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Triagem do sistema estomatognático em pré-escolares e sua importância para a elaboração de um programa interventivo em saúde

RESUMO

Objetivo:

descrever os resultados obtidos na triagem do sistema estomatognático aplicada em pré-escolares das redes pública e particular de ensino.

Métodos:

estudo observacional, transversal, que de forma aleatória selecionou quatro pré-escolas da Diretoria Regional de Educação, sendo sorteados dois municípios e eleitas as instituições localizadas no Centro. Após apresentação da proposta aos interessados e o consentimento para sua realização, a triagem foi aplicada, envolvendo as estruturas da face, o tônus, os dentes, a oclusão, a mobilidade, a fala, a respiração, a mastigação e a deglutição, por meio de protocolo testado e padronizado, de forma sintetizada. Os resultados foram submetidos à análise estatística (descritiva e teste Qui-Quadrado), com valor de significância de 5%.

Resultados:

218 pré-escolares, entre dois e seis anos, sendo que a maioria dos participantes apresentou normalidade dos aspectos triados, porém, ao serem comparados os resultados entre as instituições, houve diferenças significativas para: simetria facial, a fala, a deglutição (para os alunos das escolas públicas), os aspectos estruturais e o tônus (escolas particulares).

Conclusão:

os resultados obtidos permitiram o planejamento diferenciado de ações promotoras de saúde e preventivas dos distúrbios miofuncionais orofaciais para pré-escolares de redes institucionais distintas, determinando a importância de levantamentos epidemiológicos em espaços promotores de saúde.

Descritores:
Fonoaudiologia; Atenção Primária em Saúde; Sistema Estomatognático

ABSTRACT

Purpose:

to describe the results obtained in the stomatognathic system screening applied in preschoolers of the public and private school systems.

Methods:

a cross-sectional, observational study randomly which selected four preschools linked to the Diretoria Regional de Educação. Two municipalities were drawn, and the educational institutions located in the city Center were selected. After submission of the proposal to the secretaries, managers and family members, the consent was granted for the screening involving face structures, muscle tonus, teeth, occlusion, mobility, speech, breathing, chewing and swallowing, by means of a tested and standardized protocol for evaluation of the stomatognathic system in a synthesized way. The results were submitted to descriptive statistical analysis and the chi-square test, with a significance level of 5%.

Results:

a total of 218 preschoolers, aged between two and six years old, participated in the study. Most of the participants, regardless of the institution attended, presented normality of the aspects surveyed. However, when comparing preschool children results among the institutions, there were significant differences for facial symmetry, speech, swallowing (for students in public schools), structural aspects and muscle tonus (private schools).

Conclusion:

the results obtained allowed the differentiated planning of health promotion and preventive actions of orofacial myofunctional disorders for preschoolers of distinct institutional systems, determining the importance of epidemiological surveys in health promotion spaces.

Keywords:
Speech, Language and Hearing Sciences; Primary Health Care; Stomatognathic System

Introdução

O diálogo intersetorial entre Saúde e Educação torna-se essencial para a implantação de projetos para transformar as instituições de ensino em um espaço promotor de saúde11. Santos Silva C, Andrade Bodstein RC. A theoretical framework on intersectoral practice in School Health Promotion. Ciênc. Saúde Colet. [serial on the Internet] 2016 Jan [cited 2017 Nov 24]; 21(6):1777-88. Disponível em: https://www.scielosp.org/pdf/csc/v21n6/1413-8123-csc-21-06-1777.pdf.
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.

Em relação à Fonoaudiologia, este trabalho deve ser alicerçado no respeito e na corresponsabilidade das ações em rede com demais profissionais da saúde, gestores, comunidade e outros setores, de modo que todos estejam motivados para tal intento22. César CP, Santos CS, Andrade JS, Sordi C. Promoção da saúde e fonoaudiologia: possibilidades de atuação. In: Paranhos LR, César CPHAR, Sordi C (orgs). Coletâneas em Saúde. São José dos Pinhais: Plena, 2016. p. 71-80., requerendo reuniões periódicas de planejamento, execução e alinhamento estratégico, tornando a tarefa ainda mais complexa33. Santos JC, Guedes-Granzotti RB, Barreto ACO, Oliveira CC, Silva K, Baldrighi SEZM et al. Small citizen project: health promotion and prevention of child nutrition and orofacial motricity disorders. Distúrb. Comun. [serial on the Internet] 2016 Mar [cited 2017 Nov 24]; 28(1):151-61. Available from: http://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/23939/19303.
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.

Dentre as vertentes utilizadas para a transformação da realidade de saúde de grupos populacionais específicos está a utilização de dados epidemiológicos para a determinação das prioridades, recursos e orientação programática, como descrito no artigo sétimo da Lei do Sistema Único de Saúde44. Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Lei 8080, de 19 de setembro de 1990. Brasília: CNS; 1990 [cited 2017 Nov 24]. Available from: http://conselho.saude.gov.br/legislacao/lei8080_190990.htm..

