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Situação-problema como disparador do processo de ensino-aprendizagem em metodologias ativas de ensino

RESUMO:

Objetivo:

descrever o processo de elaboração de uma Situação-Problema e de um Módulo de aprendizagem e refletir a importância destes na formação do Fonoaudiólogo.

Métodos:

estudo descritivo do processo de elaboração de uma Situação-Problema e de um Módulo de aprendizagem de um curso de graduação em Fonoaudiologia - uma experiência precursora na área em que toda a estrutura curricular tem como base Metodologias Ativas de ensino.

Resultado:

o Módulo Estudo da Linguagem Infantil ocorre no Ciclo II do Curso e é constituído por nove Situações-Problema sendo, cada uma, discutida em duas sessões tutoriais com até dez discentes e conduzida por um professor tutor. As Situações-Problema, assim como o Módulo, são elaboradas por uma comissão de docentes doutores e especialistas em Linguagem de acordo com o Projeto Pedagógico do Curso. Discute-se, neste artigo, a terceira Situação-Problema que tem como título - "Mesmas características, mas diagnósticos diferentes... Por quê?"; O título tem o papel de despertar a curiosidade do discente e apresentar o enfoque principal do problema. Todas as Situações-Problema são avaliadas por docentes e discentes com objetivo de promover aperfeiçoamentos constantes.

Conclusão:

o contexto problematizador construído a partir das Situações-Problema permite ao discente a busca de respostas diariamente, de forma ativa e autônoma, pela vivência e discussão do trabalho em equipe, dos aspectos biopsicossociais do indivíduo e das questões éticas na atuação profissional. Possibilitando assim a formação de profissionais resolutivos, competentes para aperfeiçoar seu conhecimento constantemente e de atuar em consonância com as práticas de Saúde Pública do País.

DESCRITORES:
Aprendizagem Baseada em Problemas; Educação em Saúde; Educação Superior; Fonoaudiologia

ABSTRACT:

Purpose:

to describe the process of elaboration of a Problem-Situation and a learning Module and to reflect their importance in the formation of a speech therapist.

Methods:

a descriptive study of the elaboration process of a problem-situation and a learning Module of a Speech, Language and Hearing Sciences graduation course - a precursor experience in the area in which the entire curriculum is based on Active Teaching Methodologies.

Result:

the Child Language Study Module occurs in the Cycle II of the Course and consists in nine Problem-Situations and, each of them, is discussed in two tutorial sessions with up to ten students and led by a tutor. The Problem-Situations, as well as the Module, are drawn up by a committee of PhD professors and Language experts, according to the Pedagogical Project of the Course. It is discussed, in this article, the third Problem-Situation, entitled - "Same features, but different diagnoses... Why?"; The title role is to arouse the curiosity of students and to present the main problem approach. All Problem-Situations are evaluated by professors and students, in order to promote constant improvements.

Conclusion:

the problematizing context constructed from the Problem-Situations allows the students to search for answers daily, actively and autonomously, by experiencing and working in a team discussion, of the biopsychosocial aspects of the individual and the ethical issues in professional practice. Enabling, thus, the formation of resolute professionals, competent to constantly improve their knowledge and act in accordance with the Public Health practices in the Country.

KEYWORDS:
Problem-Based Learning; Health Education; Higher Education; Speech, Language and Hearing Sciences

Introdução

Os cursos de graduação em Fonoaudiologia foram criados, no Brasil, em meados de 1960, mas foi em nove de dezembro de 1981, que a profissão foi legalmente reconhecida com a Lei 6965/8111. Lei 6965, de 09 de dezembro de 1981. Dispõe sobre a regulamentação da profissão de Fonoaudiólogo, e determina outras providências. Diário Oficial Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF, p. 23333, 10 dez., 1981. Seção 1..

