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Introdução da alimentação complementar em crianças prematuras

RESUMO

Objetivo:

descrever as características da introdução da alimentação complementar em crianças nascidas pré-termo.

Métodos:

trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório, descritiva, transversal, quantitativa. A coleta ocorreu em fevereiro de 2020 e entre os meses de maio e julho de 2021 em um ambulatório de seguimento de recém-nascidos de alto risco. Para participar da pesquisa as crianças tinham que ter iniciado a introdução alimentar há pelo menos 30 dias e ter no máximo 24 meses de idade gestacional corrigida. O instrumento de pesquisa, desenvolvido pelas pesquisadoras, foi aplicado com o responsável pela criança no dia das consultas de rotina, o que o acompanhante não soube responder foi averiguado no prontuário institucional do paciente.

Resultados:

a amostra foi composta por 29 díades, sendo 55,2% (16) do sexo masculino, e média de idade corrigida de 13 meses. A maioria das mães introduziu a alimentação complementar aos seis meses de idade corrigida. 25% delas introduziram tardiamente e 17,9% precocemente. Quase 100% dos bebês receberam frutas e/ou verduras como primeiros alimentos.

Conclusão:

mais da metade das mães iniciaram a alimentação complementar no tempo recomendado com consistência e utensilio adequados.

Descritores:
Nutrição do Lactente; Recém-Nascido; Prematuro; Nutrição da Criança

ABSTRACT

Purpose:

to describe the characteristics of complementary feeding introduced to preterm children.

Methods:

an exploratory, descriptive, cross-sectional, quantitative research. Data collection took place in February 2020 and between May and July 2021 in an outpatient follow-up clinic for high-risk newborns. To participate in the research, children had to have food introduced at least 30 days before and be 24 months corrected gestational age, at the most. The research instrument, developed by the researchers, was applied to the children’s parents/guardians on the day of routine visits. The information they did not know was verified in the patient's institutional medical record.

Results:

the sample comprised 29 mothers/babies, 55.2% (16) of whom were males, with a mean gestational age of 13 months. Most mothers introduced complementary feeding at 6 months corrected gestational age; 25% of them introduced it late and 17.9%, early. Almost 100% of the babies received fruits and/or vegetables as their first foods.

Conclusion:

more than half of the preterm children’s mothers started complementary feeding at the recommended time with adequate consistencies and utensils.

Keywords:
Infant Nutrition; Infant, Premature; Child Nutrition

Introdução

A Alimentação Complementar (AC) é todo e qualquer alimento ou líquido, diferente do leite materno, oferecido à criança a partir dos seis meses de idade11. BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica. Saúde da criança: aleitamento materno e alimentação complementar. 2 ed. Brasília, DF, 2015.. Deste período em diante apenas o leite não é mais suficiente para suprir suas necessidades nutricionais, por isso a importância da introdução da alimentação complementar e, se possível, a manutenção da amamentação até os dois anos de idade ou mais22. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the internet]. Departamento Científico de Nutrologia. Manual de Alimentação: orientações para alimentação do lactente ao adolescente, na escola, na gestante, na prevenção de doenças e segurança alimentar. 4ª ed. São Paulo: SBP; 2018. [accessed 2021 Aug 19]. Available at: https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=3160985&forceview=1.
https://edisciplinas.usp.br/mod/resource...
. Iniciar a alimentação no tempo oportuno e de boa qualidade é imprescindível para o crescimento e desenvolvimento infantil33. BRASIL. Ministério da Saúde Cadernos de Atenção Básica. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos. Brasília, DF, 2019..

O nascimento pré-termo é a principal causa de morte no primeiro ano de vida no país, tendo essa população maiores chances de apresentar desordens neurológicas e alterações em seu desenvolvimento44. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the internet]. Departamento Científico de Neonatologia. Monitoramento do crescimento de RN pré-termos. 2017 [accessed 2019 May 25]. Available at: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/2017/03/NeonatologiaMonitoramento-do-cresc-do-RN-pt-270117.pdf.
https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_up...
. Além disso, a prematuridade é um obstáculo para o aleitamento materno exclusivo até os seis meses55. Vasconcelos TC, Barbosa DJ, Gomes MP. Fatores que interferem no aleitamento materno exclusivo durante os primeiros seis meses de vida do bebê. Rev. Pró-UniverSUS. 2020;11(1):80- 7., dentre os entraves para tal prática com bebês prematuros estão aspectos biológicos, psicológicos e socioculturais66. Moraes AS, Aguiar RS. Dificuldades com a amamentação de recém-nascidos prematuros após a alta hospitalar: uma revisão integrativa. Rev. JRG de estudos acadêmicos. 2021;4(8):252-63..

