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Alterações fonoaudiológicas e acesso ao fonoaudiólogo nos casos de óbito por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe: um estudo retrospectivo

RESUMO

Objetivos:

identificar as alterações fonoaudiológicas e o acesso ao fonoaudiólogo durante o curso da doença, nos casos de óbito por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe, nos residentes de Olinda - PE, em 2012 e 2013.

Métodos:

estudo descritivo, retrospectivo, cuja população foi composta pelos óbitos por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe, residentes em Olinda, notificados ao Sistema de Informação sobre Mortalidade e ocorridos nos anos de 2012 e 2013, com assistência integralmente realizada pelo SUS. As informações foram obtidas em entrevistas realizadas com os informantes-chave de cada caso. Para tal, foram utilizados os princípios do protocolo da Autópsia Verbal. As diferenças percentuais foram testadas por meio do teste estatístico Qui- quadrado corrigido de Yates, ou nos casos em que a ocorrência foi inferior a cinco observações, usou-se o Teste Exato de Fisher, com α=5%.

Resultados:

dos 18 óbitos investigados, em 55,6%, a suspeita de câncer foi por meio da realização do auto-exame, o diagnóstico ocorreu exclusivamente por profissionais médicos, e a língua e a orofaringe aparecem como sítio tumoral de maior ocorrência. Todos os casos apresentaram alguma alteração nas funções estomatognáticas, sendo 88,9% na fala, 83,3% na mastigação e deglutição e 77,8% na voz. Em 27,8% houve a indicação para o tratamento fonoaudiológico, e destes, todos referiram acesso ao profissional no sistema único de saúde.

Conclusão:

os resultados deste trabalho ratificam que as funções estomatognáticas apresentaram alterações em proporções elevadas, e a despeito disso, poucas pessoas receberam indicação para o acompanhamento fonoaudiológico. No entanto, todos que foram indicados, referiram acesso a este profissional.

Descritores:
Neoplasias Bucais; Sistema Estomatognático; Transtornos da Comunicação

ABSTRACT:

Purpose:

to identify the speech-language disorders and access to speech therapist during the course of the disease, the death cases from lip, oral cavity and oropharynx cancer, in Olinda residents - PE, in 2012 and 2013.

Methods:

a descriptive, retrospective study whose population consisted of deaths from lip, oral cavity and oropharynx cancer, residents in Olinda, reported to the Mortality Information System and occurred in 2012 and 2013 with full assistance provided by SUS. The information was obtained from interviews with key informants in each case. To do this, the principles of Verbal Autopsy protocol were used. The percentage differences were tested by Chi-square with Yates' correction statistical test, or in cases where occurrence was less than five remarks, it was used the Fisher's Exact Test, with α = 5%.

Results:

of the 18 deaths investigated, in 55.6%, the cancer suspicion was through self-examination, diagnosis was given exclusively by medical professionals, and tongue and oropharynx appear as tumor site of major occurrence. All the cases showed any change in stomatognathic functions, 88.9% in speech, 83.3% in chewing and swallowing and 77.8% in the voice. In 27.8% there was an indication for speech therapy treatment, and of these, all reported access to a professional in the Health System.

Conclusion:

these results confirm that stomatognathic functions showed changes in high proportions, and despite this, few people received indication for speech therapy treatment. However, everyone that was indicated, reported access to this professional.

Keywords:
Mouth Neoplasms; Stomatognathic System; Communication Disorders

Introdução

O Câncer de boca é reconhecido como tumor maligno localizado na cavidade oral, lábios e orofaringe, tendo como principais características o aparecimento de lesões que não cicatrizam, ulcerações superficiais e indolores e manchas que podem ser esbranquiçadas ou avermelhadas. O tabagismo, o etilismo e a má higiene oral são importantes fatores de risco para a doença11. Markkanen-Leppänen M, Isotalo E, Mäkitie AA, Asko-Seljaara S, Pessi T, Suominen E et al. Changes in articulatory proficiency following microvascular reconstrution in oral or oropharyngeal cancer. Oral Oncology. 2006;42(6):646-52.,22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014..

O câncer de boca está categorizado entre os cânceres de cabeça e pescoço (CCP), onde ocupa a sexta posição como o tumor mais frequente em todo o mundo. No Brasil, representa o sexto tipo de câncer mais incidente, ocupando a quarta posição na região nordeste. Este tipo de câncer atinge mais 11.000 novos brasileiros todo ano, é a mais grave doença que afeta a boca, provocando 4.891 óbitos em 2010, sendo 3.882 homens e 1.009 mulheres, ocupando a terceira posição nas razões incidência / mortalidade entre as neoplasias22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.. No Brasil, a maior ocorrência desses cânceres tem sido registrada na língua, acumulando 32% dos casos, seguidos da orofaringe (18,5%) e do assoalho de boca (12,4%), sendo o carcinoma epidermóide o tipo histológico mais frequente33. Melo LC, Silva MC, Bernardo JMP, Marques EB, Leite ICG. Perfil epidemiológico de casos incidentes de câncer de boca e faringe. RGO - Rev Gaúcha Odontol. 2010;58(3):351-5..

