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Associação entre falha nas emissões otoacústicas e indicador de risco para a perda auditiva

RESUMO

Objetivo:

descrever os resultados de um programa de saúde auditiva neonatal e verificar se há associação entre presença de indicador de risco para perda auditiva e falhas nos testes e no diagnóstico.

Métodos:

trata-se do estudo de uma coorte, observacional e retrospectiva, com dados secundários contidos em planilha eletrônica sobre condições sociodemográficas da família, história clínica e resultados dos exames de 7.800 participantes que realizaram a Triagem Auditiva, de 2010 a 2016. Na descrição da primeira e segunda etapa, utilizou-se frequência absoluta e valores percentuais. Na associação entre indicador de risco com falhas nas EOA, utilizaram-se Odds Ratio, Intervalo de Confiança e nível de significância 0,5%.

Resultados:

dos 12 lactentes com perda auditiva, oito apresentaram como indicador de risco, a medicação ototóxica e permanência em UTI, sendo que a chance de falhar nas EOA ocorreu com onze indicadores. A chance do diagnóstico de perda auditiva foi 13 vezes maior quando há indicador de risco, 18 vezes maior quando usou medicação ototóxica e 16,62 vezes maior com permanência em UTI.

Conclusão:

os resultados mostram que conhecer os indicadores levará à reflexão de ações a serem adotadas pela equipe responsável.

Descritores:
Triagem Neonatal; Perda Auditiva; Sistema Único de Saúde

ABSTRACT

Purpose:

to describe the results of a neonatal hearing health program and verify whether there is an association between the presence of risk indicators for hearing loss and failure in the tests and diagnosis.

Methods:

a one-cohort, observational, retrospective study with secondary data contained in a spreadsheet concerning the family’s sociodemographic condition, clinical history, and examination results of 7,800 participants who were submitted to hearing screening between 2010 and 2016. Absolute frequency and percentages were used in the description of the first and second stages. In the association between risk indicators and failures in the otoacoustic emissions, the odds ratio, confidence interval, and significance level at 0.5% were used.

Results:

the risk indicators in 8 out of the 12 infants presented with hearing loss were ototoxic medication and intensive care unit (ICU) stay, whereas the likelihood of failure in the otoacoustic emissions occurred along with 11 indicators. The likelihood of a diagnosis of hearing loss was 13 times greater when there was a risk indicator, 18 times greater when an ototoxic medication had been used, and 16.62 times greater when they stayed in ICUs.

Conclusion:

the results show that knowing the indicators leads to considering the actions the team in charge should take.

Keywords:
Neonatal Screening; Hearing Loss; Unified Health System

Introdução

A perda auditiva é uma privação sensorial que traz prejuízo à aquisição da linguagem e ao desenvolvimento da fala, porém pode ser minimizado com o diagnóstico precoce da deficiência11. Bevilacqua MC, Formigoni GMP. Audiologia educacional: uma opção terapêutica para a criança deficiente auditiva. 3ª ed. Carapicuiba, SP: Pró-Fono; 1998.. Para detectá-la, o Joint Committee on Infant Hearing (JCIH), desde 1994, recomendou a Triagem Auditiva Neonatal (TAN) para todos os recém-nascidos, visto que a presença de indicador de risco para perda auditiva (IRDA) pode ser identificada em apenas 50% dos pacientes com perda auditiva22. Northern JL, Downs MP. Desenvolvimento do comportamento auditivo. In: Northern JL, Downs MP, editors. Audição em crianças. 3a ed. São Paulo: Manole; 1989. p.101-41.,33. Lewis DR, Marone SAM, Mendes BCA, Cruz OLM, Nóbrega M. Comitê multiprofissional em saúde auditiva: COMUSA. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(1):121-8..

Em 2012, o Ministério da Saúde lançou as Diretrizes da Atenção à Triagem Auditiva Neonatal, com o objetivo de oferecer orientações às equipes multiprofissionais para o cuidado da saúde auditiva na infância, em especial à Triagem Auditiva Neonatal, devendo ser contemplada em duas etapas, a primeira denominada teste e a segunda como reteste44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il..

Durante a primeira etapa da TAN, o profissional realiza o levantamento da história clínica do neonato com a identificação dos riscos para perda auditiva, devido ao elevado número de alterações nos exames da TAN, e o aparecimento tardio de perda auditiva55. Joint Committee on Infant Hearing. Year 2019 Position Statement: Principles and Guidelines for Early Hearing Detection and Intervention Programs. J Early Hear Detect Interv. 2019;4(2):1-44.,66. Azevedo MF. Avaliação audiológica infantil. In: Marchesan IQ, Justino H, Tomé MC, editors. Tratado de especialidades em fonoaudiologia. São Paulo: Guanabara Koogan; 2014. p. 924-9.. Em seguida, caso o recém-nascido não apresente IRDA, deve-se utilizar como primeiro teste, o de Emissões Otoacústicas Evocadas (EOA), e na ocorrência de falha, ou seja, se ocorrer uma resposta considerada insatisfatória, o mesmo teste deve ser repetido imediatamente. Se a falha persistir, o exame de Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (Peate-Automático ou em modo triagem) é realizado, ainda nessa primeira etapa44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il.. Entretanto, para o recém-nascido que apresentar IRDA, o primeiro teste deverá ser realizado com o exame Peate-Automático ou em modo triagem, pois a prevalência de perdas auditivas retrococleares é maior nessa população, e sem a possibilidade de identificação por meio do exame de EOA44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il..