Ao tratar da prematuridade, compreende-se que o início da alimentação complementar em crianças nascidas pré-termo dependerá de sua maturidade neurológica, portanto utiliza-se a idade gestacional corrigida como parâmetro77. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the internet]. Departamento de Científico de Neonatologia. Seguimento ambulatorial do prematuro de risco. 1ª edição. 2012. [accessed 2019 Nov 3]. Available at: https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/pdfs/seguimento_prematuro_ok.pdf.
https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_up...
. Os recém nascidos pré-termo, podem apresentar maiores dificuldades na transição alimentar em relação às crianças nascidas a termo, dessa maneira, é de suma importância que essas crianças estejam em uma rede de apoio especializada desde cedo a fim de assegurar seu desenvolvimento88. Pagliaro CL, Buhler KEB, Ibidi SM, Limongi SCO. Dietary transition difficulties in preterm infants: critical literature review. Jornal de Pediatria. 2016;92(1):7-14..

A escassez de referências a respeito da alimentação complementar em crianças nascidas pré-termo revela a necessidade de mais pesquisas nesse campo, uma vez que alimentação é fundamental para o crescimento e nutrição dessas crianças, que se constituem como grupo de risco para alterações no desenvolvimento. Dessa forma, conhecer melhor essa população contribuirá na prática clínica das equipes de profissionais e facilitará o cuidado da família com esses bebês. O objetivo do trabalho foi descrever as características associadas à introdução da alimentação complementar em crianças nascidas pré-termo.

Métodos

O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da Maternidade Climério de Oliveira, Brasil, com CAAE: 26733119.1.0000.5543, parecer Nº: 3.768.089. Este estudo faz parte de um projeto guarda-chuva intitulado “Alimentação complementar em crianças nascidas pré-termo” e foi realizado no ambulatório de seguimento do prematuro da Maternidade Climério de Oliveira da Universidade Federal da Bahia - UFBA.

A amostra foi de conveniência, e foram incluídas crianças nascidas pré-termo acompanhadas no referido ambulatório, e que já tivessem iniciado a alimentação complementar há no mínimo 30 dias e até no máximo 24 meses de idade gestacional corrigida (IGC) completos no dia da coleta de dados. Todas as crianças deveriam estar em alimentação oral exclusiva. Esse período de no mínimo 30 dias foi estabelecido pelas pesquisadoras a fim de obter respostas mais consistentes e homogêneas, considerando que a introdução da alimentação complementar acontece de forma gradual.

Foram critérios de exclusão crianças com doenças neurológicas, cardiológicas, do sistema respiratório, malformações craniofaciais ou em vias aerodigestivas, ou qualquer outra situação clínica que interferisse diretamente na segurança da deglutição e eficácia da alimentação oral.

Trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório, descritiva, transversal, quantitativa.

Coleta de Dados

A coleta de dados ocorreu em fevereiro de 2020 e entre os meses de maio e julho de 2021, devido à pandemia pelo Covid-19. Sendo desempenhada pelas pesquisadoras envolvidas no projeto e pelos fonoaudiólogos que atuam no ambulatório do referido serviço.

Os responsáveis pela criança foram convidados a participar do estudo quando foram informados sobre os objetivos e metodologia da pesquisa. Os que concordaram em participar assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). Cada responsável foi entrevistado uma única vez, na ocasião de suas consultas de rotina.

O instrumento de coleta foi um formulário semiestruturado desenvolvido e aplicado pelas pesquisadoras. Para a presente investigação foram utilizadas as variáveis de classificação da prematuridade, sócio demográficos maternos, duração do aleitamento materno, uso de bicos artificiais e os dados sobre a introdução da alimentação complementar.

As informações que os pais ou responsáveis não souberam responder, foram consultadas no prontuário institucional do paciente.

Análise dos Dados

O banco de dados foi criado utilizando-se o programa Microsoft® Excel 2010. Foi procedida a uma análise descritiva (média, desvio padrão, frequência absoluta e relativa).

Resultados

A amostra foi composta por 29 crianças, sendo 55,2% (16) do sexo masculino. Os dados referentes à classificação da prematuridade quanto idade gestacional, peso e classificação segundo a curva de percentil ao nascer da amostra, encontram-se na Tabela 1.

