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Fatores associados ao uso de chupeta por lactentes nascidos pré-termo

RESUMO:

Objetivo:

investigar a avaliação de mães de recém-nascidos pré-termo acerca da introdução e uso de chupeta e sua relação com variáveis socioeconômicas, prematuridade e aleitamento materno, partindo-se do contexto da internação de seus filhos em unidade de terapia intensiva neonatal.

Métodos:

na etapa inicial, participaram 62 mães de recém-nascidos pré-termo, tendo comparecido 52 para acompanhamento aos seis meses de idade e 40 aos 24 meses. Os dados foram tabulados utilizando o programa SPSS versão 18.0 e análise estatística com testes Qui-quadrado, Fisher e Mann-Whitney.

Resultados:

a tentativa de introdução da chupeta ocorreu para 96,2% dos bebês nascidos pré-termo, egressos de unidade de terapia intensiva neonatal, e seu uso em 50%; o hábito de sucção de chupeta foi alto entre crianças da família (irmãos - 51,9%; primos - 76,9%), reforçando aspectos culturais. Apresentaram associação estatisticamente significante com maior uso de chupeta: prematuridade avaliada pela relação peso/idade-gestacional (p=0,044), dificuldade para estabelecer ou manter o aleitamento materno após a alta hospitalar (p=0,012) e primiparidade (p=0,02); relação com menor frequência de chupeta: aleitamento materno exclusivo ≥3 meses (p=0,026) e tempo de aleitamento materno ≥6 meses (p=0,004). A dificuldade para o aleitamento materno após a alta hospitalar foi associada com maior tempo de internação (p=0,007) e maior tempo de sonda orogástrica (p=0,006).

Conclusão:

a oferta da chupeta para lactentes nascidos pré-termo, egressos de unidade de terapia intensiva neonatal, apresentou grande influência cultural, mas sua aceitação pelo bebê ocorreu principalmente devido às dificuldades encontradas pelas mães para estabelecerem o aleitamento materno.

Descritores:
Chupetas; Aleitamento Materno; Cultura; Prematuro

ABSTRACT:

Purpose:

to investigate the evaluation of mothers of preterm newborns about the introduction and use of pacifiers and its relationship with socioeconomic variables, prematurity and breastfeeding, in the context of their children hospitalization in neonatal intensive care unit.

Methods:

during the early stage, 62 preterm newborns' mothers participated in this study, 52 of them came back for follow-up at six months of age and 40 at 24 months. Data were tabulated using software SPSS version 18.0 and statistical analysis using chi-square, Fisher and Mann-Whitney tests.

Results:

the attempt to introduce a pacifier took place for 96.2% of preterm infants discharged from neonatal intensive care unit, and it was used by 50%. The use of pacifiers was high among other children in the family (siblings - 51.9%; cousins - 76.9%), which reinforced cultural aspects. The following showed statistically significant association with higher use of pacifiers: prematurity assessed by weight/gestational age ratio (p=0.044), difficult to start or continue breastfeeding after discharge (p=0.012) and primiparity (p=0.02); relation with lower frequency of pacifier: exclusive breastfeeding ≥3 months (p=0.026) and breastfeeding length ≥6 months (p=0.004). Difficulty in breastfeeding after discharge was associated to higher hospitalization length (p=0.007) and higher length of orogastric tube (p=0.006).

Conclusion:

offering pacifiers to preterm infants discharged from neonatal intensive care unit showed strong cultural influence, but their acceptance occurred mainly due to mothers' difficulty to start or continue breastfeeding.

Keywords:
Pacifiers; Breastfeeding; Culture; Infant, Premature

Introdução

A compreensão dos elementos envolvidos na decisão dos adultos para a oferta da chupeta aos lactentes perpassa pela análise dos estudos sobre cultura, como produto do processo de desenvolvimento do pensamento humano originado a partir das ligações entre história individual e história social, representada pelo acúmulo de informações que se refletem em crenças e práticas11. Vygotsky LS. A formação social da mente. O desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.. Com o objetivo de verificar a presença de aspectos culturais em estudos publicados sobre hábitos de sucção de chupeta, Dadalto e Rosa22. Dadalto ECV, Rosa EM. Aspectos culturais para a oferta da chupeta às crianças. Rev bras crescimento desenvolv hum. 2013;23(2):231-7. constataram que a chupeta constitui um objeto cultural e sua oferta pelos adultos e uso pelas crianças representa um fenômeno cultural, que sofreu alterações ao longo dos séculos.

O momento da retirada da chupeta também é carregado por influência cultural, como tentativa para transferir esta responsabilidade do âmbito individual para o coletivo. Podem ser citados como exemplos: levar a criança para pendurar a chupeta em uma árvore (pacifier-tree) em parques da Dinamarca e Suécia; promover uma festa de despedida, trocar por presente ou deixar a chupeta para o Papai Noel, como soluções na Noruega33. Selmer-Olsen I. The pacifier: a story about comfort, rituals and aesthetification of childhood. Childhood. 2007;14(4):521-35.; e na Alemanha, um conto sobre a fada da chupeta objetiva induzir à criança que não foram os pais que a retiraram, mas a fada44. Heimerdinger T. Pacifiers and fairies: family culture as risk management - a german example. J of Folklore Res. 2011;48(2):197-211.. Em famílias brasileiras, o diálogo e a troca por presente ocorrem com maior frequência, porém relatos de soluções mais radicais como "jogar a chupeta fora" também podem ser encontrados55. Martins BS, Dadalto, ECV, Gomes AMM, Sanglard LF, Valle MAS. Métodos usados para remoção dos hábitos de sucção de dedo e/ou chupeta em crianças do município de Mutum-MG. Rev bras pesqui saúde. 2010;12(4):19-25..

