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Efeitos do exercício muscular respiratório na biomecânica da deglutição de indivíduos normais

RESUMO:

Objetivo:

analisar os efeitos do exercício respiratórios na biomecânica da deglutição de sujeitos normais.

Métodos:

o exercício muscular respiratório em sujeitos normais foi aplicado por sete dias consecutivos por meio de incentivador respiratório a fluxo (três séries de dez repetições para inspiração e expiração). A biomecânica da deglutição foi avaliada por videofluoroscopia, utilizando variáveis temporais (tempo de transição faríngea) e visuoperceptuais (número de deglutições, resíduos em seios piriformes e valéculas, penetração/aspiração). Para análise estatística foi aplicado o Teste de Wilcoxon, Igualdade de Duas Proporções e Kappa.

Resultados:

foram avaliadas 16 jovens do sexo feminino com média de idade de 21,2±3,4 anos. Nas variáveis visuoperceptuais observou-se concordância quase perfeita entre os avaliadores (p<0,001), bem como na temporal (p = 1,00). Após o período de treinamento houve redução no tempo de transição faríngea (p=0,02).

Conclusão:

o uso de incentivador respiratório a fluxo influenciou significantemente na biomecânica da deglutição, principalmente na redução do tempo de transição faríngea.

DESCRITORES:
Deglutição; Métodos; Exercício Respiratório; Fluoroscopia; Transtornos da Deglutição; Reabilitação

ABSTRACT:

Purpose:

to analyze the effects of the respiratory exercise in the biomechanics of swallowing in normal subjects.

Methods:

the muscle respiratory exercise in normal subjects was performed for seven consecutive days by the incentive spirometer flow (three sets of ten repetitions for inspiration and expiration).The biomechanics of swallowing was evaluated by video fluoroscopy through temporal variables (pharyngeal transition time) and visual-perceptual (number of swallows, waste in the pyriform sinuses and vallecula, penetration/aspiration). For statistical analysis, the Wilcoxon test, Equality of Two Proportions and Kappa were used.

Results:

16 young women with a mean age of 21,2±3,4 years were evaluated. In visual-perceptual variables it was observed almost perfect agreement between evaluators (p<0,001) and in temporal variable (p=1,00). After the training period there was a significant reduction in the pharyngeal transition time (p=0,02).

Conclusion:

the use of incentive spirometer flow significantly influenced the biomechanics of swallowing, especially in reducing the pharyngeal transition time.

KEYWORDS:
Deglutition; Methods; Breathing Exercises; Fluoroscopy; Deglutition Disorders; Rehabilitation

Introdução

A deglutição é considerada uma atividade complexa de ações voluntárias e involuntárias, que exige a coordenação de muitos músculos e áreas cerebrais, principalmente no córtex e tronco cerebral. Além de ser o ato de conduzir o alimento ou substâncias da cavidade oral até o estômago, de forma segura (protegendo a via aérea contra aspirações), representa uma integração temporal de eventos associados a respiração normal11. Chaves RD, Carvalho CRF, Cukier A, Stelmach R, Andrade CRF. Sintomas indicativos de disfagia em portadores de DPOC. J Bras Pneumol. 2011;37(2):176-83.. Em indivíduos saudáveis, a respiração é interrompida durante a deglutição, ato este chamado de apneia preventiva, sendo retomada na fase expiratória22. Dozier TS, Brodsky MB, Michel Y, Walters BC, Martin-Harris B. Coordination of swallowing and respiration in normal sequential cup swallows. Laryngoscope. 2006;116(8):1489-93.. Este mecanismo é considerado um dos fatores de proteção e prevenção da aspiração laríngea, induzido pelo aumento da resistência das vias aéreas33. Costa M. Deglutição & Disfagia: bases morfofuncionais e videofluoroscópicas. Rio de Janeiro: Med Book; 2013..

A faringe é uma região anatômica comum as funções respiratórias e digestivas. A fase faríngea da deglutição é influenciada indiretamente pela ação dinâmica do complexo hiolaringeo e pela faringe, que atua de forma contrátil no sentido de proteger a via aérea durante o ato de engolir33. Costa M. Deglutição & Disfagia: bases morfofuncionais e videofluoroscópicas. Rio de Janeiro: Med Book; 2013.. Steele et al. 44. Steele CM, Miller AJ. Sensory input pathways and mechanisms in swallowing: a review. Dysphagia. 2010;25:323-33., demonstraram correlações entre o movimento vertical e horizontal deste complexo durante a deglutição e o seu valor preditivo para distúrbios biomecânicos da deglutição.

