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Habilidades comunicativas em crianças com transtorno do espectro autista: percepção clínica e familiar

RESUMO

Objetivo:

descrever as habilidades de comunicação de crianças com TEA considerando a perspectiva clínica e familiar.

Métodos:

foi analisada, a partir do ponto de vista dos pais e terapeutas, a linguagem de 10 crianças com TEA. Todas as crianças estavam em acompanhamento fonoaudiológico no ambulatório de uma Clínica Escola de Fonoaudiologia. Foram utilizados dois protocolos para coleta dos dados. O Autism Treatment Evaluation Checklist- ATEC, o qual foi aplicado com os pais das crianças, e o Protocolo de Avaliação de Habilidades Pragmáticas de Crianças com Transtornos do Espectro do Autismo - PAHPEA, o qual foi respondido pelos terapeutas. Após aplicação dos protocolos, os dados foram examinados por meio de uma análise estatística descritiva, utilizando-se da frequência absoluta e relativa, e inferencial por meio do teste de associação Qui-quadrado, com significância de 5% para todas as análises.

Resultados:

de acordo com as respostas apresentadas pelos terapeutas, uma expressiva presença de déficits comunicativos foi observada. No protocolo respondido pelos pais também foi possível observar a mesma tendência, uma vez que as crianças deixaram de pontuar em vários itens da Subescala I.

Conclusão:

os pais e terapeutas evidenciaram alterações nas habilidades comunicativas das crianças pesquisadas, ressaltando que, assim como os terapeutas, os quais possuem conhecimento técnico linguístico, os pais também podem ser bons informantes sobre o processo de desenvolvimento comunicativo de seus filhos.

Descritores:
Transtorno do Espectro Autista; Linguagem; Comunicação; Família; Fonoaudiologia

ABSTRACT

Objective:

to describe the communication skills of children with autistic spectrum disorder (ASD), considering the clinical and family perspective.

Methods:

from the point of view of parents and therapists, the language of ten children with ASD was analyzed. All children underwent speech therapy at the outpatient clinic of a Speech Therapy School. Two protocols were used for data collection. Autism Treatment Evaluation Checklist (ATEC), which was applied to the children's parents, and Protocol for Assessment of Pragmatic Skills of Children with Autism Spectrum Disorders - called Pragmatic Protocol (PP), which was answered by therapists. The data were examined through a descriptive statistical analysis, considering absolute and relative frequency, and inferential statistics, through the Chi-square test, with a 5% of significance for all analyses.

Results:

an expressive presence of communicative deficits, in the answers presented by the therapists, was seen. In the protocol answered by the parents, it was also possible to observe the same trend, since the children failed to score in several items of Subscale I.

Conclusion:

parents and therapists evidenced changes in the communicative skills of the children surveyed, and emphasized that therapists, who have technical linguistic knowledge, like parents, can also be good informants about their children's communicative development process.

Keywords:
Autistic Spectrum Disorder; Language; Communication; Family; Speech, Language and Hearing Sciences

Introdução

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) tem sido alvo de pesquisa e debates entre estudiosos há décadas, mais precisamente desde sua primeira descrição, na década de 4011. Kanner L. Autistic disturbances of affective contact. Nerv Child. [jornal on the internet] 1943 [accessed on 2018 apr 09]; (2):217-50. Available at: http://www.neurodiversity. com/library_kanner 1943.pdf
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. Desde então, tais estudiosos se mobilizam em torno deste transtorno em busca de compreensão e consequente explicação de todos os processos que o caracterizam.

Em 1943, Leo Kanner publicou "Distúrbios autísticos de contato afetivo" na revista Nervous Child. Descreveu, pela primeira vez, 11 casos de crianças com autismo, relatando o comportamento e a educação de cada criança de dois a oito anos11. Kanner L. Autistic disturbances of affective contact. Nerv Child. [jornal on the internet] 1943 [accessed on 2018 apr 09]; (2):217-50. Available at: http://www.neurodiversity. com/library_kanner 1943.pdf
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. Após um ano da publicação de Kanner, em 1944, Hans Asperger, psiquiatra e pesquisador austríaco, escreve o artigo “A psicopatia autista na infância”, o qual descreveu crianças que tinham dificuldade em se integrar socialmente em grupos22. Asperger H. 'Autistic psychopathy' in childhood. In: Frith U. Autism and Asperger syndrome, editor. Cambridge: Cambridge University Press; 1944/1992. p. 37-62.. Em 1981, Lorna Wing, publica um artigo sobre a síndrome descrita por Hans Asperger, a autora descreve uma série de casos apresentando sintomas similares e aponta uma noção de um espectro de perturbações autísticas baseado em uma tríade de perturbações33. Wing L. Asperger's syndrome: a clinical account. Psychol Med. 1981;11(1):115-29..

Atualmente o autismo é conhecido como Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), descrito assim na mais nova edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, O DSM - V44. Associação Americana de Psiquiatria, APA. DSM V - Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5ª. Ed. Porto Alegre: Artmed; 2014., da Associação Americana de Psiquiatria (APA). Desta forma, o autismo se insere em um espectro, ou seja, o transtorno passa a ser visto por um conjunto de condutas e deve ser caracterizado de acordo com a gravidade. A partir desta nova classificação, o TEA, é considerado por um conjunto de manifestações que se caracteriza por alterações persistentes na comunicação e interação social, além de padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses ou atividades44. Associação Americana de Psiquiatria, APA. DSM V - Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. 5ª. Ed. Porto Alegre: Artmed; 2014..

