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Intervenções em afasia: uma revisão integrativa

RESUMO

O objetivo desta revisão foi identificar, avaliar e discutir artigos sobre intervenções e avanços terapêuticos em afasia, publicados periódicos científicos nos últimos cinco anos, em plataformas de livre acesso aos profissionais. Foi realizada uma revisão integrativa nas bases de dados SciELO, LILACS, Periódicos Capes e PubMed, com os descritores em português e inglês: afasia, reabilitação e tratamento. Foram incluídos artigos que descrevessem tratamentos para afasia ou histórias de reabilitação, publicados em inglês ou português. Os estudos que atenderam aos critérios foram lidos e analisados segundo instrumento para revisão integrativa, e posteriormente categorizada. Dos 96 artigos levantados 26 foram incluídos na revisão. Houve predominância de estudos quantitativos. De modo geral, diversas pesquisas que testavam terapias mostraram resultados positivos, confirmando que a afasia é uma condição que responde a uma ampla variedade de tratamentos. Nos estudos cujo foco foi a ativação cerebral, foram encontradas correlações importantes entre a melhora dos pacientes e a ativação de áreas cerebrais relacionadas à linguagem. A partir dos resultados, verificou-se que os tratamentos para afasia descritos não indicam a superioridade de uma abordagem terapêutica sobre outra. A maioria dos estudos revisados não apresentava bom grau de generalidade externa, indicando a necessidade de estudos controlados com amostras mais representativas. A literatura atualizada deve fundamentar as ações dos profissionais, porém esses devem estar atentos às características e limitações dos protocolos testados.

Descritores:
Afasia; Terapia; Reabilitação; Revisão

ABSTRACT

This review aims to identify, evaluate and discuss articles on aphasia interventions and therapeutic advances, published in scientific journals in the last five years. An integrative review was performed on databases SciELO, LILACS, CAPES and PubMed, with the descriptors in English and Portuguese: aphasia, rehabilitation and treatment. It was included articles describing aphasia treatment or rehabilitation case studies, published in English or Portuguese. The studies that met the criteria were read and analyzed according to an integrative review protocol, and then categorized. From the 96 studies found 26 were included in the review. It was observed a predominance of quantitative studies. Several studies that tested therapies showed positive results, confirming that aphasia is a condition that responds to a wide variety of treatments. Investigations focused on brain activation demonstrated significant correlations between patients' improvement and brain activation of language areas. It was found that aphasia treatments description did not indicate a superior therapeutic approach compared to another. Most studies did not present good degree of external generality, indicating the need for controlled studies with more representative samples. The current literature should support the actions of the professionals, nevertheless professionals should be alert to the characteristics and limitations of the protocols tested.

Keywords:
Aphasia; /therapy; Rehabilitation; Review

Introdução

A afasia é uma condição decorrente de uma lesão no cérebro, comumente no hemisfério esquerdo, frequentemente causada por acidentes vasculares cerebrais (AVC's). Esta etiologia é mais comum em idosos do que em jovens, e deixa como sequelas lesões circunscritas e, muitas vezes, permanentes no cérebro. Outras doenças também podem ocasionar afasias, como tumores, traumatismos, doenças degenerativas ou metabólicas11. Lima SI, Cury EMG. Afasia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; 2007..

A lesão cerebral presente na afasia frequentemente pode levar a uma desorganização da linguagem, podendo afetar habilidades de acesso ao vocabulário, organização sintática, e codificação e decodificação das mensagens22. Jackubovicz R. Introdução à afasia. Rio de Janeiro: Revinter; 1996.),(33. Pedersen PM, Vinter K, Olsen TS. Aphasia after stroke: type, severity and prognosis in aphasia. The Copenhagen aphasia study. Cerebrovasc Dis. 2004;17:35-43.. A depender do tipo de afasia, o indivíduo pode apresentar dificuldades na fluência, compreensão, repetição, nomeação, leitura, escrita, parafasias, agramatismos ou apraxias, sendo que as afasias podem ser classificadas em duas categorias, segundo a manifestação da fluência: fluente e não fluente44. Bruna O, Suhevic N. Afasias, Alexias, Agrafias, Acalculias e distúrbios relacionados. In: Plaja CJI, Rabassa OBI, Serrat MMI. Neuropsicologia da linguagem: funcionamento normal e patológico, reabilitação. São Paulo: Livraria Santos Editora; 2006. p. 49-78.. Como essas lesões acometem geralmente o hemisfério esquerdo, áreas motoras podem ser afetadas. Algumas dessas áreas são responsáveis pelas habilidades de ordenação dos movimentos da fala, gerando as afasias não fluentes, que envolvem as afasias globais, mistas, de Broca e Transcortical motora. Podem, também, acometer áreas associativas e de compreensão, sendo chamadas de afasias fluentes, que englobam as afasias de Wernicke, de Condução e Transcortical sensorial11. Lima SI, Cury EMG. Afasia. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; 2007.),(55. Damasio AR. Aphasia. N. England J. Med. 1992;326(8):531-9.),(66. Dubois J, Giacomo M, Grespin L, Marcellesi C, Marcellesi JB, Mevel JP. Dicionário de linguística. São Paulo: Cultrix; 1973..

Para o tratamento da afasia é necessário considerar fatores como tipo, localização, etiologia e tamanho da lesão, além de fatores individuais, como idade e dominância manual. A literatura da área tem indicado que a recuperação mais significante acontece no primeiro mês após a lesão, seguida dos próximos seis meses; após esse tempo, o nível de evolução pode diminuir, porém não se esgota77. Pérez M. Afasias do Adulto. In: Casanova JP. Manual de Fonoaudiologia. Porto Alegre: Artes Médicas; 1992. p. 314-40.)-(99. Kurland J, Baldwin K, Tauer C. Treatment induced neuroplasticity following intense naming therapy in a case of chronic Wernicke´s aphasia. Aphasiology. 2010;24:737-51..