Neste contexto, Troche et al. 55. Troche MS, Okaun MS, Rosenbek JC, Musson N, Fernandez HH, Rodriquez R et al.. Aspiration and swallowing in Parkinson disease and rehabilitation with EMST. Neurology. 2010;75:1912-9.realizaram estudo no qual demonstraram a importância do treinamento muscular respiratório, por meio do uso de incentivadores expiratórios para reabilitação da disfagia em pacientes parkisonianos. Constatou-se que houve melhora na função da deglutição, atribuída à melhora da função do complexo hiolaríngeo, resultando em uma maior proteção das vias aéreas durante a deglutição.

Os incentivadores respiratórios (IR) são aparelhos úteis para a realização de respiração espontânea, auxiliando na reexpansão pulmonar, aumento da permeabilidade das vias aéreas e fortalecimento dos músculos respiratórios, além de otimizar o trabalho mecânico da ventilação pulmonar e a oxigenação arterial66. Romanini W, Muller AP, Carvalho KAT, Olandoski M, Faria-Neto JR, Mendes FL et al.. Os efeitos da pressão positiva intermitente e do incentivador respiratório no pós-operatório de revascularização miocárdica. Arq Bras Cardiol. 2007;89(2):105-10.. Os exercícios com IR são uma forma simples e segura de realizar treinamentos respiratórios, visando à melhora dos volumes pulmonares e prevenção de complicações respiratórias em crianças, adultos e idosos77. Lunardi AC, Porras DC, Barbosa R, Paisani DM, Silva CM, Tanaka C et al. Effect of volume-oriented versus flow-oriented incentive spiromtry on chest wall volumes, inspiratory muscle activity, and thoracoabdominal synchrony in the elderly. Respir Care. 2014;59(3):420-6..

Entre estes, pode-se destacar o IR a fluxo Respiron(r), que enfatiza a inspiração profunda até a capacidade pulmonar total, fornecendo feedbackvisual77. Lunardi AC, Porras DC, Barbosa R, Paisani DM, Silva CM, Tanaka C et al. Effect of volume-oriented versus flow-oriented incentive spiromtry on chest wall volumes, inspiratory muscle activity, and thoracoabdominal synchrony in the elderly. Respir Care. 2014;59(3):420-6.),(88. Renault J, Costa-Val R, Rossetti MB, Houri Neto MA. Comparação entre Exercícios de Respiração Profunda e Espirometria de Incentivo no Pós - Operatório de Cirurgia de Revascularização do Miocárdio. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2009;24(2):165-72.. Este tipo de IR facilita a inspiração profunda, estimula altos volumes inspirados e previne a hipoventilação pulmonar66. Romanini W, Muller AP, Carvalho KAT, Olandoski M, Faria-Neto JR, Mendes FL et al.. Os efeitos da pressão positiva intermitente e do incentivador respiratório no pós-operatório de revascularização miocárdica. Arq Bras Cardiol. 2007;89(2):105-10.),(99. Azeredo AC. Fisioterapia respiratória do hospital geral. Rio de Janeiro: Manole; 2000.),(1010. Costa D. Fisioterapia Respiratória Básica. São Paulo: Atheneu; 1999.. Porém, mesmo sendo um equipamento usado para treinamento inspiratório existe a possibilidade de ser utilizado no treinamento da expiração, com fins de melhora da força muscular expiratória, capacidades pulmonares e fluxos expiratórios1111. Rosa R, Santos GK, Siqueira AB, Toneloto MGC. Inspirômetro de incentivo invertido como exercitador da musculatura respiratória em indivíduos saudáveis. Rev Intellectus. 2013;25:177-97..

