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Concordância entre classificação das queixas obtidas nas triagens e diagnóstico fonoaudiológico de crianças de 0-12 anos

RESUMO

Objetivo:

analisar a concordância entre a classificação das queixas fonoaudiológicas encontradas na triagem com os resultados das avaliações específicas de cada área em uma clínica-escola de Fonoaudiologia no sul do Brasil.

Métodos:

estudo descritivo, retrospectivo, de corte transversal, a partir de dados secundários, coletados de 133 prontuários das crianças com idade até 12 anos. A classificação das queixas encontradas nas triagens foi comparada com os diagnósticos atribuídos após a avaliação. Foram classificados 3 grupos: Grupo 1 - totalmente em acordo: Quando houve queixas e diagnósticos idênticos em número e classificação; Grupo 2 - Parcialmente em desacordo: Queixas e diagnósticos iguais, mas havendo outros discordando em número ou em área da Fonoaudiologia; e Grupo 3 - Totalmente em desacordo: Quando houvesse discordância entre queixas e diagnósticos, em número e classificação.

Resultados:

a prevalência foi de 61% para o sexo masculino. A média de idade foi de sete anos e dois meses. Não houve diferença significante entre os valores dos grupos 1 e 2, 47,4% e 46,6% respectivamente. O grupo 3 teve apenas 6%. As queixas que mais foram relatadas na triagem foram classificadas em Motricidade Orofacial (34,9%), Fala (23,1%), Linguagem (13,4%) e Fonologia (8,6%). Os diagnósticos mais encontrados foram: Motricidade Orofacial (39,8%), Fonologia (20,4%), Linguagem (11,8%), Fala (6,5%). A classificação das queixas e diagnósticos que obtiveram maior concordância foram: Fonologia, Motricidade Orofacial, Disfluência e Linguagem. Apresentou maior discordância a queixa de voz.

Conclusão:

houve concordância entre os resultados da triagem e do diagnóstico, em número e área fonoaudiológica , sendo que a maior foi referente à classificação de queixas e diagnósticos em Motricidade Orofacial.

Descritores:
Fonoaudiologia; Necessidades e Demandas de Serviços de Saúde; Ciências da Saúde; Diagnóstico; Triagem

ABSTRACT

Purpose:

to analyze the correlation between the classification of speech pathology findings on screening with the results of specific assessments of each area in a speech pathology university clinic in southern Brazil.

Methods:

a descriptive, retrospective, cross-sectional study with secondary data collected from medical records of 133 children under 12 years old. The classification of complaints found during screening were compared with the diagnoses given after evaluation. They were classified into 3 groups: Group 1 - Full correlation: When the complaints and diagnoses were identical in number and classification; Group 2 - Partial correlation: Equal complaints and diagnoses, however, are others disagreeing in number or in the area of Speech Pathology and Group 3 - No correlation: When there was correlation between complaints and / or diagnosis, in number and classification.

Results:

there was prevalence of 61 % males. The average age was seven years and two months. There was no significant difference between the values ​​of groups 1 and 2: 47.4 % and 46.6 % respectively. Group 3 had only 6 % correlation. The complaints that were reported during screening were classified as Orofacial Motricity (34.9 %), Speech (23.1 %) , Language (13.4%) and Phonology (8.6%). The most frequent diagnoses were : Orofacial Motricity (39.8%), Phonology (20.4%), Language (11.8%), Speech (6.5%). The complaints and diagnoses that had higher correlation were: Phonology, Orofacial Motricity, Stuttering and Language. There was greater disagreement for complaints about voice.

Conclusion:

there was correlation between the results for screening and diagnosis, in number and speech pathology areas, with the highest values concerning the classification of complaints and diagnoses for Orofacial Motricity.

Keywords:
Speech, Language and Hearing Sciences; Needs and Demands of Health Services; Health Sciences; Diagnosis; Screening

Introdução

O ponto de partida fundamental para qualquer tipo de atendimento fonoaudiológico é saber qual é a queixa, ou, o motivo pelo qual o indivíduo procurou um fonoaudiólogo. A queixa deve ser o centro do planejamento terapêutico da equipe, pois ela é a motivação da pessoa para procurar e aderir ao tratamento. É imprescindível a colaboração do paciente, pois o fonoaudiólogo trabalha com mudanças de padrões e/ou de hábitos já instalados11. Goulart BNG. A fonoaudiologia no tratamento das fissuras labiopalatinas: da infância a idade adulta. In: Marchesan I, Zorzi J, organizadores. Tópicos em fonoaudiologia 2002/2003. Rio de Janeiro: Revinter; 2003. p.309-13.),(22. Junqueira P. Avaliação Miofuncional IN: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia: Aspectos Clínicos da Motricidade Oral. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan; 2005. p. 19-27..