Os tratamentos da afasia são orientados por abordagens terapêuticas que, entre as mais tradicionais, priorizam a estimulação, preocupando-se com a atividade funcional da comunicação, ou ainda, priorizam habilidades específicas que guiam a identificação da alteração e auxiliam no entendimento do déficit, propondo um tratamento específico, no nível dessas habilidades. Há, também, as abordagens sociais e psicossociais, que podem ser utilizadas como complemento para a estimulação, e atuam no contexto da comunicação do afásico. Existem, ainda, as abordagens multidimensionais, em que há um compromisso com a inserção do afásico no ambiente, sem introduzir, necessariamente, uma visão de cura. Independentemente do tipo de abordagem, o tratamento para a afasia geralmente é longo e deve ser assíduo, sendo que o tempo de duração dependerá do prognóstico inicial1010. Mansur LL, Machado TH. Afasias: Visão Multidimensional da atuação do fonoaudiólogo. In: Ferreira LP, Befi-Lopes DM, Limongi SCO. Tratado de fonoaudiologia. São Paulo: Roca; 2005. p. 920-32..

Nos últimos 15 anos vêm crescendo as possibilidades de tratamento para essa alteração. Além das abordagens citadas, novos tratamentos vêm sendo desenvolvidos, como a estimulação elétrica transcraniana e o uso de diversas outras tecnologias adaptadas a certas demandas, como por exemplo, terapias específicas para categorizações, nomeação de verbos, etc. Porém, não existe um consenso sobre qual a melhor forma de tratamento, salvo a noção de que, qualquer que seja ele, deve ser assíduo. Todas as abordagens indicam casos de sucesso e casos sem melhora para os diversos tipos de intervenção. Dessa forma, a presente revisão integrativa tem por objetivo identificar, avaliar e discutir intervenções e avanços terapêuticos, publicados em artigos científicos nos últimos cinco anos, em plataformas de livre acesso aos profissionais diretamente interessados nos avanços dessa área. Pretende-se, também, discutir as características das amostras estudadas, as intervenções propostas, assim como sua eficácia e seus possíveis vieses.

Métodos

O presente estudo utiliza como método a revisão integrativa da literatura, que tem como finalidade reunir e resumir o conhecimento científico produzido sobre um tema investigado, em um período de tempo determinado, permitindo avaliar e sintetizar as evidências disponíveis, contribuindo, desta forma, para o desenvolvimento do conhecimento na temática1111. Mendes KDD, Silveira RCCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto & Contexto Enferm. 2008;17(4):758-64..

Com o objetivo de guiar o levantamento e discussão das pesquisas, foi formulada a seguinte questão norteadora: O que vem sendo publicado em periódicos científicos nos últimos cinco anos, com acesso livre, sobre tratamentos para a reabilitação de pessoas com afasia?

Para o levantamento das pesquisas foram consultadas as bases de dados Scientific Electronic Library Online (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Periódicos Capes e Public Medicine Library (PubMed), em 16 de setembro de 2014. Optou-se por estas bases de dados por se entender que atingem uma parcela maior de profissionais que tem contato com a reabilitação da população alvo. A busca foi realizada de forma ordenada, na sequência de bases apontada acima; desta forma, foram selecionadas na primeira busca publicações que se encontravam indexadas em mais de uma plataforma.

Foram cruzados os seguintes descritores, em português e inglês: afasia, reabilitação e tratamento e encontrados 96 artigos de acesso público, publicados desde setembro de 2009 a setembro de 2014. Os critérios de inclusão dos estudos foram: estudos que abordassem o tema de afasia e seu tratamento ou reabilitação, com descrições dos tratamentos ou da história de reabilitação, publicados em inglês ou português e em formato de artigos. Aplicados estes critérios, foram excluídos aqueles que não apresentassem conteúdo de livre acesso, revisões de literatura e artigos teóricos. A partir desta primeira análise, foi feita a leitura dos títulos de todos os artigos verificando-se 38 artigos que se enquadravam no tema da pesquisa. Posteriormente, com a leitura dos resumos e aplicação dos critérios de inclusão, 33 artigos foram selecionados para integrar a fase de leitura completa. Destes, sete artigos foram excluídos, pois não correspondiam a descrições de tratamentos, sendo que alguns deles somente mencionavam uma terapia específica sem descrevê-la, ou abordavam outras áreas de interesse, como a adesão ao tratamento, sem enfoque específico à terapêutica empregada. Deste modo, esta revisão integrativa foi feita a partir de um conjunto de 26 artigos.

Os estudos selecionados foram analisados e submetidos aos critérios do instrumento para revisão integrativa, validado por Ursi1212. Ursi ES. Prevenção de lesões de pele no perioperatório: revisão integrativa da literatura. [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto; 2005. (Figura 1), que contempla os seguintes itens: identificação do artigo original, características metodológicas do estudo, avaliação do rigor metodológico, das intervenções mensuradas e dos resultados encontrados. Em seguida, os artigos foram hierarquizados segundo o tipo de evidência (meta-análise, estudos de delineamento experimental, estudos quase-experimentais, estudos qualitativos, relatos de casos e evidências de opiniões de especialista)1313. Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein. 2010;8(1):102-6.. Os dados foram descritos utilizando-se frequência absoluta (n) e relativa (%).

Figura 1:
Instrumento para coleta de dados (validado por Ursi, 2005)

A análise prosseguiu com a categorização dos estudos, de acordo com a temática da pesquisa: Tratamentos diversos, Tratamento com Estimulação Elétrica Transcraniana repetitiva e Tratamentos com fármacos (Tabela 1). Para cada categoria foram verificadas a composição das amostras, as intervenções propostas, eficácia, as considerações e os vieses. A partir deste momento, foi realizada a discussão por categoria, quando cada artigo foi discutido em função dos delineamentos de pesquisa utilizados.