O indivíduo pode apresentar dificuldade para falar, se alimentar, perda acentuada de peso e linfadenomegalia cervical. Essas alterações, somadas à modificação facial e aos transtornos emocionais causados pela doença, prejudicam significativamente a qualidade de vida dessas pessoas. O tratamento do câncer ocorre por meio de cirurgia, quimioterapia e/ou radioterapia e a indicação é feita de acordo com a localização do tumor11. Markkanen-Leppänen M, Isotalo E, Mäkitie AA, Asko-Seljaara S, Pessi T, Suominen E et al. Changes in articulatory proficiency following microvascular reconstrution in oral or oropharyngeal cancer. Oral Oncology. 2006;42(6):646-52.,22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.,44. Konstantinovic VS. Quality of life after surgical excision followed by radiotherapy for cancer of the tongue and floor of the mouth: evaluation of 78 patients. J Cranio-Maxillofacial Surgery. 1999;27(3):192-7..

De forma geral, o tratamento apresenta efeitos colaterais, imediatos ou tardios, que variam conforme a dose e intensidade da radiação aplicada, levando a alterações de pele e mucosa, atrofia de órgãos, acrescentando-se outras alterações morfológicas e funcionais como fibrose laríngea e imobilidade bilateral das pregas vocais. A quimioterapia, por sua vez, ocasiona alterações gastrintestinais, sensoriais e neurotoxicidade, dependendo do tempo de exposição e da concentração plasmática. Alterações vocais e disfagia podem ser sequelas dos tratamentos cirúrgicos e ou por irradiação55. Dedivitis RA, França CM, Mafra ACB, Guimarães FT, Guimarães AV. Características clínico- epidemiológicas no carcinoma espinocelular de boca e orofaringe. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 2004;70(1):35-40.

6. Prepageran N, Raman R. Delayed complication of radiotherapy: laryngeal fibrosis and bilateral vocal cord immobility. Med J Malaysia. 2005;60(3):377-8.

7. Calheiros AS, Albuquerque CS. A vivência da fonoaudiologia na equipe de cuidados paliativos de um hospital universitário do Rio de Janeiro. Rev HUPE. 2012;11(2):94-8.
-88. Oliveira Junior FJM, Cesse EAP. Morbimortalidade do câncer na cidade do Recife na década de 90. Rev Bras Cancerol. 2005;51(3):201-8..

Tratamentos combinados de radioterapia e quimioterapia, associados ou não à ressecção cirúrgica geram resultados positivos no tratamento da doença preservando estruturas da boca e laringe. Algumas modalidades de tratamento radioterápico, como a radioterapia modulada e a braquiterapia, conduzem a radiação de forma localizada, permitindo maior preservação das áreas expostas99. Eisbruch A, Kim HM, Feng FY, Lyden TH, Haxer MJ, Feng M et al. Chemo-IMRT of Oropharyngeal Cancer Aiming to Reduce Dysphagia: Swallowing Organs Late Complication Probabilities and Dosimetric Correlates. Int J Radiat Oncol Biol Phys. 2011;81(3):93-9.

Porém, nem sempre a preservação desses órgãos se torna um tratamento que resguarde realmente todas as funções. Em geral, são observadas alterações de ordem específicas na comunicação e deglutição22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.,1010. Campos RJDS; Leite ICG. Qualidade de vida e voz pós-radioterapia: repercussões para a fonoaudiologia. Rev CEFAC. 2010;12(4):671-7.. Mediante a escolha do tratamento e a assistência prestada, o acompanhamento fonoaudiológico contribui para ampliar as potencialidades comunicativas, respeitando as expectativas e os limites da doença77. Calheiros AS, Albuquerque CS. A vivência da fonoaudiologia na equipe de cuidados paliativos de um hospital universitário do Rio de Janeiro. Rev HUPE. 2012;11(2):94-8..

Diante do exposto, esse trabalho tem como objetivo identificar as alterações fonoaudiológicas e o acesso ao fonoaudiólogo durante o curso da doença, nos casos de óbito por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe, nos residentes de Olinda - PE, em 2012 e 2013.

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo, retrospectivo, com abordagem quantitativa, desenvolvido em Olinda, localizado na Região Metropolitana do Recife, no estado de Pernambuco.

