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Comunicação suplementar alternativa: da formação a atuação clínica fonoaudiológica

RESUMO

Objetivo:

investigar a formação do fonoaudiólogo e sua atuação clínica com a Comunicação Suplementar e Alternativa.

Métodos:

estudo descritivo, de caráter transversal, individual e contemporâneo. Os dados foram coletados por meio de questionário, preenchido por vinte e quatro fonoaudiólogas, selecionadas por amostra de conveniência. Elegeu-se a análise de conteúdo para estudo dos dados.

Resultados:

quanto ao acesso aos meios de informação todas as fonoaudiólogas da amostra apresentaram a iniciativa de suprir a ausência da formação em linguagem com Comunicação Suplementar e Alternativa por diferentes meios. Em relação ao foco duplo na intervenção todos os fonoaudiólogos foram favoráveis a essa prática, entretanto relataram, conforme a experiência, resistência da família, da escola e de outros terapeutas. Os resultados mostraram dois tipos diferentes de implementação da introdução e uso da Comunicação Suplementar e Alternativa, sendo predominantemente por estratégias que contemplem o uso pragmático da linguagem por meio de contextualização de atividades significativas para o usuário. A outra forma foi o uso do Picture Exchange Communication System.

Conclusão:

os fonoaudiólogos investigados na presente pesquisa inseriram diferentes interlocutores na intervenção e guiaram-se em princípios linguísticos implícitos ou explícitos, em referenciais teóricos específicos à área do conhecimento Comunicação Suplementar e Alternativa, em elementos neuromotores globais e, por fim, em princípios de funcionalidade e bem-estar geral.

Descritores:
Fonoaudiologia; Comunicação; Linguagem; Linguagem Infantil; Paralisia Cerebral

ABSTRACT

Purpose:

to investigate the qualification of the speech language and hearing therapists and their clinical performance with Augmentative and Alternative Communication.

Methods:

a descriptive, transversal, individual and contemporary study. Data were collected through a questionnaire, filled by twenty-four speech therapists, selected by a convenience sample. Content analysis was chosen for data study.

Results:

regarding access to the information media, all speech therapists in the sample presented the initiative to supply the absence of language training with Augmentative and Alternative Communication by different means. Regarding the dual focus on intervention, all speech therapists were favorable to this practice. However, according to experience, they reported resistance from the family, school and other therapists. The results showed two different types of introduction implementation and use of Augmentative and Alternative Communication, predominantly formed by strategies contemplating the pragmatic use of language through the contextualization of significant activities for the user. The other way used the Picture Exchange Communication System.

Conclusion:

the speech-language and hearing therapists in the present study inserted different interlocutors in the intervention, guided by implicit or explicit linguistic principles, by theoretical frameworks specific to the area of Augmentative and Alternative Communication knowledge, by global neuromotor elements and, finally, by principles of functionality and general wellness.

Keywords:
Speech Language and Hearing Science; Communication; Children's Language; Language; Cerebral Palsy

Introdução

A American Speech and Hearing Association (ASHA)11. American Speech and Hearing Association - ASHA: [acessoem 2016 Ago 16]. Disponível em: http://www.asha.org.
http://www.asha.org...
refere que as Comunicação Suplementar e Alternativa (CSA) abrange todas as formas de comunicação alternativas à fala, sendo usada para expressar pensamentos, necessidades, pedidos e ideias de pessoas com complexas necessidades comunicativas.

No Brasil a área da CSA apresentou crescimento, mas ainda necessita ampliar o seu número de pesquisadores. As áreas do conhecimento relacionadas com o atendimento ao usuário na implementação de recursos de CSA foram: fonoaudiologia, psicologia, pedagogia e terapia ocupacional; já as áreas de informática e engenharia elétrica poderão influenciar ou impactar na criação de recursos eletrônicos22. Manzini EJ. Formação de pesquisadores para a área de Comunicação Alternativa. In: Nunes LROP, Pelosi MB, Walter CCF. (orgs.) Compartilhando experiências: ampliando a comunicação alternativa. Marília: ABPEE; 2011. p. 139-60.. Em outro estudo33. Cesa CC, Mota HB. Augmentative and alternative communication: scene of Brazilian journal. Rev. Cefac. 2015;17(1):264-9. foram identificados dois trabalhos da área da fisioterapia com CSA e onze na fonoaudiologia.