O uso de chupeta tem sido muito frequente em países ocidentais66. Vasconcelos FMN, Massoni ACL, Heimer MV, Ferreira AMB, Katz CRT, Rosenblatt A. Non-nutritive sucking habits, anterior open bite and associated factors in Brazilian children aged 30-59 months. Braz Dent J. 2011;22(2):140-5.

7. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10.
-88. Buccini G dos S, Benício MHD, Venancio SI. Determinantes do uso de chupeta e mamadeira. Rev Saúde Pública. 2014;48(4):571., o que pode ser analisado do ponto de vista das atribulações da vida moderna, dificultando para a mulher a disponibilização do aleitamento materno em livre demanda para suprir a necessidade de sucção do bebê e o fato relatado pelas mães de que a chupeta acalma a criança77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10.,99. Salustiano LPQ, Diniz ALD, Abdallah VOS, Pinto RMC. Fatores associados à duração do aleitamento materno em crianças menores de seis meses. Rev Bras Ginecol Obstet. 2012;34(1):28-33.. O aspecto intergeracional foi discutido por Serra-Negra et al.1010. Serra-Negra JMC, Vilela LC, Rosa AR, Andrade ELSP, Paiva SM, Pordeus IA. Hábitos bucais deletérios: os filhos imitam as mães na adoção destes hábitos? Rev odonto ciênc. 2006;21(52):146-52., cujo resultado demonstrou que em 78,9% dos casos de sucção de chupeta praticado pelas mães na sua infância houve coincidência, estatisticamente significante, com este mesmo hábito apresentado pela criança na atualidade.

A análise estatística entre uso de chupeta e variáveis demográficas, econômicas e sociais foi efetuada em alguns estudos. Mauch et al.77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10. encontraram menor frequência quando as mães tinham escolaridade correspondente ao nível superior. Buccini, Benício e Venancio88. Buccini G dos S, Benício MHD, Venancio SI. Determinantes do uso de chupeta e mamadeira. Rev Saúde Pública. 2014;48(4):571. associaram maior uso de chupeta e bicos artificiais no primeiro ano de vida com trabalho materno fora do lar, primiparidade, mães mais jovens, parto cesáreo e baixo peso ao nascer.

A idade em que ocorre a introdução da chupeta pode ter influência como causa da redução do tempo de aleitamento materno, sendo o período crítico associado à idade inferior a duas semanas de vida1111. Lindau JF, Mastroeni S, Gaddini A, Di Lallo D, Fiori Nastro P, Patanè M et al. Determinants of exclusive breastfeeding cessation: identifying an "at risk population" for special support. Eur J Pediatr. 2015;174(4):533-40. ou inferior a quatro semanas77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10., o que justifica a recomendação para não utilizar a chupeta no período neonatal. No estudo de Soares et al.1212. Soares ME, Giugliani ER, Salgado AC, Oliveira AP, Aguiar PR. Uso de chupeta e sua relação com o desmame precoce em população de crianças nascidas em Hospital Amigo da Criança. J Pediatr. 2003;79(4):309-16., apesar da recomendação para que as mães não introduzissem chupetas e mamadeiras aos recém-nascidos, o uso da chupeta foi pelo menos tentado em 87,8% dos casos, durante o primeiro mês de vida, e 61,6% a usavam na idade de um mês, com o objetivo principal de supressão do choro, uma vez que as mães relataram que acalmava o bebê.

O desafio para mães e recém-nascidos de baixo peso ao nascimento, internados em unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN) e com alimentação por meio de sonda orogástrica é o estabelecimento do aleitamento materno, uma vez que o início da alimentação por sucção está diretamente relacionado ao menor tempo de internação hospitalar1313. Zhang Y, Lyu T, Hu X, Shi P, Cao Y, Latour JM. Effect of nonnutritive sucking and oral stimulation on feeding performance in preterm infants: a randomized controlled trial. Pediatr Crit Care Med. 2014;15(7):608-­14.,1414. Sanches MTC, Buccini GS, Gimeno SGA, Rosa TEC, Bonamigo AW. Fatores associados à interrupção do aleitamento materno exclusivo de lactentes nascidos com baixo peso assistidos na atenção básica. Cad saúde pública. 2011;27(5):953-65.. Quanto menor for o tempo de aleitamento materno, maior é a possibilidade da instalação de hábitos de sucção66. Vasconcelos FMN, Massoni ACL, Heimer MV, Ferreira AMB, Katz CRT, Rosenblatt A. Non-nutritive sucking habits, anterior open bite and associated factors in Brazilian children aged 30-59 months. Braz Dent J. 2011;22(2):140-5.,1515. Romero CC, Scavone-Junior H, Garib DG, Cotrim-Ferreira FA. Breastfeeding and non-nutritive sucking patterns related to the prevalence of anterior open bite in primary dentition. J Appl Oral Sci. 2011;19(2):161-8.,1616. Carrascoza KC, Possobon RF, Ambrosano GMB, Costa Júnior AL, Moraes ABA. Fatores determinantes do uso de chupeta entre crianças participantes de programa de incentivo ao aleitamento materno. Rev. CEFAC. 2014;16(2):582-91..

