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Triagem da audição e linguagem em pré-escolares

RESUMO

Objetivo:

descrever os resultados da triagem auditiva e de linguagem, bem como a associação entre ambos, em pré-escolares.

Métodos:

estudo realizado com 75 crianças matriculadas na pré-escola. A triagem de linguagem foi realizada por meio da aplicação do Roteiro de Observação do Comportamento de Crianças de 0 a 6 anos. A triagem auditiva das crianças com idade até 1 ano e 11 meses consistiu de meatoscopia, imitanciometria, avaliação auditiva comportamental e emissões otoacústicas. As crianças com idade igual ou superior a 2 anos realizaram meatoscopia, imitanciometria e audiometria tonal lúdica. As crianças que falharam na triagem foram encaminhadas para diagnóstico. A comparação entre resultado da avaliação audiológica e linguagem foi realizada por meio do teste McNemar.

Resultados:

das 75 crianças triadas, 18 (24%) falharam nos testes auditivos e 11 (15%) falharam no teste de linguagem. Das crianças encaminhadas para diagnóstico, 12 (66%) receberam confirmação de alteração auditiva e 10 (90%) receberam confirmação de alteração de linguagem. Não houve associação entre alteração de audição e linguagem (p=0,230).

Conclusão:

foram encontradas alterações de audição e linguagem em pré-escolares que, apesar de não associadas, podem impactar no desempenho acadêmico. Este resultado enfatiza a necessidade do desenvolvimento de estratégias para a implementação da triagem do pré-escolar abrangendo a audição e linguagem.

Descritores:
Audição; Linguagem Infantil; Serviços de Saúde Escolar; Programas de Rastreamento; Pré-escolar

ABSTRACT

Purpose:

to describe the results of preschooler hearing and language screening and the association between them.

Methods:

a study with 75 children enrolled in preschool. The language was screened with the Behavior Observation Guide for 0-to-6-Year-Old Children. The hearing of children up to 1 year and 11 months old was screened with meatoscopy, acoustic immittance, behavioral hearing assessment, and otoacoustic emissions, while those in the age range 2 years or older were screened with meatoscopy, acoustic immittance, and play pure-tone audiometry. The children who failed the screening were referred for diagnosis. The results of the hearing and language assessments were compared with the McNemar test.

Results:

of the 75 children screened, 18 (24%) failed the hearing tests and 11 (15%) failed the language test. Hearing impairment was confirmed in 12 (66%) of those referred for diagnosis, and language impairment, in 10 (90%) of them. There was no association between hearing and language impairments (p = 0.230).

Conclusion:

hearing and language impairments were found in preschoolers. Although they were not associated, they can impact academic performance. This result emphasizes the need for developing strategies to implement preschooler screening programs that include hearing and language.

Keywords:
Hearing; Child Language; School Health Services; Mass Screening; Child, Preschool

Introdução

A criança em idade pré-escolar está em desenvolvimento progressivo de suas habilidades, sendo capaz de realizar atividades cada vez mais complexas no dia a dia. Neste período, pode-se destacar as habilidades auditivas e de linguagem como parte fundamental do processo de desenvolvimento global e da comunicação humana11. Willinger U, Schmoeger M, Deckert M, Eisenwort B, Loader B, Hofmair A et al. Screening for specific language impairment in preschool children: evaluating a screening procedure including the Token Test. J Psycholinguist Res. 2017;46(5):1237-47..

A integridade do sistema auditivo e seu pleno desenvolvimento é fundamental para a aquisição da linguagem oral e para a interação da criança com o meio ambiente, interferindo de forma significativa no desenvolvimento cognitivo, emocional e social22. Oliveira AC de, César CPHAR, Matos G de G, Passos PS, Pereira LD, Alves T et al. Hearing, language, motor and social skills in the child development: a screening proposal. Rev. CEFAC. 2018;20(2):218-27.,33. Borges MG de S, Gomes NSO, Medeiros AM de, Lemos SMA. Association between the auditory profile and speech-language-hearing diagnosis in children and adolescents. Rev. CEFAC. 2021;23(1):1-10..

A privação sensorial auditiva, mesmo que mínima, pode impactar diretamente na aquisição de linguagem, fala e habilidades cognitivas11. Willinger U, Schmoeger M, Deckert M, Eisenwort B, Loader B, Hofmair A et al. Screening for specific language impairment in preschool children: evaluating a screening procedure including the Token Test. J Psycholinguist Res. 2017;46(5):1237-47.,33. Borges MG de S, Gomes NSO, Medeiros AM de, Lemos SMA. Association between the auditory profile and speech-language-hearing diagnosis in children and adolescents. Rev. CEFAC. 2021;23(1):1-10.. Esse impacto será percebido como dificuldades de aprendizagem escolar, sendo que a linguagem oral, compreensão verbal e o desenvolvimento de leitura e escrita são necessárias para um bom desempenho acadêmico44. Silva LK, Labanca L, Melo EM da C, Costa-Guarisco LP. Identification of language disorders in the school setting. Rev. CEFAC. 2014;(1):1972-9.,55. Eickmann SH, Emond AM, Lima M. Avaliação do desenvolvimento infantil: além do neuromotor. J Pediatr. 2016;92(3):S71-83..

A aquisição e o desenvolvimento da linguagem ocorrem desde o nascimento e, até o quinto ano de vida, tem seu período crítico de estabelecimento. Essa aquisição e desenvolvimento dependem da maturação cognitiva, neuromotora, integridade do sistema auditivo e da interação social11. Willinger U, Schmoeger M, Deckert M, Eisenwort B, Loader B, Hofmair A et al. Screening for specific language impairment in preschool children: evaluating a screening procedure including the Token Test. J Psycholinguist Res. 2017;46(5):1237-47..

Quando a relação neurobiológica, auditiva e social não está bem estabelecida, é possível observar o aparecimento de atrasos e/ou distúrbios de linguagem. Estudos demonstram alta prevalência de distúrbios de linguagem na idade pré-escolar sendo comum esse tipo de deficiência na infância44. Silva LK, Labanca L, Melo EM da C, Costa-Guarisco LP. Identification of language disorders in the school setting. Rev. CEFAC. 2014;(1):1972-9.,55. Eickmann SH, Emond AM, Lima M. Avaliação do desenvolvimento infantil: além do neuromotor. J Pediatr. 2016;92(3):S71-83..

Entretanto, algumas alterações de linguagem não são detectadas durante a pré-escola acarretando dificuldades de aprendizagem e insucesso acadêmico66. Bishop DVM, Snowling MJ, Thompson PA, Greenhalgh T, Adams C, Archibald L et al. CATALISE: A multinational and multidisciplinary Delphi consensus study. Identifying language impairments in children. PLoS One. 2016;11(7):1-26.. A “American Speech-Language-Hearing Association” (ASHA) estima que 10% das crianças apresentam algum tipo de alteração de linguagem77. American Speech-Language-Hearing Association. Speech-Language Pathology Medical Review Guidelines [Homepage on the Internet]. Rockville, MD: American Speech-Language-Hearing Association. 2011. [accessed on 2021 April 2]. Available at: http://www.asha.org/practice/reimbursement/SLPmedical- review-guidelines/
http://www.asha.org/practice/reimburseme...
. A presença da inter-relação entre atraso na aquisição da linguagem e as dificuldades de aprendizagem faz-se necessária a detecção e intervenção em tempo oportuno evitando futuras dificuldades acadêmicas e sociais66. Bishop DVM, Snowling MJ, Thompson PA, Greenhalgh T, Adams C, Archibald L et al. CATALISE: A multinational and multidisciplinary Delphi consensus study. Identifying language impairments in children. PLoS One. 2016;11(7):1-26..