Sobre esse aspecto, percebe-se que um grande número de estudos de CSA tem foco nas questões tecnológicas do recurso, acessibilidade e portabilidade. Não se discute a importância, mas sinaliza-se que o foco principal é a pessoa com complexa necessidade comunicativa que almeja expressar seus desejos e ideias, desenvolver relacionamentos e ampliar sua participação social44. Light J, McNaughton D. Putting people first: Re-thinking the role of technology in Augmentative and Alternative Communication intervention. Augment Altern Commun. 2013;29(4):299-309.,55. Light J, McNaughton D. Communicative Competence for Individuals who require Augmentative and Alternative Communication: A New Definition for a New Era of Communication? Augment Altern Commun. 2014;30(1):1-18..

O fonoaudiólogo, profissional que atua na área da comunicação66. Brasil. Presidência da República. Lei n° 6965 de 9 de dezembro de 1981. Dispõe sobre a regulamentação da Profissão de Fonoaudiólogo, e determina outras providências., tem condições de colaborar ainda mais na equipe interdisciplinar, considerando sua expertise a cerca dos aspectos linguísticos implicados no processo de implementação de um sistema de CSA.

O Comitê de Comunicação Suplementar e Alternativa do Departamento de Linguagem da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia (SBFa)77. Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia - SBFa. [acesso em 2016 Ago 07]. Disponível em: URL: http://www.sbfa.org.br/portal/pg.php?id=comite&ttpg=COMIT%CA%20DE%20COMUNICA%C7%C3O%20SUPLEMENTAR%20E%20ALTERNATIVA&tpc=cinza
http://www.sbfa.org.br/portal/pg.php?id=...
visa organizar ações que ampliem a inserção da atuação do fonoaudiólogo na área, com discussões cientí ficas a respeito dos referenciais teóricos e práticos. A atuação fonoaudiológica nas práticas com CSA precisa ser ainda mais investigada e difundida, através de estudos baseados em evidências clínicas e científicas. A própria diversidade de nôminas no Brasil (CSA, Comunicação Alternativa, Comunicação Ampliada, Comunicação Alternativa e Ampliada, Comunicação Aumentativa e Alternativa, Comunicação Alternativa e Facilitadora, dentre outras) para uma mesma área do conhecimento sinaliza o processo de expansão, entretanto carente ainda de uma terminologia brasileira unificada.

Nesse sentido, o presente estudo tem o objetivo de investigar o perfil de atuação e a formação do fonoaudiólogo que atua com a CSA no Brasil.

Métodos

Delineamento do estudo

Trata-se de um estudo descritivo, de caráter transversal, individual e contemporâneo.

Considerações Éticas

Esse estudo atende as normas do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), dâ Universidade Federal de Santa Maria, conforme parecer número 909.685, Certificado de Apresentação para Apresentação Ética (CAAE) número 38137814.3.0000.5346 e está de acordo com as normas do Ministério da Saúde conforme a Resolução 196/96 e 466/12.

Participantes

Vinte e quatro fonoaudiólogas que atuam em diferentes estados do Brasil compuseram a amostra por conveniência. Treze fonoaudiólogas graduaram-se no Rio Grande do Sul, oito em São Paulo, uma em Minas Gerais, uma em Santa Catarina e uma no Rio de Janeiro. A Tabela 1 apresenta as variáveis sociodemográficas do perfil da amostra de fonoaudiólogos.

Tabela 1:
Perfil da amostra de fonoaudiólogas

Instrumento de Coleta

O instrumento de coleta foi desenvolvido para essa pesquisa. Trata-se de um questionário com 20 questões (APÊNDICE 1) com perguntas abertas e fechadas sobre formação e experiência em CSA. Destaca-se que foi realizado de um estudo-piloto inicial, em que o mesmo questionário foi aplicado com duas fonoaudiólogas escolhidas aleatoriamente para verificar a adequação do mesmo, sendo constatado que o instrumento atendia o objetivo da pesquisa.