Tabela 1:
Periódicos Distribuídos de Acordo com as Temáticas

Revisão de Literatura

Foram levantados 96 artigos, dos quais 26 foram incluídos na presente revisão. A Tabela 2 apresenta o número de publicações encontradas e selecionadas nas bases de dados consultadas. Em apenas três das bases de dados verificaram-se pesquisas com os descritores selecionados, sendo 79 delas na plataforma PubMed, 15 na plataforma Scielo e 02 nos Periódicos Capes. Para a composição da amostra deste estudo, selecionou-se uma publicação da plataforma Scielo e 25 da plataforma PubMed, sendo que a pesquisa da plataforma Scielo era um relato de caso.

Tabela 2:
Distribuição das Publicações Selecionadas nas Bases de Dados Utilizadas.

Em relação ao delineamento das pesquisas, identificou-se que, das 26 publicações, 20 utilizaram abordagem quantitativa (76,9%) e dessas 20, 75% de estudos quase-experimentais (15), e 25% de estudos experimentais (5). As demais pesquisas (6) foram relatos de casos (23,1%). Constata-se, portanto, a predominância de estudos quantitativos, com coleta de medidas objetivas de mudança a partir dos tratamentos testados.

Os artigos selecionados inserem-se em 19 periódicos, com destaque para quatro revistas (Brain and Language, Stroke, American Journal of Speech and Language Pathology e Journal Speech, Language, and Hearing Research), responsáveis, em conjunto, por 42,3% das publicações selecionadas (11 artigos dos 26 selecionados). A revista Stroke apresentou maior número de publicações com delineamentos experimentais na área, com três publicações.

As demais revistas (15 = 79% da amostra) tiveram apenas uma publicação cada selecionada para compor este estudo. A maioria das publicações estão voltadas à área médica.

Observou-se que 11,5% dos artigos foram publicados no ano de 2009 e 27% no ano de 2013. Em grande parte, os estudos foram desenvolvidos nos EUA (16 = 61,5% do total) sem que nenhum deles apresentasse delineamento experimental. Outros países, como Brasil, Alemanha e Reino Unido, publicaram, cada um, duas pesquisas, sendo que a Alemanha e o Reino Unido publicaram apenas pesquisas experimentais. Os demais países (Itália, Romênia, Polônia e Coréia do Sul) publicaram apenas um artigo cada.

Para discussão dos resultados os artigos foram classificados em três categorias relacionadas a sua temática: Tratamentos Diversos; Tratamento com Estimulação Elétrica Transcraniana Repetitiva e Tratamentos com fármacos (Tabela 2).

Tratamentos Diversos

Nesta categoria estão incluídos 57,7% (n=15) das publicações sendo que destas 15 publicações 73,3% (n=11) foram realizadas com delineamento quase-experimental (nível de evidência B 2C), 13,3% (n=2) com delineamento experimental (nível de evidência A 1A e A1B) e duas (13,3%) foram relatos de caso (nível de evidência C4). Esta categoria agrupa pesquisas que utilizaram tratamentos diversos, com o objetivo de melhorar a linguagem em pacientes com afasia, abordando tratamentos readaptados ou protocolos já consolidados, adaptados a distintas situações.

Os relatos de caso foram de pacientes com Afasia de Broca e com Afasia Expressiva.

Beenson, Higginson e Rising1414. Beenson PM, Higginson K, Rising K. Writing treatment for aphasia: a texting approach. Speech Lang Hear Res. 2013;56(3):945-55. verificaram a melhora de uma habilidade especifica de linguagem (comunicação por texto) a partir de dois tratamentos diferentes para um sujeito com afasia de Broca. Kunst et al55. Damasio AR. Aphasia. N. England J. Med. 1992;326(8):531-9. descreveram a evolução geral da linguagem de um paciente com afasia expressiva. Embora os resultados de ambos os estudos tenham sido significantes (em relação ao ensino de cópia e recordação na escrita no estudo de Beenson et al.1414. Beenson PM, Higginson K, Rising K. Writing treatment for aphasia: a texting approach. Speech Lang Hear Res. 2013;56(3):945-55., e na comunicação para Kunst et al.1515. Kunst LR, Oliveira LD, Costa VP, Wiethan FM, Mota HB. Speech therapy effectiveness in a case of expressive aphasia resulting from stroke. Rev CEFAC. 2013;15(6):1712-7.)), para o primeiro estudo, as conclusões foram muito generalizadas por se tratar de um estudo de caso. Nenhum dos dois estudos levantou questões para possíveis pesquisas futuras, oferecendo dados restritos a perguntas específicas.