O fonoaudiólogo é o profissional apto a desenvolver ações de promoção, aprimoramento e prevenção de alterações de audição e de linguagem dentro do ambiente escolar favorecendo o desenvolvimento e melhora no processo de aprendizagem do escolar88. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução CFFa no 309, de 01 de abril de 2005. Dispõe sobre a atuação do Fonoaudiólogo na educação infantil, ensino fundamental, médio, especial e superior, e dá outras providências [Homepage on the Internet]. Conselho Federal de Fonoaudiologia. 2005. [accessed on 2018 November 11]. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/resolucoes/resolucoes_html/ CFFa_N_309_05.htm
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. Ainda, a atuação fonoaudiológica na escola é regulamentada por lei, a qual prevê programas de triagem auditiva e de linguagem no escolar88. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução CFFa no 309, de 01 de abril de 2005. Dispõe sobre a atuação do Fonoaudiólogo na educação infantil, ensino fundamental, médio, especial e superior, e dá outras providências [Homepage on the Internet]. Conselho Federal de Fonoaudiologia. 2005. [accessed on 2018 November 11]. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/resolucoes/resolucoes_html/ CFFa_N_309_05.htm
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,99. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução CFFa no 274, de 20 de abril de 2001. Dispõe sobre a atuação do Fonoaudiólogo frente a triagem auditiva escolar [Homepage on the Internet]. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Brasil. 2001. [accessed on 2020 November 11]. Available at: http://www.fonoaudiologia.org.br/resolucoes/resolucoes_html/CFFa_N_274_01.htm
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.

Na realidade educacional brasileira, a atuação fonoaudiológica na escola tem sido cada vez mais documentada na literatura, porém é possível observar uma escassez de estudos na área da triagem de linguagem e audição do pré-escolar. Na pré-escola, a avaliação das condições de saúde inclui a identificação de educandos com possíveis sinais de alteração na audição e/ou linguagem oral. Entretanto, a atuação fonoaudiológica na pré-escola é considerada optativa pelo Programa Saúde na Escola (PSE)1010. Brasil. Documento Orientador: Indicadores e padrões de avaliação - PSE Ciclo 2017/2018 [Homepage on the Internet]. Ministério da Saúde. 2018. [accessed on 2020 November 11]. p. 25. Available at: http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/documentos/documento_orientador_monitoramento_pse_2017_2018.pdf
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. Além disso, ainda falta adesão da classe a esta demanda88. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução CFFa no 309, de 01 de abril de 2005. Dispõe sobre a atuação do Fonoaudiólogo na educação infantil, ensino fundamental, médio, especial e superior, e dá outras providências [Homepage on the Internet]. Conselho Federal de Fonoaudiologia. 2005. [accessed on 2018 November 11]. Disponível em: http://www.fonoaudiologia.org.br/resolucoes/resolucoes_html/ CFFa_N_309_05.htm
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,99. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução CFFa no 274, de 20 de abril de 2001. Dispõe sobre a atuação do Fonoaudiólogo frente a triagem auditiva escolar [Homepage on the Internet]. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Brasil. 2001. [accessed on 2020 November 11]. Available at: http://www.fonoaudiologia.org.br/resolucoes/resolucoes_html/CFFa_N_274_01.htm
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.

Sabendo da recorrência de alterações auditivas e de linguagem no ambiente escolar, a detecção precoce dessas alterações na pré-escola permite a intervenção oportuna para o desenvolvimento dos aspectos psicossociais e cognitivos e a aprendizagem de leitura e escrita dessas crianças11. Willinger U, Schmoeger M, Deckert M, Eisenwort B, Loader B, Hofmair A et al. Screening for specific language impairment in preschool children: evaluating a screening procedure including the Token Test. J Psycholinguist Res. 2017;46(5):1237-47.,33. Borges MG de S, Gomes NSO, Medeiros AM de, Lemos SMA. Association between the auditory profile and speech-language-hearing diagnosis in children and adolescents. Rev. CEFAC. 2021;23(1):1-10..

Portanto, há necessidade de maior integração entre a fonoaudiologia e o setor educacional com o objetivo de realizar metodologias de triagem e acompanhamento do desenvolvimento da audição e linguagem a fim de promover melhores estratégias de enfrentamento dos distúrbios da comunicação em pré-escolares44. Silva LK, Labanca L, Melo EM da C, Costa-Guarisco LP. Identification of language disorders in the school setting. Rev. CEFAC. 2014;(1):1972-9.,55. Eickmann SH, Emond AM, Lima M. Avaliação do desenvolvimento infantil: além do neuromotor. J Pediatr. 2016;92(3):S71-83..

Desta forma, o objetivo deste estudo foi descrever os resultados da triagem auditiva e de linguagem, bem como a associação entre ambos, em pré-escolares.

Métodos

Delineamento e Questões Éticas

Estudo observacional transversal aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, Brasil, com parecer n° 931.831 desenvolvido em uma instituição filantrópica conveniada à Prefeitura Municipal de Belo Horizonte - MG, situada em região de alta vulnerabilidade social (0,5 a 0,63)1111. Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social - Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Mapa de exclusão social de Belo Horizonte [Homepage on the Internet]. [accessed on 2020 November 11]. Available at: http://www.pbh.gov.br/smpl/PUB_P002/ Mapa da Exclusao Social de BH_ Revista Planejar 8.pdf.
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.

Inicialmente foi realizada uma reunião com a direção da escola com o objetivo de apresentar o projeto a ser desenvolvido, abordando aspectos relacionados à importância da audição e da linguagem para o desenvolvimento global da criança e esclarecendo sobre os procedimentos de triagem a serem realizados. Após autorização da instituição, os pais das crianças foram informados sobre a triagem auditiva e de linguagem a ser realizada e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Participantes do Estudo

A instituição possui capacidade para atender 95 alunos e, no momento da pesquisa, havia 90 alunos matriculados. Foram incluídos no estudo 75 alunos. O critério de inclusão no estudo foi estar devidamente matriculado na instituição. Os critérios de exclusão no estudo foram: não apresentar o termo de consentimento livre e esclarecido assinado pelos pais e/ou responsáveis (n = 4), não comparecer à escola nos dias de realização da triagem (n = 2) ou a não realização de todos os testes auditivos e de linguagem (n = 9). Durante este estudo, não havia crianças diagnosticadas com déficit cognitivo, neurológico, auditivo e/ou de linguagem matriculadas na instituição.

Coleta de Dados

A coleta de dados ocorreu em visitas semanais à instituição. A cada visita, duas crianças foram triadas e os testes duraram, em média 20 minutos para triagem auditiva e 30 minutos para triagem de linguagem por criança. Os testes foram realizados por duas fonoaudiólogas treinadas a realizar as avaliações.

Triagem Auditiva

Antes de dar início aos testes de triagem auditiva, todas as crianças participantes do estudo passaram pela inspeção do meato acústico externo (MAE), realizada por meio do Otoscópio Omni 2000, com o objetivo de observar a presença de algum impedimento que dificultasse a realização dos testes auditivos. As crianças com excesso de cerúmen no MAE foram avaliadas por médica otorrinolaringologista na própria escola. Após a remoção do cerúmen, quando necessário, foi dado início aos testes de triagem auditiva. O intervalo entre a remoção de cerúmen e a triagem auditiva foi de uma semana.