Seleção da Amostra e Procedimento de Coleta de Dados

O convite para participar da pesquisa foi realizado via e-mail a 42 fonoaudiólogas de diferentes estados brasileiros, selecionadas por amostra de conveniência. Todas as fonoaudiólogas foram devidamente esclarecidas sobre os propósitos da pesquisa. O contato telefônico quando necessário também foi realizado.

Esta amostra de conveniência foi gerada, por três diferentes meios, a saber: (a) via rede de contatos profissionais da primeira autora que atua na área clínica da fonoaudiologia neurofuncional com uso da CSA há 18 anos; (b) via contatos profissionais advindos desta primeira rede de contatos inicial e (c) de contatos profissionais compartilhados espontaneamente por membro integrante da banca examinadora na qualificação da tese (o presente artigo compõe um dos estudos da tese final).

O termo de consen timento livre e esclarecido (TCLE) e um questionário desenvolvido especialmente para este estudo (APÊNDICE 1) foi entregue pessoalmente e/ou enviado via email às fonoaudiólogas que manifestaram interesse com colaborar. A escolha da forma de entrega dos dois documentos foi acordada com cada participante. Após este primeiro momento, ambos os documentos foram recebidos assinados, preenchidos, e devolvidos à primeira pesquisadora por duas modalidades distintas: pessoalmente ou recebimento via email com ambos os documentos digitalizados.

Foram incluídas na pesquisa profissionais com experiência clínica em CSA, que aceitaram participar por meio da assinatura do TCLE e que enviaram o questionário no prazo estipulado pela pesquisadora e foram excluídas as fonoaudiólogas que não enviaram o questionário ou que não aceitaram participar da mesma.

O período de obtenção da coleta de dados foi de 07 de janeiro de 2015 a 19 de agosto de 2015.

Procedimento da Análise de Conteúdo

Os dados foram estudados pelo método de análise de conteúdo baseando-se em Minayo (2010)88. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 13a.ed. São Paulo: Hucitec; 2010.. As quatro categorias de análise foram extraídas a partir da leitura das respostas dos questionários, a saber: (a) meios de acesso à informação sobre a CSA; (b) foco duplo na intervenção (usuário e demais interlocutores); (c) resistência à adesão dos interlocutores na introdução e uso da CSA e (d) estratégias terapêuticas.

As categorias foram avaliadas por duas juízas fonoaudiólogas. Segundo Fagundes (2015)99. Fagundes AJFM. Descrição, definição e registro de comportamento. 17a ed. São Paulo: EDICON; 2015., o parâmetro comparativo aceitável relativo às ocorrências de concordâncias deveria ser igual ou superior a 70%. O índice de concordância nesse estudo variou de 75% a 100%.

Resultados

Vinte e quatro fonoaudiólogas, brasileiras, do sexo feminino, aceitaram participar do estudo. Dessas, 23 profissionais afirmaram já terem atendido crianças com encefalopatia crônica não evolutiva (ECNE) com CSA. Uma fonoaudióloga (F16) atendeu somente adultos com lesão encefálica com CSA.

A idade média das fonoaudiólogas foi de 38 anos de idade, com tempo médio de formação de 15 anos e média de 12 anos de experiência com CSA. Nove fonoaudiólogas estudaram em instituições de ensino superior públicas, abrangendo os estados do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e São Paulo e 15 em instituições particulares, abrangendo os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e São Paulo.

No momento da coleta, as entrevistadas trabalhavam em diferentes campos de atuação fonoaudiológica, como atendimento clínico, ensino, pesquisa, como membro da secretaria de saúde e como membro da secretaria de educação do Município ou do Estado.

Os resultados serão dispostos conforme as quatro categorias extraídas durante a análise de conteúdo.

Meios de acesso à informação sobre a CSA

As fonoaudiólogas F5, F6 e F11 receberam supervisões em ambiente de estágio extracurricular do período da graduação. F5 acrescenta que também aprendeu observando fonoaudiólogas atendendo durante o estágio extracurricular em uma instituição filantrópica.

Duas fonoaudiólogas (F9 e F19) não realizaram cursos, supervisão (assessoria), pesquisa ou outro meio de acesso à informação sobre a temática.

As fonoaudiólogas F5, F20 e F23 responderam explicitamente que aprenderam também com a própria experiência clínica.

