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Diagnóstico de ações de saúde: uma análise territorial sob a perspectiva do usuário

RESUMO

Objetivo:

descrever o desenvolvimento de ações comunitárias de saúde sob a ótica do usuário.

Métodos:

estudo descritivo realizado em um munícipio de pequeno porte no sul do Brasil em 2017, com 639 residentes, de ambos os sexos e alfabetizados. A amostra foi calculada de forma ponderada por bairros, ruas e faixa etária, e a coleta de dados realizada por 25 agentes comunitárias, distribuídas nas 6 Unidades Básicas de Saúde (UBS). O instrumento de pesquisa abrangeu questões concernentes a existência e conhecimento do usuário sobre atividades comunitárias de educação em saúde. Os dados foram analisados através do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 22,0.

Resultados:

76,3% identificam realização de ações comunitárias frequentes em relação à saúde; destas, 67,3% com atuação do enfermeiro e 70% dos agentes comunitários de saúde; acerca das ações, 63,6% afirmam que elas estimulam o sujeito a refletir sobre sua condição de saúde e doença, 62,5% sobre autocuidado, 66% medidas de proteção à saúde e 56,4% acreditam que essas ações influenciam a mudança de comportamento das pessoas.

Conclusão:

na perspectiva dos usuários, as atividades desenvolvidas atendem sua expectativa sobre ações comunitárias relacionadas à promoção da saúde; também demonstram ter conhecimento da realização destas ações desenvolvidas no município com abrangência significativa sobre a efetividade das ações para mudanças de hábitos. No entanto, os dados demonstram atividades centralizadas que necessitam de uma ressignificação da prática por meio de educação continuada sobre promoção da saúde.

Descritores:
Políticas Públicas; Promoção da Saúde; Atenção Primária à Saúde

ABSTRACT

Objective:

to describe the development of community health actions from the user’s perspective.

Methods:

a descriptive study carried out in a small city in the south of Brazil, in 2017, with 639 literate residents of both genders. The sample was calculated in a weighted system by neighborhoods, streets and age group, and data were collected by 25 community health workers, distributed into 6 Basic Health Units (UBS). The research instrument included questions about the existence and the awareness of the user about community health education activities. Data were analyzed using the Statistical Package for Social Sciences (SPSS) software version 22.0.

Results:

76.3% of the participants identified frequent community health actions; of these, 67.3% had a nurse present and 70%, a community health workers. 63.6% of the participants thought these actions stimulate the population to reflect on their health and illness, 62.5% self-care, 66% health protection measures and 56.4%, believed that these actions influence behavioral changes.

Conclusion:

from the perspective of the user, the activities developed fulfilled their expectations about community actions related to health promotion; the results also show that the participants are aware of the actions developed in the city and their significant effectiveness for habits changes. However, the data demonstrate centralized activities that require a re-signification of practices through permanent education on health promotion.

Keywords:
Public Policy; Health Promotion; Primary Health Care

Introdução

No Brasil, a Constituição Federal, promulgada em 1988, estabelece os princípios fundamentais inerentes à cidadania, entre eles a dignidade da pessoa humana e o direito à saúde. Este preceito constitucional foi efetivado com a criação do Sistema Único de Saúde em 1990, sustentado por princípios como universalidade, equidade e integralidade11. Paiva CHA, Teixeira LA. Reforma sanitária e a criação do Sistema Único de Saúde: notas sobre contextos e autores. Hist. cienc. saude-Manguinhos. 2014;21(1):15-35.. No entanto, para que o direito à saúde seja materializado nos cenários sociais, há necessidade de estabelecimento de políticas públicas por meio de criação de ambientes favoráveis à saúde, estímulos à participação comunitária, controle social, desenvolvimento de habilidades pessoais e reorientação dos serviços de saúde.