Estudos sobre a aquisição e prolongamento do hábito de sucção de chupeta em crianças nascidas pré-termo são escassos na literatura, tendo demonstrado frequência de 45,7% nos primeiros seis meses de vida1717. Benevenuto de Oliveira MM, Thomson Z, Vannuchi MT, Matsuo T. Feeding patterns of Brazilian preterm infants during the first 6 months of life, Londrina, Parana, Brazil. J Hum Lact. 2007;23(3):269-74. e associação significante com prematuridade1818. Ferrini FR, Marba ST, Gavião MB. Oral conditions in very low and extremely low birth weight children. J dent child 2008;75(3):235-42.. Neste último trabalho, crianças de dois a quatro anos de idade, nascidas pré-termo com muito baixo peso e extremo baixo peso apresentaram frequência de chupeta de 56%, comparadas com crianças de peso ao nascimento normal, cuja frequência foi 33%, com p-valor=0,02. Considerando o aumento da sobrevida de recém-nascidos pré-termo nas últimas décadas1919. Ibidi SM, Cardoso LEMB. Classificação do recém-nascido: cuidados com o RN PIG e RN GIG. In: Vaz FAC, Diniz EMA, Ceccon MEJR, Krels VLJ. Neonatologia. Barueri: Manole, 2011. p. 3-6. e a escassez de estudos sobre hábitos de sucção de chupeta neste segmento da população infantil, constituiu propósito do presente estudo investigar a avaliação de mães de recém-nascidos pré-termo acerca da introdução e uso de chupeta e sua relação com variáveis socioeconômicas, prematuridade e aleitamento materno, partindo-se do contexto da internação de seus filhos em unidade de terapia intensiva neonatal.

Métodos

A primeira etapa deste estudo ocorreu na cidade de Vitória-ES em uma UTIN pública e uma privada, durante cinco meses, quando foram selecionadas as participantes. O critério de inclusão para o estudo consistiu de mães de recém-nascidos pré-termo que estavam internados em UTIN, na situação de médio risco. Quando os bebês completaram seis meses de idade cronológica, as mães foram convidadas por telefone para participarem da segunda etapa, que foi executada na clínica de Odontopediatria vinculada a uma universidade pública, assim como o acompanhamento longitudinal. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo, sob o nº 249/10, e as participantes, voluntárias, assinaram o "Termo de Consentimento Livre e Esclarecido", seguindo determinações da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.

Os recém-nascidos (RN) foram classificados conforme a idade gestacional ao nascimento em: pré-termo extremo (<30 semanas), muito prematuro (30 a 33 semanas e seis dias) e pré-termo tardio (34 a 36 semanas e seis dias). De acordo com o peso ao nascimento, a classificação foi a seguinte: extremo baixo peso (<1.000 gramas), muito baixo peso (1.000 a 1.499 gramas) e baixo peso (1.500 a 2.499 gramas). Os recém-nascidos também foram classificados conforme a adequação do peso à idade gestacional em PIG (pequeno para idade gestacional), quando o peso ao nascimento era inferior ao peso indicado no percentil 10 para a idade gestacional; AIG (adequado para idade gestacional), quando o peso situava entre o percentil 10 e percentil 90; e GIG (grande para idade gestacional), quando o peso era maior que o valor indicado no percentil 90 para a idade gestacional1919. Ibidi SM, Cardoso LEMB. Classificação do recém-nascido: cuidados com o RN PIG e RN GIG. In: Vaz FAC, Diniz EMA, Ceccon MEJR, Krels VLJ. Neonatologia. Barueri: Manole, 2011. p. 3-6..

Na fase inicial, participaram do estudo 62 mães de recém-nascidos pré-termo internados em UTIN. Para a segunda etapa, compareceram 52 mães (83,9%) e o acompanhamento foi semestral durante dois anos, concomitante com as consultas odontológicas das crianças. Na avaliação realizada aos 24 meses de idade dos bebês, compareceram 40 mães.

Para a coleta dos dados da primeira fase, o instrumento continha questões sobre dados demográficos, econômicos, sociais e culturais. Do prontuário da UTIN foram coletados os dados quanto à prematuridade, peso ao nascimento, internação e uso de sonda orogástrica. Na avaliação aos seis meses de idade e nas demais avaliações semestrais, as questões foram sobre saúde geral, alimentação e hábitos do lactente.

Para a classificação econômica, a distribuição das participantes foi realizada de acordo com critérios da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa2020. Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (ABEP). Critério de classificação econômica Brasil, 2010. Acesso em: 21 outubro 2010. Disponível em: http://www.abep.org/novo/CMS/Utils/FileGenerate.ashx?id=46
http://www.abep.org/novo/CMS/Utils/FileG...
, que enfatiza a segmentação conforme o poder aquisitivo das famílias e nível de escolaridade do provedor da família, realizando a divisão por classes econômicas, sendo elas as classes A1, A2, B1, B2, C1, C2, D e E, em ordem decrescente. A escolaridade foi classificada pelo sistema de ensino brasileiro, correspondendo ao ensino fundamental incompleto (EFI), ensino fundamental completo (EFC), ensino médio incompleto (EMI), ensino médio completo (EMC), ensino superior incompleto (ESI) e ensino superior completo (ESC).