Desde então a formação do fonoaudiólogo, assim como de outros profissionais da área da saúde, tem sido marcada por práticas assistencialistas e reabilitadoras, focada no diagnóstico de doenças, no atendimento individual e pautada no atendimento da demanda espontânea, condição inerente dos serviços privados que se estendeu para os serviços públicos de saúde. Entretanto, a sociedade atual passou a exigir um profissional competente para a resolução dos problemas de saúde do indivíduo e da coletividade; o fonoaudiólogo mais próximo à realidade social e aos serviços de saúde pública. A inserção nesses serviços de forma ao entendimento de ações voltadas para o coletivo, buscando afirmar a integralidade do cuidado e desenvolvendo estratégias de promoção, prevenção e recuperação da saúde22. Lipay MS, Almeida EC. A fonoaudiologia e sua inserção na saúde pública. Rev. Ciênc. Méd. 2007;16(1):31-41..

O número de fonoaudiólogos nos diferentes níveis e serviços do setor público do Sistema Único de Saúde (SUS) ainda é restrito, e os que têm estão inseridos principalmente em serviços de média e alta complexidade, como ambulatórios e hospitais, com foco, portanto, no diagnóstico e na reabilitação. O que demonstra ainda um distanciamento desse profissional dos serviços de Atenção Primária à Saúde (APS) e, embora recentemente tenha ocorrido um significante aumento no número de profissionais nos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) este percurso ainda não foi capaz de transformar a realidade da Fonoaudiologia no contexto da Saúde Pública, havendo uma necessidade de se refletir e realizar práticas voltadas para a Educação em Saúde33. Casanova IA, Moraes AAA, Ruiz-Moreno L. O ensino da promoção da saúde na graduação de fonoaudiologia na cidade de São Paulo. Pro-Prosições. 2010;21(3):219-34..

Nesse caminho, as atenções se voltam para as Instituições de Ensino Superior (IES), visando capacitar profissionais com adequada formação técnica, ética e política e com visão integrada dos saberes, discutido assim a necessidade de novas formas de ensino-aprendizagem e, neste contexto, as Metodologias Ativas de ensino se destacam como possibilidade de ruptura com os métodos tradicionais de ensino44. Marin MJS, Lima EFG, Paviotti AB, Matsuyama DT, Silva LKD, Gonzalez C et al. Aspectos das fortalezas e fragilidades no uso das metodologias ativas de aprendizagem. Rev. bras. educ. med. 2010;34(1):13-20..

Em uma estrutura curricular que utiliza as Metodologias Ativas (MA) as disciplinas da metodologia tradicional são substituídas por Módulos de Ensino-Aprendizagem (práticos e teóricos), sendo que os módulos de caráter prático tendem a empregar o Método da Problematização (MP) - idealizado por Charles Maguerez - que utiliza os cenários reais, vivenciados na comunidade, para o aprendizado do discente. Os módulos teóricos, foco deste trabalho, utilizam a Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP), que tem como gatilho de aprendizagem a Situação-Problema (SP), discutida em Sessões Tutorias (ST)55. Berbel NN. Problematization and problem-based learning: diferente words or diferente ways? Interface. 1998;2(2):139-54.),(66. Mitre SM, Siqueira-Batista R, Girardi-de-Mendonça JM, Morais-Pinto NM, Meirelles CAB, Pinto-Porto C et al. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem na formação profissional em saúde: debates atuais. Ciênc. saúde coletiva. 2008;13(2):2133-44..

No contexto das MA, mais especificamente da ABP, o objetivo deste trabalho é descrever o processo de elaboração de uma Situação-Problema e de um Módulo de aprendizagem, e refletir a importância destes na formação do Fonoaudiólogo.

Métodos

Estudo descritivo e reflexivo sobre o processo de elaboração de uma Situação-Problema e de um Módulo teórico de aprendizagem de um curso de graduação em Fonoaudiologia que iniciou suas atividades em março de 2011. Trata-se do primeiro no Brasil a utilizar exclusivamente, em sua matriz curricular, práticas pedagógicas em Metodologias Ativas de Ensino.

Para a integralização do currículo, o discente deve cursar quatro Ciclos, sendo que cada Ciclo corresponde a um ano letivo, que é subdividido em Módulos teóricos e práticos. Especificamente, no segundo e terceiro Ciclos, cada Módulo tem o objetivo de analisar os pressupostos teórico-práticos da Fonoaudiologia em uma de suas áreas de especialidade.