Um estudo nacional evidenciou elevados índices de desvios/alterações do sistema estomatognático em pré-escolares (85,89%)33. Santos JC, Guedes-Granzotti RB, Barreto ACO, Oliveira CC, Silva K, Baldrighi SEZM et al. Small citizen project: health promotion and prevention of child nutrition and orofacial motricity disorders. Distúrb. Comun. [serial on the Internet] 2016 Mar [cited 2017 Nov 24]; 28(1):151-61. Available from: http://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/23939/19303.
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enquanto que, em estudos internacionais, encontraram percentuais de 37,65%55. Rajchanovska D, Zaifirova IB. The impact of demographic and socio-economic conditions on the prevalence of speech disorders in preschool children in Bitola. Srpski arhiv za celokupno lekarstvo. [serial on the Internet]. 2015 Mar-Apr [cited 2017 Nov 24]; 143(3-4):169-73. Available from: http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.942.921&rep=rep1&type=pdf.
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e 3,4%66. Eadie P, Morgan A, Ukoumunne OC, Ttofari Eecen K, Wake M, Reilly S. Speech sound disorder at 4 years: prevalence, comorbidities, and predictors in a community cohort of children. Dev. med. child. neurol. [serial on the Internet] 2015 Jun [cited 2017 Nov 24]; 57(6):578-84. Available from: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/dmcn.12635/epdf.
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. Alterações nessa fase da vida revelam a necessidade de atenção dos profissionais da Saúde para a proposição de ações preventivas e educativas interdisciplinares em parceria com as Secretarias de Saúde e Educação de seus municípios.

Além disso, o conhecimento por parte dos profissionais de saúde de que alterações dos aspectos estruturais da face podem ocasionar sintomas diversos prejudicando a respiração e o sono77. Al Ali A, Richmond S, Popat H, Playle R, Pickles T, Zhurov AI et al. The influence of snoring, mouth breathing and apnoea on facial morphology in late childhood: a three-dimensional study. BMJ open. [serial on the Internet] 2015 Sep [cited 2017 Nov 24]; 5(9):e009027. Available from: http://bmjopen.bmj.com/content/bmjopen/5/9/e009027.full.pdf.
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e, consequentemente, a aprendizagem88. Ribeiro GC, Santos ID, Santos AC, Paranhos LR, César CPHAR. Influence of the breathing pattern on the learning process: a systematic review of literature. Braz. j. otorhinolaryngol. [serial on the Internet] 2016 Jul-Ago [cited 2017 Nov 24]; 82(4):466-78. Available from: http://www.scielo.br/pdf/bjorl/v82n4/pt_1808-8694-bjorl-82-04-00466.pdf.
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, é importante para a intervenção precoce interdisciplinar.

Assim, os objetivos deste estudo foram descrever os resultados obtidos na triagem do sistema estomatognático de pré-escolares das redes pública e particular de ensino, bem como verificar a importância desta triagem para a elaboração de um programa de intervenção.

Métodos

Estudo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Sergipe (CAAE: 0060.0.214.000-09). Quanto ao tipo de estudo, foi observacional, transversal e descritivo, realizado em pré-escolares do Estado de Sergipe. Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a população estimada de Sergipe é de 2.265.779 habitantes distribuídos em 75 municípios99. Brasil. Censo Demográfico 2010. Características da população e da educação. Rio de Janeiro: IBGE; 2011 [cited 2016 Mar 28]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/resultados_preliminares_amostra/notas_resultados_preliminares_amostra.pdf..

Foi realizada escolha aleatória (por sorteio) de quatro pré-escolas do interior do Estado (duas públicas e duas privadas) localizadas na região central do município e que estivessem atrelados à Diretoria Regional de Educação (DRE2), compreendendo seis municípios (Lagarto, Salgado, Boquim, Poço Verde, Simão Dias e Riachão do Dantas), sendo sorteados dois: Lagarto e Salgado.

Tais municípios localizam-se no Centro-Sul do Estado de Sergipe e ficam a 23,8 km de distância entre si. A atividade econômica desses municípios é predominantemente agrícola99. Brasil. Censo Demográfico 2010. Características da população e da educação. Rio de Janeiro: IBGE; 2011 [cited 2016 Mar 28]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/resultados_preliminares_amostra/notas_resultados_preliminares_amostra.pdf..

A proposta de triagem foi apresentada à Secretaria de Educação dos Municípios, aos gestores das instituições de ensino e aos responsáveis dos pré-escolares.

Foram incluidos neste estudo crianças entre dois e seis anos, com autorização dos pais e educadores para participarem da triagem. Foram excluídas as crianças que estavam ou foram submetidas a tratamento fonoaudiológico, ortodôntico ou ortopédico facial, com histórico positivo de cirurgias faciais e faríngeas; com malformações craniofaciais, alterações neurológicas, genéticas, intelectuais e auditivas; bem como aquelas que estivessem resfriadas ou gripadas no dia da avaliação.