O comprometimento da interação social recíproca é amplo e persistente, pode haver um acentuado comprometimento do uso de múltiplos comportamentos não-verbais que regulam a interação social e a comunicação. O comprometimento da comunicação também é acentuado e persistente, afetando as habilidades tanto verbais quanto não-verbais, podendo haver atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem falada55. Dornelles C. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais 4 ª. Ed. rev. (DSM-IV-TR). São Paulo: Artes Médicas, 2002..

Diante das alterações sociais e de linguagem descritas nas crianças com TEA, os pais podem ser apontados frequentemente como informantes do desenvolvimento comunicativo de seus filhos, podendo evidenciar a existência de atrasos na aquisição de linguagem e déficits na interação social, detecções estas, que os impulsionam, em estágios iniciais, à busca de auxílio profissional66. Backes B, Zanon R, Bosa C. Identificação dos primeiros sintomas do autismo pelos pais. Psic.: Teor. e Pesq. 2014;30(1):25-33..

A percepção do terapeuta a respeito das habilidades comunicativas de crianças com TEA pode ter papel fundamental no delineamento do processo de intervenção. Ao mesmo tempo, o relato dos pais a respeito dessas habilidades, também pode fornecer informações essenciais para esse processo, mas frequentemente são pouco claras devido à utilização de protocolos longos e complexos. Assim, a verificação da possibilidade de aplicação de um protocolo simples respondido pelos pais, e um mais extenso, respondido por fonoaudiólogos tem relevância clara para a prática clínica.

Portanto, considerando o desenvolvimento da linguagem das crianças com TEA a partir do contexto social no qual se inserem, buscou-se descrever as habilidades de comunicação de crianças com TEA considerando a perspectiva clínica e familiar.

Métodos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa envolvendo Seres Humanos do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco, Brasil, sob o parecer de número 2.106.800.

Trata-se de uma pesquisa de natureza quantitativa do tipo descritiva. Aos responsáveis e terapeutas foram explicados os objetivos da pesquisa e solicitada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), os quais foram devidamente assinados.

Outrossim, seguindo as recomendações de ética e pesquisa com seres humanos, o sigilo da identidade dos participantes foi preservado.

A coleta de dados foi realizada no ambulatório da Clínica Escola de Fonoaudiologia Prof. Fábio Lessa da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE durante as atividades do projeto de pesquisa intitulado “Fonoaudiologia e Autismo: Conhecer, Intervir e Incluir”.

Participaram desta pesquisa, os pais e terapeutas de 10 crianças com TEA, de ambos os sexos, procedentes da região metropolitana de Recife, com idades entre 3 e sete anos, independentemente de o comprometimento ser leve, moderado ou grave. As quatro terapeutas conheciam as crianças há 10 meses, eram do sexo feminino, três graduandas do 8⁰ período (4º ano), último semestre do curso de Fonoaudiologia e apenas uma cursava o 6⁰ período (3º ano). Participaram ainda dez responsáveis pelas crianças com TEA, sendo a participação efetivada a partir da resolução de um questionário em forma de entrevista.