Os conteúdos teóricos da cada Módulo são apresentados em nove SP que são discutidas em ST, formada por um grupo de oito a dez discentes e conduzidas por um professor tutor.

As SP são elaboradas por uma comissão de professores especialistas na área, de acordo com a ementa de cada Módulo, estabelecida no Projeto Pedagógico do curso. Todas as SP são avaliadas, individualmente, pelos discentes e pelos professores tutores ao término que cada ST, sendo realizadas de forma on line por meio de um link disponibilizado no inicio do ano letivo, considerando-se desde a construção do conhecimento até as possibilidades de discussão geradas a partir do problema trabalhado.

As ST, de um mesmo Módulo temático, apresentam conteúdos que se integram e se complementam, aumentando gradativamente o grau de complexidade das discussões entre a primeira e a última SP. As ST são responsáveis, portanto em nortear os estudos discentes, sendo de extrema relevância no processo de ensino-aprendizagem em Metodologias Ativas.

A SP aqui descrita faz parte do Módulo denominado "Estudo da Linguagem Infantil", que tem como ementa: "Desenvolvimento infantil nos aspectos cognitivos, motores, linguísticos e afetivos, com ênfase na comunicação humana. Objetivos, funções e limites da avaliação de linguagem. Discussão sobre os vários procedimentos avaliativos, aplicados a crianças e adolescentes". Este Módulo ocorre no segundo Ciclo que tem como eixo temático a Infância e a Adolescência.

A descrição e análise desta experiência precursora tem como base a literatura vigente sobre o tema "Metodologias Ativas".

Resultados

Para contemplar a ementa do Projeto Pedagógico do curso, o Módulo Estudo da Linguagem Infantil é constituído por nove SP. A primeira leva o discente a discutir os conceitos linguísticos, seus principais pensadores e a importância da linguística para os estudos fonoaudiológicos. A segunda trata do desenvolvimento normal da fala e da linguagem e as principais teorias, assim como a compreensão das funções e aspectos da linguagem. Na terceira, o discente estuda as alterações de linguagem e as implicações destas no desenvolvimento social e escolar das crianças. Na quarta, os estudos focam as alterações de fala e a diferenciação entre estes distúrbios e os de linguagem. Na seguinte, os estudos são sobre o desenvolvimento da escrita na humanidade, as diferenças entre a linguagem oral e a escrita e, por fim, as etapas para sua aquisição assim como as rotas de leitura. Já na sexta SP, o estudante tem contato com as possíveis alterações de escrita, sejam elas pedagógicas ou cognitivas. As três últimas SP trabalham com afecções que apresentam características especificas nas alterações de comunicação sendo abordados, respectivamente, a gagueira, os transtornos invasivos do desenvolvimento e as encefalopatias crônicas não progressivas.

Todas as SP são discutidas em duas ST sempre conduzidas por um professor doutor, fonoaudiólogo e especialista em Linguagem. A organização de cada ST percorre o mesmo caminho, constituído por sete passos, que se iniciam com a apresentação da SP pelo tutor aos discentes e a leitura desta pelo grupo; seguida pela identificação e elucidação dos termos desconhecidos; e, a formulação, pelos discentes, de hipóteses explicativas para a SP possibilitando uma primeira discussão, com base em conhecimentos prévios dos discentes, sobre as prováveis fundamentações de tais hipóteses. Como quinto passo, os alunos estabelecem os objetivos de aprendizagem que são as âncoras disparadoras do estudo individual.

A ST é então interrompida e tem início a aprendizagem autodirigida (AAD), momento para que o aluno busque referências e explicações para a solução da SP. A busca é independente e o tutor não estabelece referenciais teóricos que devam ser seguidos, o que significa que o discente pode pesquisar sobre os assuntos nas várias fontes informativas, assim como pode também ouvir a opinião de especialistas na área. Na ST seguinte, como sétimo passo, o grupo rediscute a SP frente aos novos conhecimentos adquiridos, solucionando em conjunto o problema proposto.