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação de Ensino Superior de Olinda (FUNESO), sob o número de CAAE 21394913.9.0000.5194 e número de parecer 420.224/2013.

O Município é composto por 32 bairros e uma população de 397.268 habitantes1111. SEPLAMA: Secretaria de Planejamento Urbano, Transportes e Meio Ambiente de Olinda. Lei Nº 5161/99: Definições dos limites dos bairros de Olinda. Olinda: SEPLAMA; 1999.

12. IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia E Estatística [internet]. Estimativas populacionais para o TCU em 2012. [cited 2013 apr 20]; Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?ibge/cnv/poptpe.def.
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi....
-1313. Prefeitura Municipal de Olinda. Olinda em dados. [cited 2014 jan 04]; Available from: http://www.olinda.pe.gov.br/a-cidade/olinda-em-dados.
http://www.olinda.pe.gov.br/a-cidade/oli...
e participa do planejamento, organização e avaliação das ações de detecção precoce do câncer de boca por meio da política municipal de saúde bucal, possibilitando o acesso à rede de assistência ao câncer do âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, por meio de pactuação intermunicipal com Recife, capital pernambucana1313. Prefeitura Municipal de Olinda. Olinda em dados. [cited 2014 jan 04]; Available from: http://www.olinda.pe.gov.br/a-cidade/olinda-em-dados.
http://www.olinda.pe.gov.br/a-cidade/oli...

14. Silva KL, Sena RR, Leite JCA, Seixas CT, Gonçalves AM. Internação domiciliar no Sistema Único de Saúde. Rev. Saúde Pública. 2005;9(3):391-7.
-1515. Botti CS. Avaliação do processo de implementação do consórcio intermunicipal de saúde da região do Teles Pires no Estado de Mato Grosso-MT [dissertação]. Brasília: Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca; 2010..

A população estudada foi composta por todos os óbitos por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe, de residentes em Olinda, notificados ao Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), ocorridos nos anos de 2012 e 2013, com assistência integralmente realizada pelo Sistema Único de Saúde. Foram selecionados os anos 2012 e 2013 como período para o estudo por se tratarem dos dois últimos anos com dados encerrados pelo sistema de informação durante a coleta dos dados.

As informações foram obtidas em entrevistas realizadas com informantes-chave de cada caso, identificados por meio de busca ativa na residência, por meio dos registros de endereço das Declarações de Óbito do banco de dados do SIM, no qual todos os envolvidos na pesquisa concordaram em participar, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A escolha por trabalhar com os casos de óbito por esta causa se deu a partir de algumas questões: os casos estariam notificados no SIM com dados pessoais necessários à busca, e a possibilidade de tornar o grupo estudado homogêneo, tendo em vista que todos tiveram a mesma causa básica de óbito, codificadas de acordo com o Código Internacional de Doenças - CID de C00 a C101616. OMS: Organização Mundial da Saúde. CID-10 Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde. 10a rev. São Paulo: Universidade de São Paulo; 1997..

De posse dos endereços residenciais desses óbitos, foi traçado um roteiro de visitas domiciliares conforme distribuição e proximidade dos casos, utilizando o recurso do serviço Google Maps(r) versão 2014, respeitando suas políticas de utilização. Após a identificação do local da residência, buscou-se identificar se a área era coberta pela Estratégia Saúde da Família (ESF) ou Estratégia Agentes Comunitários de Saúde (EACS) e, nesses casos, acionou-se as equipes das ESF/EACS para colaborar com a identificação do indivíduo e de sua residência.

A visita aos endereços selecionados seguiu o seguinte processo: quando a residência se encontrava fechada, foi visitada por mais duas vezes, em dias e horários diferentes, a fim de ratificar a ausência de moradores no local. Essa confirmação se deu por meio da consulta aos vizinhos laterais e frontais.

Dos 38 óbitos por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe registrados no SIM, em 2012 e 2013, seis tinham endereço registrado na Declaração de Óbito (DO) inexistente ou não localizado no município; em três, o endereço não correspondia ao paciente; em oito casos, o local estava fechado ou a residência havia sido vendida e os vizinhos não tinham o contato dos familiares; houve uma recusa em responder o questionário; e dois casos os pacientes não tinham realizado o tratamento exclusivamente pelo SUS, portanto, não se enquadravam nos critérios de inclusão do estudo, restando 18 casos a serem estudados.

Os indivíduos que apresentassem outra co-morbidade, referida pelos informantes-chave na resposta à entrevista, que pudesse causar alterações na comunicação (distúrbios neurológicos, cognitivos ou sensoriais) seriam excluídos, porém nenhum caso se enquadrou nesse critério.