Os instrumentos utilizados para a triagem auditiva variaram de acordo com a idade da criança, sendo:

  • Crianças de 1 ano a 1 ano e 11 meses: imitanciometria (timpanometria e pesquisa de reflexos acústicos ipsilaterais), avaliação auditiva comportamental e emissões otoacústicas evocadas transientes (EOAT).

  • Crianças de 2 anos a 5 anos e 11 meses: imitanciometria (timpanometria e pesquisa de reflexos acústicos ipsilaterais) e audiometria tonal lúdica.

A imitanciometria (timpanometria e pesquisa de reflexos acústicos) foi realizada por meio do imitanciômetro automático AT235 h/Interacoustics. Os reflexos acústicos foram avaliados de forma ipsilateral, em ambas as orelhas, nas frequências de 1000 e 2000 Hz. Para a condição de passou, a criança deveria apresentar curva timpanométrica do tipo A e presença de reflexos acústicos com valores de normalidade entre 70 dB a 100 dB acima do limiar auditivo na frequência pesquisada 1212. Sistemas de Conselhos de Fonoaudiologia: Guia de Orientações na Avaliação Audiológica Básica [Homepage on the Internet]. 2017. [Accessed on 2020 November 15]. Available at: http://www.crefono4.org.br/cms/files/Anexos/manualdeaudiologia.pdf.
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.

A avaliação auditiva comportamental foi realizada com uso dos instrumentos Guizo (77 dB), Agogô grande (100 dB), Côco (92 dB), Voz e Teste de Detecção de Voz com os sons do Ling /a/, /u/, /i/, /s/ e /∫/. Considerou-se como resposta esperada:

  • Para a idade de 12 a 15 meses: localização sonora lateral, direta para baixo e indireta para cima;

  • Para a idade de 16 a 21 meses: localização sonora lateral, direta para baixo e para cima;

  • Para a idade de 22 a 24 meses: localização sonora direta em qualquer ângulo1313. Northern J, Downs MP. Avaliação auditiva comportamental. In: Northern J, Downs MP, editors. Audição na infância. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 129-67..

Para a condição de passou, a criança deveria ter resposta auditiva esperada de acordo com sua idade, Reflexo Cócleo-Palpebral presente e detecção da voz em todas as direções1313. Northern J, Downs MP. Avaliação auditiva comportamental. In: Northern J, Downs MP, editors. Audição na infância. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 129-67..

As EOATs foram realizadas por meio do equipamento portátil Elios/ECHODIA. O protocolo de registro das EOAT adotado utilizou estímulos cliques não lineares a uma intensidade de 80 dBNPS. As EOATs foram consideradas presentes quando a reprodutibilidade foi maior ou igual a 70% e a relação S/R (sinal/ruído) maior ou igual a 3 dB1414. Rezende AL de F, Resende LM de, Carvalho EA de A, Avan P, Carvalho SA da S. Evaluation of children with risk indicators for hearing loss in a newborn hearing screening reference service en Tr. Distúrb. Comun. 2019;31(4):630-40..

A audiometria tonal lúdica foi realizada por meio do equipamento portátil Elios/ECHODIA. Foram pesquisados os tons puros nas frequências de 1000, 2000 e 4000 Hz com uso de fones de ouvido supra aurais DD45. A audiometria lúdica foi realizada por meio de brincadeira previamente estabelecida com a criança, a qual deveria realizar uma atividade motora (encaixe de brinquedos ou colocar objetos em um recipiente) no momento em que ouviu o som apresentado1313. Northern J, Downs MP. Avaliação auditiva comportamental. In: Northern J, Downs MP, editors. Audição na infância. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 129-67.. Após o condicionamento da criança, a primeira estimulação foi apresentada em tom de 1000 Hz a 50 dBNA, e aplicada a técnica descendente até a obtenção de resposta a 20 dBNA. Em seguida, a testagem continuou na intensidade de 20 dBNA, para todas as demais frequências1313. Northern J, Downs MP. Avaliação auditiva comportamental. In: Northern J, Downs MP, editors. Audição na infância. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 129-67.. Para a condição de passou, a criança deveria apresentar resposta auditiva em pelo menos 20 dBNA em ambas as orelhas em todas as frequências pesquisadas1212. Sistemas de Conselhos de Fonoaudiologia: Guia de Orientações na Avaliação Audiológica Básica [Homepage on the Internet]. 2017. [Accessed on 2020 November 15]. Available at: http://www.crefono4.org.br/cms/files/Anexos/manualdeaudiologia.pdf.
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.

Todos os testes auditivos foram realizados em sala silenciosa, sem tratamento acústico com ruído ambiente controlado por medidor de nível de pressão sonora1515. American Speech-Language-Hearing Association. Guidelines for audiologic screening [Homepage on the Internet]. Rockville, MD: American Speech-Language-Hearing Association. 1997. [accessed on 2021 April 2]. Available at: http://www.asha.org/policy/GL1997-00199.htm
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. O nível máximo de ruído permitido na sala para realização da audiometria tonal lúdica foi de 50 dBNPS, seguindo a norma ANSI-1999 para triagens auditivas por varredura sem cabina acústica1515. American Speech-Language-Hearing Association. Guidelines for audiologic screening [Homepage on the Internet]. Rockville, MD: American Speech-Language-Hearing Association. 1997. [accessed on 2021 April 2]. Available at: http://www.asha.org/policy/GL1997-00199.htm
http://www.asha.org/policy/GL1997-00199....
. No caso da emissão otoacústica, o equipamento portátil indicava quando o nível de ruído estava elevado e o exame não era realizado naquele momento, sendo aguardado o silêncio para sua realização. Todos os equipamentos utilizados encontravam-se devidamente calibrados.

Triagem de Linguagem

Para avaliar os aspectos cognitivos, receptivos e emissivos da linguagem foi utilizado o Roteiro de Observação do Comportamento de Crianças de 0 a 6 anos de idade adaptado1616. Chiari BM, Basílio CS, Nakagwa EA, Cormedi MA, Silva NSM, Cardoso RM et al. Proposta de sistematização de dados da avaliação fonoaudiológica através da observação de comportamentos de crianças de 0 a 6 anos. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 1991;3(2):29-36.. A adaptação do protocolo consistiu em utilizar apenas os itens de avaliação da recepção, emissão e aspectos cognitivos da linguagem. Vale ressaltar que não foram avaliados os itens de aspecto do desenvolvimento motor.

A triagem de linguagem foi realizada em sala silenciosa e, de forma individual, cada criança passou por etapas de atividades lúdicas contemplando os aspectos propostos neste roteiro1616. Chiari BM, Basílio CS, Nakagwa EA, Cormedi MA, Silva NSM, Cardoso RM et al. Proposta de sistematização de dados da avaliação fonoaudiológica através da observação de comportamentos de crianças de 0 a 6 anos. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 1991;3(2):29-36.. O registro das respostas foi realizado em ficha individual, assinalando sim ou não em cada comportamento esperado para a idade. O tempo médio dessa triagem foi de 30 minutos para cada criança.