Os dados colhidos, a respeito dessa categoria de análise, indicam que a busca por meios de acesso a informação sobre como intervir com CSA partiu, sobretudo da iniciativa própria. A Figura 1 apresenta os meios de acesso à informação da CSA:

Figura 1:
Meios de acesso à informação da Comunicação Suplementar Alternativa pelas fonoaudiólogas

Foco duplo na intervenção (usuário e demais interlocutores)

Vinte e duas fonoaudiólogas afirmam atuar com foco duplo na intervenção com CSA, inserindo além da família e da escola, outros interlocutores significativos para a criança como outros responsáveis pela mesma, tais como cuidadores, amigos e outros terapeutas.

A F18 atua em um abrigo que acolhe crianças com graves comprometimentos neurológicos em que o Estado é o tutor dessas, não tendo a família presente. Já F20 não mencionou nada sobre esse aspecto.

Por meio do questionário respondido pelas fonoaudiólogas, os seguintes exemplos representativos a respeito dos aspectos da categoria foco duplo na intervenção foram selecionados:

F5: “Família e sociedade se adaptarem ao novo, a uma forma “diferente” de se comunicar (...). Persistência e diálogo é o que geralmente fazem a diferença no processo”.

F6: “A aceitação e sistematização do uso pela família. Acredito que conversas contínuas e exemplos práticos e engajamento nos objetivos há maior adesão”.

F16: “Sinceramente participa quem tem o interesse. O paciente, o terapeuta e a terceira pessoa varia. Prefiro que seja alguém com bastante contato com o paciente (familiar, amigo e/ou cuidador). Nem sempre esta pessoa está disposta ou motivada, e neste caso procuro um sujeito bem motivado (mesmo que não tenha tanto contato) que me ajude a contagiar as pessoas mais próximas do paciente. Também exploro outros profissionais que atendam o paciente ou o professor.

Os dados indicam que a estratégia terapêutica das fonoaudiólogas de incluir as famílias e demais interlocutores no processo terapêutico têm em vista a generalização do uso da CSA para ambientes naturalísticos e não somente durante a sessão fonoaudiológica.

Resistência à adesão dos interlocutores na introdução e uso da CSA

Vinte e uma fonoaudiólogas relataram que em suas experiências há resistência das famílias na introdução e uso da CSA. Registra-se que muitas profissionais afirmaram também que há resistência de educadores em usar o recurso comunicativo no ambiente escolar.

Como já discorrido na categoria anterior, F18 atua em um abrigo não tendo a família das crianças presentes. F20 e F21 não mencionaram nada a respeito desse aspecto.

A seguir serão apresentados alguns exemplos representativos extraídos das entrevistas sobre a categoria resistência à adesão familiar:

F2: “(...) favorecer e manter a adesão e motivar o uso, além de desmistificar que inibe a fala”.

F3: “Depende da motivação, preparo educacional e consciência do professor”.

F4: “A maior dificuldade são as outras pessoas, e não a própria criança”.

F10: “Acredito que sejam família e profissionais envolvidos que não conhecem a Comunicação Aumentativa e Alternativa e os benefícios dela e apresentam certo preconceito com o uso desse sistema. Também percebo que algumas escolas (direção e professores) são resistentes em aplicar a Comunicação Aumentativa e Alternativa no contexto e/ou rotina da escola”.

F13: “O engajamento, de fato, da família para que a criança seja o sujeito de sua comunicação também no ambiente familiar”.

Estratégias Terapêuticas

Os resultados dessa categoria foram agrupados em subcategorias, também criadas a partir dos dados analisados nas entrevistas. Foi elaborado um quadro único que apresenta também os princípios utilizados para guiar a atuação clínica.

Figura 2:
Princípios que guiam o atendimento com Comunicação Suplementar Alternativa e estratégias terapêuticas

Uma fonoaudióloga (F19) não respondeu a questão específica relacionada às estratégias terapêuticas e três fonoaudiólogas (F3, F9 e F18) não responderam a pergunta sobre os princípios terapêuticos.

Abaixo há alguns dos exemplos significativos selecionados das categorias de estratégias terapêuticas:

F1: “(...) que a criança perceba o efeito que o recurso da Comunicação Aumentativa e Alternativa proporciona e o prazer da comunicação”.