A coleta de dados ocorreu entre os meses de janeiro e julho de 2014, por meio de um instrumento de coleta de dados semi-estruturado, desenvolvido exclusivamente para este estudo. A equipe executora foi treinada para a aplicação do mesmo, em encontros com expertises no atendimento fonoaudiológico ao paciente com câncer de cavidade oral e faringe. Além disso, o instrumento foi aplicado na versão piloto em dois casos e foram realizados ajustes no mesmo de modo a garantir clareza nas perguntas. Para investigar as alterações ocorridas durante o curso da doença e a indicação de acompanhamento fonoaudiológico, foram utilizados os princípios do protocolo da Autópsia Verbal (AV), já validado e utilizado no Brasil e em diversos países1717. Ministério da Saúde do Brasil. Manual para investigação do óbito com causa mal definida. Normas e Manuais Técnicos. Brasília; 2008.. Esse protocolo foi implantado, no Brasil, pelo Ministério da Saúde, com o objetivo de resgatar informações, coletadas um ou mais informantes-chave, sobre os dados de saúde e a trajetória da doença, de modo a reconstruir a causa morte.

O entrevistado, denominado de informante-chave, segundo o método da AV, deve ter convivido com o falecido durante as circunstâncias ou a doença que levou a morte, preferencialmente, ter sido o cuidador da pessoa que faleceu, um membro do núcleo familiar, independente do grau de parentesco, a pessoa que assistiu ao óbito e/ou tenha residido no mesmo domicílio do falecido, e ser capaz de fornecer as informações solicitadas com clareza1717. Ministério da Saúde do Brasil. Manual para investigação do óbito com causa mal definida. Normas e Manuais Técnicos. Brasília; 2008..

Os resultados foram descritos por meio da análise da frequência absoluta e relativa. O processamento e a análise dos dados foram realizados por meio do EpiInfo, versão 3.04, e do Bioestat, versão 5.0. As diferenças percentuais foram testadas por meio do teste estatístico Qui- quadrado corrigido de Yates, com α=5%, ou nos casos em que a ocorrência foi inferior a cinco observações, usou-se o Teste Exato de Fisher, também com α=5%.

Resultados

Dos 18 casos de óbito por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe investigados, 55,6% dos informantes-chaves foram membros do núcleo familiar (cônjuges e/ou filhos/as) e em 72,2% as respostas foram fornecidas por um único informante-chave (p<0,001). Em 55,6% dos casos, a suspeita do câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe foi por meio da realização do autoexame (p<0,001), o diagnóstico ocorreu apenas por profissionais médicos, tendo igualmente a língua e orofaringe como sítio tumoral com proporção de 33,33%; em 83,3% houve a realização de algum tratamento específico (p<0,001) (Tabela 1).

Tabela 1:
Características gerais dos óbitos por câncer de boca estudados. Olinda/PE, 2012-2013

Dos indivíduos que tiveram alguma indicação de tratamento específico para o câncer, de forma isolada e/ou combinada, 72,2% realizaram quimioterapia (p<0,001), 66,6% radioterapia (p=0,012) e 27,8% foram submetidos a alguma intervenção cirúrgica (p<0,001). Todos os casos apresentaram alguma alteração nas funções estomatognáticas, sendo 88,9% na fala (p<0,001), 83,3% na mastigação e na deglutição (p<0,001), 77,8% na voz (p<0,001), 72,2% na sucção por meio de canudo (p<0,001), 27,8% na audição (p<0,001) e em 22,2% a cognição estava alterada (p<0,001). Em relação à realização de procedimentos complementares, observou-se que 72,2% realizaram sondagem gastrointestinal (p<0,001), 5,6% gastrostomia (p<0,001) e 22,2% foram submetidos ao procedimento de traqueostomia (p<0,001). Em cinco casos (27,80%) houve a indicação para fonoaudiologia, e todos que receberam indicação do tratamento fonoaudiológico, referiram acesso a este profissional (Tabela 2).

Tabela 2:
Alterações fonoaudiológicas e indicação ao tratamento fonoaudiólogo nos casos de óbito por câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe. Olinda/PE, 2012-2013

Discussão

Analisando os dados referentes ao fornecimento de informações, houve o predomínio de um único informante-chave e, em sua maioria cônjuges e filhos, fator que está relacionado à ocorrência deste tipo de câncer em indivíduos com idade superior a 40 anos, casados e com filhos1818. Melo MCB, Lorenzato FRB, Filho JEC, Melo ZM, Cardoso SO. A Família e o processo de adoecer de câncer bucal. Psicolo Estudo. 2005;10(3):413-9.