A formulação de políticas públicas se constitui no estágio em que os governos democráticos traduzem seus propósitos e plataformas eleitorais em programas e ações que produzirão resultados ou mudanças no mundo real22. Souza C. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias. 2006, ano 8(16):20-45.. No setor saúde, uma das plataformas dos governos é a política de promoção da saúde compreendida como um processo que tem por finalidade ampliar a participação dos indivíduos e comunidades nas ações que atuam sobre os fatores (modificáveis e não-modificáveis) saúde e qualidade de vida33. Malta DC, de Castro AM, Cruz DKA, Gosh CS. A promoção da saúde e da atividade física no Sistema Único de Saúde. Rev. Bra. Ativ. Fís. Saúde. 2012;13(1):24-7.. Por isso, a promoção da saúde tem se configurado como alternativa teórica e prática para o enfrentamento global do quadro epidemiológico de doenças crônicas não degenerativas44. Ribeiro AG, Cotta M, Minardi R, Ribeiro SMR. A Promoção da saúde e a prevenção integrada dos fatores de risco para doenças cardiovasculares. Ciênc. saúde coletiva. 2012;17(1):7-17..

Os movimentos sobre Promoção da Saúde começaram a ganhar maior destaque em meados da década de 1970, com a publicação do Informe Lalonde [1976]. As proposições provenientes deste relatório foram reforçadas na 1ª Conferência Internacional de Cuidados Primários à Saúde [1978], realizada na cidade de Alma Ata, República do Cazaquistão, e fortalecida na 1ª Conferência Internacional de Promoção da Saúde realizada na cidade de Ottawa, Canadá, e nas edições subsequentes55. Marchiori Buss P. Promoção da saúde e qualidade de vida. Ciênc. saúde coletiva. 2000;5(1):163-77..

Nesse contexto, no Brasil, uma das estratégias adotadas foi a criação da Política Nacional de Promoção da Saúde, que preconiza atitudes baseadas na cooperação e no respeito às singularidades, estímulo à intersetorialidade, compromisso com a integralidade do cuidado, fortalecimento da participação social e estabelecimento de mecanismos de cogestão no processo de trabalho e no trabalho em equipe, promovendo a qualidade de vida e visando reduzir vulnerabilidades e riscos à saúde relacionados aos seus determinantes e condicionantes33. Malta DC, de Castro AM, Cruz DKA, Gosh CS. A promoção da saúde e da atividade física no Sistema Único de Saúde. Rev. Bra. Ativ. Fís. Saúde. 2012;13(1):24-7..

As narrativas sobre ações comunitárias em saúde reforçam, sobretudo, o fortalecimento da mobilização popular e garantem, além de melhorias relacionadas à saúde, avanços ligados ao entendimento do significado amplo de saúde e, consequentemente, da importância do engajamento de cada ator social nos processos que envolvem a área66. Giugliani C, Rocha CMF, Antunes D, Flores EMTL, Cesa KT, Robinson PG. Série interlocuções práticas, experiências e pesquisas em saúde - Ação comunitária pela saúde em Porto Alegre (recurso eletrônico) -Rede unida. 2016; 1ed..

Ação comunitária pode ser entendida como a iniciativa de um conjunto de atores sociais de um território para tentar resolver problemas comuns, de forma intersetorial, onde a comunidade tenha interlocução com as equipes de saúde para estabelecimento de ações prioritárias para cada território. Nesse sentido, o presente trabalho avalia o conhecimento de usuários sobre ações comunitárias voltadas a promoção da saúde que são desenvolvidas em seu território, partindo, contudo, do olhar do pesquisador para averiguar se há relação com as premissas da promoção e qual o papel enquanto atores nesse processo.

Justifica-se a realização desse trabalho a partir da necessidade de uma reflexão sobre as práticas de cuidado que o município estabelece tendo em vista a utilização de campanhas de saúde como sinônimo de ações de promoção da saúde, compreendidas como um equívoco na perspectiva de mudança de comportamento, para além do preenchimento de metas. Diante do exposto, tornam-se imprescindíveis o diagnóstico e a avaliação das políticas públicas propostas pelo município. Assim sendo, o presente estudo tem por objetivo identificar a existência de ações comunitárias relacionadas à promoção de saúde, sob a ótica do usuário, em um município de pequeno porte na região Sul do Brasil.

Métodos

Trata-se de um estudo observacional do tipo descritivo que respeitou todos os preceitos éticos para pesquisa com seres humanos e foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade do Extremo Sul Catarinense de origem sob o parecer nº 1.696.968.