Os dados das fichas individuais foram digitados em banco de dados criado especificamente para a análise quantitativa dos comportamentos apresentados pelas crianças. Para a análise quantitativa utilizou-se o Índice de Desempenho (ID) em cada aspecto avaliado no roteiro de observação, sendo eles, receptivo, emissivo e cognitivo da linguagem, além do ID geral1717. Santos JN, Rates SPM, Lemos SMA, Lamounier JA. Anemia em crianças de uma creche pública e as repercussões sobre o desenvolvimento de linguagem. Rev Paul Pediatr. 2009;27(1):67-73..

O ID é determinado por meio da análise de porcentagem das respostas de acordo com os marcos do desenvolvimento da linguagem e foram considerados os ID dos aspectos receptivos, emissivos e cognitivos da linguagem e o ID geral. Para o cálculo do ID foi utilizada a seguinte fórmula1818. Labanca L, Alves CRL, Braganca LLC, Dorim DDR, Alvim CG, Lemos SMA. Language evaluation protocol for children aged 2 months to 23 months: analysis of sensitivity and specificity. CoDAS. 2015;27(2):119-27.:

I D = N c a - N c n o x 100 N c a

ID: Índice de desempenho;

Nca: Número de comportamentos avaliados;

Ncno: Número de comportamentos não observados.

 

Para a condição de passou no teste de linguagem, a criança deveria apresentar Índice de Desempenho Geral maior ou igual a 60%1717. Santos JN, Rates SPM, Lemos SMA, Lamounier JA. Anemia em crianças de uma creche pública e as repercussões sobre o desenvolvimento de linguagem. Rev Paul Pediatr. 2009;27(1):67-73.

18. Labanca L, Alves CRL, Braganca LLC, Dorim DDR, Alvim CG, Lemos SMA. Language evaluation protocol for children aged 2 months to 23 months: analysis of sensitivity and specificity. CoDAS. 2015;27(2):119-27.
-1919. Dourado JS, Carvalho SAS, Lemos SMA. Development of communication of children aged between one and three years old and their relationship with the family and school environments. Rev. CEFAC. 2015;17(1):88-99..

Etapa de Diagnóstico

Após a realização dos testes da triagem do escolar, as crianças que apresentaram possíveis alterações auditivas ou de linguagem foram encaminhadas para diagnóstico e conduta em um centro de especialidades. Nesse local as crianças foram avaliadas por duas fonoaudiólogas doutoras, professoras especialistas na área de audição e linguagem e por médica doutora professora especialista em otorrinolaringologia utilizando os seguintes métodos:

Avaliação auditiva: Inspeção do MAE, imitanciometria (timpanometria e pesquisa dos reflexos acústicos), EOAT, audiometria tonal lúdica por via aérea e óssea em cabina acústica e avaliação médica e conduta, se necessário.

Avaliação da Linguagem

Teste de Linguagem Infantil por meio do ABFW2020. Andrade CD, Befi-Lopes DM, Fernandes FDM, Wertzner HF. ABFW: teste de linguagem infantil nas áreas de fonologia, vocabulário, fluência e pragmática. São Paulo: Pró-Fono. 2004..

O tempo médio entre a etapa de triagem auditiva e de linguagem e o diagnóstico foi de 3 meses. As crianças com diagnóstico de alteração da linguagem ou audição foram orientadas e encaminhadas para realizar acompanhamento com especialistas na rede de atenção à saúde.

Após a coleta de dados, todos os responsáveis e professores foram orientados pelos pesquisadores quanto ao desenvolvimento da audição e linguagem por meio de palestra realizada na escola.

Análise dos Dados

Os dados foram digitalizados em um banco de dados criado especificamente para a pesquisa. Utilizou-se o software Excel e os dados foram analisados estatisticamente por meio do software estatístico SPSS, versão 20 (IBM, 2015). As variáveis categóricas (resultado do teste de linguagem, resultado do teste de audição e gênero) foram apresentados por meio de medidas de frequência. As variáveis contínuas idade e resultado do índice de desempenho foram apresentadas por meio de medidas de tendência central e variabilidade. Realizou-se a análise de comparação entre resultado do teste audiológico e resultado do teste de linguagem por meio do teste McNemar. Foi considerado o nível de significância menor ou igual a 0,05 e intervalo de confiança de 95%.

Resultados

Foram incluídas no estudo 75 crianças, sendo 39 (52%) do gênero masculino e 36 (48%) do gênero feminino. A idade mínima foi de 1 ano e 8 meses, máxima de 5 anos e 11 meses e a média foi de 3 anos e 8 meses. A Figura 1 apresenta um resumo geral dos resultados das etapas das avaliações auditivas e de linguagem realizadas com os pré-escolares.

Figura 1:
Resumo geral dos resultados das avaliações auditivas e de linguagem realizadas em pré-escolares

A inspeção do MAE foi realizada em todas as 75 crianças, das quais 27 (36%) apresentaram excesso de cerúmen, as quais foram submetidas a avaliação e intervenção otorrinolaringológica na própria escola antes de iniciar a triagem auditiva.

Os resultados da triagem auditiva de acordo com o exame audiológico realizado estão descritos na Tabela 1.

Tabela 1:
Resultados da avaliação auditiva de acordo com o exame audiológico realizado

Na Tabela 2 são apresentados os resultados do Índice de Desempenho Geral e dos aspectos Receptivos, Emissivos e Cognitivos da linguagem por faixa de idade.

Tabela 2:
Índice de Desempenho por faixa etária apresentados pelos pré-escolares na avaliação de linguagem

A Tabela 3 apresenta os resultados dos pré-escolares em relação à audição e linguagem de acordo com a faixa de idade. Na comparação entre os resultados dos exames auditivos e de linguagem das crianças que falharam em ambos os testes não foi encontrada associação estatística.

Tabela 3:
Resultados da avaliação auditiva e de linguagem de acordo com a faixa de idade

A Figura 2 apresenta a distribuição do resultado do Índice de Desempenho geral obtido na avaliação de linguagem para cada faixa de idade e sinaliza quais crianças falharam na triagem auditiva e de linguagem. Vale ressaltar que duas crianças falharam tanto na triagem auditiva quanto na triagem de linguagem.

Figura 2:
Distribuição do resultado do Índice de Desempenho Geral e resultado da triagem auditiva obtido na avaliação de linguagem e audição para cada faixa de idade (n=75)

Os resultados indicaram que no processo de triagem 18 (24%) crianças falharam na triagem auditiva e 11 (15%) falharam na triagem de linguagem. Todas as crianças que falharam na triagem foram avaliadas em centro de especialidade em audição e linguagem.

Em relação à audição, sete crianças foram diagnosticadas com perda auditiva do tipo condutiva de grau leve à moderado unilateral, quatro com perda auditiva do tipo condutiva de grau leve bilateral, uma com perda auditiva do tipo neurossensorial de grau leve bilateral e seis crianças não apresentaram alterações auditivas (Figura 1).

Em relação à linguagem, das 11 crianças que falharam na triagem, cinco foram diagnosticadas com transtorno fonológico2121. Prates LPCS, Martins V de O. Distúrbios da fala e da linguagem na infância. Rev Médica de Minas Gerais. 2011;21(4):54-60.,2222. Bueno GJ, Rossi SG, Appezzato MM, Chang EM, Carvalho CA de F, Kida A de SB et al. Interference of phonological disorder on the reading of items with different psycholinguistic characteristics. Audiol - Commun Res. 2017;22(0):1-7.; duas foram diagnosticadas com gagueira do desenvolvimento2121. Prates LPCS, Martins V de O. Distúrbios da fala e da linguagem na infância. Rev Médica de Minas Gerais. 2011;21(4):54-60.; três foram diagnosticadas com alteração no desenvolvimento da linguagem oral2121. Prates LPCS, Martins V de O. Distúrbios da fala e da linguagem na infância. Rev Médica de Minas Gerais. 2011;21(4):54-60. e uma não foi identificada alteração de linguagem (Figura 1).