Muitas pessoas que procuram o fonoaudiólogo são encaminhadas por outros profissionais da saúde (cirurgiões dentistas, médicos, etc) ou da educação sem saberem como é realizada a intervenção fonoaudiológica e se há necessidade concreta em realizá-la. E, principalmente, sem que a queixa seja efetivamente do paciente ou responsável, e sim desse profissional que encaminhou. É no levantamento da queixa que se assegura estas questões com a finalidade de compreender o interesse do indivíduo pelo tratamento e seu envolvimento nele11. Goulart BNG. A fonoaudiologia no tratamento das fissuras labiopalatinas: da infância a idade adulta. In: Marchesan I, Zorzi J, organizadores. Tópicos em fonoaudiologia 2002/2003. Rio de Janeiro: Revinter; 2003. p.309-13.),(22. Junqueira P. Avaliação Miofuncional IN: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia: Aspectos Clínicos da Motricidade Oral. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan; 2005. p. 19-27..

É comum o paciente estar em atendimento fonoaudiológico, sem saber o que esta ciência aborda em seu trabalho e o que ela pode contribuir para a sua qualidade de vida. Em uma pesquisa sobre o conhecimento que os acompanhantes de pacientes de uma clínica escola de Fonoaudiologia têm sobre a atuação dos fonoaudiólogos, verificou-se uma percepção restrita em relação a atuação do fonoaudiólogo dentro de sua profissão e o que este pode oferecer à população quanto a promoção de saúde e prevenção de agravos. Nesta pesquisa, a maioria dos participantes respondeu que o fonoaudiólogo é quem trabalha com a fala e a audição, visando melhorar a comunicação, a qualidade de vida e o relacionamento social do indivíduo33. Pimentel AGL, Lopes- Herrera SA, Duarte TF. Conhecimento que acompanhantes de pacientes de uma clínica-escola de Fonoaudiologia tem sobre a atuação fonoaudiológica. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(1):40-6..

A entrevista inicial possui um papel importante para enunciação da queixa, devendo ser configurada como um espaço de escuta e acolhimento ao paciente que neste momento deve colocar seu sofrimento relacionado ao(s) sintoma(s)44. Ieto V, Cunha MC. Queixa, demanda e desejo na clínica fonoaudiológica: um estudo de caso clínico. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(4):329-34.. Por queixa entende-se a manifestação espontânea, por parte do paciente, com relação a agravos e prejuízos físicos causados por qualquer alteração na área da fonoaudiologia. O acolhimento auxilia a definição das prioridades diante das necessidades de atenção da pessoa que busca atendimento fonoaudiológico.

O resultado da avaliação fonoaudiológica, por sua vez, deve oferecer condições suficientes para o diagnóstico, prognóstico, plano terapêutico e possíveis encaminhamentos para a efetiva resolutividade dos problemas identificados 22. Junqueira P. Avaliação Miofuncional IN: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia: Aspectos Clínicos da Motricidade Oral. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan; 2005. p. 19-27.),(55. Goulart BNG, Chiari BM. Avaliação clínica fonoaudiológica, integralidade e humanização:perspectivas gerais e contribuições para reflexão. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(4):335-40.. Desta forma, o fonoaudiólogo deve definir se o paciente necessita ou não de terapia, definir um projeto terapêutico singular, no qual fiquem esclarecidas as necessidades e limitações da intervenção, exames complementares necessários, encaminhamentos ou parcerias com outros profissionais e discutir conjuntamente suas condições para iniciá-la, se precisa de encaminhamentos para outros profissionais, assim como, no caso de iniciar um atendimento fonoaudiológico, quais seriam os limites desse trabalho 22. Junqueira P. Avaliação Miofuncional IN: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia: Aspectos Clínicos da Motricidade Oral. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan; 2005. p. 19-27.).