F2: “Atividades contextualizadas de interesse do usuário e de seu ambiente, envolvendo a família. Jogos, fotos e história de vida pessoal e familiar, jornal, livros de histórias, revistas, brincadeiras, jogos dramáticos, música, canto, rodas de conversa e de debate, etc.”.

F5: “Costumo respeitar suas escolhas para que perceba que pode ser entendido, então se na comunicação alternativa mostra que esta querendo beber água, procuro logo dar um copo de água, assim trabalho a ação e reação”.

F11: “(...) valorizando atividades de vida diária e todos os episódios de interação social para introduzir estratégias de Comunicação Aumentativa e Alternativa.. Além de realizarem as estratégias supracitadas, os familiares são orientados a manter uma rotina diária de pelo menos 45 minutos de estimulação de atividades trabalhadas em fonoterapia”.

F14: “Saber escutar o paciente e sua família, observar como a comunicação se estabelece entre o paciente e seu meio familiar e social, e intervir para facilitar (...)”.

F16: “Eu tento simular situações reais de comunicação. Na verdade busco as situações mais cotidianas”.

F20: “O importante é mostrar que todos podem expressar de forma melhor seus desejos e necessidades”.

F23: “As estratégias são desenvolvidas a partir do vocabulário básico do cliente nas diferentes situações de sua rotina, ampliando o uso em temas de interesse, assim como o envolvimento nas produções de narrativa e demais tipos de textos. As estratégias são fundamentais para a funcionalidade do sistema gráfico e dos recursos que devem ser utilizados. As estratégias devem prever mudança de ambiente, mudanças de tarefas e mudanças de interlocutores conhecidos e desconhecidos”.

Em relação aos princípios que guiam a terapêutica, verificou-se quatro diferentes princípios, não necessariamente excludentes entre si:

1° Princípios teóricos de aquisição de linguagem, de sujeito e de aprendizagem

Houve a adoção explícita a diferentes linhas teóricas de aquisição de linguagem (interacionista e discursiva), de como se dá o processo de aprendizagem ativa (construtivismo) e de sujeito (psicanálise).

2° Princípios teóricos específicos à área do conhecimento CSA

Autores nacionais e internacionais foram mencionados como referências, a saber: Deliberato, Manzini e Deliberato, Paura e Light e McNaughton.

O método Picture Exchange Communication System (PECS): Sistema de Comunicação pela Troca de Figuras também foi citado.

3° Princípios linguísticos explicitados

Foram mencionados a relevância de se atentar à pragmática, à intenção comunicativa, aos tipos de indagação que facilitam a comunicação, aos processos dialógicos, às habilidades de compreensão verbalà necessidade de desenvolver a competência linguística para ampliar a habilidade comunicativa, aos meios expressivos e ao sistema multimodal de comunicação.

4° Princípios Neuromotores globais

Aspectos motores globais, acuidade e percepção visual e auditiva, coordenação visomotora também foram considerados.

5° Princípios de Funcionalidade

Foi mencionado o uso da Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) para avaliar a comunicação em consonância com as políticas mundiais de saúde, qualificando medidas de capacidade, fatores ambientais e pessoais para o processo de saúde geral.

Uma fonoaudióloga (F20) refere que sua primeira diretriz estámais voltada às questões socioantropológicas, como elucida o exemplo: “primeiro o princípio que todos têm o direito de comunicar”.

Discussão

Os diferentes meios de acesso à informação da CSA pelas fonoaudiólogas da amostra dessa pesquisa evidenciam a necessidade da inclusão da temática na formação da graduação. Os achados corroboram a afirmativa de estudo1010. Cesa CC, Kessler TM. Comunicação alternativa: teoria e prática clínica. Distúrb. Comun. 2014;26(3):493-502. que recomenda incluir nas grades curricula res a disciplina especializada em CSA com práticas laboratoriais ou, no mínimo, contemplá-la em algum plano de ensino da área da linguagem.