Das 12 crianças com diagnóstico de alteração auditiva, duas crianças apresentaram alteração de linguagem concomitante. Um caso refere-se a uma criança de 5 anos diagnosticada com perda auditiva neurossensorial de grau leve com configuração descendente acentuada e diagnosticada com alteração severa no desenvolvimento da linguagem oral. A história pregressa da criança inclui prematuridade extrema, peso ao nascer inferior a 1500 gramas e internação prolongada em UTI neonatal. O outro caso refere-se a uma criança de 2 anos com perda auditiva condutiva de grau leve bilateral e com diagnóstico de alteração leve no desenvolvimento da linguagem oral. A história pregressa da criança inclui otites de repetição.

Discussão

O presente estudo descreveu a triagem auditiva e de linguagem em crianças pré-escolares identificando suas possíveis alterações. Foram triados 75 pré-escolares de 1 a 5 anos de idade, sendo identificados no processo de triagem 15% de possível alteração de linguagem e 24% de possível alteração auditiva.

O termo triagem refere-se à aplicação de testes rápidos, simples e de baixo custo que visa identificar sujeitos com possível alteração na função testada. A identificação precoce de crianças com dificuldades ou possíveis atrasos do desenvolvimento em geral é determinante para a intervenção oportuna, permitindo que essas crianças tenham seu pleno desenvolvimento. Desta forma, a triagem é de suma importância no ambiente escolar2323. Barbosa AL de A, Soares HB, Azoni CAS. Development of a vocabulary-screening tool for children 3 to 7-years of age. Audiol - Commun Res. 2019;24:e2131.. Este estudo buscou rastrear possíveis atrasos e/ou alterações de audição e linguagem, oportunizando o desenvolvimento das crianças estudadas.

Antes do início da triagem auditiva, todas as crianças participantes deste estudo passaram por inspeção do MAE a fim de identificar possíveis obstruções do conduto que impediriam a resposta adequada aos testes de triagem auditiva. Portanto, a prevalência de alteração auditiva encontrada no presente estudo não considerou as crianças com excesso de cerúmen uma vez que, quando identificadas, tais crianças foram encaminhadas para intervenção otorrinolaringológica.

No presente estudo, 36% das crianças triadas apresentavam obstrução do conduto auditivo por excesso de cerúmen. Em outros estudos foi possível observar que a prevalência de obstrução do MAE por excesso de cerúmen foi de 6,3%2424. Tamanini D, Ramos N, Dutra LV, Bassanesi HJC. School-age hearing screening: identification of hearing impairments in first grade students. Rev. CEFAC. 2015;17(5):1403-14. e 6,5%2525. Iselin Ertzgaard S, Kristin N, Sofie T, Giske Sindberg H, Tobias Bang H, Cosmas M et al. Prevalence of hearing impairment among primary school children in the Kilimanjaro region within Tanzania. Int. J. Pediatr. Otorhinolaryngol. 2020;130:1-7. evidenciando que neste estudo foi encontrado maior índice de crianças com obstrução do MAE devido ao excesso de cerúmen.

O cerúmen é produzido naturalmente por células glandulares e por descamação da pele do MAE e tem por finalidade proteger, limpar e lubrificar o conduto auditivo externo2626. Michaudet C, Malaty J. Cerumen impaction: diagnosis and management. Am Fam Physician. 2018;98(8):525-9.. Ainda, sabe-se que o excesso de cerúmen é capaz de impactar na audição quando há obstrução do MAE causando desconforto e perda auditiva e impacta em aproximadamente 10% das crianças2626. Michaudet C, Malaty J. Cerumen impaction: diagnosis and management. Am Fam Physician. 2018;98(8):525-9.. A perda auditiva em decorrência do excesso de cerúmen no MAE pode variar de 5 a 40 dB dependendo do quanto o conduto auditivo está obstruído2626. Michaudet C, Malaty J. Cerumen impaction: diagnosis and management. Am Fam Physician. 2018;98(8):525-9.. Por isso, a triagem auditiva deve incluir a inspeção do MAE antes de iniciar os exames audiológicos.

Nesta pesquisa optou-se por utilizar diferentes metodologias de triagem auditiva de acordo com a faixa de idade da criança99. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Resolução CFFa no 274, de 20 de abril de 2001. Dispõe sobre a atuação do Fonoaudiólogo frente a triagem auditiva escolar [Homepage on the Internet]. Conselho Federal de Fonoaudiologia. Brasil. 2001. [accessed on 2020 November 11]. Available at: http://www.fonoaudiologia.org.br/resolucoes/resolucoes_html/CFFa_N_274_01.htm
http://www.fonoaudiologia.org.br/resoluc...
,1313. Northern J, Downs MP. Avaliação auditiva comportamental. In: Northern J, Downs MP, editors. Audição na infância. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 129-67.,2727. Santos VF, Silva DTC, Py MO. Otoacoustic emissions as a hearing screening tool in 431 children aged 1 to 12 years-old. Distúrb. Comun. 2014;26(1):5-14.,2828. Farinetti A, Raji A, Wu H, Wanna B, Vincent C. International consensus (ICON) on audiological assessment of hearing loss in children. European Annals of Otorhinolaryngology. Head and Neck Diseases. 2018;135(1):S41-8..

A imitanciometria é um teste rápido, simples e indolor capaz de avaliar a mobilidade do sistema tímpano-ossicular e verificar a presença ou ausência dos reflexos acústicos. Esse exame fornece dados sobre a integridade da orelha média, sendo importante ferramenta para o diagnóstico. Sabendo que crianças em idade pré-escolar são mais propensas a apresentar problemas de orelha média2929. Lindau TA, Delecrode CR, Cardoso ACV. Tympanometric findings in a group of students. Rev. CEFAC. 2013;15(6):1453-60., esse teste foi escolhido para o processo de triagem deste estudo.

Em relação aos resultados da imitanciometria do presente estudo, as curvas do tipo B e C e ausência do reflexo acústico estapediano foram as alterações encontradas de maior prevalência na população estudada. Um estudo realizado em Marília/SP com 112 pré-escolares de 4 a 5 anos, com índice de vulnerabilidade similar ao presente estudo, foi encontrada prevalência de 63,4% de alterações timpanométricas com predomínio de curvas do tipo B e C, sendo a prevalência de alterações maior que as encontradas no presente estudo2929. Lindau TA, Delecrode CR, Cardoso ACV. Tympanometric findings in a group of students. Rev. CEFAC. 2013;15(6):1453-60.. Um outro estudo avaliou 130 escolares com idade entre 7 e 10 anos matriculados na rede pública da cidade de Porto Alegre/RS e encontrou 56,92% de alterações no exame imitanciométrico, sendo 20% de alteração de medidas de imitância acústica com predomínio de curvas do tipo C e 16% de alteração na pesquisa dos reflexos acústicos3030. Etges CL, Reis MCP, Menegotto IH, Sleifer P, Soldera CLC. Achados na triagem imitanciométrica e de processamento auditivo em escolares. Rev. CEFAC. 2012;14(6):1098-107.. Esses dados corroboram os resultados encontrados na presente pesquisa na qual 19% das crianças apresentaram alteração de medidas de imitância acústica e 24% apresentaram ausência do reflexo acústico estapediano. A ausência da captação do reflexo acústico estapediano nas crianças com curva timpanométrica tipo B e/ou C justifica-se pelas alterações condutivas2929. Lindau TA, Delecrode CR, Cardoso ACV. Tympanometric findings in a group of students. Rev. CEFAC. 2013;15(6):1453-60.. No presente estudo não houve crianças com ausência de reflexo acústico estapediano, timpanograma tipo A e limiares de audibilidade normais, entretanto esse achado pode ser sugestivo de déficit do processamento auditivo central, o qual impacta no aprendizado3030. Etges CL, Reis MCP, Menegotto IH, Sleifer P, Soldera CLC. Achados na triagem imitanciométrica e de processamento auditivo em escolares. Rev. CEFAC. 2012;14(6):1098-107..