Na segunda etapa, destinada aos recém-nascidos com ou sem IRDA e que tiveram uma resposta insatisfatória durante a etapa do teste, utiliza-se o exame de Peate-Automático ou em modo triagem, em até 30 dias do último teste, e quando a falha persistir, deverá ser realizado o encaminhamento ao serviço de Alta Complexidade, para confirmação do diagnóstico e protetização44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il..

As recomendações quanto à metodologia para os programas de TAN devem ser adequadas à realidade de cada município, pois podem não atender às necessidades locais de saúde de um país diverso como o Brasil, sem comprometer a identificação, o diagnóstico e a intervenção com as crianças com perdas auditivas a partir de 35 dBNA, congênitas, permanentes, ou de início na etapa neonatal77. Lewis DR, Chapchap MJ. Triagem auditiva neonatal universal: boas práticas atuais. In: Marchesan IQ, Silva HJ, Tomé MC, editors. Tratado das especialidades em fonoaudiologia. São Paulo: Guanabara Koogan; 2014. p. 867-77..

Vários estudos identificaram os indicadores de risco para deficiência auditiva e suas associações com a falha no teste e reteste, especificamente de uma ou mais maternidades de um município88. Vernier LS, Castelli CTR, Rothermel SS, Paniz TC, Zanini C, Levandowski DC. Triagem auditiva neonatal em hospital da rede cegonha. Rev Bras Promoç Saúde. 2019;32:8965.,99. Rezende ALF, Resende LM, Carvalho EAA, Avan P, Carvalho SAC. Evaluation of children with risk indicators for hearing loss in a Newborn Hearing Screening Reference Service. Distúrb. Comun. 2019;31(4):630-40., onde se realizou a TAN, entretanto a proposta desta pesquisa é mostrar o resultado de um programa de saúde auditiva infantil, incluindo todos os neonatos nascidos vivos residentes neste município.

Sendo assim, o Programa de Saúde Auditiva do município de Mogi Mirim, SP, Brasil, trará a dimensão das características regionais, com relação aos IRDAS, e assim, favorecer as discussões e implantações de ações de prevenção e promoção à saúde, entre a rede de cuidado à saúde infantil municipal e intermunicipal, e servir de modelo para outras equipes.

Considerando a importância de seguir a legislação vigente, para se triar de forma universal todos os neonatos residentes em Mogi Mirim, e de se conhecer os resultados do programa de saúde auditiva infantil em todas as suas etapas, como uma forma de avaliação do serviço prestado, esse estudo teve como objetivos descrever os resultados de um programa de triagem auditiva neonatal e verificar se há associação entre falha nos exames e presença de indicador de risco para perda auditiva nas três etapas do programa: teste, reteste e diagnóstico.

Métodos

O projeto desta pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, SP, Brasil, com aprovação dia 06/02/2018, sob o nº de parecer 2.487.739.

Trata-se do estudo de uma coorte, observacional e retrospectiva, constituída por todos os inscritos no Sistema de Informação Municipal, que realizaram a Triagem Auditiva Neonatal, de 2010 até 2016.

O município de Mogi Mirim implantou o serviço de Fonoaudiologia há 33 anos e conta atualmente com 13 profissionais que se dedicam ao Programa de Saúde Auditiva Neonatal na Atenção Primária e Especializada.

A pesquisa foi realizada com dados secundários, obtidos por meio de um livro de registro, utilizado para a construção do primeiro banco de dados, desde o início do programa no município, em 2009. Nele foram inseridas informações do recém-nascido, contidas no Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC)1010. Ministério da Saúde. Brasil. SINASC-DATASUS. Sistema de Informação de Nascidos Vivos. [Accessed on 2018 January 15]. Available at: http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=060702.
http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index...
, variáveis sociodemográficas da família, história clínica com o IRDA, data e resultados dos exames e encaminhamentos realizados. Em 2015, esses dados foram inseridos em planilha eletrônica e ampliados com as informações dos livros de registro das gestantes e do programa de monitoramento do desenvolvimento da audição e da linguagem, para facilitar a análise das variáveis e a avaliação do programa.