As duas pesquisas com delineamento experimental 1616. Bowen A, Hesketh A, Patchick E, Young A, Davies L, Vail A et al. Effectiveness of enhanced communication therapy in the first four months after stroke for aphasia and dysarthria: a randomised controlled trial. British Med Journal. 2012;345:1-15.),(1717. Palmer R, Enderby P, Cooper C, Latimer N, Julious S, Paterson G et al. Computer Therapy compared with usual care for people with long-standing aphasia poststroke a pilot randomized controlled trial. Stroke. 2012;43(7):1904-11. objetivaram investigar o efeito de tratamentos específicos (terapia tradicional e tratamento auto-gestório, respectivamente) na reabilitação de linguagem em afásicos. Palmer et al.1717. Palmer R, Enderby P, Cooper C, Latimer N, Julious S, Paterson G et al. Computer Therapy compared with usual care for people with long-standing aphasia poststroke a pilot randomized controlled trial. Stroke. 2012;43(7):1904-11. testaram um tratamento auto-gestório em computador e seus resultados foram positivos, mostrando que o grupo experimental (34 indivíduos com afasia não fluente) obteve melhor desempenho em linguagem quando comparado com o grupo controle, porém essa diferença não se manteve no follow up realizado. Analisando os dados encontrados, os autores sugeriram replicações com maior controle da amostra e a mensuração da linguagem com diferentes instrumentos. A pesquisa de Bowen et al.1616. Bowen A, Hesketh A, Patchick E, Young A, Davies L, Vail A et al. Effectiveness of enhanced communication therapy in the first four months after stroke for aphasia and dysarthria: a randomised controlled trial. British Med Journal. 2012;345:1-15. comparou a terapia tradicional, focada na dificuldade, com a aplicação de uma intervenção baseada em grupos de conversa cotidiana, e seus resultados indicaram que não houve diferenças entre a intervenção e a estimulação por meio de conversas nos primeiros quatro meses após o AVC (389 indivíduos com afasia severa e disartria). Os resultados encontrados questionaram as recomendações sobre o que se acredita ser o período mais produtivo para a estimulação, que envolveria os seis primeiros meses após o acometimento77. Pérez M. Afasias do Adulto. In: Casanova JP. Manual de Fonoaudiologia. Porto Alegre: Artes Médicas; 1992. p. 314-40.. Contudo, os autores ressaltaram a importância de se realizar outros tipos de tratamentos e comparar com outras populações, como pacientes com afasia crônica.

Nesta categoria foi encontrado um número elevado de pesquisas com delineamento quase experimental (n=11). Destas pesquisas, quatro apresentaram como objetivo verificar a ativação cerebral em tratamentos distintos, quatro tinham como objetivo investigar a recuperação de uma habilidade específica de linguagem e três delas investigar a eficácia de tratamentos específicos nas diversas habilidades de linguagem.

Entre as pesquisas cujo objetivo foi o de verificar a ativação cerebral em tratamentos distintos, três (IMITATE1818. Sarasso S, Santhanam P, Maatta S, Poryiazova R, Ferrarelli F, Tononi G et al. Non-fluent afasia and neural reorganization after speech therapy: insights from human sleep electrophysiology and functional magnetic resonance imaging. Arch Ital Biol. 2010;148(3):271-8.; CILT1919. Breier JI, Juraneck J, Maher LM, Schmadeke S, Men D, Papanicolau AC. Behavioral and neurophysiologic response to therapy for chronic aphasia. Arch Phys Med Rehabil. 2009;90(12):2016-33.; CIAT-II2020. Johnson M, Taub E, Harper LH, Wade JT, Bowman MH, Bishop-McKay S et al. An enhance protocol for constraint-induced aphasia therapy II: a case series. Am Jour of Speech- Language Pathology. 2014;23:60-72.)) podem ser caracterizadas como terapias intensivas, aplicadas, em geral, de quatro a cinco vezes por semana, com duração de mais de uma hora por sessão. Essas pesquisas utilizaram o mesmo instrumento para medir o desempenho em linguagem (Escala WAB), o que facilitou a comparação de seus resultados. Sarasso et al.1818. Sarasso S, Santhanam P, Maatta S, Poryiazova R, Ferrarelli F, Tononi G et al. Non-fluent afasia and neural reorganization after speech therapy: insights from human sleep electrophysiology and functional magnetic resonance imaging. Arch Ital Biol. 2010;148(3):271-8. promoveram o ensino de movimentos fonoarticulatórios por imitação e, além da melhora dos quatro indivíduos com afasia não fluente no teste WAB, verificaram mudanças no hemisfério ipsilateral nas áreas pré-motoras e parietais, assim como na região frontal de ambos os hemisférios cerebrais. Breier et al.1919. Breier JI, Juraneck J, Maher LM, Schmadeke S, Men D, Papanicolau AC. Behavioral and neurophysiologic response to therapy for chronic aphasia. Arch Phys Med Rehabil. 2009;90(12):2016-33. testaram um protocolo de terapia de linguagem induzida por restrição e, além de verificarem melhoras nos escores dos 33 pacientes com afasia severa no teste de linguagem, observaram uma correlação entre a manutenção dessa melhora e a maior ativação do hemisfério esquerdo, assim como piora desse desempenho para a ativação do hemisfério direito. Os autores sugeriram a necessidade de estudos com uma amostra maior e com grupo controle. Johnson et al.2020. Johnson M, Taub E, Harper LH, Wade JT, Bowman MH, Bishop-McKay S et al. An enhance protocol for constraint-induced aphasia therapy II: a case series. Am Jour of Speech- Language Pathology. 2014;23:60-72. testaram a ampliação do protocolo CILT para uma afasia específica (Broca), porém sem grupo controle e apenas com quatro sujeitos. Os resultados indicaram melhora na linguagem para todos os participantes, sugerindo ampliação da amostra em estudos posteriores, com maior controle experimental do protocolo. Os três estudos indicaram que a terapia intensiva tem efeitos significantes na ativação cerebral dos pacientes com afasia, produzindo melhoras nos escores em testes de linguagem. Breier et al.1919. Breier JI, Juraneck J, Maher LM, Schmadeke S, Men D, Papanicolau AC. Behavioral and neurophysiologic response to therapy for chronic aphasia. Arch Phys Med Rehabil. 2009;90(12):2016-33. sugeriram também, que a manutenção dos resultados seria variável entre os pacientes, o que indicaria necessidade de maior investimento de pesquisas sobre a correlação entre a ativação cerebral e a eficácia destes tratamentos a longo prazo.