A coleta de dados foi realizada com a aplicação de dois protocolos. O primeiro é o Autism Treatment Evaluation Checklist- ATEC77. Rimland B, Edelson M. Autism treatment evaluation checklist. Autism Research Institute [database on the internet]; San Diego, CA. 1999. [accessed on 2018 jun 12]; Available at: https://www.autismeval.com/ari-atec/report1.html
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(Anexo 1 Anexo 1 AUTISM TREATMENT EVALUATION CHECKLIST (ATEC) Rimland, B., & Edelson, M. (1999) NOME: ________________________________________________ DATA: _____/______/______ D/N: ____/____/____ SEXO: _____ SCORE ANTERIOR: ________ Respondido por:_________________________________________________________________ Por favor, assinale com um “X” a opção que mais se adequa: I. Fala/Linguagem/ Comunicação: não verdadeiro (nv)/ mais ou menos (mm)/ verdade (v) (nv) (mm) (v) 1. Sabe o próprio nome 2. Responde ao “não” ou “pare” 3. Pode obedecer certas ordens 4. Consegue usar uma palavra por vez. ex. Não, comer, água 5. Consegue usar 2 palavras juntas. ex. Não quero, quero ir. 6. Consegue usar 3 palavras juntas. ex. Não quero leite. 7. Sabe 10 ou mais palavras 8. Consegue usar frases com 4 ou mais palavras 9. Explica o que quer 10. Faz perguntas com sentindo 11. Sua linguagem costuma ser relevante/ com sentido 12. Com frequência usa várias frases sucessivas 13.Mantém uma conversa razoavelmente boa 14. Tem capacidade de comunicação normal para sua idade II. Sociabilidade: não descritivo (nd) / mais ou menos (mm)/ descreve meu filho(d) (nd) (mm) (v) 1. Parece estar fechado em si mesmo- não é possível interagir com ele (a) 2. Não presta atenção nas pessoas 3. Mostra pouca ou nenhuma atenção quando falamos com ele 4. Não é cooperativo e é resistente 5. Não tem contato ocular 6. Prefere que o deixem sozinho 7. Não demonstra afeto 8. Não cumprimenta os pais 9. Evita contato com as outras pessoas 10. Não imita 11. Não gosta que lhe abracem ou acariciem 12. Não compartilha/ mostra coisas aos outros 13. Não se despede fazendo tchau 14. É desagradável / desobediente 15. Faz birras 16. Não tem amigos/ companheiros 17. Sorri muito pouco 18. Insensível ao sentimento dos outros 19. Não tem interesse em agradar os outros 20. Fica indiferente quando os pais vão embora III. Capacidade Sensorial/ Cognitiva: não descritivo (nd)/ pouco descritivo (pd)/ muito descritivo(md) (nd) (pd) (md) 1. Responde ao seu próprio nome 2. Reconhece quando é elogiado 3. Olha para pessoas e animais 4. Assiste desenhos na TV 5. Desenha, colore, faz objetos de arte 6. Brinca com os brinquedos de forma correta 7. Tem uma expressão facial apropriada 8. Entende as histórias da TV 9. Entende as suas explicações 10. Está consciente do ambiente que lhe rodeia 11.Tem consciência do perigo 12. Demonstra imaginação 13. Inicia atividades 14. Se veste sozinho 15. Curioso, interessado 16. Se aventura, explora 17. Sintonizado, não parece estar nas nuvens 18. Olha para onde os outros olham IV. Saúde/ Aspectos Físicos/ Comportamentos: Não é um problema (np)/ Problema pequeno(pp)/ Problema moderado(pd)/ Problema Grave(pg) (np) (pp) (pm) (pg) 1. Enurese noturna (xixi na cama) 2. Urina nas calças/ fralda 3. Defeca nas calças ou fralda 4. Diarreia 5. Prisão de ventre 6. Problema para dormir 7. Come muito/ come muito pouco 8. Dieta limitada, não aceita qualquer tipo de alimento 9. Hiperativo 10. Letárgico 11.Machuca a si mesmo 12. Machuca os outros 13. Destrutivo 14. Sensível ao barulho 15. Ansioso/ medroso 16. Triste/ Chora 17. Convulsões 18. Fala/ Linguagem obsessiva 19. Rotinas Rígidas 20. Grita/ Fala alto 21. Exige que as coisas sejam sempre feitas da mesma forma 22. Com frequência fica agitado 23. Insensível a dor 24. Fixação por certos objetos/temas 25. Faz gestos/movimentos repetitivos ) o qual foi aplicado com os pais das crianças. A lista de verificação é projetada para avaliar a eficácia dos tratamentos, bem como para monitorar como um indivíduo progride ao longo do tempo. O ATEC é usado por pais e pesquisadores, bem como por escolas, clínicas médicas e diversos profissionais de saúde. O objetivo do ATEC é medir a mudança em um indivíduo devido a várias intervenções, ou seja, a diferença entre os escores ATEC iniciais (de base) e os escores posteriores do ATEC. A escala, porém, possui dados normativos que permitem a comparação de um indivíduo com os outros. O ATEC avalia 77 itens, como se a criança sabe o seu nome, faz contato visual com os outros, ou tem sintomas como enurese, diarréia, constipação e assim por diante. Estes são divididos em quatro sub-grupos que medem a criança em termos de: Fala/ Linguagem/ Comunicação (14 itens) , Sociabilidade (20 itens), Percepção sensorial/ cognitiva (18 itens) e Saúde/ Física/ Comportamento (25 itens)77. Rimland B, Edelson M. Autism treatment evaluation checklist. Autism Research Institute [database on the internet]; San Diego, CA. 1999. [accessed on 2018 jun 12]; Available at: https://www.autismeval.com/ari-atec/report1.html
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. Para este estudo será analisado o primeiro sub-grupo composto por 14 itens que são específicos sobre fala, linguagem, e comunicação .

O segundo é o Protocolo de Avaliação de Habilidades Pragmáticas de Crianças com Transtornos do Espectro do Autismo - PAHPEA88. Fernandes F. Assessment of pragmatic abilities of children with Autism Spectrum Disorders. ACR. 2021. No prelo. o qual foi respondido pelos terapeutas. Este protocolo é composto de 29 questões, tendo sido incluídas mais três questões consideradas relevantes para este estudo, totalizando 32 questões. O protocolo contempla os aspectos das habilidades verbais e não verbais de comunicação, além de considerar a compreensão social e o contexto comunicativo.

As entrevistas com os pais foram realizadas individualmente em uma sala de atendimento na Clínica Escola de Fonoaudiologia da instituição de origem durante os atendimentos fonoaudiológicos das crianças, sem tempo pré-determinado. As entrevistas duraram em média 30 minutos.

Aos terapeutas, foram disponibilizados os questionários referentes a cada paciente pelos quais eram responsáveis e eles o responderam individualmente.

A coleta de dados foi realizada entre os meses de julho e novembro de 2018, sendo os dados coletados com pais e terapeutas de cada criança no mesmo momento, evitando desta forma, divergências de respostas relacionadas a espaço de tempo, uma vez que os protocolos deveriam ser respondidos considerando a situação comunicativa apresentada pelas crianças no momento da coleta.