Na primeira etapa do Programa de Saúde Auditiva Neonatal, realizou-se o levantamento do histórico clínico com as informações dos indicadores de risco para perda auditiva segundo as Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal, sendo que foram considerados recém-nascidos com IRDA, os que apresentaram, no mínimo, um dos seguintes indicadores: antecedente familiar de surdez permanente, com início desde a infância; consanguinidade; permanência na UTI por mais de cinco dias; ventilação mecânica; exposição a drogas ototóxicas; hiperbilirrubinemia com necessidade de exsanguineotransfusão; anóxia peri natal grave; Apgar neonatal de 0 a 4 no primeiro minuto, ou 0 a 6 no quinto minuto; peso ao nascer inferior a 1.500 grs; infecções congênitas; anomalias; síndromes genéticas; distúrbios neurodegenerativos; infecções bacterianas ou virais pós-natais; e traumatismo craniano44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il.. Entretanto, para esse estudo, foram acrescentados os indicadores convulsões neonatais, uso de drogas, hemorragia peri-intra ventricular33. Lewis DR, Marone SAM, Mendes BCA, Cruz OLM, Nóbrega M. Comitê multiprofissional em saúde auditiva: COMUSA. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(1):121-8. e o nascimento pré-termo66. Azevedo MF. Avaliação audiológica infantil. In: Marchesan IQ, Justino H, Tomé MC, editors. Tratado de especialidades em fonoaudiologia. São Paulo: Guanabara Koogan; 2014. p. 924-9..

Em seguida, todos os recém-nascidos residentes realizaram o teste de Emissões Otoacústicas Transientes (EOAT), com o equipamento Maico Ero-Scan, o qual testa as frequências de 1,5 kHz a 4 kHz, considerando como critério de passa, a relação sinal/ruído superior a 4dBNPS em 1 kHZ e superior a 6 dB NPS nas demais frequências, em pelo menos 3 frequências avaliadas, incluindo 4kHz, conforme as especificações do equipamento utilizado.

Quando o neonato apresentou um ou mais IRDA, o mesmo foi encaminhado para o exame de Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (Peate). De acordo com as diretrizes do município, todos os neonatos foram encaminhados ao programa de monitoramento do desenvolvimento da audição e da linguagem, com um profissional fonoaudiólogo na Atenção Primária.

Quando os neonatos falhavam no primeiro teste, eram encaminhados à etapa de reteste, também realizada com o exame de EOAT e quando o resultado de falha persistia, realizavam-se os exames de timpanometria e a pesquisa dos reflexos do músculo do estribo. Caso o resultado não estivesse dentro da normalidade, encaminhava-se o neonato ao médico otorrinolaringologista. A classificação dos resultados dos exames seguiu o guia de orientação na avaliação audiológica do sistema de conselhos de fonoaudiologia1111. Sistema de Conselhos de Fonoaudiologia. Guia de orientação na avaliação audiológica básica. 2017. [Accessed on 2019 December 28]. Available at: https://www.fonoaudiologia.org.br/cffa/wp-content/uploads/2013/07/Manual-de-Audiologia.pdf.
https://www.fonoaudiologia.org.br/cffa/w...
.

Se o resultado do exame das medidas de imitância, apresentar uma curva timpanométrica do tipo A, e reflexo do músculo do estribo presente, o mesmo era encaminhado para a etapa de diagnóstico, com o exame de Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico (Peate), com o equipamento Pentetek - Audtec - Potencial de tronco cerebral do sistema Audiscan que avalia, por meio do estímulo clique, a integridade da via auditiva e as frequências de 2 a 4 kHz, e com frequência específica, a de 1000Hz. Quando se constatava alteração no exame de Peate, o recém-nascido era inserido no programa de reabilitação do município e encaminhado ao Hospital de Referência, para confirmação do diagnóstico e protetização.

Para a descrição da primeira e segunda etapa da TAN, utilizou-se frequência absoluta (n) e valores percentuais. Para verificar a associação entre a presença de IRDA com as falhas nas EOAT, no teste e reteste, e no diagnóstico de perda auditiva, utilizou-se as medidas de Odds Ratio, Intervalo de Confiança, com nível de significância de 0,5%. A média foi considerada para o cálculo da idade de realização do reteste.

Resultados

Participaram do Programa de Saúde Auditiva Neonatal do Município de Mogi Mirim, 7.800 recém-nascidos, entre 2010 e 2016.

Referente à primeira etapa do teste, dos 7.800 participantes, 993 (12,73%) apresentou IRDA e 155 (15,60%) falharam no primeiro teste. Dos 6807 sem IRDA, 351 (5.15%) falharam no primeiro teste. No total, 506 neonatos foram encaminhados para o reteste. A média de idade do primeiro teste foi de 17 dias e a média do agendamento do reteste foi de 28 dias após o primeiro exame.

Na Tabela 1, verifica-se que o indicador de risco para deficiência auditiva mais frequente foi a prematuridade (n=571; 7,32%).