Como exemplo, apresenta-se a SP que tem como título - "Mesmas características, mas diagnósticos diferentes... Por quê?", a terceira a ser entregue aos discentes, durante o Módulo Estudo da Linguagem Infantil. Convém salientar que o título tem papel importante, pois tem o objetivo de despertar a curiosidade do discente e apresentar o enfoque principal do problema.

A SP foi elaborada de forma objetiva e direta, como pode ser observado: "Raquel e Luan, pais de Joaquim de 4 anos, foram chamados na escola pelas dificuldade que Joaquim apresentava, dentre elas, a falta de interação com as outras crianças, já que sua fala era, na maioria da vezes, ininteligível, nem mesmo a professora o entendia. Por esse motivo, foi encaminhado para avaliação fonoaudiológica. Durante o processo de avaliação os pais observaram que a fonoaudióloga investigou não só a fala e a linguagem, mas aspectos do desenvolvimento cognitivo, sensorial, perceptual, sócio-educacional, além de solicitar uma avaliação audiológica, antes de fechar o diagnóstico".

Ao fim de todas as ST, os discentes, assim como o tutor, realizam as avaliações da SP e ao término de cada Módulo as respostas são analisadas pela comissão de elaboração do Módulo.

Discussão

Um Módulo de aprendizagem em Metodologias Ativas de ensino é baseado em um elenco de situações que o discente deverá ter conhecimento. A análise das situações leva os docentes, especialistas na área, a determinarem quais conhecimentos são necessários adquirir para cada uma delas, constituindo os temas de estudo. Cada tema, relativo à esfera cognitiva, é transformado então em uma SP para ser estudado e discutido pelos alunos na ST77. Universidade Estadual de Londrina. Centro de Ciências da Saúde. Colegiado do Curso de Medicina. [acesso em 10 agosto 2015].Disponível: http://www.uel.br/ccs/medicina.
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A construção das SP exige do docente uma visão ampliada, integrada e integradora dos temas imprescindíveis a serem estudados, contemplando diferentes aspectos do processo saúde-doença mais prevalentes no perfil epidemiológico nacional, com ênfase na sua região de atuação e identificando as dimensões bio-psico-sociais. Para isso, devem seguir alguns princípios como: realizar uma descrição dos fenômenos abordados no problema da forma mais neutra possível, formular o problema de forma concreta, minimizar os distratores do texto, guiar o aprendizado a um número limitado de itens, e conter itens que utilizem as informações prévias dos discentes88. Lima GZ, Linhares REC. Escrever bons problemas. Rev. bras. educ. med. 2008;32(2):197-201.) .

Além disso, os problemas devem ser necessariamente abertos, não comportarem uma única solução correta, mas uma ou mais soluções possíveis, para que o discente tenha a oportunidade de se engajar em um processo de especulação, definição, coleta de informações, análise e redefinição do problema. Quanto menos específico for o problema, maior a probabilidade de desenvolvimento de habilidades de solução e estudo autônomo99. Ribeiro LRC. Aprendizagem Baseada em Problemas - Uma experiência no ensino superior. São Carlos: EdUFSCar; 2010..

Neste trabalho, a elaboração do Módulo Estudo da Linguagem Infantil fica a cargo de uma comissão constituída por três docentes especialistas em Linguagem e que, além disso, realizaram doutorado em programas de pós-graduação em áreas correlacionadas a fonoaudiologia, quais sejam, Neurociências, Psicobiologia e Educação Especial, possibilitando a integração de saberes necessários para a construção do Módulo, e favorecendo a interdisciplinaridade dos conteúdos.

As SP devem conter os temas essenciais para que os discentes cumpram o currículo e estejam aptos para o exercício profissional1010. Sobral FR, Campos CJG. Utilização de metodologia ativa no ensino e assistência de enfermagem na produção nacional: revisão integrativa. Rev. esc. enferm. USP. 2012;46(1):208-18., com esse fim, a SP, descrita nesta comunicação, levou em consideração aspectos importantes e comumente encontrados na atuação profissional do fonoaudiólogo, a saber: o sexo, a idade do encaminhamento, o profissional que encaminhou para o atendimento fonoaudiológico e os aspectos biopsicossociais envolvidos. Assim como, o desconhecimento da ampla atuação do fonoaudiólogo também foi considerado, por ser, ainda nos dias de hoje, um aspecto que merece atenção do profissional.