O estudo foi realizado em um munícipio de pequeno porte localizado nas encostas da Serra do Rio do Rastro, no Sul de Santa Catarina, a 188 km de Florianópolis, capital do estado. A cidade conta com aproximadamente 14.250 habitantes, tem uma renda per capita de R$ 678,67. Atualmente, no município há 11 escolas, nove municipais e duas estaduais. A estrutura de saúde é composta por seis Unidades de Saúde Básica com cobertura total da ESF (Estratégia da Saúde da Família), um NASF (Núcleo de Apoio a Saúde da Família), um CAPS (Centro de Atenção Psicossocial), um hospital municipal e uma clínica de dependência química.

Participaram do estudo moradores do referido município, alfabetizados, de ambos os sexos, pertencentes à área adscrita das Unidades Básicas de Saúde dos bairros Sumaré, Itanema, Guatá, Centro, Arizona e Barro Branco, que totalizam uma população de 12.514 pessoas. A amostra representativa da população quantificou 639 participantes, com distribuição ponderada por bairros, ruas e faixa etária, e foi estratificada pela área de 25 agentes comunitárias, distribuídas em seis UBS.

Realizou-se um estudo piloto com uma amostragem de 4 instrumentos para cada ACS, no qual todos receberam capacitação para aplicação dos instrumentos utilizados. A estratégia de coleta de dados se deu com a distribuição de mapas da região com a identificação (número) das casas a serem visitadas para entrevista sob forma de sorteio aleatório; os moradores que estavam em casa eram entrevistados. Os bairros identificados representam a cidade; cada bairro possui um quantitativo de domicílios que foram selecionados de forma aleatória pelo número da casa, sem a presença do ACS (cegamento). No caso de não haver morador no momento das visitas, a entrevista foi realizada na casa subsequente que tivesse presença de morador, a fim de garantir a caracterização dos bairros estudados. Os critérios de inclusão na pesquisa foram: ser morador do bairro, estar em casa no momento da entrevista, preencher e assinar o TCLE e responder ao instrumento de pesquisa na íntegra. Os moradores que não se dispuseram à realização da entrevista pelo agente comunitário foram excluídos do estudo.

O instrumento utilizado foi um questionário estruturado, padronizado e construído pelos pesquisadores de acordo com a prerrogativa e com o objetivo da pesquisa, que diz respeito ao conhecimento dos usuários acerca da existência de ações comunitárias em saúde, sobre o conhecimento da autoria e características gerais das ações para a mudança de comportamento. Todas as questões eram de múltipla escolha (três opções de resposta).

Para a caracterização da amostra, foi utilizada a estatística descritiva, por meio de valores absolutos, de média, desvio padrão, frequência absoluta e relativa das variáveis estudadas. A normalidade dos dados foi analisada pelo teste Kolmogorov Smirnov, sendo identificadas as distribuições normais. As proporções nas categorias de cada variável foram verificadas pela não sobreposição dos intervalos de confiança, utilizando-se valores absolutos e relativos. Para a organização dos dados, usou-se o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) -, versão 22,0.

Resultados

O percentual de participantes foi maior no gênero feminino do que no masculino 79,9% e 20,1%, respectivamente, com média de idade 40,7+14,9 anos, após a aplicação do instrumento para classificação socioeconômica, a população foi identificada pelas seguintes classes: A (6%), B1 (14,8%), B2 (37,3%), C1 (20,4%), C2 (14,7%), D-E (6,8%). No que tange à idade média dos participantes, a amostragem por sexo está apresentada por bairro na Tabela 1. Os resultados foram organizados em três seções que sintetizam a apreensão do fenômeno investigado.

Na Tabela 1 são apresentados os dados de identificação da população, a distribuição da amostra por gênero com maior incidência no feminino em todos os bairros, a representatividade da região adscrita (bairro) por percentual e a idade média dos avaliados identificados como adultos jovens.