O objetivo deste estudo é analisar a concordância entre as classificações das queixas fonoaudiológicas relatadas na triagem com os resultados das avaliações fonoaudiológicas específicas de cada área em uma clínica-escola de Fonoaudiologia no sul do Brasil.

Métodos

Este é um estudo descritivo, retrospectivo, transversal. Foi desenvolvido na clínica-escola Fonoaudiologia do Curso de Fonoaudiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), localizada na Faculdade de Odontologia. Aprovado sob número 137.238 pelo Comitê de Ética em Pesquisa - CEP/UFRGS, que dispensou a assinatura de TCLE devido ao perfil da pesquisa.

Os dados foram coletados a partir dos prontuários das crianças com idade até 12 anos, atendidos por fonoaudiólogos e estagiários na referida clínica-escola, no período de Março de 2010 à Outubro de 2012. A demanda da clínica-escola de Fonoaudiologia é constituída por pessoas que buscam atendimento espontâneamente ou por encaminhamentos de profissionais, pesquisas e outras clínica-escolas da faculdade. As clínicas de Odontologia, que funcionam no mesmo prédio, fazem o maior número de encaminhamentos.

De um total de 702 triagens realizadas, 544 foram catalogados em um banco de dados, pois os demais (22,5%) não se encontravam preenchidos de forma correta ou estavam incompletos, sendo este o critério de exclusão da amostra. Apenas 133 prontuários atenderam ao critério de seleção - ter até 12 anos de idade e possuir triagem e avaliação completas - e, nesse caso, foram incluídos na amostra.

Os dados analisados foram retirados dos protocolos de triagens disponíveis na Clínica de Fonoaudiologia da UFRGS e dos dados de avaliação/terapia, contidos nos prontuários fonoaudiológicos pertencentes à supracitada clínica.

As variáveis identificadas para o estudo foram sexo, idade, escolaridade (na data da triagem), procedência, resultado da triagem, número de identificação de queixas fonoaudiológicas e diagnóstico fonoaudiológico.

As queixas fonoaudiológicas foram classificadas de acordo com os diversos aspectos da competência de atuação fonoaudiológica: Motricidade Orofacial, Fissura Lábio-Palatina, Distúrbio Fonológico, Queixa audiológica, Alterações Neurológicas, Déficits de Aprendizagem, Disfunção Temporomandibular (DTM), Transtornos do Espectro Autista, Linguagem Oral, Fala, Disfluência, Pessoas com Deficiência (PcD), Voz, Disfagia e outros. E esta mesma classificação foi utilizada na categorização dos diagnósticos fonoaudiológicos.

As queixas encontradas em cada prontuário foram comparadas com os diagnósticos atribuídos após a avaliação. Então foi verificada a concordância entre as queixas e os diagnósticos. O resultado deste levantamento foi comparado utilizando as variáveis: número e identificação de queixas e diagnósticos idênticos.

Assim, foram classificados 3 grupos: Grupo 1 (G1) - totalmente em acordo: Quando houve queixas e diagnósticos idênticos em número e classificação; Grupo 2 (G2) - Parcialmente em desacordo: Queixas e diagnósticos iguais, mas havendo outros associados discordando em número ou em área da Fonoaudiologia. Grupo 3 (G3) - Totalmente em desacordo: Quando houvesse discordância queixas e/ou diagnóstico em numero e classificação.

A partir da análise das informações contidas nos prontuários dos pacientes, os dados armazenados em planilha eletrônica microsoft excel(r) foram transpostos para o programa de análise estatística Statistical Programm for Social Sciences (SPSS) versão 17 e realizada estatística descritiva (frequência e percentuais).

Resultados

Dos 133 prontuários analisados a ocorrência foi de 61% para o sexo masculino e 39% para o sexo feminino.

A média de idade foi de 7,2 meses (desvio padrão 2,75), sendo a mínima de dois anos e cinco meses e a idade máxima de 12,9.

A Tabela 1 representa os dados referentes ao sexo, escolaridade e procedência da população estudada.

Tabela 1:
Perfil dos pacientes atendidos na clínica-escola de Fonoaudiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - sexo, escolaridade e procedência. (Porto Alegre, 2013)

A Figura 1 mostra os valores absolutos e percentuais de crianças atendidas pela clínica-escola em relação a idade.

Figura 1:
Distribuição dos pacientes triados e avaliados na Clínica de Fonoaudiologia, segundo a idade (Porto Alegre, 2013).