O estudo de Fridriksson et al.2121. Fridriksson J, Hubbard I, Hudspeth SG, Holland AL, Bonilha L, Fromm D et al. Speech entraiment enables patients with Broca´s aphasia to produce fluent speech. Brain. 2012;135:3815-29. examinou mudanças na ativação cerebral após treinos de fala com feedbacks diferentes (auditivo-visual; somente auditivo; e somente fala espontânea), em 13 pacientes com Afasia de Broca. Os autores verificaram que o treino com feedback auditivo visual foi o mais efetivo e gerou uma ativação bilateral, com maior ativação das áreas da linguagem para o grupo experimental. Os resultados desta investigação, apesar das diferenças metodológicas, apoiam resultados de Sarasso et al.1818. Sarasso S, Santhanam P, Maatta S, Poryiazova R, Ferrarelli F, Tononi G et al. Non-fluent afasia and neural reorganization after speech therapy: insights from human sleep electrophysiology and functional magnetic resonance imaging. Arch Ital Biol. 2010;148(3):271-8., que também mostraram uma correlação entre melhora do desempenho em linguagem e ativação das áreas cerebrais relacionadas a linguagem.

Entre as pesquisas cujo objetivo foi o de investigar a recuperação de uma habilidade específica de linguagem, duas examinaram as relações entre a melhora da habilidade de nomeação, a ativação cerebral2222. Fridriksson J, Richardson JD, Fillmore P, Cai B. Left hemisphere plasticity and aphasia recovery. NeuroImage. 2012b;60(2):854-6324. e a extensão da lesão2323. Parkinson RB, Raymer A, Chang YL, FitzGerald DB, Crosson B. Lesion Characteristics related to treatment improvement in object and action naming for patients with chronic aphasia. Brain Language. 2009;110(2):61-70.. Ambos os estudos contaram, em média, com 20 participantes, com afasias fluentes e não fluentes, e empregaram as técnicas de facilitadores semânticos, fonológicos e gestuais, que foram comparadas entre si. Os resultados dos dois trabalhos indicaram melhora da habilidade treinada, sem diferença significante entre as técnicas e encontraram correlações entre a melhora dos pacientes e a ativação dos lobos frontais, parietais e temporais (corroborando os achados de Sarasso et al.,1818. Sarasso S, Santhanam P, Maatta S, Poryiazova R, Ferrarelli F, Tononi G et al. Non-fluent afasia and neural reorganization after speech therapy: insights from human sleep electrophysiology and functional magnetic resonance imaging. Arch Ital Biol. 2010;148(3):271-8.) e de Fridriksson et al.,2121. Fridriksson J, Hubbard I, Hudspeth SG, Holland AL, Bonilha L, Fromm D et al. Speech entraiment enables patients with Broca´s aphasia to produce fluent speech. Brain. 2012;135:3815-29.)) e lesões mais anteriorizadas. Os dois estudos não tinham grupo controle, o que diminui a dimensão destas correlações, embora tais dados sejam importantes e sinalizem a necessidade de futuras investigações.

O estudo de Bonifazi et al.2424. Bonifazi S, Tomaiuolo F, Altoe G, Ceravolo MG, Provinviali L, Marangolo P. Action observation as a useful approach for enhancing recovery of verb production: new evidence from aphasia. Eur J Phys Rehab Med. 2013;49:473-81. também apresentou como interesse central a habilidade de nomeação, mais especificadamente a nomeação de ação. Para tanto, os autores testaram diferentes modos de observação de ação, incluindo a observação ativa (que requer a emissão de resposta de imitação), em seis pacientes com Afasia não fluente. Os resultados foram promissores para a nomeação de verbos, que aumentou em 100%, porém o tipo de observação empregado não se mostrou uma variável significante nos resultados encontrados.

Dessa forma, os três estudos que tiveram como interesse a habilidade de nomeação apresentaram resultados positivos, independente do tratamento utilizado, o que sugere ser essa uma habilidade que responde muito bem às técnicas de reabilitação.

Um último estudo quase-experimental2525. Kiran S, Sandberg C. Treatment of category generation and retrieval in aphasia: effect of typicality of category items. J Speech lang Hear Res. 2011;54(4):1101-17., teve como objetivo investigar a recuperação da habilidade de categorização, após a aplicação de uma terapia de categorização para de itens categorizáveis com seis pacientes com Afasia fluente, anômica e de condução. Os autores compararam dois tipos de treino para essa habilidade, um com itens típicos, e outro com itens atípicos, revelando que a atipicidade dos itens influenciou de forma positiva o desempenho dos participantes, quando testada a generalização.

Ainda na categoria de Tratamentos Diversos, três estudos tiveram como foco testar a eficácia de tratamentos específicos em diferentes habilidades de linguagem2626. Kiran S, Sandberg C, Gray T, Ascenso E, Kester E. Rehabilitation in bilingual aphasia: evidence for within and between-language generalization. Am J Speech Lang Pathol. 2013;22(2):298-309.)-(2828. Nicholas M, Sinotte MP, Helm-Estabrooks N. C-Speak Aphasia alternative communication program for people with severe aphasia: Importance of executive functioning and semantic knowledge. Neuropsychol Rehabil. 2011;21(3):322-66.. Todas as amostras eram formadas por um número semelhante de sujeitos (entre 10 e 19), com diagnósticos de Afasia bilíngue, crônica e não fluente, respectivamente. Apenas a pesquisa de Middleton e Schwartz2727. Middleton E, Schwartz MF. Learning to fail in aphasia: an investigation of error learning in naming. J Speech Lang Hear Res. 2013;56(4):1287-97. apresentou dados de um grupo controle. Kiran et al.2626. Kiran S, Sandberg C, Gray T, Ascenso E, Kester E. Rehabilitation in bilingual aphasia: evidence for within and between-language generalization. Am J Speech Lang Pathol. 2013;22(2):298-309. investigaram a nomeação em afásicos bilíngues, após um tratamento semântico que consistia em escolher características de elementos específicos, divididos em grupos de elementos com associação a uma característica ou perguntas sobre itens relevantes do elemento e grupos sem essas relações de associação e perguntas. Foi demonstrada melhora na nomeação e na generalização semântica para a maioria dos participantes, e o treino bilíngue gerou melhores desempenhos, sem diferenças entre as relações. No entanto, não foram controlados os níveis de fluência na segunda língua dos participantes. Nicholas et al.2828. Nicholas M, Sinotte MP, Helm-Estabrooks N. C-Speak Aphasia alternative communication program for people with severe aphasia: Importance of executive functioning and semantic knowledge. Neuropsychol Rehabil. 2011;21(3):322-66. investigaram o efeito de um procedimento computadorizado (de comunicação alternativa, que treinava a linguagem geral, comunicação ao telefone, escrita e e-mail), sobre a linguagem expressiva dos pacientes. Os resultados foram expressivos para poucos participantes. Middleton e Schwartz2727. Middleton E, Schwartz MF. Learning to fail in aphasia: an investigation of error learning in naming. J Speech Lang Hear Res. 2013;56(4):1287-97. investigaram a influência da ocorrência (ou não) de erros em três tipos de treino: semântico, fonológico e de poucos erros. O treino semântico foi o que sofreu menos influência da ocorrência de erros, ou seja, a experiência com ou sem erros nesse tratamento não influenciou os resultados demonstrados pelos participantes. Esse dado indica que a experiência com o erro pode influenciar na reabilitação da afasia, a depender do tipo de tratamento. Neste caso, nos treinos fonológicos e de poucos erros, a quantidade de erros influenciou o desempenho dos participantes nas tarefas propostas.