Na medida de associação entre falha no primeiro exame de EOAT e os indicadores de risco para perda auditiva, a chance de um participante falhar nas EOAT está associada aos seguintes riscos: anomalias craniofaciais, peso de nascimento inferior a 1.500 g, Apgar menor que 7 no 5º minuto, uso de drogas, anóxia peri-natal, ventilação mecânica, permanência em UTI neonatal por mais de 5 dias, nascimento pré-termo, síndromes, infecção congênita, medicação ototóxica e hiperbilirrubinemia.

Tabela 1:
Distribuição dos Indicadores de Risco para Deficiência Auditiva ao nascimento na população estudada e associação com a falha no primeiro teste de Emissões Otoacústicas

Na etapa do reteste, a média de idade do neonato foi de 60 dias. Dos 460 (92,18%) que compareceram ao reteste, 348 (75,65%) passaram, 78 (22,41%) com IRDA e 270 (77,58%) sem IRDA. Destes, 112 (24,35%) continuaram falhando no teste, sendo 56 (50%) com IRDA e 56 (50%) sem IRDA. No estudo de associação da presença de IRDA e a falha no teste e reteste, a chance de falhar no teste foi de 3,40 (IC 95%: 2,78-4,15) e no reteste de 3,46 (IC 95%: 2,21-5,42), o que mostra chance semelhante nos dois exames, quando há presença de IRDA.

Tabela 2:
Associação entre os indicadores de risco para deficiência auditiva e o resultado do primeiro teste da Triagem Auditiva Neonatal e do reteste

Dos 7.800 neonatos triados, diagnosticou-se 12 com perda auditiva, 8 (66,66%) com IRDA e 4 (33,34%) sem a presença de IRDA, sendo que os indicadores mais frequentes foram medicação ototóxica (75%) e a permanência em UTI neonatal por mais de cinco dias (62,50%), de acordo com a Tabela 3.

Observou-se também que dos 6 (75%) neonatos com histórico de uso de medicação ototóxica, 5 apresentavam outros IRDAS, sendo que permanência em UTI neonatal por mais de cinco dias foi comum a todos. Porém, em um dos participantes, a presença de medicação ototóxica ocorreu durante a infância, devido ao tratamento constante de otite média.

Tabela 3:
Descrição dos indicadores de risco para deficiência auditiva apresentados pelos participantes com perda auditiva

Dos 8 participantes com IRDAS, observou-se que 2 (25%) tinham IRDA ao nascimento, sendo em um dos participantes a ocorrência de anóxia de parto e um com prematuridade, porém não detectado durante o levantamento do histórico clínico, momento que antecede o primeiro exame de EOA.

Das 12 perdas auditivas, 10 eram neurossensoriais bilaterais e duas neurossensoriais unilaterais.

Com relação ao estudo da associação da presença de IRDA ao nascimento e diagnóstico da perda auditiva permanente, a chance de um participante com IRDA apresentar alteração é 13 vezes maior com relação ao que não apresenta IRDA. No caso de uso de medicação ototóxica ou permanecer em UTI neonatal por mais de 5 dias, a chance de apresentar perda auditiva é de 18 e 16.62 vezes maior, respectivamente, nos participantes com a presença de IRDA com relação aos que não apresentam (Tabela 4).

Tabela 4:
Associação entre a presença de indicador de risco para a deficiência auditiva ao nascimento e o diagnóstico de perda auditiva permanente

Discussão

As diretrizes brasileiras e a literatura internacional recomendam a Triagem Auditiva Neonatal antes da alta hospitalar, para garantir a adesão dos neonatos e a universalidade da triagem, pois se sabe que o retorno ao hospital gera um problema de ordem social44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il.,55. Joint Committee on Infant Hearing. Year 2019 Position Statement: Principles and Guidelines for Early Hearing Detection and Intervention Programs. J Early Hear Detect Interv. 2019;4(2):1-44.. Entretanto, é realidade no Brasil o modelo ambulatorial como o mais viável, devido tanto às diferenças sociodemográficas do país quanto também pela falta de recursos humanos e equipamentos necessários nas maternidades1212. Lima MCMP, Rossi TRF, Françozo MFC, Collela-Santos MF, Correa CR. Analysis of neonatal hearing screening program performed on an outpatient basis. Int J Pediatric Otorhinolaryngol. 2015;79(12):2227-33.,1313. Januário GC, Lemos SMA, de Lima Friche AA, Alves CR. Quality indicators in a newborn hearing screening service. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(3):255-63..