As alterações de orelha média, principalmente as otites de repetição, são comuns em países em desenvolvimento e são altamente prevalentes na infância2929. Lindau TA, Delecrode CR, Cardoso ACV. Tympanometric findings in a group of students. Rev. CEFAC. 2013;15(6):1453-60.. Por esse motivo, há autores que sugerem orientação aos pais e professores para reduzir a incidência de alterações de orelha média com a implementação de programas de imunização visando reduzir os episódios de infecções de vias aéreas superiores2929. Lindau TA, Delecrode CR, Cardoso ACV. Tympanometric findings in a group of students. Rev. CEFAC. 2013;15(6):1453-60..

Para as crianças com idade até 1 ano e 11 meses deste estudo foram utilizados os testes de EOAT e avaliação auditiva comportamental. Estudos demonstram que a EOAT é indicada para crianças menores de 2 anos por ser um teste objetivo que não necessita da colaboração de crianças menores e consequentemente há menor número de recusa ao teste2828. Farinetti A, Raji A, Wu H, Wanna B, Vincent C. International consensus (ICON) on audiological assessment of hearing loss in children. European Annals of Otorhinolaryngology. Head and Neck Diseases. 2018;135(1):S41-8.. A avaliação auditiva comportamental é um método de fácil execução e baixo custo, entretanto não avalia as orelhas separadamente e limita o controle de intensidade1313. Northern J, Downs MP. Avaliação auditiva comportamental. In: Northern J, Downs MP, editors. Audição na infância. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 129-67.. Desta forma, ao comparar os resultados da avaliação auditiva comportamental e EOAT deste estudo, identificou-se mais casos alterados no teste de EOAT, principalmente para perda auditiva unilateral. Estudo sugere que a EOAT é um método eficaz para triagem de escolares da educação infantil3131. Pereira SG, Carvalho A de JA, Escarce AG, Alves JMM, Goulart LMHF, Lemos SMA. Triagem auditiva na educação infantil: associação com determinantes de saúde. Distúrb. Comun. 2019;31(2):285-96..

As crianças de 2 a 5 anos foram triadas utilizando a audiometria tonal lúdica por ser recomendada como o método capaz de obter os limiares de audibilidade por frequências pré-determinadas e aferir se a audição periférica é normal ou alterada, sendo capaz de quantificar a perda auditiva1212. Sistemas de Conselhos de Fonoaudiologia: Guia de Orientações na Avaliação Audiológica Básica [Homepage on the Internet]. 2017. [Accessed on 2020 November 15]. Available at: http://www.crefono4.org.br/cms/files/Anexos/manualdeaudiologia.pdf.
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,2828. Farinetti A, Raji A, Wu H, Wanna B, Vincent C. International consensus (ICON) on audiological assessment of hearing loss in children. European Annals of Otorhinolaryngology. Head and Neck Diseases. 2018;135(1):S41-8..

Em relação à prevalência de alteração na triagem auditiva escolar, em uma pesquisa realizada na Tanzânia que avaliou 403 crianças de 6 a 17 anos revelou que a prevalência da perda auditiva entre as escolas avaliadas variou de 7,1% a 16,7%2525. Iselin Ertzgaard S, Kristin N, Sofie T, Giske Sindberg H, Tobias Bang H, Cosmas M et al. Prevalence of hearing impairment among primary school children in the Kilimanjaro region within Tanzania. Int. J. Pediatr. Otorhinolaryngol. 2020;130:1-7.. Estudo realizado na Polônia identificou prevalência de 9,4% de alteração auditiva no processo de triagem3232. Skarzynski H, Gos E, Swierniak W, Skarzynski PH. Prevalence of hearing loss among polish school-age children from rural areas - results of hearing screening program in the sample of 67 416 children. Int. J. Pediatr. Otorhinolaryngol. 2020;128:1-12.. Em uma pesquisa realizado no Rio de Janeiro (Brasil) com 196 crianças de 1 a 5 anos matriculadas na rede pública de ensino encontrou prevalência de 17,3% de alteração auditiva2727. Santos VF, Silva DTC, Py MO. Otoacoustic emissions as a hearing screening tool in 431 children aged 1 to 12 years-old. Distúrb. Comun. 2014;26(1):5-14.. Em outro estudo realizado no Brasil com 391 escolares de 6 a 9 anos matriculados na rede pública da cidade de Caxias do Sul/RS verificou que 14,6% apresentaram alteração auditiva2424. Tamanini D, Ramos N, Dutra LV, Bassanesi HJC. School-age hearing screening: identification of hearing impairments in first grade students. Rev. CEFAC. 2015;17(5):1403-14.. Esses dados corroboram o presente estudo que encontrou 17% de possível alteração auditiva na triagem do pré-escolar.

Conforme relatado na literatura, a triagem auditiva escolar permite a detecção precoce de alterações auditivas que possam influenciar negativamente nos processos de aprendizagem, leitura e escrita proporcionando melhoria na qualidade de vida da população pediátrica2424. Tamanini D, Ramos N, Dutra LV, Bassanesi HJC. School-age hearing screening: identification of hearing impairments in first grade students. Rev. CEFAC. 2015;17(5):1403-14.,2828. Farinetti A, Raji A, Wu H, Wanna B, Vincent C. International consensus (ICON) on audiological assessment of hearing loss in children. European Annals of Otorhinolaryngology. Head and Neck Diseases. 2018;135(1):S41-8.. Devido a prevalência de alterações auditivas na faixa etária de 1 a 5 anos, as crianças devem ser acompanhadas e monitoradas auditivamente para permitir a aquisição adequada da linguagem e aprendizado de conceitos por se tratar da fase inicial da alfabetização2727. Santos VF, Silva DTC, Py MO. Otoacoustic emissions as a hearing screening tool in 431 children aged 1 to 12 years-old. Distúrb. Comun. 2014;26(1):5-14.. Destaca-se que a triagem auditiva escolar é uma forma eficiente de determinar a conduta adequada a ser adotada quando são detectados escolares com perdas auditivas2929. Lindau TA, Delecrode CR, Cardoso ACV. Tympanometric findings in a group of students. Rev. CEFAC. 2013;15(6):1453-60..