Para isso, os temas de estudo e aprendizagem, estabelecidos pela comissão, para esta SP foram: 1) identificar, caracterizar e diferenciar as alterações do desenvolvimento da linguagem e, 2) analisar as implicações das alterações de linguagem no desenvolvimento social e escolar das crianças; sendo que estes não podem ser apresentados aos discentes. É importante salientar que estes objetivos de estudo são atingidos, pois o texto apresenta gatilhos para que isso ocorra, sem informações desviantes nos quais o discente possam se perder.

As MA são baseadas em formas de desenvolver o processo de aprender, utilizando experiências reais ou simuladas, tendo em vista às condições de solucionar, com sucesso, desafios advindos das atividades essenciais da prática social, em diferentes contextos1111. Berbel NAN. As metodologias ativas e a promoção da autonomia de estudantes. Semina: Ciências Sociais e Humanas. 2011;32(1):25-40.. Além disso, a SP tem como função gerar dúvidas, desequilíbrios ou perturbações intelectuais para que o discente possa delinear o percurso necessário, a fim de conhecer diferentes possibilidades de solução1212. Mezzari A. O uso da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) como reforço ao ensino presencial utilizando o ambiente de aprendizagem Moodle. Rev. bras. educ. med. 2011;35(1):114-21.. A SP representa, portanto, uma ferramenta de trabalho fundamental dentro de um projeto pedagógico que adota a abordagem da ABP. Isso porque para que as ST alcancem os objetivos pretendidos é imprescindível que as SP contemplem o conteúdo programático necessário para a formação profissional do discente88. Lima GZ, Linhares REC. Escrever bons problemas. Rev. bras. educ. med. 2008;32(2):197-201..

Além da presença do tutor nas ST, os discentes devem se revezar exercendo as funções de coordenador e secretário, no decorrer do Módulo, tendo como principais atribuições, respectivamente: 1) coordenar e conduzir a discussão, garantindo que todos os integrantes do grupo participem da resolução do problema e 2) anotar os pontos discutidos, a fim de evitar que o grupo se desvie do tema abordado e que se repitam os assuntos já discutidos1313. Cabral HSR, Almeida KVG. Problem based learning: aprendizagem baseada em problemas. Rev. Interfaces [periódico na Internet]. 2014. [acesso em 15 junho2015];2(4):[5].Disponível: http://interfaces.leaosampaio. edu.br /index.php/ revista-interfaces/article/view/35/42.
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. As discussões ocorrem respeitando os sete passos da ST, sendo essencial a participação ativa de todos os discentes no sentido de mudança de papéis, na maneira de se colocar e de se posicionar, tendo como objetivo sempre, a construção do conhecimento.

Vale ressaltar que no quinto passo os objetivos elencados pelos discentes devem ser os mesmos, ou similares, ao pretendido pela comissão de elaboração da SP, garantindo assim que o conteúdo programático seja contemplado integralmente. Como se constata na literatura88. Lima GZ, Linhares REC. Escrever bons problemas. Rev. bras. educ. med. 2008;32(2):197-201., quando os objetivos não coincidem, a SP deve ser reformulada ou descartada, pois não mostrou eficácia na elucidação dos temas pretendidos.