O município de Mogi Mirim optou pelo Programa de Saúde Auditiva Neonatal Ambulatorial, pois na época da implantação, no ano de 2009, não havia recursos humanos suficientes para ser esse serviço em nível hospitalar, além da atenção hospitalar não pertencer à rede municipal de saúde. Para a implantação do Programa, a equipe de Fonoaudiologia teve a colaboração do controle social e dos gestores municipais, os quais viabilizaram o recurso financeiro para a compra de equipamento e a capacitação dos recursos humanos para a realização dos exames. É importante ressaltar que o Programa foi construído com o envolvimento de profissionais de todos os níveis de atenção à saúde, da Atenção Primária, Especializada e Hospitalar. O Programa de Saúde Auditiva Neonatal do município de Mogi Mirim é referência para todos os nascidos vivos residentes, independentemente do local e município de ocorrência do parto, e em alguns casos a outros municípios, pertencentes ao Sistema Único de Saúde, convênios ou rede particular.

Da população estudada, durante a primeira etapa da TAN, após o levantamento dos indicadores de risco para a perda auditiva, 993 participantes (12,30%) apresentaram indicador de risco para perda auditiva. Esse resultado é semelhante ao de estudos brasileiros realizados em Belo Horizonte, Curitiba e em outro país, na Polônia, com 13%, 12% e 11,3%, respectivamente, porém maior quando comparado às diretrizes do Ministério da Saúde, de 10%44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il.,1313. Januário GC, Lemos SMA, de Lima Friche AA, Alves CR. Quality indicators in a newborn hearing screening service. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(3):255-63.

14. Sabbarg JC, Lacerda ABM. Neonatal hearing screening in primary health care and family health care. CoDAS. 2017;29(4):e20160102.
-1515. Wroblewska-Seniuk K, Greczka G, Dabrowski P, Szyfter W, Mazela J. The results of newborn hearing screening by means of transient otoacoustic emissions - has anything changed over 10 years? Int J Pediatric Otorhinolaryngol. 2017;96(5):4-10..

Observou-se nesse estudo que o indicador de risco para perda auditiva mais frequente foi a prematuridade, com 7,30% dos participantes, resultado semelhante à pesquisa realizada em um serviço da Estratégia Saúde da Família, com 6% de neonatos com esse indicador1212. Lima MCMP, Rossi TRF, Françozo MFC, Collela-Santos MF, Correa CR. Analysis of neonatal hearing screening program performed on an outpatient basis. Int J Pediatric Otorhinolaryngol. 2015;79(12):2227-33.. Porém, em outra pesquisa no município de Botucatu, a prematuridade representou dado superior, com 24% dos neonatos, mas o fato da amostra ter sido composta apenas por participantes com risco para perda auditiva pode ter influenciado nesse resultado1616. Silva DPC, Lopez PS, Ribeiro GE, Luna MOM, Lyra JC, Montovani JC. The importance of retesting the hearing screening as an indicator of the real early hearing disorder. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(4):363-7..

Referente à primeira etapa do teste, a média de idade da realização do exame foi de 17 dias, sendo que 5,15% falharam, e todos foram encaminhados ao reteste. Achados semelhantes foram encontrados em outros estudos, com resultado de 6%, 7% e 6% para as falhas, sendo estes acima do proposto pelos indicadores de qualidade1414. Sabbarg JC, Lacerda ABM. Neonatal hearing screening in primary health care and family health care. CoDAS. 2017;29(4):e20160102.,1313. Januário GC, Lemos SMA, de Lima Friche AA, Alves CR. Quality indicators in a newborn hearing screening service. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(3):255-63.,1717. Bertoldi P, Manfredi A, Mitre E. Analysis of the results of newborn hearing screening in the city of Batatais. Medicina Ribeirão Preto. 2017;50(3):150-7..

Em uma pesquisa, realizada em Luxemburgo, observou-se que a idade do neonato pode influenciar passar ou não no teste e que 95% apresentam resultado satisfatório quando realizaram a TAN entre o quarto e o quinto dias de vida. Portanto, antes da alta hospitalar, a porcentagem do neonato falhar é maior, fato que reafirma a importância da TAN nos primeiros 30 dias de vida, e consequentemente, reduz a probabilidade de falha, o encaminhamento ao reteste e à etapa diagnóstica1818. Panosetti E, Shi BX, Eloy JP, Orband D, Rasque E. Oto-émissions provoquées à la naissance: l'expérience luxembourgeoise. Arch Pediatr. 1999;6(2):353-5.. Portanto, observa-se que Programa em nível ambulatorial, como o da atual pesquisa, pode ter melhores indicadores com relação à porcentagem de falha no primeiro teste quando comparados com os Programas hospitalares.

No atual estudo, os participantes realizaram o reteste com média de agendamento de 28 dias, após o primeiro exame de EOAT, conforme a orientação do Comitê Multiprofissional em Saúde Auditiva, pois reduz a ocorrência de falso-positivos devido à presença de vérnix na orelha externa nos primeiros dias de vida33. Lewis DR, Marone SAM, Mendes BCA, Cruz OLM, Nóbrega M. Comitê multiprofissional em saúde auditiva: COMUSA. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(1):121-8.. Porém, 24,35% dos participantes falharam no reteste, índice superior ao encontrado em estudo anterior, de 10,96%1919. Marinho ACA, Pereira ECS, Torres KKC, Miranda AM, Ledesma ALL. Evaluation of newborn hearing screening program. Rev Saúde Publica. 2020;54(1):44-51.. Entretanto, a média de idade do reteste foi de 60 dias e os fatores que podem ter contribuído para esse resultado foram: falta nos agendamentos, presença de vérnix no meato acústico externo ou infecções da orelha média.