19. Souza RM, Sakae TM, Guedes AL. Características clínico-epidemiológicas de pacientes portadores de carcinomas da cavidade oral e orofaringe em clínica privada no sul do Brasil. Arq Catarin de Med. 2008;37(2):32-41.
-2020. Marques LA, Eluf-Neto J, Figueiredo RAO, Góis-Filho JF, Kowalski LP, Carvalho MB. Saúde bucal, Práticas de higiene bucal e Ocorrência de Câncer da Cavidade oral. Rev. Saúde Pública. 2008;42(3):471-9.. Pernambuco e Vilela2121. Pernambuco LA, Vilela MBR. Estudo da mortalidade por câncer de laringe no estado de Pernambuco - 2000-2004. Rev Bras Otorrinolaringol. 2009;75(2):222-7., em estudo sobre a mortalidade por neoplasia de laringe, apontam prevalência maior entre indivíduos casados, no entanto não foi encontrada referência que relacione a ocorrência do óbito com o estado civil do indivíduo, sendo esta informação mais relevante quando avaliados os aspectos de qualidade de vida.

Os resultados encontrados neste estudo descreveram que a ocorrência da suspeita do câncer em lábio, cavidade oral e orofaringe, se deu em sua maioria durante o autoexame da cavidade oral, ratificando a importância dessa prática e sugerindo a ampliação das ações preventivas de saúde bucal. Moraes destaca a importância de realização dos exames periódicos e de ações educativas direcionadas à população, para identificar possíveis lesões em estágios iniciais da doença, visto que o câncer nesta área geralmente é indolor e de difícil visualização2222. Moraes TMN. Câncer de Boca: Avaliação do conhecimento dos cirurgiões dentistas quanto aos fatores de risco e procedimentos de diagnósticos [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo. Faculdade de Odontologia; 2003.. Entretanto, grande parte da população só atenta para alguma anormalidade anatômica na boca quando a lesão está apresentando deformidades, comprometimento da função ou mau cheiro no local.

Neste sentido, o Instituto Nacional do Câncer afirma que não existem evidências científicas que comprovem que o autoexame seja efetivo como medida preventiva contra o câncer de boca, pois a população em geral tem dificuldade em diferenciar lesões potencialmente malignas de áreas anatômicas normais, porém o autoexame possibilita a visualização de lesões em estágios iniciais, reduzindo a chance de evolução e agravamento da doença22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014..

Para a população do estudo, a língua e a orofaringe aparecem como os principais sítios de localização do tumor. Essa situação pode se dar pelo fato de serem áreas mais expostas aos fatores de risco para o câncer de boca, como tabagismo, etilismo e infecções pelo Papiloma Vírus Humanos (HPV), favorecendo o desenvolvimento de lesões, em especial nesses sítios anatômicos22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.,2323. Cruz ACS, Franzolin SOB, Pereira AAC, Beijo LA, Hannerman JAC, Cruz JRS. Carcinoma de células escamosas da boca: Concordância diagnóstica em exames realizados no laboratório de anatomia patológica da Universidade Federal de Alfenas. Rev. Bras Cancerol. 2012;58(4):655-61..

Foi possível verificar que na maioria dos casos houve a realização de tratamento específico, de forma isolada ou associada a outro tratamento, e menos de um terço da população foi submetida a alguma intervenção cirúrgica, devido apresentarem lesões em estágio avançado. Os componentes terapêuticos que podem ser aplicados, isolados ou em associação, para o tratamento do câncer de boca são cirurgia, radioterapia e quimioterapia22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.,2424. Marchioni DML, Fisberg RM, Góis Filho JF, Kowalshill, LP, Carvalho MB, Abrahão M et al. Fatores dietéticos e câncer oral: estudo de caso-controle na Região metropolitana de São Paulo, Brasil. Rev Saúde Pública. 2007;23(3):553-64.,2525. Teixeira LC. Implicações subjetivas e sociais do câncer de boca: considerações psicanalíticas. Arq bras Psicol. 2009;61(2):1-12..

A indicação da terapêutica é feita de acordo com a localização, estadiamento clínico tumoral e condições clínicas do indivíduo, entretanto os métodos de tratamento para o câncer de cabeça e pescoço podem causar comprometimentos estéticos e funcionais significativos22. INCA: Instituto Nacional de Cancer. Estimativa 2014: Incidência de câncer no Brasil. Coordenação de prevenção e vigilância. Rio de Janeiro: INCA, 2014.,2525. Teixeira LC. Implicações subjetivas e sociais do câncer de boca: considerações psicanalíticas. Arq bras Psicol. 2009;61(2):1-12..