O presente estudo demonstrou que o ideal é utilizar EOAT e imitanciometria para as crianças de 12 a 24 meses e audiometria tonal lúdica e imitanciometria para as crianças de 2 a 5 anos seguindo as seguintes etapas: inspeção do meato acústico externo para avaliar possíveis obstruções que impeçam a visualização da membrana timpânica e a entrada do som no conduto auditivo, avaliação e conduta otorrinolaringológica para as crianças com alguma alteração na meatoscopia (obstrução do MAE), EOAT e/ou audiometria tonal lúdica e imitanciometria.

No presente estudo as crianças que falharam no teste de triagem auditiva foram reavaliadas e os resultados confirmaram perda auditiva do tipo condutiva de grau leve à moderado unilateral, perda auditiva do tipo condutiva de grau leve bilateral, perda auditiva do tipo neurossensorial de grau leve bilateral. Vale ressaltar que um terço das crianças que falharam na triagem auditiva refizeram os exames e não apresentaram alterações na reavaliação. Esse fato justifica-se pela possível associação entre disfunção da tuba auditiva causada por resfriados e gripes e alteração temporária nos testes auditivos3030. Etges CL, Reis MCP, Menegotto IH, Sleifer P, Soldera CLC. Achados na triagem imitanciométrica e de processamento auditivo em escolares. Rev. CEFAC. 2012;14(6):1098-107.. Vale destacar que o tempo entre a realização da triagem e o diagnóstico foi de três meses e possivelmente as crianças melhoraram nesse período.

Para a triagem da linguagem, utilizou-se o Roteiro de Observação do Comportamento de Crianças de 0 a 6 anos de idade adaptado1616. Chiari BM, Basílio CS, Nakagwa EA, Cormedi MA, Silva NSM, Cardoso RM et al. Proposta de sistematização de dados da avaliação fonoaudiológica através da observação de comportamentos de crianças de 0 a 6 anos. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 1991;3(2):29-36..Trata-se de um método de fácil aplicação, baixo custo e capaz de abranger os aspectos cognitivos, receptivos e emissivos da linguagem em situações naturais do brincar, nas quais há maior variedade comunicativa apresentada pela criança1616. Chiari BM, Basílio CS, Nakagwa EA, Cormedi MA, Silva NSM, Cardoso RM et al. Proposta de sistematização de dados da avaliação fonoaudiológica através da observação de comportamentos de crianças de 0 a 6 anos. Pró-Fono R. Atual. Cientif. 1991;3(2):29-36.,1818. Labanca L, Alves CRL, Braganca LLC, Dorim DDR, Alvim CG, Lemos SMA. Language evaluation protocol for children aged 2 months to 23 months: analysis of sensitivity and specificity. CoDAS. 2015;27(2):119-27.. Os resultados obtidos no presente estudo foram analisados de acordo com o Índice de Desempenho descrito na literatura1717. Santos JN, Rates SPM, Lemos SMA, Lamounier JA. Anemia em crianças de uma creche pública e as repercussões sobre o desenvolvimento de linguagem. Rev Paul Pediatr. 2009;27(1):67-73..

No presente estudo, 15% das crianças apresentaram possível alteração de linguagem, com predominância de falha no aspecto emissivo da linguagem, estando abaixo de 60% do Índice de Desempenho Geral. Em estudo com 752 crianças entre dois e 23 meses completos que frequentavam três unidades básicas de saúde de Belo Horizonte/MG com índice de vulnerabilidade similar ao presente estudo, demonstrou que 30,3% das crianças avaliadas apresentavam risco de alterações de linguagem e houve predomínio de alterações nos aspectos emissivos da linguagem, corroborando o presente estudo1818. Labanca L, Alves CRL, Braganca LLC, Dorim DDR, Alvim CG, Lemos SMA. Language evaluation protocol for children aged 2 months to 23 months: analysis of sensitivity and specificity. CoDAS. 2015;27(2):119-27.. Estudo realizado com 91 crianças entre 2 e 4 anos matriculadas na rede pública de ensino de Belo Horizonte/MG encontrou prevalência de 22%, 34% e 35% de alteração nos aspectos receptivos, emissivos e cognitivos da linguagem respectivamente44. Silva LK, Labanca L, Melo EM da C, Costa-Guarisco LP. Identification of language disorders in the school setting. Rev. CEFAC. 2014;(1):1972-9.. Em outro estudo, a prevalência de alteração na linguagem foi de 7%22. Oliveira AC de, César CPHAR, Matos G de G, Passos PS, Pereira LD, Alves T et al. Hearing, language, motor and social skills in the child development: a screening proposal. Rev. CEFAC. 2018;20(2):218-27..

A importância da triagem de linguagem nos pré-escolares se dá devido ao alto índice de alterações de linguagem encontradas nos diferentes estudos e possibilita intervenção em tempo oportuno nos casos de atrasos e distúrbios1818. Labanca L, Alves CRL, Braganca LLC, Dorim DDR, Alvim CG, Lemos SMA. Language evaluation protocol for children aged 2 months to 23 months: analysis of sensitivity and specificity. CoDAS. 2015;27(2):119-27.,3333. Sakai TA, Guijo LM, Barbosa DAN, Delecrode CR, Cardoso ACV. Auditory abilities stimulation in preschoolers. Rev. CEFAC. 2020;22(3):1-9.. Nos primeiros anos de vida, a maturação biológica e a interação com o meio são fundamentais para o desenvolvimento da linguagem favorecendo a construção da autonomia, socialização e desenvolvimento escolar da criança11. Willinger U, Schmoeger M, Deckert M, Eisenwort B, Loader B, Hofmair A et al. Screening for specific language impairment in preschool children: evaluating a screening procedure including the Token Test. J Psycholinguist Res. 2017;46(5):1237-47..

O índice de vulnerabilidade também é um fator importante para o desenvolvimento da linguagem. Locais com maior índice de vulnerabilidade social apresentaram maiores taxas de alterações de linguagem1818. Labanca L, Alves CRL, Braganca LLC, Dorim DDR, Alvim CG, Lemos SMA. Language evaluation protocol for children aged 2 months to 23 months: analysis of sensitivity and specificity. CoDAS. 2015;27(2):119-27., o que corrobora a presente pesquisa. Estudos indicam que fatores externos relacionados ao ambiente em que a criança vive influenciam no desenvolvimento infantil3131. Pereira SG, Carvalho A de JA, Escarce AG, Alves JMM, Goulart LMHF, Lemos SMA. Triagem auditiva na educação infantil: associação com determinantes de saúde. Distúrb. Comun. 2019;31(2):285-96.,3434. Zago JT de C, Pinto PAF, Leite HR, Santos JN, Morais RL de S. Association between neuropsychomotor development and biological and environmental risk factors in early childhood children. Rev. CEFAC. 2017;19(3):320-9..