Os grupos amostrais foram selecionados por conveniência, tendo em vista que os gestores das pré-escolas precisavam aceitar a proposta. Para minimizar o viés dessa escolha, optou-se por configurar os grupos sem outras variáveis que interferissem na análise, como o número de pré-escolares e o sexo dos participantes. No entanto, não foi possível dividir igualitariamente os grupos por faixa etária, sendo obtido maior número de crianças com idades entre quatro e cinco anos, idade em que as crianças tendem a colaborar mais.

Ainda nesse sentido, as crianças menores geralmente são tidas como desafios no momento da pesquisa e dispendem de maior tempo para que possa ser estabelecido vínculo de confiança entre o pesquisador e o sujeito. Assim, mesmo que o grupo amostral de crianças com dois anos de idade fosse considerado pequeno (seis crianças), optou-se por permanecer com essa faixa etária, a fim de serem estabelecidas atividades dirigidas também para essa faixa etária.

Assim, após a aplicação dos critérios supracitados, foi procedida a triagem, que foi realizada em sala cedida pelas instituições (com boa iluminação, ventilação e com interferência mínima de ruídos), por meio de entrevista com pais e triagem do sistema estomatognático.

O instrumento de coleta de dados foi dividido em duas partes, constando na primeira com os dados de identificação e indicadores socioeconômicos e, na segunda, a triagem do sistema estomatognático, por meio do protocolo sintetizado MBGR1010. Genaro KF, Berretin-Felix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial - protocolo MBGR. Rev. CEFAC [serial on the Internet] 2009 Abr-Jun [cited 2016 Mar 29]; 11(2):237-55. Available from:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-18462009000200009.
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. Foram utilizados espelho de Glatzel para verificação do fluxo aéreo nasal expiratório, água (oferecida em copo transparente de plástico de 200 ml) e pão de sal (fatia de 2 cm) para triagem da deglutição. O pão também foi utilizado para triagem da mastigação.

Todas as produções da fala foram registradas em máquina fotográfica na função de vídeo, com uso da máquina fotográfica Sony Cyber-Shot, digital (7,2 megapixels), modelo DSC P200. As crianças foram fotografadas nas posições: frente e perfil1111. Silveira MC, Sígolo C, Quintal M, Sakano E, Tessitore A. Proposta de documentação fotográfica em motricidade oral. Rev. CEFAC. [serial on the Internet] 2006 Out-Dez [cited 2016 Mar 29]; 8(4):485-92. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v8n4/v8n4a09.pdf.
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. As triagens apresentaram duração de 20 minutos e os resultados foram classificados em “normal”, quando o item avaliado correspondia ao esperado para o padrão de normalidade para a idade (com pontuação zero no protocolo MBGR)1010. Genaro KF, Berretin-Felix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial - protocolo MBGR. Rev. CEFAC [serial on the Internet] 2009 Abr-Jun [cited 2016 Mar 29]; 11(2):237-55. Available from:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-18462009000200009.
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e “alterado” caso apresentasse as características descritas abaixo (com pontuação ≥ 1 no protocolo utilizado)1010. Genaro KF, Berretin-Felix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial - protocolo MBGR. Rev. CEFAC [serial on the Internet] 2009 Abr-Jun [cited 2016 Mar 29]; 11(2):237-55. Available from:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-18462009000200009.
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:

- Aspectos estruturais: assimetria facial, lábios abertos ou entreabertos com acúmulo de saliva ou baba; mucosa de bochechas ou língua com marcas dentárias e/ou feridas; frênulo de língua curto e/ou anteriorizado; palato ósseo com profundidade e/ou largura aumentadas ou reduzidas; palato muscular assimétrico, com extensão longa ou curta; úvula bífida e/ou desviada; tonsilas palatinas hipertrofiadas; conservação dentária e gengival ruins; presença de mordida aberta, cruzada ou desvio de linha média (todos verificados por inspeção visual e auxílio de lanterna, quando necessário);

- Mobilidade: não execução ou dificuldades para a mobilidade de lábios (estalar, protrair, retrair e alternância entre protrusão e retração), língua (protrair, alternância entre protrair e retrair, lateralizar, estalar e vibrar), bochechas (inflar), palato muscular (emissão repetida do /a/) e mandíbula (abertura, fechamento e lateralidade).