Durante a AAD, período para os estudos independentes que ocorre entre a discussão inicial e a final, os discentes têm a autonomia de utilizar livros, artigos, vídeos, consultas com especialistas ou outros meios, desde que cumpram os objetivos de aprendizado1414. Smolka MLRM, Gomes AP, Siqueira-Batista R. Autonomia no Contexto Pedagógico: percepção de Estudantes de Medicina acerca da Aprendizagem Baseada em Problemas. Rev. bras. educ. med. 2014;38(1):5-14.. Há um controle dos temas que deverão ser estudados, porém o discente é autônomo na busca de respostas, na escolha crítica das fontes e na síntese das informações obtidas, já que a ABP é uma metodologia formativa e não apenas informativa, como comumente ocorre nos métodos tradicionais de ensino, encorajando o discente a buscar ativamente seu conhecimento e a se responsabilizar pela sua aprendizagem1111. Berbel NAN. As metodologias ativas e a promoção da autonomia de estudantes. Semina: Ciências Sociais e Humanas. 2011;32(1):25-40., justificando aqui a conduta do tutor em não estabelecer referenciais teóricos para serem seguidos pelos discentes.

Com relação à formação e o nível de conhecimento do tutor responsável pela ST a opção aqui foi definir um docente da comissão de elaboração, ou seja, especialista na área, como tutor no Módulo. Entretanto, apesar de ser um aspecto relevante, ainda é controversa a literatura sobre qual a profundidade de conhecimentos específicos que deve ter o tutor para orientar de forma eficaz o processo de aprendizagem nas ST. É importante salientar que o papel do tutor é mediar o grupo na tarefa de cumprir os objetivos de aprendizagem e, segundo alguns estudos, para uma melhor aquisição cognitiva é necessário que ele seja especialista sobre os temas abordados na SP que irá tutorar, já que pode intervir na construção de hipóteses ou nos tópicos de aprendizagem que estão sendo levantados pelos alunos, sem, no entanto lhes revelar a solução do problema1515. Macallan DC, Kent A, Holmes SC, Farmer EA, McCrorie P. A model of clinical problem-based learning for clinical attachment in medicine. Med Educ 2009;43:799-807.)-(1717. Saliba NA, Moimaz SAS, Chiaratto RS, Tiano AVP. The use of PBL methodology in Dentistry: displaying new possibilities for the teaching-learning process. Rev odonto ciênc. 2008;23(4):392-6.. Entretanto, para outros não é imperativo que o mesmo seja especialista, contudo, é desejável que seu conhecimento sobre o tema seja suficiente para permitir um redirecionamento do grupo em casos nos quais as discussões se desviam do eixo proposto pelo problema1818. Park SE, Susarla SM, Cox CK, Da Silva J, Howell TH. Do tutor expertise and experience influence student performance in a problem-based curriculum? J Dent Educ. 2007;71(6):819-24.),(1919. Peets AD, Cooke L, Wright B, Coderre S, McLaughlin K. A prospective randomized trial of content expertise versus process expertise in small group teaching. BMC Med Educ. 2010;10:70..

Fato é, que o papel do docente na perspectiva das MA, ao contrario do que se possa pensar em um primeiro momento, ganha um status de relevância, ao mesmo tempo que aumentam as suas responsabilidades quando comparadas a estilos de trabalho convencionais. Isso porque o papel do docente vai além da transmissão de conhecimento, sendo fundamental para o envolvimento do discente com o seu aprendizado, já que a interação entre discente e docente é descrita como uma das principais fontes de motivação para o "aprender a aprender". A empatia com o professor facilita a identificação pessoal com aquilo que ele apresenta, possibilitando a valorização das atividades e conteúdos propostos e a internalização das exigências ou demandas externas1111. Berbel NAN. As metodologias ativas e a promoção da autonomia de estudantes. Semina: Ciências Sociais e Humanas. 2011;32(1):25-40.),(1212. Mezzari A. O uso da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) como reforço ao ensino presencial utilizando o ambiente de aprendizagem Moodle. Rev. bras. educ. med. 2011;35(1):114-21..

A avaliação da aprendizagem é uma etapa essencial em um currículo que utiliza MA, tanto para a formação discente quanto para o aprimoramento continuo do curso, para tanto, deve ocorrer durante todo o Módulo, de forma horizontal, em que os docentes avaliam seu trabalho e a aprendizagem dos discentes, e estes avaliam as SP, avaliam os seus parceiros, se autoavaliam e avaliam o tutor2020. Venturelli J, Fiorini VML. Programas Educacionais inovadores em escolas médicas: capacitação docente. Rev bras educ med. 2001;25:7-21.),(2121. Silva RHA, Scapin LT. Utilização da avaliação formativa para a implementação da problematização como método ativo de ensino-aprendizagem. Est. Aval. Educ. 2011;22(50):537-52..