Tabela 1:
Distribuição da amostra por sexo, idade e bairro

Para a identificação do conhecimento dos avaliados sobre a existência de ações comunitárias sob a ótica do usuário em seu território (Tabela 2), os dados apresentam valores absolutos e relativos para cada variável e são subdivididos em “desconheço”, “frequente” e “pouco frequente” (às vezes é desenvolvida), identificando uma frequência importante na realização de ações de pleno conhecimento da comunidade, e que são desenvolvidas por uma profissional do serviço de saúde.

Tabela 2:
Conhecimento sobre a existência de ações comunitárias no território

Para a identificação dos tipos de ações comunitárias (Tabela 3), no instrumento de pesquisa empregado foram elencadas variáveis utilizadas referentes à existência de ações com indicadores de promoção e proteção da saúde, perguntas fechadas com opções de resposta (“não sei”, “sim” ou “não”) representadas por valores absolutos e relativos de cada variável. Apontam a existência de ações comunitárias em suas regiões, realizadas por intermédio de campanhas, informativos e orientações pessoais que facilitam o conhecimento e a participação da população.

Tabela 3:
Existência de tipos de ações comunitárias

A Tabela 4 se refere ao conhecimento sobre a participação popular nos serviços, campanhas identificadas, na participação nas tomadas de decisões para o enfrentamento de problemas e seu autocuidado, utilizando valores absolutos e relativos para as questões investigadas. Percebe-se envolvimento da comunidade nas ações comunitárias, relativa mudança de comportamento descontextualizada da promoção da saúde.

Tabela 4:
Políticas públicas de promoção e participação popular

Discussão

É preciso repensar as políticas de saúde referentes à participação dos homens nesta região, que é pouco representativa devido às características culturais predominantes, que tratam da responsabilização dos homens pela subsistência da família. É inegável o avanço na atenção em saúde, especificamente relacionado à educação em saúde como uma ação comunitária, após a implantação da Estratégia de Saúde da Família (ESF), cujo enfoque reside no olhar ampliado sobre o modelo biomédico e no autocuidado, proporcionando assim um estímulo à promoção da saúde77. Araujo MRN, Assunção RS. A atuação do agente comunitário de saúde na promoção da saúde e na prevenção de doenças. Rev. bras. enferm. 2004;57(1):19-25., observando a territorialidade como preceito de ações efetivas; porém, os homens continuam à margem desse processo.

As informações sobre a existência de ações comunitárias no seu território (Tabela 2) indicam que há uma frequência na realização das ações/atividades comunitárias voltadas para a saúde, com maior responsabilização das ações aos ACS, seguido pelos enfermeiros. A realização de ações comunitárias no território da área adscrita das ESF é de fundamental importância para a construção de um entendimento ampliado sobre saúde.

Desse modo, estão intrínsecas, no trabalho dos ACS, as práticas de educação em saúde, evidenciando que seu trabalho está centrado na educação em saúde com ênfase em promoção da saúde88. Costa JSDd, Barcellos FC, Sclowitz ML, Sclowitz IKT, Castanheira M, Olinto MTA. Prevalência de hipertensão arterial em adultos e fatores associados: um estudo de base populacional urbana em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Arq Bras Cardiol. 2007;88(1):54-9.. O trabalho realizado pelos ACS tem o propósito de orientar os indivíduos quanto ao autocuidado e às medidas de proteção, além de estimulá-los, e também à comunidade, a refletirem sobre suas condições de saúde e doença99. Santos LPGSd, Fracolli LA. O agente comunitário de saúde: possibilidades e limites para a promoção da saúde. Rev Esc Enferm USP. 2010;44(1):76-83.. No município onde foi realizada esta pesquisa, os ACS desempenham papel relevante para o cuidado da saúde da população. É válido ressaltar que muito provavelmente outras ações não são desenvolvidas devido à inexistência de uma política municipal de formação em saúde, contextualizada por território, que acaba por ficar à margem da Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), necessitando, então, de uma formação continuada para todos os trabalhadores da saúde do município.