- Tônus: aumentado ou diminuído (triado por meio de palpação da musculatura orofacial triada) e

- Funções orais: modo respiratório alterado pela visualização de lábios abertos, dificuldades de manutenção dos lábios vedados por dois minutos ou mais e fluxo aéreo nasal expiratório assimétrico após limpeza de narinas (triado por meio do uso de espelho milimetrado abaixo das narinas durante a expiração); mastigação com incisão lateral, trituração ineficiente, padrão unilateral crônico ou bilateral simultâneo, velocidade diminuída e presença de contrações musculares atípicas (analisada com a oferta de pão francês); deglutição com interposição de língua visível, lábio inferior em contato com incisivos superiores, falta de contenção de líquido, volume de líquido aumentado, presença de ruídos, incoordenação entre respiração e deglutição e/ou presença de contrações musculares atípicas (verificada com copo de plástico transparente com oferta de água); fala com presença de omissões não esperadas para a faixa etária e distorções dos sons da fala (observada por conversa espontânea e figuras do protocolo MBGR)1010. Genaro KF, Berretin-Felix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial - protocolo MBGR. Rev. CEFAC [serial on the Internet] 2009 Abr-Jun [cited 2016 Mar 29]; 11(2):237-55. Available from:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-18462009000200009.
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.

A partir dos resultados obtidos, os familiares receberam devolutivas individuais e foram orientados quanto às condutas necessárias; os educadores e familiares receberam material educativo contendo informações sobre temas diversos e os gestores participaram de reunião para discussão de ações necessárias para a diminuição dos distúrbios miofuncionais orofaciais existentes.

Os resultados obtidos foram digitados em software de planilha eletrônica Excel. Foi utilizada análise estatística descritiva e para a comparação entre os grupos utilizou-se do teste Qui-Quadrado de Pearson, considerando-se valor de significância de 5%.

Resultados

Participaram 108 pré-escolares de duas instituições públicas e 110 de duas particulares (total: 218 crianças).

Quanto ao sexo, 101 eram meninos (51 da pública e 50 da particular, correspondendo a 46,33% da amostra) e 117 meninas (57 da pública e 60 da particular, 53,67% da amostra), não sendo reveladas diferenças estatisticamente significantes quanto à distribuição entre o tipo de instituição frequentada e o sexo dos participantes (p=0,892).

Em relação às condições socioeconômicas e culturais, observou-se que a maioria (84,9%) apresentava renda familiar de até dois salários mínimos. A diferença entre o perfil socioeconômico e cultural deu-se apenas no aspecto relacionado à escolaridade dos pais, sendo que na instituição pública a maioria (n=71; 81,6%) não apresentava Ensino Fundamental completo, enquanto que na instituição particular, 63 (63,77%) apresentou Ensino Fundamental completo e 36 (36,23%) Ensino Médio incompleto.

A faixa etária da amostra foi constituída por pré-escolares de dois a seis anos de idade (média: 4,12 ± 0,95), havendo diferença estatisticamente significante para as idades de quatro e cinco anos (p<0,001), evidenciado pelo maior número de pré-escolares nessa faixa etária, porém sem diferenças entre as instituições de ensino. De forma geral, as alterações do sistema estomatognático foram constatadas em 94 pré-escolares (43,12%), independentes das instituições frequentadas.

Nos aspectos estruturais orofaciais, foram observadas diferenças estatisticamente significantes na simetria facial, com alterações mais evidentes nas instituições públicas (p=0,018); em bochechas, tonsilas faríngeas, palato duro e oclusão dental, com número maior de alterações nas instituições particulares (p<0,001). Nas demais estruturas (lábios, língua e dentes) não foram observadas diferenças estatisticamente significantes (Tabela 1).

Tabela 1:
Caracterização dos aspectos estruturais triados nos pré-escolares das instituições participantes da pesquisa

Relacionada à mobilidade de lábios, língua, bochechas, mandíbula e véu palatino, não houve diferença entre as instituições investigadas (Tabela 2).

Tabela 2:
Comparação da mobilidade das estruturas orofaciais dos pré-escolares das instituições públicas e particulares

Em relação ao tônus das estruturas orofaciais, foi possível observar que os pré-escolares das instituições particulares apresentaram maior ocorrência de alterações, com resultados estatisticamente significantes (Tabela 3).

Tabela 3:
Comparação do tônus das estruturas orofaciais dos pré-escolares de instituições públicas e particulares

Nas funções orais as provas que revelaram diferenças estatísticas foram as de deglutição e fala, sendo piores nos pré-escolares da rede pública de ensino (Tabela 4).

Tabela 4:
Comparação das funções orais dos pré-escolares de instituições públicas e particulares

Discussão

O ideal é que as políticas públicas em saúde sejam organizadas e norteadas a partir da prática baseada em evidências e da análise da situação de saúde de grupos populacionais1212. Guimarães RM, Meira KC, Paz EP, Dutra VG, Campos CE. Os desafios para a formulação, implantação e implementação da Política Nacional de Vigilância em Saúde. Ciênc. Saúde Colet. [serial on the Internet] 2017 Maio [cited 2017 Nov 27]; 22(5):1407-16. Available from: http://www.redalyc.org/pdf/630/63050935003.pdf.
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.