Os dados foram alocados em planilha digital do Microsoft Excel. Foi realizada análise estatística descritiva, analisando-se a frequência absoluta e a relativa, e inferencial aplicando-se o teste de Associação Qui-quadrado, por meio do software SPSS versão 21, com significância de 5% para todas as análises. Após o tratamento estatístico, os dados foram organizados em tabelas.

Resultados

Os participantes da pesquisa apresentavam entre três e sete anos de idade, sendo 90% do sexo masculino e 10% são do sexo feminino, ou seja, apenas uma menina.

A Tabela 1 traz os resultados das respostas dos pais a cada afirmativa da Subescala I (Fala, Linguagem e Comunicação) da escala ATEC 77. Rimland B, Edelson M. Autism treatment evaluation checklist. Autism Research Institute [database on the internet]; San Diego, CA. 1999. [accessed on 2018 jun 12]; Available at: https://www.autismeval.com/ari-atec/report1.html
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. Foi realizada uma média percentual dos 14 itens da escala ATEC que versam sobre Fala, Linguagem e Comunicação a partir das respostas “Não Verdade” (NV), quando a criança não apresentava o comportamento comunicativo; “Mais ou menos Verdade” (MM), quando ocorria às vezes, e “Verdade” quando este já foi consolidado pela criança.

Tabela 1:
Respostas obtidas a partir da aplicação do questionário Autism Treatment Evaluation Checklist com os responsáveis das crianças com Transtorno do Espectro do Autismo.

As 14 questões referentes aos aspectos de Fala, Linguagem e Comunicação revelaram que uma grande parte dos pais marcaram o item “Não verdade” (NV) nas seguintes situações: saber o próprio nome (50%); conseguir usar 2 palavras juntas (50%); conseguir usar 3 palavras juntas (80%); conseguir usar frases com 4 ou mais palavras(80%); fazer perguntas com sentido (70%); utilizar linguagem relevante/ com sentido (70%); usar com frequência várias frases sucessivas (70%); manter uma conversa razoavelmente boa (80%); ter uma capacidade de comunicação normal para sua idade (80%).

As respostas “Mais ou Menos Verdade” (MM) obtiveram grande parte assinalada pelos pais nas seguintes situações: obedecer certas ordens (70%) e explicar o que quer (50%).

Com relação a veracidade (V) das questões obtiveram grande parte das respostas as seguintes afirmativas: responder ao “não ou ao “pare” (50%), conseguir usar uma palavra por vez (70%) e saber 10 ou mais palavras (60%).

A Tabela 2 apresenta informações referentes ao Protocolo de Avaliação de Habilidades Pragmáticas de Crianças com Transtorno do Espectro do Autismo - PAHPEA88. Fernandes F. Assessment of pragmatic abilities of children with Autism Spectrum Disorders. ACR. 2021. No prelo. obtidas por meio das respostas dos terapeutas das crianças. Estes responderam aos questionamentos a partir das seguintes opções: sempre, frequentemente, às vezes, raramente ou nunca.

Tabela 2:
Respostas obtidas a partir da aplicação do Protocolo de Avaliação de Habilidades Pragmáticas de Crianças com Transtornos do Espectro do Autismo com os terapeutas das crianças com Transtorno do Espectro do Autismo.

O PAHPEA demonstrou dados quantitativos do desenvolvimento e da comunicação das crianças a partir de uma média percentual dos 32 itens do questionário.

Os itens que obtiveram a resposta “nunca” assinalada por grande parte dos terapeutas foram: uso da fala principalmente para se comunicar (40%); responder a perguntas complexas (60%); responder com frases completas com estruturas complexas (70%); pedir informações (realizar perguntas) (60%); fazer comentários adequados (50%); usar palavras isoladas e frases de duas palavras para se comunicar (40%); usar frases completas e estruturas complexas para se comunicar (70%); dar ordens (40%); iniciar comunicação (40%); contar histórias ou relatar fatos (70%) e comentar sobre o que está acontecendo ou pode acontecer (50%).

Grande parte dos terapeutas marcaram a resposta “às vezes” em 7 itens: olhar para o adulto (50%); se fazer entender facilmente (40%); interagir para pedir ações ou objetos (40%); deixar claro quando não quer fazer alguma coisa de forma adequada (50%); brincar isolada em atividades repetitivas (60%); ser atenta e compreender expressões faciais e prosódia (40%); usar o brinquedo de forma funcional (40%).

A resposta “frequentemente” foi assinalada por grande parte dos terapeutas nos seguintes itens: responder (compreender) perguntas simples (40%); responder com palavras isoladas ou frases de duas palavras (50%); expressar prazer, medo ou descontentamento de forme clara; responder ao próprio nome (30%) e realizar imitação (50%).

A resposta “sempre” obteve grande parte assinalada em apenas 1 item questionado, o qual se referia a usar choro, birra ou agressão quando frustrada ou para interromper alguma atividade, sendo apontada por 50% da amostra. Do mesmo modo, a reposta “raramente” obteve grande parte apenas no item incluir o adulto na brincadeira, sendo assinalada por 40% dos terapeutas.

A aplicação do PAHPEA evidenciou uma grande variabilidade nas médias encontradas na população deste estudo a partir das respostas obtidas pelos terapeutas.