As questões foram tabuladas por meio do pacote estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences) versão 18.0 para Windows (SPSS INC., CHICAGO, IL, USA). Para a análise dos dados foram utilizados procedimentos de estatística descritiva e análises bivariadas, para verificar a relação entre as variáveis, principalmente com o teste Qui-quadrado. Para as tabelas cruzadas que apresentaram células com resultados esperados menores do que cinco para a hipótese nula foi utilizado o teste Exato de Fisher, para os casos de duas categorias; ou a Razão da Máxima Verossimilhança para mais de duas categorias. As variáveis métricas foram comparadas, após aplicação do teste de normalidade Shapiro-Wilk, por meio do teste t para médias quando a distribuição foi adequada ao modelo de Gauss, ou por meio do teste de Mann-Whitney (não-paramétrico) quando a distribuição não foi gaussiana.

Resultados

A distribuição das participantes de acordo com dados demográficos e socioeconômicos pode ser observada na Tabela 1; a idade das mães variou de 17 a 42 anos, com média de 28,3 anos (desvio padrão 6,9). Estes resultados foram tabulados para as 62 mães de lactentes nascidos pré-termo internados em UTIN, que participaram do estudo na primeira etapa.

Tabela 1:
Distribuição das participantes, conforme dados demográficos e socioeconômicos

Os dados relacionados ao recém-nascido pré-termo demonstraram que 51,6% eram do sexo feminino; 43,5% apresentaram idade gestacional entre 27,4 semanas e 33 semanas e 6 dias, enquanto 56,5% completaram 34 semanas até a idade gestacional inferior a 37 semanas; o peso ao nascimento foi inferior a 1.500 gramas em 17,7%, maior ou igual a 1.500 gramas, porém inferior a 2.500 gramas em 61,3% ao passo que 21% apresentaram peso de 2.500 gramas ou mais. O tempo de internação na UTIN para a maioria foi entre cinco e 30 dias (72,6%), 31 a 60 dias (16,1%), enquanto 11,3% ficaram internados por um período entre 61 a 180 dias; 45,2% necessitaram de alimentação via sonda orogástrica por até sete dias, 45,2% por oito dias ou mais e para 9,6%, não houve uso da sonda.

Não apresentaram diferenças estatisticamente significantes conforme o tipo de UTIN (pública ou privada) as variáveis métricas quanto ao tempo (em dias) de internação (p=0,614) e tempo (em dias) de uso de sonda orogástrica (p=0,977). As variáveis categóricas primiparidade (p=0,352) e classificação de prematuridade por idade gestacional (p=0,258) também não diferiram estatisticamente conforme o tipo de UTIN. As variáveis quanto à escolaridade da mãe e classificação econômica apresentaram diferenças estatisticamente significantes entre as duas unidades (p=0,001 e p=0,025, respectivamente). Na UTIN privada foi mais frequente a escolaridade correspondente ao EMC, ESI e ESC (77,1%) e as classes econômicas A2, B1 e B2 (54,3%), comparadas com a UTIN pública. Entretanto, como havia cinco usuárias do Sistema Único de Saúde na UTIN privada, em leitos disponibilizados pelo governo brasileiro, o tipo de UTIN não foi utilizado nas demais comparações estatísticas, sendo consideradas as variáveis quanto à classificação econômica e escolaridade da mãe para a análise socioeconômica.

A avaliação dos resultados aos seis meses de vida dos lactentes correspondeu às respostas de 52 participantes. Nestes primeiros seis meses, 50% dos lactentes nascidos pré-termo estavam usando (n=25) ou usaram (n=1) chupeta. A idade para início do hábito de chupeta em 26,9% dos casos foi antes dos três meses de idade, mas, na maioria dos casos (73,1%), a oferta inicial ocorreu na idade de três meses ou mais. A estratificação por idade foi: menos de um mês de vida (3,6%), um mês (17,8%), dois meses (7,1%), três meses (39,3%), quatro meses (28,6%) e cinco meses (3,6%).

As variáveis categóricas socioeconômicas e aquelas relacionadas à prematuridade foram testadas estatisticamente, para verificar se haveria independência ou não com o uso de chupeta nos primeiros seis meses, utilizando-se o teste Qui-quadrado e quando necessário o teste Exato de Fisher ou a Razão de Máxima Verossimilhança (Tabela 2). As variáveis métricas relativas ao tempo de permanência na UTIN (em dias), tempo de uso de sonda orogástrica (em dias), peso ao nascimento e idade da mãe, foram comparadas para verificar se haveria diferença conforme uso ou não de chupeta, aplicando-se o teste não-paramétrico de Mann-Whitney ou teste t para médias. Os resultados podem ser visualizados na Tabela 3.

Tabela 2:
Distribuição das participantes quanto a variáveis socioeconômicas e relacionadas à prematuridade, de acordo com uso de chupeta nos primeiros seis meses (n=52)
Tabela 3:
Distribuição das variáveis métricas, conforme uso ou não de chupeta em recém-nascidos pré-termo egressos de UTIN, de acordo com relato de suas mães

As variáveis categóricas concernentes ao aleitamento materno e sua associação ou não com uso de chupeta durante os primeiros seis meses de vida estão apresentadas na Tabela 4. As participantes relataram, ainda, que não tiveram dificuldades para estabelecer o aleitamento materno em 55,8% (n=29) dos casos e estavam amamentando aos seis meses, mas 44,2% (n=23) relataram problemas. Em alguns casos, estes problemas foram relacionados à produção escassa de leite materno e, por este motivo, iniciaram uso de mamadeira com consequente redução do aleitamento materno até à recusa total pelo bebê (11,5%); em outros casos, apesar de ter leite suficiente, o bebê não conseguia sugar, ficava cansado e perdia peso (9,6%). Algumas relataram que tiveram problemas como mastite e fissuras no mamilo, mas não interromperam o aleitamento materno (7,8%), e oito participantes não amamentaram, devido a sua saúde geral (3,8%) ou à falta de produção do leite materno (11,5%).