De modo geral, as pesquisas que testaram Terapias Diversas mostraram resultados positivos, tanto para amostras com diagnósticos mais bem delimitados, como para habilidades mais específicas, confirmando que a afasia é uma condição que, em geral, responde muito bem a uma ampla variedade de tratamentos. Nos estudos cujo foco foi a ativação cerebral, foram encontradas correlações importantes entre a melhora dos pacientes e a ativação de áreas cerebrais específicas relacionadas à linguagem. Dessa forma, são necessárias pesquisas que repliquem os dados mais relevantes com amostras maiores, a fim de se aumentar a generalidade desses resultados e compreender melhor as correlações e benefícios encontrados.

Tratamentos com Estimulação Elétrica Transcraniana repetitiva (rTMS)

As pesquisas sobre essa temática representam 38,5% (n=10) do total de artigos revisados neste estudo. Três desses estudos foram feitos com rTMS excitatória e outros sete com rTMS inibitória.

A rTMS é uma técnica neurofisiológica que permite a indução de um campo magnético no cérebro e é aplicada colocando-se um aparelho metálico sobre áreas especificas do crânio para emissão de pulsos magnéticos que atuam sobre o cérebro de maneira focalizada2929. Jung TD, Kim JY, Lee YS, Kim DH, Lee JJ, Seo JH et al. Effect of repetitive transcranial magnetic stimulation in a patient with chronic crossed aphasia: fMRI study. J Rehabil Med. 2010;42:973-8.. Dependendo da frequência utilizada, os estímulos podem aumentar (excitatória) ou diminuir (inibitória) a atividade da área cerebral atingida. Dessa forma, é uma técnica que pode ser aplicada terapeuticamente, modulando (equilibrando) o funcionamento neuronal.

As três publicações sobre a utilização da rTMS excitatória foram realizadas com delineamentos quase-experimentais. Duas delas3030. Allendorfer JB, Storrs JM, Szaflarski JP. Changes in white matter integrity follow excitatory rTMS treatment of post-stroke aphasia. Restor Neurol Neuros. 2012;30(2):103-13.),(3131. Szaflarski JP, Vannest J, Wu SW, DiFrancesco MW, Banks C, Gilbert DL. Excitatory repetitive transcranial magnetic stimulation induces improvements in chronic post-stroke aphasia. Med Sci Monit. 2011;17(3):CR132. trabalharam com os mesmos sujeitos (8 indivíduos) com diagnóstico de Afasia de Broca no estudo de 2011, e Afasia de Broca ou anômica no estudo de 2013. O mesmo protocolo de aplicação foi utilizado nos dois estudos: três pulsos de 50Hz repetidos a cada 10 segundos, num total de 600 pulsos, porém o estudo de 2011 estimulou a área de Broca e o estudo de 2013 estimulou áreas que respondiam otimamente a testes de linguagem, identificadas por ressonância magnética funcional (fMRI) no estudo de 2011. Ambos os estudos demonstraram alterações na ativação cerebral, principalmente para áreas de decisões semânticas no estudo de 2011. Além disso, os participantes nos dois estudos apresentaram melhoras nos testes de linguagem, especialmente nos de fluência, no estudo de 2013. O número de sujeitos da amostra foi limitado, o que restringe a generalidade externa dos resultados, além de não apresentar um grupo controle para garantir os efeitos do tratamento.

Santos et al.3232. Santos MD, Gagliardi RJ, Mac-Kay APMG, Boggio PS, Lianza R, Fregni F. Transcranial direct-current stimulation induced in stroke patients with aphasia: a propective experimental cohort study. São Paulo Med J. 2013;131(6):422-6. também trabalharam com rTMS excitatória, e utilizaram um protocolo com estimulação de 2mA, por 20 minutos, por 10 dias consecutivos, em 19 pacientes (oito com Afasia de Broca, sete com Afasia Anômica e quatro com Afasia Mista). Foi registrada melhora de todos os pacientes em testes de linguagem e em habilidades como a compreensão de frases, nomeação e fluência. As limitações deste estudo, porém, são as mesmas dos dois estudos descritos anteriormente: necessidade de replicações com maior controle experimental (estimulação de outras áreas cerebrais e inclusão de grupo controle). De forma geral, as três pesquisas da área de rTMS excitatório demonstraram a eficiência do tratamento, principalmente na população com afasia não fluente.

