabalhadores estudados em outras pesquisas88. Nunes CP, Abreu TRM, Oliveira VC, Abreu RM. Sintomas auditivos e não auditivos em trabalhadores expostos ao ruído. Rev Baiana Saúde Pública. 2011; 35(3):548-55.),(1717. Oliveira PF, Raposo OFF, Santos ACA, Santos LA.Emissões otoacústicas como instrumento de vigilância epidemiológica na saúde do trabalhador. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(4):444-9. que tem atividade laboral envolvendo ruído por uma média de 8 horas diárias.

Queixas de saúde geral em função da exposição ao ruído foram referidas por 14,7% dos trabalhadores. Além disso, 56% referiram ter um queixa auditiva específica, resultado semelhante ao de Lopes et al.1414. Lopes AC, Santos CC, Alvarenga KF, Feniman MR, Caldana ML, Oliveira NA. Alterações auditivas em trabalhadores de indústrias madeireiras do interior de Rondônia. Rev Bras Saúde Ocupacional. 2009;34(119):88-92., que verificaram que a metade dos trabalhadores de madeireiras estudados mencionou a ocorrência de queixas auditivas.

Apesar de 76% dos trabalhadores afirmarem conhecer os riscos que o ruído pode causar à saúde geral e as situações que podem causar riscos para a audição, 58% referem alguma das queixas auditivas questionadas (desconforto a sons intensos, zumbido, plenitude auricular, diminuição auditiva e otalgia). Este é um dado intrigante, pois os trabalhadores afirmam conhecer os riscos causados por esse agente físico nocivo, mas tem queixas auditivas, o que pode mostrar que o uso do EPI não vem sendo correto ou sistemático ou seu ambiente laboral pode não oferecer métodos preventivos compreendidos como essenciais para ambientes com exposição a níveis elevados de ruído. O protetor auditivo é uma barreira acústica que busca proteger a audição do trabalhador1818. Samelli AG, Fiorini AC. Saúde coletiva e saúde do trabalhador: prevenção de perdas auditivas. In: Bevilacqua MC, Martinez MAN, Balen SA, Pupo AC, Reis ACMB, Frota S, organizadoras. Tratado de Audiologia. São Paulo: Santos; 2012. p. 455-72. e, havendo a atenuação dos sons que adentram no sistema auditivo, consequentemente, evitará ou reduzirá a ocorrência de queixas de ordem auditiva.

Em um estudo com trabalhadores de uma indústria1414. Lopes AC, Santos CC, Alvarenga KF, Feniman MR, Caldana ML, Oliveira NA. Alterações auditivas em trabalhadores de indústrias madeireiras do interior de Rondônia. Rev Bras Saúde Ocupacional. 2009;34(119):88-92., um número maior de trabalhadores (93,75%) afirmou conhecer a relação causal do ruído com a perda auditiva, porém um menor percentual (50%) mencionou ter queixas auditivas e 50% disseram que utilizam o EPI durante a jornada de trabalho (8 horas). Dessa forma, as estratégias de prevenção das consequências do ruído sobre a saúde auditiva devem ser repensadas, considerando que podem não estar surtindo o efeito desejado.

A exposição continuada a níveis elevados de pressão sonora em ambientes de trabalho pode ocasionar diversos efeitos auditivos e extra-auditivos nos indivíduos. Os efeitos auditivos mais referidos pelos trabalhadores desta pesquisa foram, em ordem decrescente, desconforto a sons de forte intensidade, zumbido, plenitude auricular, diminuição auditiva e otalgia. Em outra pesquisa com trabalhadores expostos ao ruído1414. Lopes AC, Santos CC, Alvarenga KF, Feniman MR, Caldana ML, Oliveira NA. Alterações auditivas em trabalhadores de indústrias madeireiras do interior de Rondônia. Rev Bras Saúde Ocupacional. 2009;34(119):88-92., os sintomas auditivos foram citados por 50% da amostra e os mais frequentes foram a otalgia (25%) e o zumbido (12,5%). Esses resultados diferem dos dados do presente estudo, em que a otalgia foi o sintoma menos referido.