De acordo com a Figura 2, os grupos 1, 2 e 3 apresentam a classificação em relação a triagem e diagnóstico. Houve pouca diferença entre os valores dos grupos 1 e 2. Chama atenção o grupo 2 com altos valores demonstrando concordância parcial entre os resultados da triagem e avaliação. O grupo 3 aponta os resultados da discordância, de números e classificação, entre queixa e diagnóstico. A Figura 3 revela a distribuição do número de queixas apresentado por paciente.

Figura 2:
Distribuição dos pacientes triados e avaliados, segundo os classificadores da concordância entre queixa e diagnóstico (Porto Alegre, 2013).

Figura 3:
Distribuição do número de queixas apresentado por paciente (Porto Alegre, 2013).

Nas triagens, as queixas que mais foram relatadas são relacionadas a Motricidade Orofacial (34,9%), Fala (23,1%), Linguagem (13,4%), Fonologia (8,6%), Disfluência (7,5%) e Aprendizagem (4,8%). Os diagnósticos mais encontrados foram: Motricidade Orofacial (39,8%), Fonologia (20,4%), Linguagem (11,8%), Fala (6,5%), Disfluência (5,9%), Aprendizagem (5,4%).

O teste de frequência mostrou a concordância entre classificação das queixas apresentadas pelos pacientes e os diagnósticos realizados após a avaliação fonoaudiológica, que podem ser observados na Tabela 2. A classificação das queixas que obteve maior relação com os diagnósticos foram: Motricidade Orofacial, Fonologia, Linguagem, Fala e Disfluência. A classificação das queixas e diagnósticos que tiveram total discordância foram com relação à voz. O teste ainda mostrou diagnósticos para os pacientes que não tiveram queixas associadas: foram 19 casos, nos quais 8 Motricidade Orofacial, 3 Aprendizagem, 3 Voz, 2 outros, 1 Linguagem, 1 Fala e 1 Autismo. (Inserir Tabela 2)

Discussão

A maioria das pesquisas consultadas concorda com os achados deste estudo, nos quais a maior ocorrência de encaminhamento para terapia fonoaudiológica é de pessoas do sexo masculino 66. Hage SRV, Faiad LN. Perfil de Pacientes com alteração de Linguagem atendidos na Clínica de Diagnósticos dos distúrbios da comunicação - Universidade de São Paulo - Campus Bauru. Rev CEFAC. 2005;7(4):433-40.)-(1313. Cavalheiro LG, Brancalioni AR, Keske-Soares M. Prevalência de desvio fonológico em crianças da cidade de Salvador, Bahia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2012;17(4):441-6.. As explicações para esse fato não são consensuais, e um autor afirma que o cérebro dos meninos possui uma maturação mais lenta que o das meninas 66. Hage SRV, Faiad LN. Perfil de Pacientes com alteração de Linguagem atendidos na Clínica de Diagnósticos dos distúrbios da comunicação - Universidade de São Paulo - Campus Bauru. Rev CEFAC. 2005;7(4):433-40.. Outros estudos apontam para os fatores genéticos que são determinantes na prevalência de distúrbios específicos de linguagem no sexo masculino1414. Lai CS, Fisher SE, Hurst JA, Vargha-Khadem F, Monaco AP. A forkhead-domain gene in mutatedin a severe speech and language disorder. Nature. 2001;413(6855):519-23.),(1515. O´Brien EK, Zhang X, Nishimura C, Tomblin JB, Murray JC. Association of specific language impairment (SLI) to the region of 7q31. Am J Hum Genet. 2003;72(6):1536-43..

Houve predomínio nas idades de 4 a 6 anos, seguindo de 8 a 10 anos, ou seja, 42,1% das triagens e avaliações ocorreram em crianças com idade pré-escolar e escolar. Outros autores descrevem a relação entre alterações fonoaudiológicas em idades semelhantes77. César AM, Maksud SS. Caracterização da demanda de Fonoaudiologia no Serviço Público Municipal de Ribeirão das Neves - MG. Rev CEFAC. 2007;9(1):133-8.),(1111. Mandrá PP, Diniz MV. Caracterização do perfil diagnóstico e fluxo de um ambulatório de Fonoaudiologia hospitalar na área de Linguagem infantil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):121-5.),(1212. Diniz RD, Bordin R. Demanda em Fonoaudiologia em um serviço público municipal da região Sul do Brasil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):126-31.),(1616. Antunes DK. Perfil fonoaudiológico da comunidade do Dendê: perspectiva para ações futuras. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):264-9.. Vale ressaltar que na idade de 5 anos foi encontrado o maior número de queixas (15,8%). Este dado já foi levantado e concorda com a literatura 1313. Cavalheiro LG, Brancalioni AR, Keske-Soares M. Prevalência de desvio fonológico em crianças da cidade de Salvador, Bahia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2012;17(4):441-6..