As pesquisas com rTMS inibitória apresentaram delineamento experimental (três estudos) ou foram relatos de caso (quatro estudos) e, de modo geral, tiveram maior controle experimental. A inibição no cérebro acontece quase sempre nas áreas do hemisfério direito homólogas às áreas de linguagem do hemisfério esquerdo, determinadas a partir de pesquisa anterior por fMRI da melhor área ativada durante atividades de linguagem.

Os três estudos experimentais3333. Weiduschat N, Thiel A, Rubi-Fessen I, Hartmann A, Kessler J, Merl P et al. Effects of Repetitive Transcranial Magnetic Stimulation in Aphasic Stroke A Randomized Controlled Pilot Study. Stroke. 2011;42(2):409-15.)-(3535. Thiel A, Hartmann A, Rubi-Fessen I, Anglade C, Kracht L, Weiduschat N et al. Effects of noninvasive brain stimulation on language networks and recovery in early poststroke aphasia. Stroke. 2013;44:2240-6. utilizaram protocolos semelhantes: estimulação de 1Hz, com cinco a 10 estimulações consecutivas em 20 minutos, durante oito a 10 sessões, totalizando duas semanas de estimulação. Todas as pesquisas incluíram grupos controle e vários diagnósticos de afasia (afasias não fluentes e fluentes). O alvo destas pesquisas também foi a linguagem de forma geral e, mais especificadamente, a nomeação para o estudo de Waldowski et al.3434. Waldowski K, Seniów J, Lesniak M, Iwanski S, Czlonkowska A. Effect of Low-Frequency Repetitive Transcranial Magnetic Stimulation on Naming Abilities in Early-Stroke Aphasic Patients: A Prospective, Randomized, Double-Blind Sham-Controlled Study. Sci World Journal. 2012;7(2):1-8. Destaca-se que os estudos foram realizadas com número reduzido de participantes (10, 26 e 24 respectivamente), sendo que a replicação em maior escala seria importante para confirmação dos achados. Thiel, et al.3535. Thiel A, Hartmann A, Rubi-Fessen I, Anglade C, Kracht L, Weiduschat N et al. Effects of noninvasive brain stimulation on language networks and recovery in early poststroke aphasia. Stroke. 2013;44:2240-6. e Weiduschat, et al.3333. Weiduschat N, Thiel A, Rubi-Fessen I, Hartmann A, Kessler J, Merl P et al. Effects of Repetitive Transcranial Magnetic Stimulation in Aphasic Stroke A Randomized Controlled Pilot Study. Stroke. 2011;42(2):409-15. aplicaram além da rTMS a terapia de fala para ambos os grupos, garantindo assim um ambiente mais próximo do real, uma vez que a terapia de fala é o tratamento preferencial para casos de afasia3636. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de atenção à reabilitação da pessoa com acidente vascular cerebral / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Brasília: Ministério da Saúde; 2013..

Os resultados das três pesquisas foram promissores. Foram registradas melhoras nos campos da linguagem, aferidas por meio de testes específicos, e também alterações na ativação cerebral para o estudo de Thiel et al.3535. Thiel A, Hartmann A, Rubi-Fessen I, Anglade C, Kracht L, Weiduschat N et al. Effects of noninvasive brain stimulation on language networks and recovery in early poststroke aphasia. Stroke. 2013;44:2240-6.. Este estudo também teve como objetivo testar o protocolo de rTMS para início imediato após a manifestação da afasia e obteve como resultado desempenhos satisfatórios, que corroboram dados de literatura que indicam que o início imediato da reabilitação pode favorecer a melhora rápida dos pacientes77. Pérez M. Afasias do Adulto. In: Casanova JP. Manual de Fonoaudiologia. Porto Alegre: Artes Médicas; 1992. p. 314-40.. A conclusão de Thiel et al.3535. Thiel A, Hartmann A, Rubi-Fessen I, Anglade C, Kracht L, Weiduschat N et al. Effects of noninvasive brain stimulation on language networks and recovery in early poststroke aphasia. Stroke. 2013;44:2240-6., porém, deve ser ponderada à luz dos dados do estudo de Bowen et al.1616. Bowen A, Hesketh A, Patchick E, Young A, Davies L, Vail A et al. Effectiveness of enhanced communication therapy in the first four months after stroke for aphasia and dysarthria: a randomised controlled trial. British Med Journal. 2012;345:1-15., que demonstraram que a estimulação cotidiana é capaz de produzir o mesmo efeito reabilitador nos afásicos, durante os primeiros quatro meses após a afasia. Portanto, determinar o impacto de um tratamento para afasia logo após o acometimento do quadro, em comparação com efeitos de recuperação espontânea e com efeitos de estimulação no ambiente natural, parece ser um desafio importante para pesquisas da área.

Todos os quatro relatos de casos sobre o uso de rTMS seguiram os mesmos protocolos, aplicados em regiões cerebrais específicas, determinadas por exame de imagem anterior. Todos eles foram aplicados para casos específicos de afasia não fluente. Nos estudos de Hamilton et al.3737. Hamilton RH, Sanders L, Benson J, Faseyitan O, Norise C, Naeser M et al. Stimulating conversation: enhancement of elicited propositional speech in a patient with chronic nonfluent aphasia following transcranial magnetic stimulation. Brain Lang. 2010;113(1):45-50. e Martin et al.3838. Martin PI, Naeser MA, Ho M, Doron KW, Kurland J, Kaplan J et al. Overt naming fMRI pre- and post-TMS: Two nonfluent aphasia patients, with and without improved naming post-TMS. Brain Language. 2009;111(1):20-35., os protocolos de estimulação foram aplicados em três sujeitos (um e dois, respectivamente) com afasia crônica (mais de um ano). Os resultados foram significantes para a melhora da linguagem no caso do estudo de 2010 e para um dos participantes do estudo de 2009, indicando que um mesmo protocolo pode não produzir a melhora da linguagem para todos os pacientes, dependendo principalmente das áreas lesionadas, questão discutida por Martin, et al.3838. Martin PI, Naeser MA, Ho M, Doron KW, Kurland J, Kaplan J et al. Overt naming fMRI pre- and post-TMS: Two nonfluent aphasia patients, with and without improved naming post-TMS. Brain Language. 2009;111(1):20-35.. e indicada nos estudos de Sarasso et al.1818. Sarasso S, Santhanam P, Maatta S, Poryiazova R, Ferrarelli F, Tononi G et al. Non-fluent afasia and neural reorganization after speech therapy: insights from human sleep electrophysiology and functional magnetic resonance imaging. Arch Ital Biol. 2010;148(3):271-8., Fridriksson et al.2121. Fridriksson J, Hubbard I, Hudspeth SG, Holland AL, Bonilha L, Fromm D et al. Speech entraiment enables patients with Broca´s aphasia to produce fluent speech. Brain. 2012;135:3815-29. e Fridriksson et al.2222. Fridriksson J, Richardson JD, Fillmore P, Cai B. Left hemisphere plasticity and aphasia recovery. NeuroImage. 2012b;60(2):854-6324..