Na Tabela 3 foi realizada uma correlação entre as respostas obtidas pelos dois protocolos utilizados na pesquisa a partir de sua correlação inferencial entre as variáveis pelo teste de Qui-quadrado. Desta maneira, os resultados que se mostraram estatisticamente significantes ao cruzarem as variáveis do ATEC e PAHPEA foram analisados, ou seja, foi realizada uma análise a partir do confronto das respostas entre pais e terapeutas.

Tabela 3:
Correlação das variáveis questão 4 do Autism Treatment Evaluation Checklist e questão 5 do Protocolo de Avaliação de Habilidades Pragmáticas de Crianças com Transtornos do Espectro do Autismo.

Apesar da Tabela 3 mostrar a correlação entre as Questões 4- ATEC e Questão 5-PAHPEA, houve uma grande variabilidade de respostas nas questões estudadas, tendo sido foi possível observar que 3 pais relataram que era “não verdade” que as crianças conseguiam utilizar uma palavra por vez, destes 2 terapeutas enfocaram que “sempre” as crianças utilizavam gestos para se comunicar e 1 terapeuta enfocou que a criança usava gestos “frequentemente”. Além disto, de acordo com as repostas dos pais, é “verdade” que 7 crianças conseguem usar uma palavra por vez, destas 2 utilizam gestos frequentemente, 3 às vezes e 2 raramente.

Discussão

O ATEC utilizado para análise das habilidades comunicativas das crianças com TEA descrito na Tabela 1, a partir das repostas dos pais, foi utilizado em uma pesquisa 99. Mahapatra S, Khokhlovich E, Martinez S, Kannel B, Edelson S, Vyshedskiy A. Longitudinal epidemiological study of autism subgroups using Autism Treatment Evaluation Checklist (ATEC) score. J Autism Dev Disord. 2018;50(5):1497-508. que, por meio de um estudo longitudinal, analisou os escores do ATEC em subgrupos com TEA obtendo resultados sensíveis nas médias das pontuações ao longo do tempo. Outros pesquisadores1010. Magiati I, Moss J, Yates R, Charman T, Howlin P. Is the Autism Treatment Evaluation Checklist a useful tool for monitoring progress in children with autismo spectrum disorders? J Intellect Disabil Res. 2011;55(3):302-12 monitoraram a evolução ao longo do tempo de 22 crianças em idade escolar com TEA a partir do ATEC; os pais foram responsáveis pelo preenchimento do protocolo. Os escores totais iniciais do ATEC previram 64% de variação nos escores no acompanhamento subsequente. No entanto, também houve variação considerável nos padrões individuais de pontuação das crianças ao longo do tempo, fornecendo evidências da eficácia do ATEC com correlações significantes para monitorar o processo evolutivo de crianças com TEA em decorrência do tempo ou em resposta à processos de intervenção. O ATEC também foi apresentado1111. Freire M, André A, Kummer A. Confiabilidade teste-reteste e validade concorrente da Lista de Verificação de Avaliação do Tratamento do Autismo (ATEC). J.bras. psiquiatr. 2018;67(1):63-4. como uma ferramenta segura e válida para avaliar tratamentos e progressos em indivíduos com TEA, mesmo se comparado a outros protocolos mais difundidos cientificamente como a Escala de Avaliação de Autismo Infantil (CARS).

A partir da análise dos valores da ATEC constatou-se que as crianças deixaram de pontuar em vários itens da Subescala I como: saber o próprio nome; usar uma palavra por vez; usar 2 palavras juntas; usar 3 palavras juntas; usar frases com 4 ou mais palavras; explicar o que quer; fazer perguntas com sentido; apresentar linguagem relevante com sentido; usar várias frases sucessivas; manter uma conversa razoavelmente boa e ter capacidade de comunicação normal para sua idade.

Os resultados encontrados, os quais analisam a linguagem expressiva das crianças com TEA, convergem com os dados abordados no estudo de Kanner11. Kanner L. Autistic disturbances of affective contact. Nerv Child. [jornal on the internet] 1943 [accessed on 2018 apr 09]; (2):217-50. Available at: http://www.neurodiversity. com/library_kanner 1943.pdf
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com 11 crianças, em que oito tinham adquirido a linguagem, embora muitas vezes com atraso, e três perseveraram com mutismo completo. No presente estudo, a maioria dos pais apontaram que seus filhos eram verbais, uma vez que conseguiam usar uma palavra por vez para se comunicar, bem como alguns relataram que seus filhos também produziam frases, porém 30% da amostra pesquisada apresentou-se como não-verbal, visto que não eram capazes de se expressar por meio de palavras. Tais achados, apresentam os mesmos resultados de outros estudos1212. Klin A. Autismo e síndrome de Asperger: uma visão geral. Rev. Bras. Psiquiatr. 2006;28(1):3-11. que descrevem atraso importantes ou ausência total da linguagem falada em uma proporção relevante de crianças com TEA, que podem ser prolongar até a vida adulta66. Backes B, Zanon R, Bosa C. Identificação dos primeiros sintomas do autismo pelos pais. Psic.: Teor. e Pesq. 2014;30(1):25-33.,1212. Klin A. Autismo e síndrome de Asperger: uma visão geral. Rev. Bras. Psiquiatr. 2006;28(1):3-11.,1313. Gadia C, Tuchman R, Rotta N. Autismo e doenças invasivas do desenvolvimento. J. Pediatria. 2004;80(2):83-94..