A maior parte dos indivíduos reside na cidade de Porto Alegre, onde está localizada a clínica-escola de Fonoaudiologia. Em pesquisa semelhante realizada em Salvador, Bahia88. Costa RG, Souza LBR. Perfil dos usuários e a demanda pelo serviço da clínica-escola de Fonoaudiologia da UFBA. R. Ci. Méd. biol., 2009;8(1):53-9., os pesquisadores encontraram dado semelhante aos da presente pesquisa no que diz respeito ao logradouro dos pacientes que procuravam sua clínica-escola, sendo que 94,9% viviam na capital e apenas 5,1% em cidades vizinhas. Em outra pesquisa com objetivos semelhantes1111. Mandrá PP, Diniz MV. Caracterização do perfil diagnóstico e fluxo de um ambulatório de Fonoaudiologia hospitalar na área de Linguagem infantil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):121-5., os autores encontraram, da mesma forma, que 84,5% dos pacientes que procuravam o ambulatório de fonoaudiologia ligado ao Hospital Universitário da USP (campus Ribeirão Preto) eram provenientes de Ribeirão Preto, e os demais de outras localidades do Estado de São Paulo.

Essa informação sugere que os serviços vinculados às universidades são importantes referências para o município, em diferentes regiões do país. No entanto, não foi identificado o papel destas unidades na rede de atenção fonoaudiológica conveniada ao SUS local, nem dos municípios vizinhos, para avaliar o impacto do serviço no acesso da população ao tratamento em fonoaudiologia.

Estudos apontam queixas de alterações de fala como as mais comuns no atendimento fonoaudiológico77. César AM, Maksud SS. Caracterização da demanda de Fonoaudiologia no Serviço Público Municipal de Ribeirão das Neves - MG. Rev CEFAC. 2007;9(1):133-8.)-(99. Barros PML, Oliveira PN. Perfil dos Pacientes atendidos no setor de Fonoaudiologia de um Serviço Público de Recife-PE. Rev CEFAC. 2010;12(1):128-33.),(1212. Diniz RD, Bordin R. Demanda em Fonoaudiologia em um serviço público municipal da região Sul do Brasil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):126-31.),(1616. Antunes DK. Perfil fonoaudiológico da comunidade do Dendê: perspectiva para ações futuras. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):264-9.) nos serviços públicos. Em alguns trabalhos a queixa de Motricidade Orofacial vem em segundo lugar 77. César AM, Maksud SS. Caracterização da demanda de Fonoaudiologia no Serviço Público Municipal de Ribeirão das Neves - MG. Rev CEFAC. 2007;9(1):133-8.)-(99. Barros PML, Oliveira PN. Perfil dos Pacientes atendidos no setor de Fonoaudiologia de um Serviço Público de Recife-PE. Rev CEFAC. 2010;12(1):128-33.. Um levantamento realizado em uma clínica especializada em Linguagem refere que dentro desta área as maiores prevalências foram de atraso de linguagem, distúrbios de linguagem e distúrbios de aprendizagem1111. Mandrá PP, Diniz MV. Caracterização do perfil diagnóstico e fluxo de um ambulatório de Fonoaudiologia hospitalar na área de Linguagem infantil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):121-5.. Uma pesquisa verificou que a baixa escolaridade está relacionada às queixas auditivas, enquanto que a baixa renda está associada a alterações da motricidade oral e vocal.

Os autores sugerem que as alterações fonoaudiológicas encontradas (Linguagem, Voz, Motricidade Orofacial e Queixas audiológicas) sofram interferência do ambiente em que a pessoa vive1717. Ceballos AGC, Cardoso C. Determinantes sociais de alterações fonoaudiológicas. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(3):441-5..