De forma geral, foram observados altos percentuais de alterações fonoaudiológicas nos casos investigados, com destaque para fala e mastigação. Sabe-se que os procedimentos adotados para o tratamento específico do câncer de boca podem causar efeitos indesejáveis e/ou irreversíveis ao sistema estomatognático, tais como xerostomia, fibrose dos tecidos irradiados, necrose de tecido ósseo ou cartilagíneo, perda de dentes, trismo, disfagia, disfonia, alteração na articulação da fala, ageusia ou hipogeusia e cáries, comprometendo as funções de fonoarticulação e dificuldades de deglutição de saliva e alimentos1919. Souza RM, Sakae TM, Guedes AL. Características clínico-epidemiológicas de pacientes portadores de carcinomas da cavidade oral e orofaringe em clínica privada no sul do Brasil. Arq Catarin de Med. 2008;37(2):32-41.,2121. Pernambuco LA, Vilela MBR. Estudo da mortalidade por câncer de laringe no estado de Pernambuco - 2000-2004. Rev Bras Otorrinolaringol. 2009;75(2):222-7.,2626. Mendes AMS. Câncer de Boca: um campo a ser explorado pela fonoaudiologia. [monografia]. Rio de Janeiro: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica - CEFAC; 2000..

Estudos afirmam que a ressecção total ou parcial de estruturas fonoarticulatórias é responsável por modificações na articulação dos sons e voz que afetam significativamente a inteligibilidade de fala desses sujeitos. A voz assume característica pastosa, monótona e hipernasal, além do comprometimento de diversos sons da fala, causados por imprecisão articulatória, que acrescida de trismo acentuado, prejudicam a fala2424. Marchioni DML, Fisberg RM, Góis Filho JF, Kowalshill, LP, Carvalho MB, Abrahão M et al. Fatores dietéticos e câncer oral: estudo de caso-controle na Região metropolitana de São Paulo, Brasil. Rev Saúde Pública. 2007;23(3):553-64.,2626. Mendes AMS. Câncer de Boca: um campo a ser explorado pela fonoaudiologia. [monografia]. Rio de Janeiro: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica - CEFAC; 2000..

Os tumores que surgem na cavidade oral apresentam obstáculos anatômicos, como ossos e nervos periféricos, que dificultam a realização da cirurgia, levando a escolha da radioterapia como conduta terapêutica. Contudo, grandes doses de irradiação são necessárias na tentativa de erradicação do tumor. Dentre as reações pós-radioterapia registram-se a osteorradionecrose da mandíbula e dentes, otite média ou externa, trismo, fibrose, disfunção endócrina, edema de laringe e até imobilidade de prega vocal, diminuição do reflexo da deglutição e do peristaltismo faríngeo, que podem permanecer por até dois anos. Já o tratamento quimioterápico, indicado antes ou após uma ressecção de tumor, e isolado/combinado à radioterapia, pode acarretar em dificuldades de sucção e deglutição dos alimentos, cujo grau de dificuldade será determinado pelo tipo de tratamento realizado e dosagem aplicada, pela natureza e extensão da ressecção necessária77. Calheiros AS, Albuquerque CS. A vivência da fonoaudiologia na equipe de cuidados paliativos de um hospital universitário do Rio de Janeiro. Rev HUPE. 2012;11(2):94-8.,2626. Mendes AMS. Câncer de Boca: um campo a ser explorado pela fonoaudiologia. [monografia]. Rio de Janeiro: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica - CEFAC; 2000.,2727. Andreotti M, Rodrigues AN, Cardoso LM, Figueiredo RAO, Eluf-Neto J, Wunsch-Filho V. Ocupação e câncer da cavidade oral e orofaringe. Cad. Saúde Pública. 2006;22(3):543-52..

Para que ocorra uma diminuição considerável de massa tumoral, o paciente necessita de várias doses de quimioterápicos por um tempo prolongado, fazendo com que a concentração sanguínea das drogas se elevem, destruindo as células neoplásicas, e concomitantemente as saudáveis, levando a efeitos colaterais e alterações indesejáveis nas estruturas responsáveis pela comunicação. Mendes2323. Cruz ACS, Franzolin SOB, Pereira AAC, Beijo LA, Hannerman JAC, Cruz JRS. Carcinoma de células escamosas da boca: Concordância diagnóstica em exames realizados no laboratório de anatomia patológica da Universidade Federal de Alfenas. Rev. Bras Cancerol. 2012;58(4):655-61. caracteriza diversos métodos que podem ser utilizados na reabilitação das funções orais que foram prejudicadas, são elas a fonoterapia, a realização de cirurgias reconstrutoras ou o uso de próteses orais.