A adesão ao reteste foi de 92,18%, valores superiores aos estudos de programas ambulatoriais realizados, como em Belo Horizonte e Campinas, com 71,9% e 85% respectivamente1212. Lima MCMP, Rossi TRF, Françozo MFC, Collela-Santos MF, Correa CR. Analysis of neonatal hearing screening program performed on an outpatient basis. Int J Pediatric Otorhinolaryngol. 2015;79(12):2227-33.,1313. Januário GC, Lemos SMA, de Lima Friche AA, Alves CR. Quality indicators in a newborn hearing screening service. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(3):255-63.. Porém, quando comparado com pesquisa de programa em ambiente hospitalar como, por exemplo, do município de Botucatu e Sobradinho, a adesão ao reteste foi de 70% e 71,1%, respectivamente, sendo interessante ressaltar que essa etapa foi realizada após a alta1616. Silva DPC, Lopez PS, Ribeiro GE, Luna MOM, Lyra JC, Montovani JC. The importance of retesting the hearing screening as an indicator of the real early hearing disorder. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(4):363-7.,1919. Marinho ACA, Pereira ECS, Torres KKC, Miranda AM, Ledesma ALL. Evaluation of newborn hearing screening program. Rev Saúde Publica. 2020;54(1):44-51.. Esses achados seguem a orientação do JICH aos programas de triagem com duas etapas, de que o encaminhamento ao reteste deverá ser de 5% a 20% do total dos participantes avaliados, e o índice de comparecimento no reteste aos programas com maior tempo de implantação deverá superar 90%55. Joint Committee on Infant Hearing. Year 2019 Position Statement: Principles and Guidelines for Early Hearing Detection and Intervention Programs. J Early Hear Detect Interv. 2019;4(2):1-44..

Fatores que podem contribuir a esse importante dado, ou seja, a significativa adesão ao programa, podem estar relacionados à orientação dada a gestante a respeito da importância da triagem auditiva neonatal, da possibilidade de um reteste e o envolvimento de toda uma equipe de profissionais, tais como o Fonoaudiólogo responsável pelo teste e reteste, o Assistente Social e a busca ativa constante, além do envolvimento dos profissionais da Atenção Básica, em especial do Agente Comunitário de Saúde, dos Fonoaudiólogos e até das Recepcionistas das unidades básicas de saúde. Porém, há programas com melhores resultados, como a do município de Batatais, uma cidade do interior do estado de São Paulo, com 95,07% de adesão1717. Bertoldi P, Manfredi A, Mitre E. Analysis of the results of newborn hearing screening in the city of Batatais. Medicina Ribeirão Preto. 2017;50(3):150-7.. Portanto, garantir a conscientização das famílias sobre a importância da triagem auditiva neonatal e as consequências da perda auditiva ao desenvolvimento infantil, é essencial para a adesão em todas as etapas de um programa de TAN2020. Archana RS, Reethu MS, Vibha V. Is awareness of infant hearing screening in India still in its infancy. A Survey. Glob J Otolaryngol. 2019;19(5):94-8..

Outro fator importante, para a adesão ao reteste, diferentemente de outros estudos publicados, principalmente, quando se compara com programas em nível hospitalar, é que todas as etapas acontecem no mesmo local, consequentemente, cria-se um vínculo com as famílias, além do agendamento do reteste ser realizado pela fonoaudióloga responsável pelo primeiro teste, no mesmo dia em que ocorre a falha, momento em que se orienta da importância do comparecimento.

O estudo da associação entre a presença de indicador de risco e falha no primeiro exame com as EOAT no teste e reteste mostrou semelhança, sendo que a chance de falhar foi de 3,40 e 3,46 vezes no grupo de crianças com IRDA do que em relação ao sem indicador de risco, respectivamente. O estudo realizado em Belo Horizonte, encontrou 2,4 vezes maior o risco de falhar no exame no grupo de crianças com risco para a perda auditiva do que no grupo sem IRDA, e não houve diferença com significância estatística entre os grupos do reteste1313. Januário GC, Lemos SMA, de Lima Friche AA, Alves CR. Quality indicators in a newborn hearing screening service. Braz J Otorhinolaryngol. 2015;81(3):255-63..