Assim, a análise situacional da saúde de pré-escolares dos municípios participantes foi procedida para que fosse possível a elaboração de um programa de saúde que atingisse as necessidades locorregionais. Por tal motivo, duas realidades distintas foram eleitas: rede pública e privada de ensino. Como os integrantes dessas redes podem se diferenciar pelo estrato socioeconômico, essa condição foi analisada, sendo constatado que a amostra não se diferenciou pela renda familiar, moradia e trabalho. Houve diferença no grau de instrução dos pais, sendo que no ensino público a maioria não apresentava Ensino Fundamental completo enquanto na particular, apresentava-o completo e Ensino Médio incompleto. Não foi encontrada justificativa na literatura que explicasse o motivo de sujeitos com mesmo estrato socioeconômico apresentarem diferentes graus de instrução. Hipotetiza-se que as rendas tenham se equiparado entre os grupos em virtude da transferência monetária possibilitada pelo Programa de Bolsa Família, sendo necessário estudo detalhado das particularidades das famílias participantes.

Sabe-se, no entanto, que o baixo estrato socioeconômico familiar e escolaridade dos pais são determinantes sociais que podem influenciar negativamente na saúde infantil1313. Assis SG, Avanci JQ, Oliveira RVC. Socioeconomic inequalities and child mental health. Rev Saúde Pública. [serial on the Internet] 2009 Jun. [cited 2016 Mar 29]; 43(1):92-100. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_nlinks&ref=000096&pid=S0102-7972201300030000300006&lng=pt.
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, justificando a realização de pesquisas que verifiquem a comunicação e, em especial, as relacionadas ao sistema estomatognático, responsável pelas funções orais como a fala, a mastigação, a deglutição, a respiração e a sucção.

Quanto aos aspectos estruturais orofaciais triados, foram encontradas alterações na simetria facial, bochechas, palato e oclusão. De acordo com a literatura1414. Procaci MIMA, Ramalho SA. Crescimento assimétrico da face: atividade muscular e implicações oclusais. Rev. dent. Press Ortodon. Ortopedi. Facial 2002;7(6):87-93., os fatores que ocasionam a assimetria facial são os funcionais, os esqueléticos, os dentários ou a junção de todos. Dessa forma, a avaliação seria necessária para a elucidação dos motivos que levaram os pré-escolares da escola pública a apresentarem assimetria facial, sendo esta uma limitação deste estudo.

Pesquisadores1515. Czlusniak GR, Carvalho FC, Oliveira JP. Alterações de motricidade orofacial e hábitos nocivos orais em crianças de 5 a 7 anos de idade: implicações para intervenções fonoaudiológicas em âmbito escolar. UEPG CiBiol Saúde. [serial on the Internet] 2008 Mar [cited 2016 Mar 29]; 14:29-39. Available from: http://177.101.17.124/index.php/biologica/article/view/480/481.
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observaram que 81% das alterações estruturais das crianças diziam respeito a alterações de estruturas moles, como a postura inadequada, em repouso, de lábios e língua; mobilidade e tonicidade inadequadas de bochechas, lábios e língua e quanto às alterações em estruturas duras, estas apareceram com menor frequência (19%), sendo destacadas as relacionadas ao tipo de mordida (aberta e cruzada) e à alteração morfológica de palato (ogival).

Ainda em relação aos aspectos estruturais orofaciais, foram também observadas alterações em bochechas (presença de marcas dentárias, linha Alba ou feridas), palato (profundidade, largura de palato duro e simetria e extensão de palato mole) e oclusão (nas dimensões horizontal, vertical ou transversal). Tais alterações sugerem avaliação mais detalhada e ações promotoras e preventivas da Odontologia. O ideal seria o da realização de intervenções interdisciplinares e colaborativas, para que fosse concretizada a educação interprofissional, prática idealizada pela Organização Mundial da Saúde1616. Organização Mundial da Saúde. Marco para ação em educação interprofissional e prática colaborativa. Genebra: OMS; 2010 [cited 2017 Nov 27]. Available from: http://new.paho.org/bra/images/stories/documentos/marco_para_acao.pdf%20. para a melhoria dos resultados mundiais de saúde.

Uma possível explicação para as alterações estruturais orofaciais supracitadas pode ser o fato de que, geralmente, os sinais do hábito oral deletério de apertamento dentário ou bruxismo podem ser constatados pelas marcas dentárias nas bordas laterais da língua, presença de linha Alba ou de feridas na mucosa das bochechas, como observado nos pré-escolares investigados, podendo ocasionar ainda alteração no tônus de bochechas e mordida, nas funções alimentares e na respiração1717. Simões-Zenari M, Bitar ML. Fatores associados ao bruxismo em crianças de 4 a 6 anos. Pró-Fono R. Atual. Cientif. [serial on the Internet] 2010 Out-Dez [cited 2016 Apr 05]; 22(4):465-72. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-56872010000400018&lng=en.
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.