Com este tipo de exercício é possível evidenciar a movimentação do osso hióide e do complexo hiolaringeo, que tem um papel importantíssimo na motricidade orofacial por meio das estruturas contráteis nele inseridas1212. Deljo E, Filipovic M, Babacic R, Grabus J. Correlation analysis of the hyoid bone position in relationto the cranial base, mandible and cervical part of vertebra with particular reference to bimaxillary relations / teleroentgenogram analysis. Acta Inform Med. 2012;20(1):25-31.. Tais estruturas podem apresentar melhora na sua mobilidade e função, a partir do treinamento respiratório aplicado por incentivadores55. Troche MS, Okaun MS, Rosenbek JC, Musson N, Fernandez HH, Rodriquez R et al.. Aspiration and swallowing in Parkinson disease and rehabilitation with EMST. Neurology. 2010;75:1912-9..

Desta forma, este estudo teve como objetivo analisar os efeitos do exercício respiratório na biomecânica da deglutição de sujeitos normais.

Métodos

Trata-se de um estudo prospectivo e longitudinal, previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria, seguindo a Resolução 466/2012, sob registro 23676813.8.0000.5346. Todas as participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido consentindo participação na pesquisa.

Foram incluídas adultas jovens, com idades entre 18 e 30 anos, sem diagnóstico prévio de doença respiratória, sintomas de resfriado e/ou afecções respiratórias no momento da avaliação, sem queixas de alterações na deglutição e não tabagistas. Foram avaliadas 18 jovens que iniciaram o estudo, porém 02 foram excluídas por não apresentarem-se no período correspondente (após uma semana da primeira avaliação) para reavaliação após os exercícios, resultando uma amostra de 16 sujeitos.

O exame de videofluoroscópia da deglutição (VFD) foi realizado a fim de analisar a biomecânica da deglutição, utilizando a oferta de consistência pastosa em colher com volume de 10ml, antes e após o exercício muscular respiratório.

As imagens foram geradas em um equipamento marca Siemens, modeloIconos R200, no modo fluoroscopia com 30 quadros por segundos, já os vídeos gravados no software de captura Zscan6. Este software possui como principais características técnicas: imagem com matriz até 720x576; resolução da imagem de 32Bits (32 milhões de cores); formato de imagem JPEG com 1440 dpi; sistema de vídeo NTSC, PAL, SECAM (todos standard); vídeo de até 720x576 com imagens em tempo real (30 quadros por segundo(quadros/s) formato AVI e compressor divX podendo ser gravado em DVD e CD. O valor médio de dose gerado neste procedimento é de 0,14 mR/quadro (2,1 mR/s), essas medidas de dose foram realizadas em condições que reproduzem a técnica e o posicionamento do paciente, utilizando-se um simulador de 4 cm de alumínio e um eletrômetro marca Radcal, modelo 9010 com câmara de ionização específica para procedimentos em fluoroscopia de 60 cm33. Costa M. Deglutição & Disfagia: bases morfofuncionais e videofluoroscópicas. Rio de Janeiro: Med Book; 2013..

Durante a VFD, os sujeitos foram avaliados na posição sentada, com projeção lateral. O campo da imagem videofluoroscópica incluiu os lábios, cavidade oral, coluna cervical e esôfago cervical proximal.

Os dados coletados por meio da VFD foram avaliados utilizando variáveis temporais e visuoperceptuais, conforme proposta de Baijens et al. (2011). A variável temporal analisada foi o tempo de transição faríngea (TTF), expressa em segundos, a qual é definida pelo momento de abertura da junção glossopalatal até o fechamento do esfíncter esofágico superior1313. Kahrilas PJ, Lin S, Rademaker A, Logemann J. Impaired deglutitive airway protection: a videofluoroscopic analysis of severity and mechanism. Gastroenterology. 1997;113(5):1457-64.. Para análise foi utilizado o software Movie Maker(r), o qual permite visualizar cada frame em segundos.

As variáveis visuoperceptuais foram representadas em uma escala numérica, conforme se descreve a seguir1414. Baijens LWJ, Speyer R, Passos VL, Pilz W, Roodengurg N, Clave P. Swallowing in Parkinson patients versus healthy controls: reliability of measurements in videofluoroscopy. Gastroenterology Research and Practice 2011. Article ID 380682.:

  • Número de deglutições (número de vezes que o bolo alimentar é fragmentado): 0 - uma deglutição; 1 - duas deglutições; 2 - três deglutições; 3 - quatro ou mais deglutições;

  • Resíduo em valécula (estase do bolo alimentar em valécula após a deglutição completa): 0 - não houve estase; 1 - resíduo preencheu até 50 % da valécula; 2 -resíduo preencheu mais de 50% da valécula.