Em relação à realização de procedimentos complementares, muitos necessitaram de sondagem gastrointestinal, e uma proporção razoável, de traqueostomia. Pessoas em estágio avançado da doença ou fora das possibilidades terapêuticas, tendem a perder a função de algumas estruturas anatômicas, seja pelo tamanho e localização do tumor, como também pelo tipo de tratamento específico a que foi submetido2626. Mendes AMS. Câncer de Boca: um campo a ser explorado pela fonoaudiologia. [monografia]. Rio de Janeiro: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica - CEFAC; 2000..

Funções como alimentação e comunicação se encontram prejudicadas, agravando ainda mais o quadro do paciente. Alterações na deglutição, mastigação e sucção são registrados comumente na literatura2828. Miranda GMD, Mendes ACG, Silva ALA, Rodrigues M. Assistência fonoaudiológica no SUS: a ampliação do acesso e o desafio de superação das desigualdades. Rev CEFAC [Internet]. 2015 Feb [cited 2015 jul 08] ; 17(1):71-9. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201515213.
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e foram ratificados aqui no estudo, havendo a necessidade de realização de procedimentos complementares que reestabeleçam essas atividades, porém a utilização de alguns dispositivos acaba levando a implicações na comunicação. Calheiros e Albuquerque destacam a importância de observar quais estruturas o tumor já acometeu, assim como, a presença de dispositivos como sonda para alimentação ou traqueóstomo, verificando o grau de comprometimento das funções de alimentação e comunicação77. Calheiros AS, Albuquerque CS. A vivência da fonoaudiologia na equipe de cuidados paliativos de um hospital universitário do Rio de Janeiro. Rev HUPE. 2012;11(2):94-8..

Após o diagnóstico e início do tratamento para o câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe, cerca de um terço receberam indicação para acompanhamento em Fonoaudiologia e, para todos os casos em que foi indicado, houve o relato de acesso a este profissional. Como dito acima, os métodos utilizados para tratamento do tumor e o tipo de reconstrução utilizada, podem provocar prejuízo osteomuscular, cartilagíneos e glandulares nas áreas de incidência do tratamento, repercutindo em alterações nas funções estomatognáticas e na face, de modo que esses indivíduos, em sua maioria, necessitariam de acompanhamento fonoaudiológico.

Devido às alterações fonoaudiológicas nesses casos, o fonoaudiólogo tem um papel importante na orientação e condução dos casos. Cabe a ele contribuir de modo a maximizar a deglutição, adaptá-la e/ou preservar com segurança o prazer da alimentação por via oral, bem como colaborar com o paciente para o restabelecimento ou adaptação da comunicação, orientado quanto ao processo de reabilitação de fala e/ou deglutição, que se dará pela utilização de estruturas remanescentes e funções compensatórias, visando a uma maior integração familiar e social.

As estratégias para desenvolver a comunicação, seja por meio da (re)adaptação da linguagem oral como também no estabelecimento de uma comunicação efetiva não-verbal, garante uma melhor qualidade de vida e melhora na inter-relação deste com seus familiares e equipe77. Calheiros AS, Albuquerque CS. A vivência da fonoaudiologia na equipe de cuidados paliativos de um hospital universitário do Rio de Janeiro. Rev HUPE. 2012;11(2):94-8.,2626. Mendes AMS. Câncer de Boca: um campo a ser explorado pela fonoaudiologia. [monografia]. Rio de Janeiro: Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica - CEFAC; 2000.,2727. Andreotti M, Rodrigues AN, Cardoso LM, Figueiredo RAO, Eluf-Neto J, Wunsch-Filho V. Ocupação e câncer da cavidade oral e orofaringe. Cad. Saúde Pública. 2006;22(3):543-52..

No entanto, observa-se que a indicação fonoaudiológica foi restrita a menos de um terço da população estudada. Essa ocorrência pode estar relacionada à doença avançada, com alguns indivíduos submetidos a cuidados paliativos, e com isso, algumas propostas terapêuticas se tornam inviáveis. As complicações provenientes do tratamento específico, principalmente as da quimioterapia, como a imunossupressão, indisposição e efeitos colaterais como náuseas e vômito, desestimulam o paciente a buscar acompanhamento de outros profissionais envolvidos de forma indireta no tratamento da doença.

Mas destaca-se também que essa baixa indicação pode manter relação com o desconhecimento acerca da atuação profissional fonoaudiólogo acerca dos cuidados nos casos de câncer de lábio, cavidade oral e orofaringe, ou ainda a pouca oferta deste profissional da rede SUS.