Jung et al.2929. Jung TD, Kim JY, Lee YS, Kim DH, Lee JJ, Seo JH et al. Effect of repetitive transcranial magnetic stimulation in a patient with chronic crossed aphasia: fMRI study. J Rehabil Med. 2010;42:973-8. e Naeser et al.3939. Naeser MA, Martin PI, Lundgren K, Klein R, Kaplan J, Treglia E et al. Improved Language in a Chronic Nonfluent Aphasia Patient Following Treatment with CPAP and TMS. Cogn Behav Neurol. 2010;23(1):29. tiveram como objetivo a reabilitação de fala em um caso de Afasia Global com hemisfério direito dominante, e de Afasia não fluente associada à apneia do sono. Ambos os estudos demonstraram melhoras na linguagem por meio de testes padronizados, porém os estudos suscitam discussões como, por exemplo, o uso de fMRI, que pode não garantir o que o paciente está executando na hora do exame, não oferecendo uma descrição exata dos efeitos do tratamento no caso do paciente estar executando outras tarefas que não aquelas pedidas pelo examinador. Isso também se aplica à pesquisa de Naeser et al.3939. Naeser MA, Martin PI, Lundgren K, Klein R, Kaplan J, Treglia E et al. Improved Language in a Chronic Nonfluent Aphasia Patient Following Treatment with CPAP and TMS. Cogn Behav Neurol. 2010;23(1):29. em que a sequência dos tratamentos (tratamento para apneia e TMS) não garante a separação dos efeitos de cada terapêutica de forma isolada, limitando a discussão dos benefícios dos mesmos quando aplicados de forma individualizada.

Em síntese, o protocolo para aplicação de rTMS excitatória parece estar bem estabelecido, de modo que os trabalhos experimentais, com maior rigor metodológico e controle experimental, replicam resultados obtidos a partir de estudos de caso. É possível observar, também, que os resultados gerais têm sido benéficos e que esse tipo de estimulação vem sendo mais utilizado que a rTMS inibitória.

Tratamentos com fármacos

Foi encontrada apenas uma publicação que relata tratamento de afasia com fármacos, e ela será discutida separadamente porque esse tipo de pesquisa apresenta uma vertente muito distinta de tratamento. A pesquisa de Jianu et al.4040. Jianu DC, Muresanu DF, Bajenaru O, Popescu BO, Deme SM, Moessler H et al. Cerebrolysin adjuvant treatment in Broca's aphasics following first acute ischemic stroke of the left middle cerebral artery. J Med Life. 2010;3(3):297. teve como objetivo verificar a eficácia do fármaco Cerebrolysin para o tratamento da Afasia de Broca (2212 pacientes). O Cerebrolysin é um fármaco que produz enzimas com a capacidade de quebrar e purificar proteínas do cérebro, além de ativar moléculas peptídicas e aminoácidos livres. A administração do medicamento foi realizada com janela de 72 horas, além da administração de placebo para o grupo controle. As habilidades medidas nos testes de linguagem melhoraram com o tempo em ambos os grupos, com aumento significante no grupo experimental, sendo esse efeito mantido no follow up. Embora o estudo tenha demonstrado bons resultados terapêuticos, os autores sugeriram o aumento da amostra (a amostra final foi de 425 indivíduos), coleta de uma linha de base para a habilidade de compreensão, uso de fMRI e intervalos diferentes administrações.

Conclusão

A partir dos resultados aqui discutidos, verifica-se que os tratamentos para afasia descritos na literatura recente não indicam a superioridade de uma abordagem terapêutica sobre outra, nem identificam condições do paciente que justifiquem o uso de uma ou outra terapêutica de reabilitação específica. Além disso, os resultados positivos encontrados com rTMS ainda são iniciais e esbarram em limitações óbvias, como a ampliação de seu uso como procedimento terapêutico padrão e acesso à população de interesse. A maioria dos estudos revisados aqui não possui bom grau de generalidade externa, o que induz a preocupação de que, ao selecionar um tratamento, o profissional deve estar atento às características peculiares de cada caso, reavaliando periodicamente as abordagens e tratamentos aplicados Além disso, os dados aqui descritos indicam fortemente a necessidade de condução de replicações sistemáticas dos estudos mais relevantes, com amostras maiores para, com isso, compreender melhor as correlações e benefícios que esses tratamentos têm sugerido. Dessa forma, o profissional terá mais condições de tomar decisões sobre mudanças no enfoque adotado com base na evolução do quadro e de evidências empíricas, sempre levando em consideração as limitações de cada pesquisa e as indicações estabelecidas nos protocolos testados.

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  • Fonte de auxílio: Fapesp

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2016

Histórico

  • Recebido
    25 Maio 2015
  • Aceito
    15 Jun 2015
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