A limitação do achado destacado nesta seção está atrelada à necessidade de identificação e quantificação populacional com relação direta com as ações desenvolvidas; o estudo faz somente apontamento sobre a existência das atividades no território de abrangência. No entanto, a utilização da ferramenta “educação em saúde”, a qual possibilita o diálogo sobre temáticas emergentes relacionando informação e comunicação em saúde, os problemas de saúde e a condição de vida, reflexões sobre as condições de saúde e doença, bem como a relação entre o conhecimento sobre autocuidado e medidas de proteção à saúde, faz-se necessário, tendo em vista a tipologia das ações comunitárias desenvolvidas, indicando que há necessidade de qualificação dos ACS para esse novo cenário.

A educação em saúde pode ser compreendida como uma prática social que deve estar centrada na problematização do cotidiano, na valorização da experiência de indivíduos e grupos sociais e na leitura das diferentes realidades1010. Alves GG, Aerts D. As práticas educativas em saúde e a Estratégia Saúde da Família. Ciênc. saúde coletiva. 2011;16(1):319-25.. Atualmente, observa-se, nas unidades básicas de saúde (UBS) no Brasil, uma profusão de novas propostas de educação em saúde. Assim, as ações propostas devem contemplar a interdisciplinaridade, a criação de vínculos, a intersetorialidade e o fortalecimento de uma gestão local democrática, além de potencializar indivíduos e comunidades no exercício da cidadania voltada para a melhoria das condições de vida, com poder de decisão na formulação de políticas públicas, integração social e capacidade de participar da vida em sociedadel1111. Carneiro ACLL, Souza Vd, Godinho LK, Faria ICMd, Silva KL, Gazzinelli MF. Educação para a promoção da saúde no contexto da atenção primária. Rev Panam Salud Publica. 2012;31(2):115-22..

A existência de ações comunitárias e os tipos de atividades (Tabela 3), com interface entre comunidade e profissionais de saúde, aponta que os usuários dos serviços destacaram ações comunitárias vinculadas aos problemas de saúde e condições de vida; ações estas que estimulam os indivíduos a refletirem sobre sua condição de saúde e doença; orientações sobre autocuidado e medidas de proteção à saúde, além das principais estratégias e serviços oportunizados a todos. A realidade da cidade de Lauro Müller não está descontextualizada de outras localidades do território brasileiro no que concerne ao desenvolvimento de ações comunitárias, onde o profissional tem procurado fortalecer a educação em saúde pautada nos princípios da multicausalidade do processo saúde-doença, e da participação social que inclui o autocuidado e a autonomia, na contramão de evidências apresentadas pelo território avaliado.

A participação popular sobre o ordenamento e participação intersetorial voltadas à saúde e à promoção da saúde é apontada como um fator determinante para sua efetividade. Compreendendo a situação local (creches, asilos, escolas, comerciantes locais), bem como a participação social de forma efetiva na elaboração, desenvolvimento e avaliação das políticas implantadas, já identificados e apresentados em outros momentos, considera-se o conhecimento dos participantes sobre as políticas públicas de promoção da saúde e a participação popular nas ações comunitárias, estabelecendo relação de intersetorialidade no município (Tabela 4). Observou-se que os usuários sabem da existência dessa comunicação entre os diversos setores do município para o desenvolvimento das ações a favor da saúde, resultantes de parcerias com creches, escolas, grupos sociais; além disso, constatou-se que a participação do conselho local e outros conselhos tem significativa representatividade e que as ações são efetivas para a mudança de hábitos, com envolvimento participativo no desenvolvimento destas ações.

Os conselhos municipais e locais assumem hoje um significado mais do que relevante, pois, além de representarem as estruturas formais de poder local, oriundas dos processos de descentralização e municipalização das diferentes políticas públicas, essas instâncias podem também se converter em espaços de formação de consensos e pactuação e não somente de decisão1212. Goya N. Promoção da saúde, poder local e saúde da família: estratégias para a construção de espaços locais saudáveis, democráticos e cidadãos-humanamente solidários e felizes. SANARE. 2013;4(1):51-6., de participação comunitária. Legalmente, os mesmos devem ser constituídos pela participação de 50% da população, visto que são locus de construção de políticas e reivindicação da garantia do direito à saúde.