Adicionalmente, Oliveira e colaboradores2929. Oliveira EXG, Melo ECP, Pinheiro RS, Noronha CP, Carvalho MS. Acesso à assistência oncológica: O caso do câncer de mama. Cad. Saúde Pública. [Internet]. 2011 Feb [cited 2015 jul 08] ; 27(2):317-26. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200013.
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afirmam que a utilização dos serviços de saúde está ligada a características da oferta e à conduta das pessoas frente à morbidade e aos serviços. O padrão de procura pode variar segundo sexo, idade, grupos sociais, e sua utilização poderá depender dos problemas de saúde e gravidade da doença, procedimentos específicos e áreas geográficas em que o paciente ou o serviço se encontram2929. Oliveira EXG, Melo ECP, Pinheiro RS, Noronha CP, Carvalho MS. Acesso à assistência oncológica: O caso do câncer de mama. Cad. Saúde Pública. [Internet]. 2011 Feb [cited 2015 jul 08] ; 27(2):317-26. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200013.
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,3030. Santos FD, Montovani J, Soares CT, Carvalho LR. Expressão da P53 no tumor e no epitélio oral em pacientes com câncer de boca e faringe. Arquivos Int Otorrinolaringol [Internet]. 2011 Mar [cited 2015 Nov 09]; 15 (01): [about 6 p.]. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1809-48722011000100006&script=sci_arttext
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Desta forma, o acesso ao serviço de fonoaudiologia também é um outro complicador para o ingresso e manutenção da terapia, pois a maioria dos usuários é SUS-dependente e com isso a demanda alta de pacientes, atrelada a baixa oferta de profissionais2828. Miranda GMD, Mendes ACG, Silva ALA, Rodrigues M. Assistência fonoaudiológica no SUS: a ampliação do acesso e o desafio de superação das desigualdades. Rev CEFAC [Internet]. 2015 Feb [cited 2015 jul 08] ; 17(1):71-9. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201515213.
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,2929. Oliveira EXG, Melo ECP, Pinheiro RS, Noronha CP, Carvalho MS. Acesso à assistência oncológica: O caso do câncer de mama. Cad. Saúde Pública. [Internet]. 2011 Feb [cited 2015 jul 08] ; 27(2):317-26. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2011000200013.
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, leva à prolongar o tempo de espera para começar o acompanhamento fonoaudiológico. Essa situação pode ser agravada quando o serviço oferecido se encontra em um local distante da residência do paciente, más condições para o deslocamento e a centralização da assistência oferecida. O acompanhamento fonoaudiológico favorece o enfrentamento da doença, no que se refere ao processo de comunicação e alimentação, assim como, auxilia na readaptação das suas novas condições provenientes do pós-terapia. Assim, estimula-se a discussão sobre linha de cuidado da pessoa com câncer entre os profissionais envolvidos na atenção à saúde desse público, de modo a proporcionar o acompanhamento adequado na sua readaptação funcional, impactando na qualidade de vida do indivíduo e da sua família, e em importantes funções sociais.

Adicionalmente, registra-se aqui a potencialidade do uso dos princípios da AV nas pesquisas em saúde. Na busca realizada, não foram encontradas evidências científicas com o uso desta estratégia na Fonoaudiologia. A partir dos dados disponíveis nos sistemas de informações em saúde, é possível ter acesso a informações pessoais tais como nome e endereço, e reconstruir as trajetórias de saúde-doença das pessoas, a partir de estudos retrospectivos utilizando tais princípios. Deste modo, constitui-se numa potencial estratégia a ser utilizada nas pesquisas em Fonoaudiologia.

Por fim, reconhecem-se alguns elementos que podem constituir limitação metodológica do estudo, tais como a imprecisão dos endereços registrados no SIM, dificultando a localização das residências e provocando redução no tamanho da população de estudo, e a possibilidade de existência de viés temporal de memória dos informantes-chave, tendo em vista se tratar de um estudo retrospectivo, cujo óbito ocorreu nos anos de 2012 ou 2013 e a coleta dos dados em 2014. No entanto, para este foram adotadas estratégias de contextualização da época do adoecimento e morte dos indivíduos, de modo a minimizar os efeitos da questão temporal, proporcionando maior segurança na coleta dos dados, bem como utilizou-se os anos com dados mais atuais no Sistema de Informação sobre Mortalidade.

Conclusão

Os resultados deste trabalho permitem concluir que a língua e a orofaringe foram os principais sítios tumorais primários encontrados entre os sujeitos que foram a óbito por esse tipo de câncer, e que as funções fonoaudiológicas apresentam alterações em proporções elevadas.

A despeito disso, poucas pessoas receberam indicação para o acompanhamento fonoaudiológico no curso da doença, sugerindo possíveis entraves na continuidade do cuidado à pessoa com câncer de lábio, cavidade oral e orofoaringe. No entanto, todos que foram indicados referiram acesso ao profissional.

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  • Fonte de auxílio: Secretaria de Saúde de Olinda - PE

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    19 Out 2015
  • Aceito
    09 Abr 2016
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