Assim, a conscientização do referido hábito e a intervenção precoce com pré-escolares e seus familiares pode minimizar ou sanar possíveis alterações no desempenho das funções estomatognáticas. Neste sentido, o ideal seria a organização de equipes interprofissionais de saúde, incluindo o Pediatra, o Fonoaudiólogo, o Odontopediatra e o Psicólogo.

As alterações oclusais e nos elementos dentários, mesmo que não diferissem entre os grupos e com percentuais que indicaram normalidade para a maioria dos pré-escolares triados, sugerem avaliação mais detalhada, acompanhamento longitudinal desses pré-escolares e ações promotoras e preventivas da Odontologia. Esses dados resultaram em uma discussão tanto com docentes universitários do respectivo Curso, para o acompanhamento de tais crianças; quanto com os familiares e os gestores das instituições, para a adoção de medidas profiláticas diárias e o encaminhamento para os profissionais da rede de saúde. O ideal, neste sentido, seria a realização de intervenções interdisciplinares e colaborativas, para que fosse concretizada a educação interprofissional, prática idealizada pela Organização Mundial da Saúde1616. Organização Mundial da Saúde. Marco para ação em educação interprofissional e prática colaborativa. Genebra: OMS; 2010 [cited 2017 Nov 27]. Available from: http://new.paho.org/bra/images/stories/documentos/marco_para_acao.pdf%20. para a melhoria dos resultados mundiais de saúde.

Outros dados interessantes foram a alteração estrutural em palato duro, quais sejam, de profundidade aumentada e largura reduzida, bem como em tonsilas faríngeas, com hipertrofia. Quando o palato ósseo é muito alto pode invadir o espaço interno das fossas nasais, causando obstáculo mecânico e modificação do modo respiratório de nasal para oral1818. Carvalho GD. Estruturas estomatognáticas alteradas na síndrome do respirador bucal. In Carvalho GD (org). S.O.S. Respirador bucal: uma visão funcional e clínica da amamentação. São Paulo: Lovise; 2003. p. 65-100.. Ademais, o uso da mamadeira por tempo prolongado pode ocasionar uma diminuição da ação mandibular, levando a língua a pressionar o bico da mamadeira contra o palato, o que pode ocasionar palato ogival1919. Cotrim LC, Venancio SI, Escuder MML. Uso de chupeta e amamentação em crianças menores de quatro meses no estado de São Paulo. Rev. bras. saúde matern. infant. [serial on the Internet], 2002 Set-Dez [cited 2016 Mar 29]; 3(2):245-52. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbsmi/v2n3/17094.pdf.
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. Entretanto a presença de hábito oral deletério não foi investigada nesta pesquisa, representando uma limitação deste estudo.

O aumento do tamanho e do volume das tonsilas faríngeas, encontrado nos pré-escolares que frequentavam as escolas privadas, podem apresentar predisposição a desordens do sono como a síndrome da apneia do sono (SAOS), embora outras causas possam acarretar SAOS, necessitando de maiores investigações2020. Sólyom R, Csiszér IR, Neagos A. Tonsillar hypertrophy implications in sleep disorders in adults and children. Rom J Morphol Embryol. [serial on the Internet], 2014 Jan [cited 2017 Nov 27];55(2 Suppl):603-6. Available from: http://www.rjme.ro/RJME/resources/files/551214603606.pdf.
http://www.rjme.ro/RJME/resources/files/...
. Os pré-escolares que apresentaram aumento das tonsilas faríngeas foram encaminhados para avaliação e conduta otorrinolaringológica.

Quando as tonsilas se apresentam com volume aumentado, há a adaptação do posicionamento da língua na cavidade intraoral. Desta forma, a língua adota uma postura mais rebaixada e anteriorizada e, consequentemente, entra em contato com as superfícies oclusais dentárias, podendo gerar má oclusão e adaptações das funções orais como a mastigação, a deglutição e a fala.

Várias são as consequências para o sistema estomatognático na presença de más oclusões, como a adaptação no vedamento labial e das funções de mastigação (com possibilidades de modificação da incisão do alimento, do padrão, ritmo e eficiência da trituração), de deglutição (produzida com atipia) e de fala (com distorção e imprecisão articulatória) - todos em decorrência da adaptação do posicionamento da língua ao executar diferentes ações2121. Vieira D, Carreira IP, Silva MR, Andrade JS, Santos FFD, César CPHAR. A interferência das más oclusões nas funções estomatognáticas. In: César CPHAR, Paranhos LR, Sordi C (eds). Coletâneas em saúde. São José dos Pinhais: Plena; 2017. p. 65-76..