Déficits de compreensão da linguagem falada são apontados como sendo uma característica de crianças com TEA1212. Klin A. Autismo e síndrome de Asperger: uma visão geral. Rev. Bras. Psiquiatr. 2006;28(1):3-11.,1414. Flippin M, Reszka S, Watson L. Effectiveness of the Picture Exchange Communication System (PECS) on communication and speech for children with autism spectrum disorders: a meta-analysis. Am J Speech Lang Pathol. 2010;19(2):178-95.. Neste estudo, a partir das repostas dos pais, com relação a linguagem compreensiva, observou-se que a maioria das crianças são capazes de compreender 10 ou mais palavras.

Considerando a idade das crianças envolvidas nesta pesquisa, observa-se que apenas 20% dela conseguem usar frases com três palavras e quando esse número sobe para o uso de quatro ou mais palavras o percentual cai para 10%, demonstrando um baixo desempenho comunicativo para o uso de frases.

Os maiores déficits comunicativos das crianças com TEA estão nos aspectos pragmáticos e na estruturação de narrativas. Tais limitações, impedem estes indivíduos de compreender, iniciar e manter a conversação1515. Perissonoto J. Linguagem da criança com Autismo. In: Perissonoto J, editor. Conhecimentos essenciais para atender a criança com autismo. São José dos Campos: Pulso; 2003. p.39-44.,1616. Surian L. Autismo: informações essenciais para familiares, educadores e profissionais de saúde. São Paulo: Paulinas; 2010..

Diante das alterações na comunicação descritas pelos pais, a maioria (80%) evidenciou que as crianças tinham comunicação alterada se comparadas a crianças de mesma faixa etária. Tal achado evidencia a consciência dos pais com relação as alterações encontradas no desenvolvimento da linguagem das crianças com TEA, sendo os déficits de linguagem, amplamente descritos na literatura, considerados como ponto central deste transtorno1212. Klin A. Autismo e síndrome de Asperger: uma visão geral. Rev. Bras. Psiquiatr. 2006;28(1):3-11.,1616. Surian L. Autismo: informações essenciais para familiares, educadores e profissionais de saúde. São Paulo: Paulinas; 2010..

Os resultados da Tabela 2 abordam as capacidades comunicativas das crianças com TEA a partir das respostas dos terapeutas. Percebe-se que houve uma grande variabilidade nas respostas dos terapeutas em todas as questões levantadas, porém com uma expressiva presença de déficits comunicativos.

Observou-se uma grande variabilidade nas respostas dos terapeutas nas seguintes questões: interage com o adulto; usa principalmente sons nãos verbais para se comunicar; usa principalmente gestos para se comunicar; troca turnos comunicativos de forma adequada; brinca de faz de conta; produz fala, sons ou gestos descontextualizados ou fora do contexto; usa expressões faciais e variações prosódicas para se comunicar e responde ao próprio nome.

Na amostra estudada também foi descrito o comportamento da habilidade de contato ocular. O olhar é um dos indicadores fundamentais não verbais para elaborar interpretações corretas de um enunciado. Vários experimentos demonstram que as crianças com TEA não tem atenção no olhar do interlocutor e por isso apresentam dificuldades em formular interpretações, uma vez que crianças típicas de dois anos buscam o olhar da mãe para compreender qual objeto no contexto se referem suas palavras1616. Surian L. Autismo: informações essenciais para familiares, educadores e profissionais de saúde. São Paulo: Paulinas; 2010.. Tal achado pode influenciar os déficits comunicativos encontrados na amostra estudada.

Em relação à fala, a maioria dos terapeutas relataram que as crianças nunca a utilizavam como principal forma de comunicação, os sons não verbais apareceram como segunda forma de comunicação mais utilizada e foi observada uma maior tendência de uso dos gestos. Um estudo anterior1717. Campelo L, Lucena J, Lima C, Araújo H, Viana L, Veloso M et al. Autismo: um estudo sobre habilidades comunicativas em crianças. Rev. CEFAC. 2009;11(4):598-606. também apontou essa evidência, os autores analisaram as habilidades comunicativas verbais e não-verbais de seis crianças com diagnóstico de atraso de linguagem secundário ao TEA. O meio comunicativo gestual apareceu com maior frequência, expressando uma ampla variedade das funções comunicativas.

A linguagem receptiva foi apontada pelos terapeutas com pouco comprometimento. Autores1818. Rapin I, Dunn M. Update on the language disorders of individuals on the autistic spectrum. Brain and Development. 2003;25(3):166-72. em um estudo clínico de crianças com TEA indicou déficits tanto no meio comunicativo expressivo quanto no receptivo.

As habilidades que envolvem o uso social da linguagem, pragmática, representaram um déficit quantitativo no grupo estudado a partir das respostas dos terapeutas.