As crianças que apresentaram possíveis alterações de linguagem foram encaminhadas para diagnóstico fonoaudiológico. Houve diagnóstico de transtorno fonológico caracterizado por produções atípicas dos sons da fala, omissões, substituições ou adições não esperadas para idade2121. Prates LPCS, Martins V de O. Distúrbios da fala e da linguagem na infância. Rev Médica de Minas Gerais. 2011;21(4):54-60.,2222. Bueno GJ, Rossi SG, Appezzato MM, Chang EM, Carvalho CA de F, Kida A de SB et al. Interference of phonological disorder on the reading of items with different psycholinguistic characteristics. Audiol - Commun Res. 2017;22(0):1-7.; gagueira do desenvolvimento caracterizado por rupturas na fala, como repetições de sons e sílabas, bloqueios e prolongamentos2121. Prates LPCS, Martins V de O. Distúrbios da fala e da linguagem na infância. Rev Médica de Minas Gerais. 2011;21(4):54-60. e alteração no desenvolvimento da linguagem oral caracterizado por vocabulário pobre, dificuldade na combinação de palavras para formar frases e fala ininteligível2121. Prates LPCS, Martins V de O. Distúrbios da fala e da linguagem na infância. Rev Médica de Minas Gerais. 2011;21(4):54-60.. Vale ressaltar que das 11 crianças que falharam na triagem de linguagem, dez tiveram diagnóstico de alteração de linguagem e apenas uma foi classificada sem alteração após avaliação especializada. Esse achado corrobora o estudo realizado em Gothenburg, na Suécia, que indicou que a cada 10 crianças que falharam na triagem de linguagem aos 2,5 anos, nove crianças tiveram diagnóstico de alteração de linguagem após avaliação especializada e foram encaminhadas para intervenção3535. Schachinger-Lorentzon U, Kadesjö B, Gillberg C, Miniscalco C. Children screening positive for language delay at 2.5 years: Language disorder and developmental profiles. Neuropsychiatr Dis Treat. 2018;14:3267-77.. Estudo realizado em São Paulo com 524 crianças entre 0 e 11 anos de idade identificou prevalência de 22,9% de transtorno fonológico, 13% em gagueira e 15% em linguagem oral3636. Longo IA, Tupinelli GG, Hermógenes C, Ferreira LV, Molini-Avejonas DR. Prevalence of speech and language disorders in children in the western region of São Paulo. CoDAS. 2017;29(6):1-7., o que difere do presente estudo no qual a prevalência encontrada foi de 6,6% de transtorno fonológico, 2,6% de gagueira do desenvolvimento e 4% de alteração de linguagem oral3636. Longo IA, Tupinelli GG, Hermógenes C, Ferreira LV, Molini-Avejonas DR. Prevalence of speech and language disorders in children in the western region of São Paulo. CoDAS. 2017;29(6):1-7..

No presente estudo não foi observada associação com relevância estatística entre alteração de audição e alteração de linguagem, porém, sabendo que a audição é um requisito para o desenvolvimento da linguagem oral e que é função correlacionada e interdependente com a linguagem, a deficiência auditiva produz efeitos significativos na linguagem oral22. Oliveira AC de, César CPHAR, Matos G de G, Passos PS, Pereira LD, Alves T et al. Hearing, language, motor and social skills in the child development: a screening proposal. Rev. CEFAC. 2018;20(2):218-27.,33. Borges MG de S, Gomes NSO, Medeiros AM de, Lemos SMA. Association between the auditory profile and speech-language-hearing diagnosis in children and adolescents. Rev. CEFAC. 2021;23(1):1-10..

No presente estudo duas crianças falharam tanto na triagem auditiva quanto na triagem de linguagem e é relevante descrever algumas características desses dois casos. Um caso refere-se a uma criança de 5 anos diagnosticada com perda auditiva neurossensorial de grau leve com configuração descendente acentuada e diagnosticada com alteração severa no desenvolvimento da linguagem oral. A análise do caso indica que possivelmente os fatores de risco para a alteração de linguagem e da perda auditiva foram a prematuridade extrema, peso ao nascer inferior 1500 gramas e longo tempo de internação em UTI neonatal3737. Souza ACF de S e, Casais-e-Silva LL, Sena EP de. The influence of prematurity on the development of phonological skills. Rev. CEFAC. 2019;21(4):1-9.,3838. Soares ACC, Silva K da, Zuanetti PA. Risk factors for language development associated with prematurity. Audiol - Commun Res. 2017;22:1-7.. A criança foi encaminhada ao Programa de Saúde Auditiva.

O outro caso refere-se a uma criança de 2 anos com perda auditiva condutiva de grau leve bilateral e com diagnóstico de alteração leve no desenvolvimento da linguagem oral. Estudos indicam que a privação sensorial auditiva, mesmo que temporária, pode causar alteração no desenvolvimento da linguagem oral3939. Bayat A, Farhadi M, Emamdjomeh H, Saki N, Mirmomeni G, Rahim F. Effect of conductive hearing loss on central auditory function. Braz. J. Otorhinolaryngol. 2017;83(2):137-41..

As alterações auditivas condutivas foram as mais prevalentes neste estudo e tais problemas levam a redução na intensidade dos sons percebidos pela criança e assim, os sons são reduzidos, abafados e perdem sua riqueza3939. Bayat A, Farhadi M, Emamdjomeh H, Saki N, Mirmomeni G, Rahim F. Effect of conductive hearing loss on central auditory function. Braz. J. Otorhinolaryngol. 2017;83(2):137-41.. Desta forma, os resultados do presente estudo não excluem a hipótese de que tais alterações auditivas podem ser precursoras de alterações de linguagem.

Estudos relatam que dificuldades nos processos de aprendizagem de leitura e escrita podem ser o desfecho de alterações auditivas condutivas nos primeiros anos de vida3939. Bayat A, Farhadi M, Emamdjomeh H, Saki N, Mirmomeni G, Rahim F. Effect of conductive hearing loss on central auditory function. Braz. J. Otorhinolaryngol. 2017;83(2):137-41.,4040. Carvalho NGD, Ubiali T, Amaral MIRD, Colella-Santos MF. Procedures for central auditory processing screening in schoolchildren. Brazilian J Otorhinolaryngol. 2018;13(5):469-74.. Estudo realizado com 122 crianças encontrou associação entre a alteração de audição confirmada por audiometria tonal em crianças e a hipótese diagnóstica de alteração de linguagem33. Borges MG de S, Gomes NSO, Medeiros AM de, Lemos SMA. Association between the auditory profile and speech-language-hearing diagnosis in children and adolescents. Rev. CEFAC. 2021;23(1):1-10..

Uma das limitações do presente estudo foi o tamanho amostral, o que limita as possíveis generalizações para população de pré-escolares.

Tendo em vista os resultados do presente estudo, a triagem de audição e linguagem em crianças pré-escolares é fundamental para detectar em tempo oportuno as alterações de audição e linguagem que possam afetar o pleno desenvolvimento das habilidades sociais, psíquicas e escolares e garantir o diagnóstico e intervenção precoce promovendo melhora na qualidade de vida da população escolar e o sucesso acadêmico do indivíduo.

Tais resultados validam a necessidade de implementação de programas de triagem que abrangem as áreas auditivas e de linguagem pois, mesmo que tais alterações não sejam necessariamente concomitantes, ambas as triagens são necessárias para evitar prejuízos no desenvolvimento cognitivo e escolar dessas crianças.

Conclusão

Das 75 crianças estudadas, 24% apresentaram alteração auditiva e 15% alteração de linguagem. Destas, 12 (16%) crianças foram diagnosticadas com perda auditiva e 10 (13%) com alteração de linguagem, porém, não houve associação entre a condição de audição e de linguagem no grupo estudado.

Este resultado enfatiza a necessidade do desenvolvimento de estratégias para a implementação da triagem escolar abrangendo a audição e linguagem, otimizando assim o desenvolvimento e integração dos aspectos sensoriais, perceptivos e cognitivos para o pleno desenvolvimento de aprendizagem.

REFERENCES

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  • Trabalho realizado no Departamento de Fonoaudiologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.
  • Fontes de auxílio à pesquisa: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    17 Mar 2021
  • Aceito
    06 Ago 2021
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