Tendo em vista que quase a metade da amostra apresentou alterações oclusais, a inserção de medidas preventivas e o encaminhamento para a Odontopediatria foram efetivadas. Estudo2222. Sadakyio CA, Degan VV, Pignataro Neto G, Puppin Rontani RM. Prevalência de má oclusão em pré-escolares de Piracicaba-SP. Braz. dent. sci. [serial on the Internet], 2004 Abr-Jun [cited 2016 Apr 26]; 7(2):92-9. Available from: http://dx.doi.org/10.14295/bds.2004.v7i2.493.
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evidenciou alta prevalência de má oclusão em pré-escolares, com achados mais frequentes de mordida aberta anterior associada ao cruzamento de caninos e molares, corroborando com os achados obtidos neste estudo.

Não foram encontradas diferenças entre os pré-escolares relacionadas à mobilidade dos órgãos fonoarticulatórios, com exceção da diferença na aquisição da mobilidade de língua e bochechas entre as idades dos pré-escolares, verificando-se maior dificuldade entre os pré-escolares menores quando comparados aos maiores. Estudo33. Santos JC, Guedes-Granzotti RB, Barreto ACO, Oliveira CC, Silva K, Baldrighi SEZM et al. Small citizen project: health promotion and prevention of child nutrition and orofacial motricity disorders. Distúrb. Comun. [serial on the Internet] 2016 Mar [cited 2017 Nov 24]; 28(1):151-61. Available from: http://revistas.pucsp.br/index.php/dic/article/view/23939/19303.
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relatou resultados similares, acrescentando que a mobilidade da musculatura esquelética tende a melhorar com o avançar da idade, sendo que os movimentos mandibulares foram realizados sem dificuldades desde os três anos de idade, seguido pelos de lábios aos quatro anos e pelos de língua e bochechas aos cinco anos.

Em relação ao tônus das estruturas orofaciais triadas, os pré-escolares das instituições particulares apresentaram maior ocorrência de alterações, com resultados estatisticamente significantes. Alguns fatores podem influenciar no tônus da musculatura orofacial, como o modo respiratório alterado, as condições oclusais2323. Marchesan IQ. Avaliando e tratando o sistema estomatognático. In: Lopes Filho O (ed). Tratado de fonoaudiologia. São Paulo: Roca; 1997. p. 763-80. e de praxia, parecendo haver associação entre o tônus e os movimentos práxicos não verbais de língua e destes, com as alterações de fala2424. Farias SR, De Ávila CRB, Vieira MM. Relação entre fala, tônus e praxia não-verbal do sistema estomatognático em pré-escolares. Pró-Fono R. Atual. Cientif. [serial on the Internet] 2006 Set-Dez [cited 2016 Mar 29]; 18(3):267-76. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pfono/v18n3/a06v18n3.pdf.
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. A má oclusão, como observado nos resultados obtidos, foi mais encontrada nos pré-escolares das escolas particulares do que nas públicas, podendo justificar maiores alterações de tônus, uma vez que a respiração oral não revelou diferenças entre os grupos.

As funções orais que revelaram diferenças estatisticamente significativas entre os pré-escolares foram a deglutição (atípica) e a fala (em especial, os distúrbios fonéticos), apresentando-se piores nos pré-escolares da rede pública de ensino. As causas possíveis de deglutição atípica são a sucção de dedo/língua, alimentação por mamadeira, respiração oral2525. Machado Junior AJ, Crespo AN. Avaliação cefalométrica do espaço orofaríngeo em crianças com deglutição atípica. Braz. j. otorhinolaryngol. [serial on the Internet] 2012 Jan [cited 2016 Mar 29]; 78(1):120-5. Available from: http://www.scielo.br/pdf/bjorl/v78n1/v78n1a19.pdf.
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e má oclusão, sendo que quanto maior a severidade do quadro, maior é a probabilidade de associação com os distúrbios miofuncionais orofaciais2626. Suliano AA, Rodrigues MJ, Caldas Júnior ADFC, Fonte PP, Porto-Carreiro CF. Prevalência de maloclusão e sua associação com alterações funcionais do sistema estomatognático entre escolares. Cad. Saúde Pública [serial on the Internet] 2007 Ago [cited 2017 Sep 15]; 23(8):1913-23. Available from: http://pesquisa.bvs.br/brasil/resource/es/lil-456025.
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. As atipias na deglutição podem agravar ainda mais a má oclusão e acarretar distúrbios fonéticos na fala.