  • Resíduo em seios piriformes (estase do bolo alimentar em seios piriformes após a deglutição completa): 0 - não houve estase; 1 - leve a moderada estase; 2 - grave estase, preenchendo os seios piriformes.

  • Penetração/Aspiração: 0 - normal; 1 - penetração; 2 - aspiração.

As variáveis em estudo foram analisadas por dois avaliadores cegados, com experiência de cinco anos em análise de VFD.

O treinamento com exercício respiratório foi realizado em domicílio, com orientações prévias dadas por um fisioterapeuta, por meio de IR a fluxo Respiron(r), por um período de sete dias consecutivos. Para o treino inspiratório todas as participantes deveriam realizar três séries de dez repetições diárias, partindo da Capacidade Residual Funcional (CRF) até atingir a Capacidade Inspiratória (CI) e sustentar as esferas por período de cinco a oito segundos1515. Ysayama L, Lopes LR, Silva AMO, Andreollo NA. A influência do treinamento muscular respiratório pré-operatório na recuperação de pacientes submetidos à esofagectomia. Arq Bras Cir Dig. 2008;21(2):61-4..

Já para o treino expiratório, houve a utilização do Respiron(r) de forma invertida. Cada participante foi orientada a realizar três séries de dez repetições diárias, partindo da CI até atingir a CRF, com um minuto de descanso entre cada série inspiratória e expiratória1616. Landis JR, Koch GG. The Measurement of Observer Agreement for Categorical Data. Biometrics. 1977;33:159-74..

Os dados foram analisados pelo programa computacional Statistical Package for Social Science (SPSS) versão 17. Para verificar a significância entre as variáveis analisadas pré e pós exercício muscular respiratório foi aplicado o Teste de Wilcoxon e Igualdade de Duas Proporções.

Para a concordância entre os avaliadores o Teste de Wilcoxon foi aplicado para a variável temporal e o Kappa para as visuoperceptuais. Para o grau de concordância entre os avaliadores foi utilizada a classificação de Landis e Koch1717. Padovani AR, Moraes DP, Mangili LD, Andrade CR. Protocolo fonoaudiológico de avaliação do risco para disfagia (PARD). Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):199-205., onde encontra-se que: <0,00 concordância pobre; 0,00 - 0,19 concordância pobre; 0,20 - 0,39 concordância fraca; 0,40 - 0,59 concordância moderada; 0,60 - 0,79 concordância substancial; 0,80 - 1,00 concordância quase perfeita.

Os resultados foram expressos em média±desvio padrão e percentagem, considerando estatisticamente significante, valores de p< 0,05.

Resultados

A amostra foi composta por 16 adultas jovens, com média de idade de 21,2±3,4 anos. NaTabela 1 estão apresentadas as variáveis verificadas e analisadas antes da aplicação do exercício muscular respiratório.

Tabela 1:
Caracterização da biomecânica da deglutição da amostra avaliada

Na variável temporal, nota-se que o TTF ocorreu em média 0,62±0,19 segundos. Já nas variáveis visuoperceptuais, observou-se que a maioria realizou apenas uma deglutição (56,2%), 81,2% não apresentaram resíduos em valécula e apenas 6,2% em seios piriformes. Por se tratar de uma amostra composta de adultas jovens hígidas, nenhuma apresentou episódios de penetração e/ou aspiração.

Na análise entre os avaliadores observou-se que na variável TTF os avaliadores obtiveram 100% de concordância (p = 1,00), o que indica concordância quase perfeita. Os índices de concordância das variáveis visuoperceptuais estão descritos na Tabela 2:

Tabela 2:
Concordância entre os avaliadores nas variáveis visuoperceptuais pré e pós exercício muscular respiratório

Verifica-se que os valores de Kappa foram máximos e significantes, mostrando que na análise das variáveis visuoperceptuais os avaliadores foram 100% iguais, indicando concordância quase perfeita.