Tabela 4:
Distribuição das participantes conforme uso de chupeta pelo bebê e associação com variáveis relacionadas ao aleitamento materno (n=52)

A dificuldade para estabelecer ou manter o aleitamento materno após a alta da UTIN apresentou associação estatisticamente significante com uso de chupeta, conforme foi demonstrado na Tabela 4. Esta variável foi comparada aplicando-se o teste não-paramétrico de Mann-Whitney, sendo verificado que o grupo com dificuldades para estabelecer ou manter o aleitamento materno após a alta hospitalar apresentou maior tempo de internação em UTIN (p=0,007) e maior tempo de uso de sonda orogástrica (p=0,006).

A sugestão às mães para introdução de chupeta foi muito frequente entre as pessoas da família (63,5%), sendo que em 44,3% por até duas pessoas e em 19,2% por três pessoas ou mais, ao passo que em 36,5% dos casos ninguém sugeriu. Entre as próprias mães, 40,4% usaram chupeta na sua infância, 40,4% não usaram e 19,2% não souberam informar. Quanto ao pai do bebê 23,1% usaram, 25% não, porém 51,9% das participantes não souberam informar. Entre os bebês que já tinham irmão(s), 57,1% deles usavam ou tinham usado chupeta, enquanto o uso por um ou mais primos do bebê foi relatado por 76,9% das participantes. Não houve associação estatisticamente significante do uso ou não de chupeta, no presente estudo, quanto às variáveis: número de pessoas que sugeriram chupeta (p=0,375), uso de chupeta pela mãe (p=0,217), pai (p=0,226), irmãos (p=1,000) e primos (p=1,000), pelos testes de Qui-quadrado e Exato de Fisher.

A tentativa para acostumar o bebê com a chupeta ocorreu para 96,2% dos lactentes. Na maioria das vezes, esta oferta foi efetuada pela própria mãe (65,4%), avó (11,5%), pai (5,8%) ou outra pessoa da família (13,5%) e para apenas dois bebês (3,8%) a chupeta não foi disponibilizada. Para os 50 casos em que houve tentativa para seu uso, em 48% o adulto somente colocou a chupeta na boca do bebê para verificar se ele "queria" ou "pegava", 16% insistiram por algumas vezes até três dias, e 36% insistiram várias vezes, por uma semana ou mais. Na Tabela 5, pode-se observar a relação entre tentativa para introdução da chupeta e seu uso efetivo pelo bebê como hábito de sucção nos primeiros seis meses de vida.

Tabela 5:
Distribuição das participantes conforme a tentativa para acostumar o bebê com a chupeta e o hábito de sucção de chupeta nos primeiros seis meses de vida (n=50)

Os motivos pelos quais os adultos tentaram introduzir o hábito de chupeta foram variados. Nos casos em que o bebê adquiriu este hábito de sucção, para 34,6% o motivo foi para acalmá-lo porque chorava muito; 26,9% a oferta da chupeta foi para ajudá-lo adormecer mais rápido e por um tempo maior; 23,1% para prover um maior tempo de sucção para o lactente, que estava mamando no peito a noite toda, ou que chorava após ter mamado porque queria sugar mais o peito; 11,5% porque o bebê começou sucção digital; e 3,8% para ver se ele precisava da chupeta.

Já nos casos em que as crianças não adquiriram o hábito de sucção de chupeta, o motivo apresentado para sua tentativa pela maioria das mães (54,2%) foi para ver se o bebê aceitava, já que muitas outras crianças usavam. Um número menor de mães alegou que era para acalmar o bebê que chorava muito (33,3%); ajudá-lo a adormecer mais rápido (8,3%); evitar que ele continuasse com sucção digital (4,2%); e nenhuma mencionou dificuldades na amamentação.

Aos 24 meses de idade cronológica dos bebês, 40 participantes compareceram para o acompanhamento dos filhos. Foram observados relatos de uso de chupeta por 24 crianças. Desde a avaliação realizada aos seis meses de vida, o hábito de chupeta ocorreu em mais um caso aos oito meses; e dois casos entre 12 e 18 meses. Quanto à interrupção deste hábito até o final do estudo, das 24 crianças que apresentaram o hábito de chupeta, seis interromperam até os 18 meses (25%), mas a maioria delas (n=18) ainda permanecia com o hábito aos 24 meses de idade. A continuação do aleitamento materno por 12 meses ou mais ocorreu em 15 casos; apenas quatro crianças nunca haviam usado mamadeira e aos 24 meses, 27 delas continuavam se alimentando por meio de mamadeira, mesmo quando o aleitamento materno ainda era ofertado.

Discussão

Embora o planejamento não tenha sido direcionado para estudar prevalência do uso de chupeta entre recém-nascidos pré-termo, a frequência encontrada aos seis meses de idade (n=52) foi de 50%. Este resultado é semelhante ao verificado por Brusco e Delgado2121. Brusco TR, Delgado SE. Caracterização do desenvolvimento da alimentação de crianças nascidas pré-termo entre três e 12 meses. Rev. CEFAC. 2014;16(3):917-28., em que metade da amostra constituída por bebês nascidos pré-termo usava chupeta, e próximo ao resultado de 45,7% encontrado por Benevenuto de Oliveira et al.1717. Benevenuto de Oliveira MM, Thomson Z, Vannuchi MT, Matsuo T. Feeding patterns of Brazilian preterm infants during the first 6 months of life, Londrina, Parana, Brazil. J Hum Lact. 2007;23(3):269-74..