No presente estudo a área da Linguagem foi dividida didaticamente em alguns pontos: Fonologia, Linguagem, Fala, Queixas Audiológicas, Disfluência, Autismo e PcD. O grupo classificado como outros, teve baixa frequência nas queixas e foi agrupado.

Estudos mostram a prevalência no diagnóstico de linguagem88. Costa RG, Souza LBR. Perfil dos usuários e a demanda pelo serviço da clínica-escola de Fonoaudiologia da UFBA. R. Ci. Méd. biol., 2009;8(1):53-9. e fala77. César AM, Maksud SS. Caracterização da demanda de Fonoaudiologia no Serviço Público Municipal de Ribeirão das Neves - MG. Rev CEFAC. 2007;9(1):133-8.),(1717. Ceballos AGC, Cardoso C. Determinantes sociais de alterações fonoaudiológicas. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(3):441-5.),(1818. Goulart BNG; Chiari BM. Prevalência de desordens de fala em escolares e fatores associados. Rev Saúde Públ. 2007;41(5):726-31.) na população. Em dois trabalhos, o diagnóstico mais encontrado foi de alteração na fala e o segundo de alterações de linguagem77. César AM, Maksud SS. Caracterização da demanda de Fonoaudiologia no Serviço Público Municipal de Ribeirão das Neves - MG. Rev CEFAC. 2007;9(1):133-8.),(88. Costa RG, Souza LBR. Perfil dos usuários e a demanda pelo serviço da clínica-escola de Fonoaudiologia da UFBA. R. Ci. Méd. biol., 2009;8(1):53-9.. O presente estudo evidencia os diagnósticos mais encontrados: Motricidade Orofacial, Fonologia e Linguagem. Assim, o diagnóstico de maior ocorrência não está de acordo com os achados da literatura citada, mas o segundo e o terceiro combinam com o relato dessa literatura.

A classificação da queixa de voz na triagem apresentou total discordância com o diagnóstico obtido na avaliação, uma vez que os pacientes com esta queixa apresentaram, na realidade, alterações de Motricidade Orofacial. Embora não encontremos na literatura nacional dados semelhantes aos desse estudo, pode-se refletir sobre o senso comum abrangência do termo "voz", que a população em geral associa a qualquer problema relacionado ao "falar", desde a voz propriamente dita até problemas de linguagem, fluência e mesmo articulação da fala.

Tabela 2:
Concordância entre a classificação das queixas e diagnósticos realizados na clínica-escola de Fonoaudiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.. (Porto Alegre, 2013)

Na faculdade de Odontologia X, a clínica-escola de Fonoaudiologia tem demanda livre e encaminhamentos dos projetos e atividades externas (estágios, pesquisas), porém uma parcela relevante decorre do atendimento fonoaudiológico prestado nas clínicas de pediatria, ortodontia e PcD da Odontologia. Os casos de PcD estão sendo atendidos por um projeto de extensão do curso de Fonoaudiologia da instituição de origem.

Assim, o destaque ao diagnóstico de Motricidade Orofacial pode ser justificado pela amostra, que contempla muitos pacientes encaminhados da clínica-escola da faculdade de Odontologia para a clínica-escola de Fonoaudiologia.

Para se obter dados com maior precisão, seria interessante padronizar as fichas clínicas, com opções específicas para classificação de queixas e diagnósticos dentro da clínica-escola, pois estes dados foram preenchidos por vários alunos e profissionais diferentes. Sugere-se que desde a formação do fonoaudiólogo, este exerça a prática utilizando ao menos o guia de consulta rápida da CID-10, elaborado pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia1919. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Guia Prático de Consulta Rápida da CID-10 pelo fonoaudiólogo. Mai,2007. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/publicacoes/pubmanual1.pdf
http://www.fonoaudiologia.org.br/publica...
.