Há uma lista de comportamentos pragmáticos inapropriados presentes no repertório de indivíduos com TEA: uso inadequado de contato visual; dificuldade em ler emoções em expressões faciais; dificuldades para expressar emoções em expressões faciais; dificuldade em entender gestos comunicativos e não verbais; falta de uso de gestos comunicativos e não verbais; dificuldades com reparo conversacional; ausência de prosódia (ou seja, melodia da voz); dificuldades com a manutenção do tópico; fala em quantidade exagerada; falta de iniciações sociais com os outros; dificuldades com reciprocidade conversacional; perseveração na linguagem; dificuldades com a coerência do tópico; uso de linguagem tangencial; dificuldades na interpretação da linguagem abstrata; dificuldades demonstrando interesse pelos outros; dificuldades com amizades; interesses restritos e repetitivos1919. Philofsky A, Fidler D, Hepburn S. Pragmatic language profiles of school-age children with autism spectrum disorders and Williams syndrome. Am J Speech Lang Pathol. 2007;16(4):368-80..

Importante destacar que o comprometimento no funcionamento geral da linguagem pragmática de indivíduos com TEA é significativo1919. Philofsky A, Fidler D, Hepburn S. Pragmatic language profiles of school-age children with autism spectrum disorders and Williams syndrome. Am J Speech Lang Pathol. 2007;16(4):368-80. e estão presentes no questionário88. Fernandes F. Assessment of pragmatic abilities of children with Autism Spectrum Disorders. ACR. 2021. No prelo., o qual foi objeto de análise deste estudo e, a partir das respostas dos terapeutas, também foram evidenciados déficits significativos na linguagem pragmática destas crianças.

A linguagem pragmática prejudicada (ou seja, o uso da linguagem para interação social) é uma característica marcante do TEA. Autores realizaram um estudo com 29 meninos em idade escolar diagnosticados com TEA que foram constatados déficits de linguagem pragmática por meio de métodos de avaliação semi-naturalísticos e padronizados2020. Klusek J, Martin G, Losh M. A Comparison of pragmatic language in boys with autism and fragile X syndrome. J Speech Lang Ouvir Res. 2014;57(5):1692-707..

Ainda com relação aos aspectos pragmáticos, uma pesquisa2121. Fernandes F. Aspectos funcionais da comunicação de crianças autistas. Temas em desenvolvimento. 2000;9(51):25-35. investigou a comunicação de 50 crianças com diagnóstico de TEA seguindo os parâmetros da teoria pragmática. As crianças foram submetidas a situação de jogo com um fonoaudiólogo e um adulto. Os resultados indicaram que a comunicação dos adultos foi essencialmente verbal enquanto as das crianças foi fundamentalmente gestual, além disso as iniciativas de comunicação foram semelhantes entre adultos e crianças. Na presente pesquisa os terapeutas enfatizaram que 40% das crianças nunca iniciavam comunicação.

Vários autores descrevem essa inabilidade comunicativa em crianças com TEA e um dado relevante a ser destacado neste estudo refere-se que a maioria dos terapeutas apontaram que as crianças nunca contam histórias ou relatam fatos. As trocas comunicativas são de extrema importância para estabelecer a união entre um indivíduo e outro evidenciando a importância de se iniciar trocas comunicativas especialmente em indivíduos com TEA2222. Miilher l, Fernandes F. Considering responsivity: a proposal for pragmatic analysis in autism spectrum. CoDAS. 2013;25(1):70-5..

Os achados do presente estudo corroboram com vários autores que apontam a habilidade pragmática como uma das mais afetadas nas crianças com TEA1414. Flippin M, Reszka S, Watson L. Effectiveness of the Picture Exchange Communication System (PECS) on communication and speech for children with autism spectrum disorders: a meta-analysis. Am J Speech Lang Pathol. 2010;19(2):178-95.,1515. Perissonoto J. Linguagem da criança com Autismo. In: Perissonoto J, editor. Conhecimentos essenciais para atender a criança com autismo. São José dos Campos: Pulso; 2003. p.39-44.,1919. Philofsky A, Fidler D, Hepburn S. Pragmatic language profiles of school-age children with autism spectrum disorders and Williams syndrome. Am J Speech Lang Pathol. 2007;16(4):368-80.

20. Klusek J, Martin G, Losh M. A Comparison of pragmatic language in boys with autism and fragile X syndrome. J Speech Lang Ouvir Res. 2014;57(5):1692-707.

21. Fernandes F. Aspectos funcionais da comunicação de crianças autistas. Temas em desenvolvimento. 2000;9(51):25-35.
-2222. Miilher l, Fernandes F. Considering responsivity: a proposal for pragmatic analysis in autism spectrum. CoDAS. 2013;25(1):70-5..

O uso social da linguagem é apontado com um grande acometimento por grande parte dos autores que realizam estudos sobre as habilidades comunicativas de crianças com TEA. Tal fato pode estar relacionado a partir da análise de alguns pressupostos2323. Tager-Flusberg H. The challenge of studying language development in children with autism. In: Menn L, Ratner N, editors. Methods for studying language production. New Jersey: Lawrence Erlbaum, 2000. p. 313-32. que apontam para o fato de que independente de adquirirem ou não alguma competência linguística os indivíduos com TEA podem não se comunicar com outros. Portanto, para a autora a forma de avaliar as áreas da linguagem tem sido centro de preocupação para alguns pesquisadores.

Desta forma, observa-se a necessidade de se avaliar todos as habilidades comunicativas e observar como estas se relacionam entre si, uma vez que não está claro como estas habilidades relacionam-se e influenciam-se, sendo necessários a realização de novos estudos que avaliem estas relações.