A primiparidade apresentou associação estatística com uso de chupeta (80,8%) comparada com bebês que não usaram (38,5%), o que também foi observado por Buccini, Benício e Venancio88. Buccini G dos S, Benício MHD, Venancio SI. Determinantes do uso de chupeta e mamadeira. Rev Saúde Pública. 2014;48(4):571., provavelmente relacionada à inexperiência da mãe para interpretar as necessidades do filho. Não houve diferença estatisticamente significante entre uso ou não de chupeta e escolaridade da mãe e do pai, idade da mãe, inserção da mãe no mercado de trabalho, classificação econômica e sexo do bebê. Por outro lado, na literatura, o hábito de sucção de chupeta tem sido associado significantemente com menor escolaridade das mães77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10., com trabalho materno fora do lar, mães mais jovens e parto cesáreo88. Buccini G dos S, Benício MHD, Venancio SI. Determinantes do uso de chupeta e mamadeira. Rev Saúde Pública. 2014;48(4):571..

Apesar de não ter havido associação entre uso de chupeta e prematuridade avaliada pela idade gestacional (p=0,126) e peso ao nascimento (p=0,214), quando a classificação foi realizada de acordo com a relação entre peso ao nascimento para a idade gestacional correspondente, o grupo de recém-nascidos classificados como pequeno para a idade gestacional (PIG) apresentou associação estatisticamente significante com maior uso de chupeta (p=0,044). Ainda no presente estudo, o tempo de internação em UTIN e o tempo de uso de sonda orogástrica não foram relacionados com uso de chupeta. Estudos para associar a prevalência de uso de chupeta e prematuridade são escassos, mas a literatura mostra tendência para maior prevalência de uso neste segmento, se comparada com crianças nascidas a termo e peso de nascimento adequado1717. Benevenuto de Oliveira MM, Thomson Z, Vannuchi MT, Matsuo T. Feeding patterns of Brazilian preterm infants during the first 6 months of life, Londrina, Parana, Brazil. J Hum Lact. 2007;23(3):269-74.,1818. Ferrini FR, Marba ST, Gavião MB. Oral conditions in very low and extremely low birth weight children. J dent child 2008;75(3):235-42.. Similarmente, o baixo peso ao nascimento foi associado à maior frequência de uso de chupeta88. Buccini G dos S, Benício MHD, Venancio SI. Determinantes do uso de chupeta e mamadeira. Rev Saúde Pública. 2014;48(4):571..

O tipo de aleitamento (mamadeira, aleitamento materno ou aleitamento misto) não apresentou associação estatisticamente significante com uso ou não de chupeta (p=0,071). A dificuldade para estabelecer ou manter a amamentação após a alta hospitalar teve associação estatística com maior uso de chupeta (p=0,012) e foi relatada por 44,2%, sendo relacionada principalmente à ausência ou produção escassa do leite materno. Como fatores de proteção relacionados ao menor uso de chupeta, as variáveis que apresentaram associação estatisticamente significante foram o aleitamento materno exclusivo por período de três meses ou superior e a manutenção do aleitamento materno por seis meses ou mais. Estes resultados contribuem para a discussão sobre o uso da chupeta como consequência das dificuldades encontradas por mãe e bebê para manutenção do aleitamento materno como fonte de satisfação da necessidade de sucção não nutritiva, o que também foi apresentado por Silva e Guedes2222. Silva WF, Guedes ZCF. Tempo de aleitamento materno exclusivo em recém-nascidos prematuros e a termo. Rev. CEFAC. 2013;15(1):160-71.. A relação inversa entre maior tempo de aleitamento materno e menor frequência de hábitos de sucção não nutritiva também foi demonstrada66. Vasconcelos FMN, Massoni ACL, Heimer MV, Ferreira AMB, Katz CRT, Rosenblatt A. Non-nutritive sucking habits, anterior open bite and associated factors in Brazilian children aged 30-59 months. Braz Dent J. 2011;22(2):140-5.,1515. Romero CC, Scavone-Junior H, Garib DG, Cotrim-Ferreira FA. Breastfeeding and non-nutritive sucking patterns related to the prevalence of anterior open bite in primary dentition. J Appl Oral Sci. 2011;19(2):161-8., enquanto Carrascoza et al.1616. Carrascoza KC, Possobon RF, Ambrosano GMB, Costa Júnior AL, Moraes ABA. Fatores determinantes do uso de chupeta entre crianças participantes de programa de incentivo ao aleitamento materno. Rev. CEFAC. 2014;16(2):582-91. associaram a menor frequência de uso de chupeta com a presença de aleitamento materno exclusivo ao final do primeiro mês de vida, no momento da alta hospitalar e aos seis meses de idade.

Corrobora os resultados de que a aceitação da chupeta pelo bebê é uma consequência das dificuldades encontradas no aleitamento materno o fato de que, devido à orientação hospitalar contrária ao uso da chupeta, sua oferta inicial ocorreu na maioria dos casos do presente estudo, na idade igual ou superior a três meses (73,1%), quando os problemas relacionados à amamentação já haviam se instalado, e apenas um caso antes de um mês de idade (3,6%). De acordo com os achados de Lindau et al.1111. Lindau JF, Mastroeni S, Gaddini A, Di Lallo D, Fiori Nastro P, Patanè M et al. Determinants of exclusive breastfeeding cessation: identifying an "at risk population" for special support. Eur J Pediatr. 2015;174(4):533-40. a introdução precoce da chupeta, nas primeiras duas semanas de vida, comparada com o uso tardio, reduziu a duração do aleitamento materno, fato também constatado por Mauch et al.77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10. nas primeiras quatro semanas, reforçando a recomendação para evitar seu uso no período neonatal.