Em cada artigo consultado é observado uma nomenclatura diferente para as alterações fonoaudiológicas pesquisadas o que sugere a necessidade de padronização da nomenclatura em cada área da Fonoaudiologia 88. Costa RG, Souza LBR. Perfil dos usuários e a demanda pelo serviço da clínica-escola de Fonoaudiologia da UFBA. R. Ci. Méd. biol., 2009;8(1):53-9.),(1919. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Guia Prático de Consulta Rápida da CID-10 pelo fonoaudiólogo. Mai,2007. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/publicacoes/pubmanual1.pdf
http://www.fonoaudiologia.org.br/publica...
. A literatura consultada usou nomenclaturas diferentes, como: desvio fonológico 99. Barros PML, Oliveira PN. Perfil dos Pacientes atendidos no setor de Fonoaudiologia de um Serviço Público de Recife-PE. Rev CEFAC. 2010;12(1):128-33.),(1313. Cavalheiro LG, Brancalioni AR, Keske-Soares M. Prevalência de desvio fonológico em crianças da cidade de Salvador, Bahia. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2012;17(4):441-6.) desvio fonético 1212. Diniz RD, Bordin R. Demanda em Fonoaudiologia em um serviço público municipal da região Sul do Brasil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):126-31., atraso de linguagem 99. Barros PML, Oliveira PN. Perfil dos Pacientes atendidos no setor de Fonoaudiologia de um Serviço Público de Recife-PE. Rev CEFAC. 2010;12(1):128-33., alteração de linguagem 77. César AM, Maksud SS. Caracterização da demanda de Fonoaudiologia no Serviço Público Municipal de Ribeirão das Neves - MG. Rev CEFAC. 2007;9(1):133-8., alteração de fala 77. César AM, Maksud SS. Caracterização da demanda de Fonoaudiologia no Serviço Público Municipal de Ribeirão das Neves - MG. Rev CEFAC. 2007;9(1):133-8.),(1212. Diniz RD, Bordin R. Demanda em Fonoaudiologia em um serviço público municipal da região Sul do Brasil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16(2):126-31., área da Linguagem 88. Costa RG, Souza LBR. Perfil dos usuários e a demanda pelo serviço da clínica-escola de Fonoaudiologia da UFBA. R. Ci. Méd. biol., 2009;8(1):53-9.. O Conselho Federal de Fonoaudiologia publicou um guia de consulta prático para o CID-10, no qual grande parte das alterações fonoaudiológicas estão catalogadas1919. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Guia Prático de Consulta Rápida da CID-10 pelo fonoaudiólogo. Mai,2007. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/publicacoes/pubmanual1.pdf
http://www.fonoaudiologia.org.br/publica...
, o que sugere a consulta dos profissionais para que a nomenclatura das alterações fonoaudiológicas possam ser registradas de maneira uniforme em todo o território nacional.

Além disso, outros dados estavam ausentes nos prontuários dos pacientes. Seria interessante a continuidade do registro das atividades para pesquisas com uma abrangência maior de prontuários. Outras pesquisas relatam a dificuldade em acessar os dados dos prontuários pela mesma causa1010. Marques SRLM, Friche AAL, Motta AR. Adesão à terapia em motricidade orofacial no ambulatório de Fonoaudiologia do hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):54-62.)-(1616. Antunes DK. Perfil fonoaudiológico da comunidade do Dendê: perspectiva para ações futuras. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):264-9.. Sugere-se uniformidade nos registros dos prontuários das instituições para registros mais adequados dos procedimentos, da produção e para realização de pesquisas mais fidedignas.

Conclusão

O presente estudo buscou analisar a concordância entre a classificação das queixas relatadas na triagem e os resultados das avaliações fonoaudiológicas realizadas numa clínica-escola do sul do país.

Os achados apontam maior ocorrência para o sexo masculino, idade de 4 a 6 anos e a população residente no município de Porto Alegre.

O maior número de queixas e diagnósticos foi para Motricidade Orofacial provavelmente devido à ao serviço estar localizado junto às clínicas de Odontologia. Em seguida, aparecem as queixas e diagnósticos da área da Linguagem corroborando a literatura.

Houve concordância entre os resultados da classificação da triagem e do diagnóstico. As queixas que obtiveram concordância com o diagnóstico foram: Fonologia, Motricidade Orofacial, Disfluência e Linguagem. Em algumas sub-áreas da Fonoaudiologia houve pouca concordância em relação as queixas e diagnósticos. A classificação da queixa de voz na triagem apresentou total discordância com o diagnóstico obtido na avaliação.

Também sugere-se padronização da nomenclatura dos diagnósticos fonoaudiológicos, utilizando-se o guia prático da CID-10 elaborado pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia, e a uniformidade nos registros dos prontuários das instituições para levantamento de informações mais fidedignas, que permitam comparação entre os diferentes serviços.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2016

Histórico

  • Recebido
    11 Jun 2015
  • Aceito
    21 Out 2015
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