Com relação à associação da falha nas EOA e os IRDAS, o estudo realizado por Oliveira et al., também não encontrou associação entre a falha nas EOA com o histórico familiar e as infecções congênitas. Entretanto, há dados semelhantes com o presente estudo, pois também encontraram associação com a ocorrência de malformação craniofacial, peso ao nascimento inferior a 1.500g, hiperbilirrubinemia, ventilação mecânica, apgar menor que 7 no 5º minuto, e síndromes2121. Oliveira CS, Santiago DB, Valente JSP, Borja ALVF, Bernardi APA. Prevalence of risk indices for hearing loss in 'failure' results of newborn hearing screening. Rev. CEFAC. 2015;17(3):827-35..

Quanto aos achados da conclusão do diagnóstico, dos 7.800 participantes, 12 foram diagnosticados com perda auditiva, sendo que 8 (66,66%) apresentaram IRDA ao nascimento e 4 (33,34%) não apresentaram, o que mostra a importância da triagem auditiva neonatal universal, conforme as diretrizes da literatura internacional e nacional33. Lewis DR, Marone SAM, Mendes BCA, Cruz OLM, Nóbrega M. Comitê multiprofissional em saúde auditiva: COMUSA. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(1):121-8.

4. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il.
-55. Joint Committee on Infant Hearing. Year 2019 Position Statement: Principles and Guidelines for Early Hearing Detection and Intervention Programs. J Early Hear Detect Interv. 2019;4(2):1-44.. Dados semelhantes foram encontrados em um estudo realizado na Índia, pois a maior porcentagem de perda auditiva foi entre os participantes com IRDA, colaborando para a conclusão sobre a importância da realização da avaliação auditiva em todos os recém-nascidos2222. James M, Kumar P, Ninan PJ. A study on prevalence and risk factors of hearing impairment among newborns. Int J of Contemp Pediatr. 2018;5(2):304-9..

Entre os oito participantes com indicador de risco e diagnosticados com perda auditiva, em 6 (75%) o IRDA mais frequente foi a medicação ototóxica (75%), sendo que 5 apresentaram esse IRDA ao nascimento e também a permanência em UTI neonatal (UTIN) por mais de cinco dias. Esses dados são semelhantes ao estudo realizado em um hospital universitário, com lactentes advindos da UTIN, pois a medicação ototóxica foi o IRDA mais frequente nessa população (73%)2323. Rechia IC, Liberalesso KP, Angst OVM, Garcia FD, Garcia MV, Biaggio EPV. Intensive care unit: results of the Newborn Hearing Screening. Braz J Otorhinolaryngol. 2016;82(1):76-81..

Um participante deste estudo fez uso de medicação ototóxica durante a infância, utilizada ao tratamento de otites de repetição. Vários autores apontam que estratégias para prevenir a perda auditiva devem incluir objetivos para reduzir as infecções de orelha média, como as otites, além do uso de antibióticos ototóxicos durante o período fetal, neonatal e infantil, minimizar o som ambiente das UTIN, orientação aos pais sobre o risco de perda auditiva progressiva ou tardia, e assim prevenir ou minimizar o risco de lesão na cóclea2424. World Health Organization. Childhood Hearing Loss: Strategies for prevention and care. World Health Organization: Geneva, Switzerland. 2016;1-28.,2525. Garinis AC, Kemph A, Tharpe AM, Weitkamp JH, McEvoy C, Peter S et al. Monitoring neonates for ototoxicity. Int J Audiol. 2018;57(4):54-61..

Importante ressaltar que esse participante com a presença de IRDA durante a infância, participou do programa de monitoramento do desenvolvimento infantil na Atenção Primária com a fonoaudióloga de referência do seu território, e por meio da interface com a Atenção Especializada, diagnosticou-se a perda auditiva. Esse dado mostra a importância do monitoramento do desenvolvimento infantil das crianças independente da presença do IRDA, como é realizado no município dessa pesquisa, embora as Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal do Ministério da Saúde oriente o monitoramento apenas às crianças com IRDA44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il..

Dos oito participantes com IRDAS, observou-se que dois (25%) tinham IRDA ao nascimento, sendo a ocorrência de anóxia de parto e a prematuridade os indicadores presentes, porém não detectado durante o levantamento do histórico clínico, momento que antecede o primeiro exame de EOA. Especificamente nesses dois casos, é importante ressaltar que os profissionais da Atenção Primária observaram atraso no desenvolvimento infantil e os lactentes foram então encaminhados aos profissionais da Atenção Especializada, sendo que os dois níveis de atenção à saúde realizaram o levantamento dos IRDAS, não observados ao nascimento.

Diante desses resultados obtidos, os profissionais de todos os níveis de atenção e que realizam ações ao cuidado à criança deverão ter maior atenção com relação ao preenchimento e verificação da caderneta de saúde da criança durante todas as consultas, além de uma reflexão de nova abordagem à escuta da história clínica durante o pré-natal, o pós-natal e toda a infância.