Diversos estudos relacionados às queixas auditivas e extra-auditivas de trabalhadores33. Alves AS, Fiorini AC. A autopercepção do handicap auditivo em trabalhadores de uma indústria têxtil. Distúrb Comun. 2012;24(3):337-49.),(88. Nunes CP, Abreu TRM, Oliveira VC, Abreu RM. Sintomas auditivos e não auditivos em trabalhadores expostos ao ruído. Rev Baiana Saúde Pública. 2011; 35(3):548-55.),(1414. Lopes AC, Santos CC, Alvarenga KF, Feniman MR, Caldana ML, Oliveira NA. Alterações auditivas em trabalhadores de indústrias madeireiras do interior de Rondônia. Rev Bras Saúde Ocupacional. 2009;34(119):88-92.),(1919. Santoni BC, Fiorini AC. Músicos de pop-rock: avaliação da satisfação com protetores auditivos. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(4):454-61. apontam o zumbido como a queixa mais referida pelos sujeitos expostos ao ruído ocupacional. Esse sintoma está cada vez mais presente na população devido a vários fatores, como a crescente exposição a níveis de pressão sonora elevados no ambiente ocupacional, estilo de vida, hábitos alimentares, sobrecarga de trabalho, estresse, ansiedade e depressão2020. Weber SR, Périco E. Zumbido no trabalhador exposto ao ruído. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(4):459-65..

A partir dos resultados da correlação entre o tempo que os trabalhadores estão no seu posto de trabalho com as queixas auditivas referidas, que foram zumbido, sensação de plenitude auricular, desconforto a sons de forte intensidade e diminuição auditiva, pode-se dizer que há uma relação direta, ou seja, quanto maior o tempo de exposição ao ruído, maior será a probabilidade do trabalhador apresentar tais queixas auditivas. Considerando que a presbiacusia se torna frequente a partir de 55 anos2121. Fuess VLR, Cerchiari DP. Estudo da hipertensão arterial sistêmica e do diabetes melitus como fatores agravantes da presbiacusia. Arq Otorrinolaringol. 2003;7(2):116-21. e o fato de haver apenas um sujeito com idade superior a 53 anos, acredita-se que o fator idade não foi preponderante para o resultado observado. Estudo99. Oliva FC, Morata TC, Lacerda ABM, Steinmetz L, Bramatti L, Vivan AG et al. Mudança significativa do limiar auditivo em trabalhadores expostos a diferentes níveis de ruído. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(3): 260-5. corrobora a relação entre a ocorrência de queixas referidas por trabalhadores e o tempo em que estes estavam expostos nas suas funções.

Conclusão

De forma geral, verificou-se que todas as queixas auditivas investigadas (desconforto a sons de forte intensidade, zumbido, plenitude auricular, diminuição auditiva e otalgia) foram referidas pelos trabalhadores expostos a ruído.

Foi verificada correlação estatisticamente significante entre o tempo de atuação dos trabalhadores e frequência das queixas de desconforto a sons de forte intensidade, zumbido, plenitude auricular e diminuição auditiva, relatadas pelos mesmos, podendo-se concluir que melhores políticas de educação em saúde e de prevenção de doenças e agravos ainda são necessárias no sentido de assegurar ao trabalhador o direito ao trabalho com saúde.

De forma secundária, percebeu-se que, embora a maior parte dos trabalhadores refira conhecer os riscos que o ruído pode causar na saúde como um todo, incluindo a saúde auditiva, apenas uma parcela destes consegue relatar uma queixa espontaneamente, ainda que muitos apresentem as queixas auditivas mencionadas.

Percebe-se, portanto, que apesar de os trabalhadores afirmarem conhecer os riscos do ruído para a saúde, se mostraram incapazes de compreender que os sintomas auditivos que apresentam podem estar associados a este importante risco físico, ou seja, tal conhecimento sobre os riscos do ruído mostra-se limitado e ineficiente do ponto de vista prático.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    23 Abr 2015
  • Aceito
    19 Ago 2015
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