Como foi visto, as crianças com TEA apresentaram alterações na comunicação a partir das respostas dos pais e de seus terapeutas. A seguir serão discutidas as correlações entre as respostas obtidas por esses dois grupos tão presentes no cotidiano comunicativo destas crianças.

Um achado importante na presente pesquisa está na correlação entre as questões 4- ATEC e questão 5- PAHPEA, demonstradas na Tabela 3, onde observou-se que 3 crianças não conseguiam usar uma palavra por vez, destas, 3 terapeutas evidenciaram que estas usavam gestos para se comunicar, demonstrando neste estudo que as crianças não- verbais apresentaram uma tendência maior de se comunicarem por meio de gestos. Tais dados, não corroboram com os estudos de autores1616. Surian L. Autismo: informações essenciais para familiares, educadores e profissionais de saúde. São Paulo: Paulinas; 2010.,2424. Perissonoto J. Processo de evolução da criança com autismo. In: Perissonoto J, editor. Conhecimentos essenciais para atender a criança com autismo. São José dos Campos: Pulso; 2003. p.23-7. que apontam que as crianças com TEA não utilizam os gestos como tentativa de substituir o código linguístico, diferentemente do que ocorre em indivíduos com deficiência auditiva que por possuírem uma boa interação social fazem uso dos gestos como forma de comunicação.

Analisando-se as respostas dos dois protocolos utilizados pode-se perceber tanto a visão dos pais das crianças com TEA quanto de seus terapeutas. Os resultados de uma pesquisa recente revelaram a importância de orientações de comunicação para pais e cuidadores de crianças om TEA, uma vez que, após as sessões de orientações, foi possível observar mudança no olhar dirigido pelos pais ao processo comunicativo de seus filhos em diferentes situações2525. Balestro J, Fernandes F. Caregivers' perception of children with Autism Spectrum Disorder regarding to the communicative profile of their children after a communicative orientation program. CoDAS. 2019;31(1):1-9.. Outro estudo avaliou o perfil funcional de comunicação e dados do relacionamento social de crianças com TEA e de crianças com desenvolvimento típico (DT), a partir de informações fornecidas pelos pais e professores. Os resultados revelaram que as respostas de ambos os grupos foram adequadas na identificação de características específicas das crianças com TEA e com DT2626. Hyter Y, Vogindroukas I, Chelas E-N, Paparizos K, Kivrakiou E, Kaloudi V. Differentiating autismo from typical development: preliminar findings of greek versions of a pragmatic language and social communication questionnaire. Folia Phoniatr Logop. 2017;69(1-2):20-6..

Autores2727. Campos L, Fernandes F. School profile and language and cognitive abilities of children and adolescents with autism spectrum disorders. CoDAS. 2016;28(3):234-43. apontam para o fato de que os pais fornecem tais informações sem a influência da cobrança profissional no que tange a necessidade de bons resultados.

Em linhas gerais, se torna evidente nesta pesquisa que pais e terapeutas apresentaram o mesmo entendimento com relação ao desempenho das dificuldades e habilidades na comunicação das crianças do estudo. A convergência de dados encontrados sobre as alterações comunicativas das crianças com TEA nos faz concluir que os pais podem ser bons informantes do processo comunicativo de seus filhos, ressaltando desta forma, a importância da inserção da família durante o processo terapêutico tornando-os mais presentes e participativos no processo de desenvolvimento comunicativo de seus filhos.

Conclusão

A presente pesquisa verificou que ambos, pais e terapeutas, referiram déficits tanto nas habilidades comunicativas verbais quanto nas não verbais das crianças com TEA. Entretanto, faz-se necessário chamar atenção para o tamanho da amostra o que não nos possibilita realizar generalizações, sendo necessário a realização de novos estudos para confirmação dos resultados.

Agradecimentos

A todos os participantes envolvidos, a Clínica Escola de Fonoaudiologia Prof. Fábio Lessa da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE pela cessão do espaço a pesquisa, aos sujeitos com Transtorno do Espectro do Autismo, seus pais e terapeutas participantes do projeto que fizeram possível a realização desse estudo.

Anexo 1

AUTISM TREATMENT EVALUATION CHECKLIST (ATEC)

Rimland, B., & Edelson, M. (1999)

NOME: ________________________________________________ DATA: _____/______/______

D/N: ____/____/____ SEXO: _____ SCORE ANTERIOR: ________

Respondido por:_________________________________________________________________

Por favor, assinale com um “X” a opção que mais se adequa:


I. Fala/Linguagem/ Comunicação: não verdadeiro (nv)/ mais ou menos (mm)/ verdade (v)


II. Sociabilidade: não descritivo (nd) / mais ou menos (mm)/ descreve meu filho(d)


III. Capacidade Sensorial/ Cognitiva: não descritivo (nd)/ pouco descritivo (pd)/ muito descritivo(md)


IV. Saúde/ Aspectos Físicos/ Comportamentos: Não é um problema (np)/ Problema pequeno(pp)/ Problema moderado(pd)/ Problema Grave(pg)

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    Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal da Paraíba - UFPB, João Pessoa, Paraiba, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2021
  • Aceito
    21 Jul 2021
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