Na Tabela 3 estão apresentados os valores referentes às variáveis da biomecânica da deglutição analisadas pré e pós exercício muscular respiratório com Respiron(r).

Tabela 3:
Variáveis analisadas pré e pós exercício muscular respiratório

Discussão

A concordância entre os avaliadores na presente pesquisa foi máxima e significante, demonstrando alta confiabilidade nos resultados encontrados por meio da escala aplicada. Tal como encontrado no estudo de Baijens et al.1414. Baijens LWJ, Speyer R, Passos VL, Pilz W, Roodengurg N, Clave P. Swallowing in Parkinson patients versus healthy controls: reliability of measurements in videofluoroscopy. Gastroenterology Research and Practice 2011. Article ID 380682., no qual os avaliadores obtiveram concordância quase perfeita nas variáveis visuoperceptuais intra-avaliadores (0,8 a 1,0).

Apesar de ser possível determinar a fisiologia da deglutição, sua dinâmica pode variar em alguns aspectos em cada indivíduo, dificultando a definição de dados normativos. Alguns autores consideram padrão de normalidade da deglutição 17,5 segundos para consistência pastosa, e isto desde a abertura da cavidade oral para receber o alimento até a última passagem deste pelo esôfago superior. Pode-se ainda achar um tempo de 4 segundos para a consistência líquida1717. Padovani AR, Moraes DP, Mangili LD, Andrade CR. Protocolo fonoaudiológico de avaliação do risco para disfagia (PARD). Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):199-205.. Porém, a identificação de uma referência para a localização do disparo da fase faríngea é ainda objeto de estudo, além da duração das suas fases. O estudo de medidas temporais, por meio de dados objetivos, ainda não possui um consenso sobre seus valores de referência1818. Stephen JR, Taves DH, Smith RC, Martin RE. Bolus location at the initiation of the pharyngeal stage of swallowing in healthy older adults. Dysphagia. 2005;20(4):266-72.)-(2020. Douglas CR. Fisiologia aplicada à Fonoaudiologia. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. podendo variar de 0,7 a 1,0 segundo2121. Vale-Prodomo LP. Caracterização videofluoroscópica da fase faríngea da deglutição [tese]. São Paulo (SP): Fundação Antonio Prudente; 2010.. Vale-Prodomo2222. Wheeler KM, Chiara T, Sapienza CM. Surface electromyographic activity of the submental muscles during swallow and expiratory pressure threshold training tasks. Dysphagia. 2007;22:108-16. verificou que o tempo médio da duração da fase faríngea é de 0,71 segundos.

No presente estudo, observou-se na amostra estudada, uma média de TTF ainda menor do que as propostas pela literatura antes da aplicação do treinamento respiratório (0,62±0,19 segundos). Estes dados são importantes a fim de contribuir no estabelecimento de parâmetros de normalidade que permitam a formação de um controle para outros estudos com adultos jovens de faixa etária e sexo semelhantes.

Em relação aos efeitos do exercício respiratório na biomecânica da deglutição houve diferença significante sobre o TTF, reduzindo este em média 0,09 segundos após o treinamento. Estudos que tenham utilizado IR a fluxo sobre as variáveis analisadas não foram encontrados na literatura até o momento. No entanto, estudos prévios que utilizaram treinamento muscular expiratório (TME) por meio de incentivadores com carga linear pressórica, demonstraram resultados satisfatórios sobre a biomecânica da deglutição.

Estudos têm demonstrado que o TME melhora o movimento vertical do osso hióide, pois favorece uma maior ativação e força da musculatura submentoniana, resultando em melhor elevação laríngea e abertura do esfíncter esofágico superior2222. Wheeler KM, Chiara T, Sapienza CM. Surface electromyographic activity of the submental muscles during swallow and expiratory pressure threshold training tasks. Dysphagia. 2007;22:108-16.)-(2424. Laciuga H, Rosenbek JC, Davenport PW, Sapienza CM. Functional outcomes associated with expiratory muscle strength training: narrative review. J of Rehabilitation Research & Development. 2014;51(4):535-46.. Pitts et al.2525. Pitts T, Bolser D, Rosenbek J, Troche M, Okun MS, Sapienza C. Impact of expiratory muscle strength training on voluntary cough and swallow function in Parkinson disease. Chest. 2009;135:1301-8. ainda referem que a melhor mobilidade do hióide obtida pelo TME favorece a coordenação muscular das estruturas relacionadas a deglutição, ocasionando também aumento da pressão subglótica.