Os espaços educacionais estão consolidando a realização de ações em promoção da saúde; no entanto, o propósito das ações comunitárias em saúde neste território é o estabelecimento de um modelo de educação em saúde hegemônico tradicional pautado em orientações direcionadas verticalmente aos usuários (palestras), não levando em consideração as histórias de vida e os diversos saberes88. Costa JSDd, Barcellos FC, Sclowitz ML, Sclowitz IKT, Castanheira M, Olinto MTA. Prevalência de hipertensão arterial em adultos e fatores associados: um estudo de base populacional urbana em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Arq Bras Cardiol. 2007;88(1):54-9.,1212. Goya N. Promoção da saúde, poder local e saúde da família: estratégias para a construção de espaços locais saudáveis, democráticos e cidadãos-humanamente solidários e felizes. SANARE. 2013;4(1):51-6., ou seja, fortalecer a tendência do repasse de informações e não reconstruir significados coletivamente significa dizer que o usuário não é parte do processo de construção e planejamento das ações educativas, o qual o sistema de saúde deve utilizar a educação em saúde para promoção da saúde1313. de Ottawa C. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Projeto Promoção da Saúde. As Cartas da Promoção da Saúde/Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, Projeto Promoção da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde. 2002..

O papel dos programas comunitários de promoção da saúde corresponde ao encorajamento das pessoas a assumirem a responsabilidade pelo seu próprio bem-estar e a construírem sua autonomia, contribuindo na recuperação de função, estabilidade e independência1313. de Ottawa C. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Projeto Promoção da Saúde. As Cartas da Promoção da Saúde/Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, Projeto Promoção da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde. 2002.,1414. Middleton R, Moxham L, Parrish D. The value of health promotion programs for older people with chronic conditions in the community. Aust Nurs Midwifery J. 2016;24(2):30. aumentando as oportunidades, porque quando a escolha pessoal é aumentada dentro de um programa, a satisfação de vida e prazer é aumentada e os participantes são muito mais propensos a se beneficiarem dos resultados.

Nesse contexto, há necessidade de compreender a educação em saúde como um processo que deve estar pautado na construção do conhecimento para a mudança de hábitos, utilizando-se de um conjunto de práticas que aumentem a autonomia dos usuários dos serviços de saúde relacionados ao autocuidado, e na articulação destes com os profissionais e gestores dos serviços de saúde, ou seja, nesse processo educativo todas as partes envolvidas (trabalhadores da saúde, usuários e gestores) precisam se reconhecer como um conjunto coerente na elaboração de temáticas abordadas com foco na educação em saúde1313. de Ottawa C. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Projeto Promoção da Saúde. As Cartas da Promoção da Saúde/Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, Projeto Promoção da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde. 2002..

Conclusão

O estudo demonstrou o desenvolvimento de ações comunitárias voltadas à saúde, porém, com responsabilização dos ACS e enfermeiros. Há falta de ações intersetoriais, baixo envolvimento dos demais profissionais da saúde das ESF e da comunidade, fazendo-se necessária, assim, a realização de ações compartilhadas e ampliadas para a promoção da saúde. Foram relacionadas as ações comunitárias ao conhecimento da natureza das ações, destacando os problemas de saúde e condições de vida, reflexões sobre sua condição de saúde e doença, orientações sobre autocuidado e medidas de proteção à saúde, ou seja, há um distanciamento dessas ações com a promoção da saúde, pois enfatizam somente a doença.

Os resultados obtidos a partir da reflexão da real condição territorial apontam para a necessidade de qualificação e formação continuada para os profissionais da saúde em todos os níveis. O município precisa repensar as ações realizadas, que estão descontextualizadas da realidade nacional e não se configuram como estratégias intersetoriais efetivas para adoção de hábitos de vida saudáveis. A utilização de campanhas não contribui para o aumento da autonomia, empoderamento das pessoas, apenas condicionam ações pontuais e contínuas. Logo, há a necessidade de investimentos municipais voltadas para a concretização de uma política de promoção da saúde.

REFERENCES

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    Fonte de auxílio: Grupo de Estudos e Pesquisa em Promoção da Saúde - GEPPS.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    18 Out 2017
  • Aceito
    01 Nov 2018
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