A variável relacionada à dificuldade encontrada pelas mães para estabelecer ou manter o aleitamento materno foi comparada com as variáveis métricas tempo de internação na UTIN (em dias) e tempo de uso de sonda orogástrica (em dias), posto que este foi o contexto inicial no planejamento do presente estudo para verificar o uso ou não de chupeta em recém-nascidos que tiveram restrição ao aleitamento materno, devido ao uso de sonda orogástrica ou à separação temporária da mãe, como consequência da hospitalização. Os resultados demonstraram que o grupo com dificuldades para estabelecer ou manter a amamentação após a alta hospitalar apresentou maior tempo de internação em UTIN (p=0,007) e maior tempo de uso de sonda orogástrica (p=0,006). Considerando o risco biológico da população estudada em razão da prematuridade e internação em UTIN, os resultados se assemelham aos achados de Crestani et al.2323. Crestani AH, Souza APR, Beltrami L, Moraes AB. Análise da associação entre tipos de aleitamento, presença de risco ao desenvolvimento infantil, variáveis obstétricas e socioeconômicas. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(3):205-10. que verificaram menor frequência de aleitamento materno exclusivo associada significantemente com baixo peso ao nascimento, na presença de intercorrências peri e pós-natais. Da mesma forma, bebês pequenos para a idade gestacional foram associados com estabelecimento mais tardio do aleitamento materno exclusivo em 5,6 dias2424. Maastrup R, Hansen BM, Kronborg H, Bojesen SN, Hallum K, Frandsen A et al. Breastfeedinf progression in preterm infants is influenced by factors in infants, mothers and clinical practice: the results of a national cohort study with high breastfeeding initiation rates. PLoS One. 2014;9(9):e108-208., enquanto as melhores condições para o início da amamentação em bebês nascidos pré-termo foram encontradas nos casos de maior idade gestacional e mais dias de vida2525. Silva PK, Almeida ST. Avaliação de recém-nascidos prematuros durante a primeira oferta de seio materno em uma uti neonatal. Rev. CEFAC. 2015;17(3):927-35.. A dificuldade encontrada para a amamentação do lactente nascido de baixo peso (≤ 2000g) e a queixa da mãe sobre a mamada no primeiro mês constituíram fatores associados com a interrupção do aleitamento materno exclusivo1414. Sanches MTC, Buccini GS, Gimeno SGA, Rosa TEC, Bonamigo AW. Fatores associados à interrupção do aleitamento materno exclusivo de lactentes nascidos com baixo peso assistidos na atenção básica. Cad saúde pública. 2011;27(5):953-65..

Quanto à análise do contexto cultural, a sugestão por parte dos familiares para introdução da chupeta ocorreu na maioria dos casos, e pode-se avaliar que seu uso era comum entre crianças da família, incluindo a própria mãe na sua infância, o filho mais velho e os primos. No estudo de Serra-Negra et al.1010. Serra-Negra JMC, Vilela LC, Rosa AR, Andrade ELSP, Paiva SM, Pordeus IA. Hábitos bucais deletérios: os filhos imitam as mães na adoção destes hábitos? Rev odonto ciênc. 2006;21(52):146-52. foram encontradas associações estatisticamente significantes entre uso de chupeta pelas mães na sua infância e uso por seus filhos. Embora não tenha havido diferença estatística entre uso de chupeta pelos lactentes pré-termo do presente estudo e essas variáveis, as frequências foram muito altas, demonstrando como tem sido comum entre as gerações. A partir das antigas tradições de disponibilizar artefatos feitos com tecido para o lactente sugar, a chupeta, ao longo dos séculos, sofreu aperfeiçoamentos, em um processo de apropriação da cultura pelas sucessivas gerações22. Dadalto ECV, Rosa EM. Aspectos culturais para a oferta da chupeta às crianças. Rev bras crescimento desenvolv hum. 2013;23(2):231-7.,33. Selmer-Olsen I. The pacifier: a story about comfort, rituals and aesthetification of childhood. Childhood. 2007;14(4):521-35.. Em países ocidentais, a prevalência de chupeta tem aumentado para a população de crianças em geral, devido às atribulações da vida moderna, que dificultam a disponibilização pelas mães do aleitamento em livre demanda para suprir a necessidade de sucção do lactente77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10.,99. Salustiano LPQ, Diniz ALD, Abdallah VOS, Pinto RMC. Fatores associados à duração do aleitamento materno em crianças menores de seis meses. Rev Bras Ginecol Obstet. 2012;34(1):28-33..

A tentativa para acostumar o bebê com a chupeta realizada por um adulto da família, principalmente a própria mãe, ocorreu em 96,2% dos casos. Resultado semelhante também foi encontrado por Soares et al.1212. Soares ME, Giugliani ER, Salgado AC, Oliveira AP, Aguiar PR. Uso de chupeta e sua relação com o desmame precoce em população de crianças nascidas em Hospital Amigo da Criança. J Pediatr. 2003;79(4):309-16., com tentativa de 87,8%. A oferta, no presente estudo, foi feita inclusive para bebês que aparentemente não apresentavam uma necessidade maior de sucção, apenas com o intuito de verificar se ele precisava ou aceitava a chupeta (54,2% no grupo que não usou chupeta), com a alegação das participantes de que elas observavam que muitas crianças faziam uso. Estes resultados reforçam o caráter da influência cultural nas crenças e decisões das mães acerca da oferta deste objeto22. Dadalto ECV, Rosa EM. Aspectos culturais para a oferta da chupeta às crianças. Rev bras crescimento desenvolv hum. 2013;23(2):231-7.,33. Selmer-Olsen I. The pacifier: a story about comfort, rituals and aesthetification of childhood. Childhood. 2007;14(4):521-35.,77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10..