Exemplo dessa lacuna teórica é observada no Figura 2, o qual apresenta os princípios que guiam as estratégias terapêuticas das fonoaudiólogas. Alguns dos princípios não se enquadram metodologicamente com a estratégia exemplificada, conforme as amostras F7 e F22, considerando o método PECS1111. Oliveira GC, Rosa VSV, Carvalho W, Freitas EF. Considerações da aplicação do método PECS em indivíduos com TEA. EVS. 2015;42(3):303-14.)-(1313. Bondy A. PECS: Potential benefits and risks. Behav Anal Today. 2001;2:127-32. informado no questionário.

O aparecimento de recursos como estratégias terapêuticas mostram que a definição do que são estratégias focadas no usuário não estão suficientemente claras, pois o domínio operacional é o que abrange esse aspecto. Já as respostas que mencionam a personalização de acordo com o usuário, é muito abrangente para poder compreender na prática quais são as reais estratégias de implementação da CSA.

Na presente pesquisa, as estratégias terapêuticas evidenciam diferentes abordagens na introdução e uso da CSA. Há o predomínio da estratégia que contempla o uso pragmático da linguagem por meio de contextualização de atividades significativas para o usuário. O aporte em conceitos cognitivistas também foi mencionado como fundamentação teórica. Por fim, a outra forma de abordagem foi o uso de um programa de comunicação denominado no Brasil de Sistema de Comunicação pela Troca de Figuras (Picture Exchange Communication System, idealizado por Bondy e Frost em 1994)1212. Bondy AS, Frost LA. The Picture Exchange Communication System. Focus Autism. Other. Dev. Disabl. 1994 [artigo na internet] 9(3):1-19 [acesso em 2016 Ago 07]. Disponível em: URL: http://pecs-canada.com/Brochures/pecsfocuspdf.pdf
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,1313. Bondy A. PECS: Potential benefits and risks. Behav Anal Today. 2001;2:127-32., o qual tem sua aplicação fundamentada na Análise do Comportamento Aplicada (ABA). Em um estudo1010. Cesa CC, Kessler TM. Comunicação alternativa: teoria e prática clínica. Distúrb. Comun. 2014;26(3):493-502., com fonoaudiólogas, sobre suas bases teóricas no atendimento com CSA, foram constatadas abordagens de base sociointeracionista, comportamentalista e cognitivista, corroborando com os dados do presente estudo.

Mesmo tendo visões teóricas diferentes, as fonoaudiólogas relatam dificuldades e até insucesso na implementação da CSA junto à família e/ou escola. Dessa maneira, percebe-se que somente a variável de pesquisa “linha teórica” não sustenta a generalização do uso para o cotidiano. Portanto, há de se considerar a atitude pró-ativa e a vontade do interlocutor em querer se comunicar com a criança. Pesquisadores internacionais1414. Smith AL, Barton-Hulsey A, Nwosu N. AAC and Families: dispelling myths and empowering parents. Perspectives of the ASHA Special Interest Groups - SIG 12. 2016;1:10-20., divulgaram na Special Interest Groups (SIG 12), publicação temática somente sobre CSA da American Speech and Hearing Association (ASHA), evidências que há indecisão da família e/ou de profissionais para implementar estratégias de CSA, por isso incentiva-se a motivação para o empoderamento familiar nesse processo de implementação com suporte dos profissionais.

Nessa pesquisa infere-se que as famílias não utilizam o recurso, pois demanda vontade, tempo e persistência em usar com as crianças. Na realidade o desejo genuíno era de que as crianças usassem a linguagem oral, e não a alternativa.

Já em relação aos interlocutores no ambiente educacional há a carência de formação e consultoria continuada em CSA. Outro aspecto a ser considerado, no momento da seleção, professores que tenham real vontade e perfil para trabalhar junto às crianças com complexas necessidades de comunicação, além da presença de monitores e número reduzido de alunos por turma.

No âmbito educacional, o êxito do acompanhamento de uma fonoaudióloga junto a uma professora, em uma pesquisa de campo1515. Silva RLM, Silva SSC, Pontes FAR, Oliveira AIA, Deliberato D. Efeitos da comunicação alternativa na interação professor-aluno com paralisia cerebral não-falante. Rev. Bras. Ed. Esp. 2013;19(1):25-42., favoreceu um aumento do uso, inclusive como ferramenta de avaliação e ensino de conceitos pedagógicos.