Troche et al.55. Troche MS, Okaun MS, Rosenbek JC, Musson N, Fernandez HH, Rodriquez R et al.. Aspiration and swallowing in Parkinson disease and rehabilitation with EMST. Neurology. 2010;75:1912-9. relataram melhora na proteção das vias aéreas e redução do risco de penetração/aspiração ao realizar um TME com equipamento incentivador, de uso semelhante ao Respiron(r), em sujeitos parkinsonianos. Neste trabalho atribuiu-se a conquista de um melhor desempenho e movimentação das estruturas laringofaríngeas ao aumento da mobilidade destas estruturas, induzida pelo treinamento muscular e consequente ganho de força. Neste sentido não foram encontrados estudos com grandes amostras populacionais. Mas diversos trabalhos tem demonstraram ganhos consideráveis em nível de força da musculatura respiratória com o uso do IR a fluxo Respiron(r)77. Lunardi AC, Porras DC, Barbosa R, Paisani DM, Silva CM, Tanaka C et al. Effect of volume-oriented versus flow-oriented incentive spiromtry on chest wall volumes, inspiratory muscle activity, and thoracoabdominal synchrony in the elderly. Respir Care. 2014;59(3):420-6.),(2626. Oliveira M, Santos C, Oliveira C, Ribas D. Efeitos da técnica expansiva e incentivador respiratório na força da musculatura respiratória em idosos institucionalizados. Fisioter Mov. 2013;26(1):133-40.),(2727. Souza HCM. Efeitos do treinamento muscular inspiratório sobre a função pulmonar em idosas [dissertação]. Recife (PE): Universidade Federal de Pernambuco; 2013..

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A partir disto, é possível inferir no presente trabalho que a diminuição do TTF do bolus de consistência pastosa na amostra submetida ao treinamento respiratório por meio de incentivador, pode estar relacionada ao aumento na mobilidade do complexo hiolaringeo. Neste caso, o aumento desta mobilidade pode ter ocorrido pelo treinamento e ganho de força das estruturas musculares deste complexo. Para Pilz et al.2929. Pilz W, BaijensL WJ, Passos VL, Verdonschot R, Wesseling F, Roodenburg N et al. Swallowing assessment in myotonic dystrophy type 1 using fiberoptic endoscopic evaluation of swallowing (FEES). Neuromuscul Disord. 2014;24(12):1054-62., qualquer prejuízo nesta força muscular, ainda que mínimo, representa risco potencial para penetração e ou aspiração laringotraqueal.

Conclusão

O uso do IR demonstrou produzir efeitos na biomecânica da deglutição, notadamente na variável temporal TTF, o qual diminuiu levando a uma melhor eficiência da deglutição, na amostra estudada. Quanto às variáveis visuoperceptuais houve uma alteração significante na variável resíduo em seios piriformes, sendo eliminado qualquer resíduo no pós treinamento. E na variável número de deglutições, houve um ligeiro aumento nesta quantidade na comparação pré e pós intervenção.

Cabe salientar as limitações encontradas no desenvolvimento do estudo, como a impossibilidade de realizar medidas de variáveis espaciais, a fim de verificar o movimento do osso hióide. Isto se deve ao fato de não possuir software específico para este tipo de análise. Além disso, os autores sugerem medidas instrumentais que avaliem a sensibilidade laríngea, juntamente com a avaliação da força muscular respiratória antes e após o uso de IR visando estabelecer correlações entre estas avaliações.

Estudos que tenham utilizado o Respiron(r) e seus efeitos na deglutição ou tratamento das disfagias, não foram encontrados na literatura, limitando o aprofundamento teórico e da discussão do presente estudo. Dessa forma, sugerem-se mais estudos abordando o uso de IR relacionado à biomecânica da deglutição.

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  • Fonte de auxílio: CAPES

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    19 Dez 2014
  • Aceito
    21 Set 2015
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