Das 12 perdas auditivas, 10 (83,33%) eram neurossensoriais bilaterias, e duas (16,67%) neurossensoriais unilaterais. Em um estudo realizado em toda a região do Lácio, na Itália, encontraram-se dados semelhantes ao presente estudo, com porcentagem maior de perdas auditivas bilaterias, com 60% das crianças e 40% unilaterais2626. Turchetta R, Conti G, Marsella P, Orlando MP, Picciotti PM, Frezza S et al. Universal newborn hearing screening in the Lazio region, Italy. Ital J Pediatr. 2018;44(1):104.. Em outro estudo com 37 crianças de 0 a 11 anos e 11 meses, foram diagnosticadas 73% de crianças com perdas auditivas bilaterais e 27% unilaterais2727. Gouveia FN, Corteletti LCBJ, Silva BCS, Araujo EJ, Amantini RCB, Oliveira EB et al. Unilateral and asymmetric hearing loss in childhood. CoDAS. 2020;32(1):e20180280.. Entretanto, em um estudo realizado em um arquipélago da África, 100% dos participantes apresentaram perdas auditivas bilaterias e todos com IRDA2828. Abraham ZS, Alawy K, Massawe ER, Ntunaguzi D, Kahinga AA, Mapondella KB. Prevalence of hearing loss and associated factors among neonates in Zanzibar. Med J Zambia. 2018;45(2):98-105.. Dados relevantes, pois mostram a importância de considerar as diferenças regionais, para adoção de protocolos para a triagem auditiva neonatal e orientação para as equipes com relação aos resultados encontrados2929. Ribeiro GE, Montavani JC, Silva DPC. Neonatal hearing screening: the importance of the study of risk indicators for hearing loss. J Otolarynbgolent Res. 2017;8(3):00244..

Com relação ao estudo da associação da presença de IRDA ao nascimento e o diagnóstico da perda auditiva permanente, neste trabalho, os dados são diferentes, quando comparado a um estudo anterior realizado em um hospital de Minas Gerais, em que a chance de um participante com IRDA ter uma perda auditiva foi 8 vezes maior com relação aos que não tinham IRDA, e o uso de medicação ototóxica e a permanência em UTI neonatal por mais de 5 dias não teve significância estatística para a perda auditiva3030. Barboza ACS, Resende LM, Ferreira DBC, Lapertosa CZL, Carvalho SAS. Correlation between hearing loss and risk indicators in a neonatal hearing screening reference service. Audiol., Commun. Res. 2013;18(4):285-92.. Justifica-se, portanto, a importância do estudo em questão, de todo um município, que considera as diferenças regionais e colabora no planejamento de acordo com as necessidades locais.

Esta pesquisa foi possível de ser realizada, porque o Programa sempre se preocupou com a implantação de um banco de dados único, de todo o município, conforme as orientações da literatura nacional e internacional33. Lewis DR, Marone SAM, Mendes BCA, Cruz OLM, Nóbrega M. Comitê multiprofissional em saúde auditiva: COMUSA. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(1):121-8.

4. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de Atenção da Triagem Auditiva Neonatal / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas e Departamento de Atenção Especializada. Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 32 p.: il.
-55. Joint Committee on Infant Hearing. Year 2019 Position Statement: Principles and Guidelines for Early Hearing Detection and Intervention Programs. J Early Hear Detect Interv. 2019;4(2):1-44..

Importante também destacar, que as informações referentes ao IRDA e à idade do primeiro teste e reteste, dos recém-nascidos que não realizaram o primeiro exame de EOA, no Serviço de Fonoaudiologia, localizado no Centro de Especialidades de Mogi Mirim, conforme previstos na lei municipal são inseridos no banco de dados do Programa após o momento da busca ativa realizada pela gestão ou regulação do Programa. As ferramentas utilizadas na busca ativa são o contato telefônico, localização da família na atenção primária à saúde ou por e-mail enviado a outros Programas do município vizinho.

Conclusão

O presente estudo mostrou que a chance de falhar no primeiro exame e no reteste, com EOA, foi semelhante, quando um lactente apresentou IRDA. Portanto, reafirma a importância do levantamento dos indicadores de risco para a deficiência auditiva ao nascimento.

Os indicadores de risco mais frequentes foram o uso de medicação ototóxica e a permanência em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal por mais de cinco dias, mas a chance de falha no primeiro exame de Emissões Otoacústicas ocorreu com onze indicadores de risco para deficiência auditiva.

A chance de um lactente ser diagnosticado com perda auditiva foi 13 vezes maior quando apresentou indicador de risco, 18 vezes maior quando usou medicação ototóxica e 16,62 vezes maior quando permaneceu em unidade de terapia intensiva por mais de cinco dias.

Os dados reforçaram a importância da triagem auditiva neonatal universal, além do conhecimento dos indicadores de risco, para tomada de decisões e mudanças com relação às ações de prevenção e promoção à saúde, para o monitoramento e acompanhamento do desenvolvimento infantil e dos protocolos dos programas de saúde auditiva.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    22 Ago 2020
  • Aceito
    18 Jan 2021
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