Entre os bebês que não aceitaram a chupeta na primeira tentativa, somente estavam usando aos seis meses de idade, aqueles para os quais foram realizadas várias tentativas pelos familiares. Os motivos mais frequentes foram para acalmar o bebê que chorava muito, ajudá-lo a adormecer mais rápido e por maior tempo e porque muitas crianças usam, corroborando a discussão sobre a insistência dos familiares para instalar o hábito na criança com o intuito de acalmá-la77. Mauch CE, Scott JA, Magarey AM, Daniels LA. Predictors of and reasons for pacifier use in first-time mothers: an observational study. BMC Pediatr. 2012;12(7):1-10..

É fundamental o estabelecimento de suporte profissional domiciliar para as lactantes, especialmente quando considerado o contexto do nascimento pré-termo e internação em UTIN. Programas com ações de educação em saúde, orientados por profissionais qualificados, voltados para as mães desde a gestação até os dois anos de vida da criança, devem ser implantados com a adequação de valores e crenças2626. Fernandes CB, Picon FS, Paviotti AB, Canevari TS, Pinheiro OL, Spadella MA. Conhecimentos de gestantes sobre o desenvolvimento pré-natal: subsídios para educação em saúde. J hum Growth dev. 2013;23(3):282-9.,2727. Alleo LG, Souza SB, Szarfarc SC. Práticas alimentares no primeiro ano de vida. J Hum Growth Dev. 2014;24(2):195-200..

Na avaliação quanto à interrupção do hábito de sucção de chupeta, foi observado no presente estudo, que a maioria das crianças ainda permanecia com este hábito aos 24 meses de idade, o que pode ser comparado com o trabalho de Martins et al.55. Martins BS, Dadalto, ECV, Gomes AMM, Sanglard LF, Valle MAS. Métodos usados para remoção dos hábitos de sucção de dedo e/ou chupeta em crianças do município de Mutum-MG. Rev bras pesqui saúde. 2010;12(4):19-25., quando observaram que em apenas 20% das crianças a remoção da chupeta ocorreu antes dos dois anos de idade. Como ponto relevante, pode ser evidenciado pelos referenciais culturais discutidos33. Selmer-Olsen I. The pacifier: a story about comfort, rituals and aesthetification of childhood. Childhood. 2007;14(4):521-35.,44. Heimerdinger T. Pacifiers and fairies: family culture as risk management - a german example. J of Folklore Res. 2011;48(2):197-211., que a própria cultura em alguns países busca soluções para o momento da retirada da chupeta, enquanto as famílias brasileiras, na maioria das vezes, optam pelo diálogo55. Martins BS, Dadalto, ECV, Gomes AMM, Sanglard LF, Valle MAS. Métodos usados para remoção dos hábitos de sucção de dedo e/ou chupeta em crianças do município de Mutum-MG. Rev bras pesqui saúde. 2010;12(4):19-25., o que pode demandar mais tempo para convencer a criança e, assim, prolongar o hábito.

Uma amostra maior é necessária para confirmar os resultados do presente estudo e determinar a prevalência de hábitos de sucção de chupeta entre crianças nascidas pré-termo. O cálculo amostral para esta finalidade não constituiu objetivo deste estudo, o que teria a finalidade de um diagnóstico populacional amplo.

Conclusão

O uso de chupeta foi relatado em 50% dos casos aos seis meses de idade, mas a tentativa pelas mães ou familiares para acostumar o bebê com a chupeta ocorreu em 96,2%. A primiparidade foi diretamente associada com maior uso de chupeta; não houve associação estatisticamente significante entre uso de chupeta e prematuridade avaliada pela idade gestacional e peso ao nascimento, mas o grupo de recém-nascidos classificados como pequeno para idade gestacional apresentou associação estatisticamente significante com maior uso de chupeta.

As dificuldades encontradas para estabelecer ou manter a amamentação após a alta hospitalar foram significantemente relacionadas com maior uso de chupeta, maior tempo de internação na UTIN e maior tempo de uso de sonda orogástrica. A idade inicial da introdução da chupeta foi igual ou superior a três meses, quando os problemas relacionados ao aleitamento materno já haviam se instalado. Os fatores de proteção relacionados ao menor uso de chupeta foram o aleitamento materno exclusivo até à idade igual ou superior a três meses e a manutenção do aleitamento materno por seis meses ou mais.

Com base nos resultados do presente estudo, pode-se concluir ainda que a oferta da chupeta apresentou influência cultural, mas a sua aceitação pelo bebê, com a consequente instalação do hábito, ocorreu principalmente devido às dificuldades encontradas pelas mães de lactentes nascidos pré-termo e egressos de UTIN para estabelecer ou manter o aleitamento materno. Por outro lado, a interferência cultural também se fez presente na aceitação da chupeta nos casos em que a oferta pelos familiares foi realizada com base na insistência.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    03 Dez 2015
  • Aceito
    09 Maio 2016
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