Estudos sobre o diálogo do usuário e demais interlocutores é tema de diversas pesquisas1616. Deliberato D. Percepção de mães e fonoaudólogos a respeito do uso de Sistemas Suplementares e Alternativos de Comunicação. In: Nunes LROP, Pelosi MB, Walter CCF. (orgs.) Compartilhando experiências: ampliando a comunicação alternativa. Marília: ABPEE; 2011. p.57-69.

17. Manzini MG, Martinez CMS, Almeida MM. Programa individualizado de comunicação alternativa para mães de crianças com paralisia cerebral não oralizadas. Distúrb. Comum. 2015;27(1):26-38.

18. Paura AC, Deliberato D. Estudo de vocábulos para avaliação de crianças com deficiência sem linguagem oral. Rev. Bras. Ed. Esp. 2014;20(1):37-52.
-1919. Deliberato D. Sistemas suplementares e alternativos de comunicação nas habilidades expressivas de um aluno com paralisia cerebral. Rev. Bras. Ed. Esp. 2011;17(2):225-44.. Sobre essa temática um de relato de caso1717. Manzini MG, Martinez CMS, Almeida MM. Programa individualizado de comunicação alternativa para mães de crianças com paralisia cerebral não oralizadas. Distúrb. Comum. 2015;27(1):26-38. considerou uma metodologia longitudinal, com uma linha de base (LB), um seguimento e um follow up da díade mãe e criança com ECNE. Foi utilizado um material desenvolvido no doutoramento da primeira autora do trabalho no estudo (op. cit), desenvolvendo um programa individualizado de CSA para mães de crianças com ECNE. Vê-se que pontos norteadores de programas de intervenção de comunicação mais funcional estão sendo pesquisados e difundidos.

Percebe-se um aumento dos estudos linguísticos em CSA, considerando o uso da linguagem e da comunicação no cotidiano. Exemplo dessa afirmativa é a lista de 269 vocábulos, classificadas em 18temas semânticos e sintáticos desenvolvida por autoras brasileiras1818. Paura AC, Deliberato D. Estudo de vocábulos para avaliação de crianças com deficiência sem linguagem oral. Rev. Bras. Ed. Esp. 2014;20(1):37-52. para profissionais da saúde e educação, mas especialmente aos fonoaudiólogos para que a criação de pranchas de comunicação e seu uso sejam mais funcionais.

Outro estudo1919. Deliberato D. Sistemas suplementares e alternativos de comunicação nas habilidades expressivas de um aluno com paralisia cerebral. Rev. Bras. Ed. Esp. 2011;17(2):225-44., direcionado para a avaliação da sintaxe, também com CSA, têm grande relevância para ampliar as habilidades comunicativas. As crianças com complexas necessidades comunicativas tendem a usar um único símbolo (miniatura, rótulo, símbolo gráfico, fotografia, desenho, etc.), permanecendo em uma estrutura vertical. Já para desenvolver uma narrativa há de se desenvolver uma estrutura horizontal em que diferentes símbolos são usados e produzidos por diferentes meios comunicativos1919. Deliberato D. Sistemas suplementares e alternativos de comunicação nas habilidades expressivas de um aluno com paralisia cerebral. Rev. Bras. Ed. Esp. 2011;17(2):225-44., favorecendo a competência linguística para ampliar as habilidades comunicativas55. Light J, McNaughton D. Communicative Competence for Individuals who require Augmentative and Alternative Communication: A New Definition for a New Era of Communication? Augment Altern Commun. 2014;30(1):1-18..

Conclusão

Verifica-se a necessidade de inserir nos projetos políticos pedagógicos dos cursos de fonoaudiologia, disciplinas teóricas de observação clínica e disciplinas práticas (estágios curriculares) com a temática intervenção em linguagem com CSA. Os fonoaudiólogos inserem diferentes interlocutores na intervenção com CSA e guiam-se em princípios linguísticos implícitos ou explícitos, conforme seu discurso escrito, em referenciais teóricos específicos à área do conhecimento CSA, em elementos neuromotores globais e, por fim, em princípios de funcionalidade e bem-estar geral.

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APÊNDICE 1: Questionário aos fonoaudiólogos voluntários

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2017

Histórico

  • Recebido
    25 Fev 2017
  • Aceito
    28 Jun 2017
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