Quanto à fala, 79% dos pré-escolares apresentaram alterações, sendo essa porcentagem considerada um elevado índice de presença de simplificação de líquidas, ratificando a literatura2424. Farias SR, De Ávila CRB, Vieira MM. Relação entre fala, tônus e praxia não-verbal do sistema estomatognático em pré-escolares. Pró-Fono R. Atual. Cientif. [serial on the Internet] 2006 Set-Dez [cited 2016 Mar 29]; 18(3):267-76. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pfono/v18n3/a06v18n3.pdf.
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, apesar da faixa etária do estudo citado2424. Farias SR, De Ávila CRB, Vieira MM. Relação entre fala, tônus e praxia não-verbal do sistema estomatognático em pré-escolares. Pró-Fono R. Atual. Cientif. [serial on the Internet] 2006 Set-Dez [cited 2016 Mar 29]; 18(3):267-76. Available from: http://www.scielo.br/pdf/pfono/v18n3/a06v18n3.pdf.
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ser de pré-escolares entre quatro e cinco anos e a deste estudo terem sido incluídos pré-escolares até seis anos de idade. Além do exposto, houve forte associação entre as alterações de fala dos pré-escolares com a escolaridade baixa dos familiares dos frequentadores da escola pública. Partindo dessa perspectiva, pode-se inferir que quanto maior a escolaridade, maior a possibilidade de uso da norma culta falada na família e que, por conseguinte, será aprendida pelas crianças.

Sabe-se que distúrbios da fala podem acarretar em diversos prejuízos, como na alfabetização (dependendo da natureza do distúrbio), social-interacional e emocional. Pesquisa2727. Blood GW, Blood IM. Victims seeking help from speech-language pathologists: bullying, preparedness, and perceptions. Folia phoniatr. logop. 2016;68(1):29-36. evidenciou que crianças que sofrem bullying por apresentarem algum distúrbio de fala buscam ajuda dos fonoaudiólogos e que, apesar de tais profissionais terem recebido formação para atuação neste sentido, declararam-se despreparados para tanto, sendo o bullying muito frequente nas escolas pelo motivo apresentado. A pergunta lançada é: e os fonoaudiólogos brasileiros, sabem lidar com o bullying? E os demais profissionais que atuam com pré-escolares, como os pediatras, os enfermeiros entre outros? Este é um tema que merece maior atenção dos profissionais da área e de pesquisas que possam evidenciar a realidade e as medidas que devem ser tomadas. Afinal, segundo a literatura2828. Almeida KL, Cavalcante A, Silva JS. The importance of early identification of bullying: a review of the literature. Rev Pediatr. [serial on the Internet] 2008 Jan-Jun [cited 2017 Nov 27]; 9(1):8-16. Available from: http://www.conhecer.org.br/download/BULLYING/LEITURA%2011.pdf.
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, o bullying pode ser controlado precocemente quando detectado e conduzido de forma adequada pela família, escola e sociedade, de forma não isolada.

A partir dos resultados obtidos nas triagens, programas interventivos foram delineados para cada instituição participante de forma a abarcar as maiores dificuldades de seus pré-escolares. A duração dos programas foi de um ano e as atividades desenvolvidas foram semanais, com duração de uma hora. Assim, oficinas temáticas foram realizadas em sala de aula, com atividades estimulando a mobilidade dos órgãos fonoarticulatórios utilizando músicas; conscientização da mastigação e da deglutição por meio da dramatização utilizando fantoches e vídeos; trabalho com consciência fonológica em dinâmicas de grupo, pistas proprioceptivas táteis-cinestésicas, visuais e auditivas; oficinas de contos sobre higienização dentária, hábitos orais deletérios e bullying. Foram disponibilizados materiais educativos com definição, fatores etiológicos, sinais e sintomas, cuidados e condutas frente a respiração oral, má oclusão, distúrbios de fala e fissura lábiopalatina; e material didático para os educadores sobre a aquisição e desenvolvimento da fala. Foram realizadas também uma avaliação semanal do programa por parte dos pré-escolares (com ideogramas simbolizando alegria - indicando satisfação; regular - ideograma simbolizando face neutra e tristeza - indicando insatisfação), e dos educadores (entrevista individual); bem como reuniões bimestrais com os familiares (em reuniões próprias para tal finalidade). Os encaminhamentos foram efetivados para diferentes profissionais da saúde (otorrinolaringologistas, odontopediatras, nutricionistas e fonoaudiólogos). As avaliações evidenciaram satisfação com os programas implantados pela maioria dos participantes.

Assim, é possível afirmar que ações integradas dos diferentes profissionais da saúde são necessárias para a minimização destes agravos, que podem interferir nas funções sociais de comunicação e alimentação, bem como na estética facial.

Conclusão

A maioria dos pré-escolares apresentou alteração no sistema estomatognático, sendo que as crianças de instituições particulares tiveram mais alterações em relação ao tônus, aspectos estruturais de bochechas, palato e oclusão. Crianças das instituições públicas apresentaram mais alterações na simetria facial, deglutição e fala, justificando a importância da triagem para levantamentos epidemiológicos, bem como para a implantação de ações preventivas e interdisciplinares dos distúrbios miofuncionais orofaciais, no âmbito de instituições de educação infantil.

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  • Fonte de Financiamento: Pesquisa financiada pela Universidade Federal de Sergipe, Sergipe, Brasil, com bolsa de iniciação científica Pibic.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    23 Abr 2018
  • Aceito
    20 Dez 2018
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