Especificamente a avaliação das SP é vista na literatura como parte importante da análise qualitativa do currículo e de todas as suas etapas; devendo ocorrer frequentemente por discentes e docentes. Todas as respostas devem ser discutidas pela comissão de elaboração do Módulo verificando a necessidade de considerar a manutenção ou a exclusão de ideias iniciais, a inserção, se necessário, de novas questões de aprendizagem e a reformulação das mesmas, possibilitando a elaboração de novas SP e o aperfeiçoamento dos Módulos temáticos1313. Cabral HSR, Almeida KVG. Problem based learning: aprendizagem baseada em problemas. Rev. Interfaces [periódico na Internet]. 2014. [acesso em 15 junho2015];2(4):[5].Disponível: http://interfaces.leaosampaio. edu.br /index.php/ revista-interfaces/article/view/35/42.
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),(1414. Smolka MLRM, Gomes AP, Siqueira-Batista R. Autonomia no Contexto Pedagógico: percepção de Estudantes de Medicina acerca da Aprendizagem Baseada em Problemas. Rev. bras. educ. med. 2014;38(1):5-14.),(2222. Lopes RM, Silva Filho MV, Marsden M, Alves NG. Aprendizagem baseada em problemas: uma experiência no ensino de química toxicológica. Quim. Nova. 2011;34(7):1275-80..

No link utilizado para avaliação da SP, como descrita neste trabalho, o discente deve identificar as seguintes condições: 1) grau de facilidade para identificar as questões da SP; 2) grau de facilidade para levantar hipóteses; 3) grau de facilidade para estabelecer os objetivos do estudo; 4) grau de facilidade para resolver a SP; 5) grau de estimulação da discussão em grupo e questão; e 6) grau de abordagem das questões bio-psico-sociais; em que cada item deverá ser pontuado de zero a quatro, sendo zero/insuficiente, um/fraco, dois/médio, três/bom e quatro/ótimo.

Como pode ser visto todo o processo envolvido nas ST, desde a construção do Módulo e da SP até as avaliações realizadas, faz com que os discentes necessitem buscar as informações, sendo especialmente estimulados a trabalhar com elas, elaborando-as e reelaborando-as em função do que precisam responder ou equacionar. Fazendo com que ocorra, gradativamente, o desenvolvimento do espírito científico, do pensamento crítico e reflexivo e, de valores éticos, entre outras conquistas dessa natureza, por meio da educação, contribuindo assim para o desenvolvimento da autonomia na formação do ser humano e de futuros profissionais1111. Berbel NAN. As metodologias ativas e a promoção da autonomia de estudantes. Semina: Ciências Sociais e Humanas. 2011;32(1):25-40.),(2323. Dornelas R, Barreto ACO, Guedes-Granzotti RB, Domenis DR, César CPHAR, Alencar RI et al. Active Methodologies: An experience in Speech, Language and Hearing Sciences. Dist Comun. 2014;26(4):815-21..

Conclusão

A utilização de Metodologias Ativas de ensino na formação do Fonoaudiólogo busca, por meio de um contexto problematizador, em que as respostas são construídas diariamente de forma ativa e autônoma e, discutindo-se aspectos biopsicossociais do indivíduo e questões éticas da atuação profissional, formar profissionais resolutivos, competentes para aperfeiçoar seu conhecimento constantemente e de atuar em consonância com as práticas de Saúde Pública do País.

Para isso a construção dos Módulos de aprendizagem e a formulação das Situações-Problemas devem ser condizentes com a realidade que o profissional irá encontrar em sua prática clínica, considerando que durante todo o processo o discente utiliza o seu conhecimento de vida, busca novas informações e as integram, assumindo assim, cada vez mais uma postura critica diante de situações reais.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    25 Maio 2015
  • Aceito
    07 Set 2015
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