Tabela 1:
Dados de classificação da prematuridade quanto idade gestacional, peso e classificação segundo a curva de percentil ao nascer

Os dados maternos quanto à idade e ao grau de escolaridade estão descritos na Tabela 2.

Tabela 2:
Dados maternos da amostra

No que se refere ao histórico do aleitamento, 58,6% (17) das crianças saiu de alta hospitalar em aleitamento materno exclusivo (AME), dessas 31% (9) atingiu o AME aos seis meses de IGC.

A Tabela 3 descreve as informações sobre a introdução da alimentação complementar. Uma mãe não soube responder quando iniciou.

Tabela 3:
Informações sobre a introdução da alimentação complementar

Frutas e/ou verduras foram os primeiros alimentos oferecidos aos bebês e mencionados por 28 mães. Os tipos de alimentos oferecidos inicialmente estão descritos na Tabela 4. A consistência dos alimentos utilizados no momento da introdução da alimentação complementar está detalhada na Tabela 5.

Tabela 4:
Alimentos da introdução da alimentação complementar

Tabela 5:
Consistências dos alimentos na introdução da alimentação complementar

Discussão

A presente amostra, composta por prematuros que são acompanhados no ambulatório de seguimento de uma instituição Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC), mostrou que mais da metade dos bebês iniciaram a AC aos seis meses de idade gestacional corrigida (IGC). Ainda não há consenso na literatura a respeito do momento ideal para a introdução da alimentação complementar em prematuros11. BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica. Saúde da criança: aleitamento materno e alimentação complementar. 2 ed. Brasília, DF, 2015.,99. Baldassare ME, Di Mauro A, Pedico A, Rizzo V, Capozza M, Meneghin F. Tempo de desmame em bebês prematuros: uma auditoria de pediatras da atenção primária italiana. Nutrients. 2018;10(5):616.,1010. Liotto N, Cresi F, Beghetti I, Roggero P, Menis C, Corvaglia L et al. Alimentação complementar em bebês prematuros: uma revisão sistemática. Nutrients. 2020;12(6):1843.. Alguns autores, descrevem que bebês prematuros expostos a AC aos quatro meses tiveram maior admissão hospitalar em relação ao grupo de bebês que iniciou aos seis meses de IGC1111. Gupta S, Agarwal R, Aggarwal KC, Chellani H, Duggal A, Arya S. Alimentação complementar aos 4 versus 6 meses de idade para bebês prematuros nascidos com menos de 34 semanas de gestação: um estudo randomizado, aberto e multicêntrico. Lancet Glob. Health. 2017;5(5):e501.. No entanto, outro estudo constatou que a introdução da AC precoce trouxe benefícios para o crescimento e aspectos nutricionais nesta população1212. Foote KD, Marriott L. Weaning of infants. Arch Dis Child. 2003;88:488-92..

Adiar o início da AC pode trazer impactos negativos para o bebê, como déficit no crescimento e carência de micronutrientes, de energia e de proteínas11. BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica. Saúde da criança: aleitamento materno e alimentação complementar. 2 ed. Brasília, DF, 2015.. Porém, tratando-se de uma população nascida com menos de 33 semanas de idade gestacional, muitas vezes com baixo peso extremo, a introdução tardia se deva a imaturidade neurológica, às condições oromotoras, do desenvolvimento neuropsicomotor ou até outras dificuldades que impeçam a introdução da AC. A idade gestacional ao nascimento influencia no desenvolvimento sensório motor oral e motor global. Quanto menor a idade gestacional ao nascimento, maiores são os riscos de atraso no desenvolvimento do sistema sensório motor oral e, consequentemente das funções que ele desempenha1313. Castro AG, Lima MC, Aquino RR, Eeickmann SH. Desenvolvimento do sistema sensório motor oral e motor global em lactentes pré-termo. Pró-Fono Rev. Atual. Cientif. 2007;19(1):29-38..

Para iniciar a alimentação complementar em crianças nascidas pré-termo, é importante levar em consideração dois pontos: a idade gestacional corrigida e os sinais de prontidão do bebê11. BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica. Saúde da criança: aleitamento materno e alimentação complementar. 2 ed. Brasília, DF, 2015.. Ou seja, deve-se avaliar a maturidade e a organização motora global e oral dessas crianças. Dentre os parâmetros a serem analisados do desenvolvimento motor para início da AC, estão: sustentar cabeça e pescoço; sentar sem apoio; redução do reflexo de protrusão de língua; manipular objetos, entre outros1414. Perilo TVC. Tratado do especialista em cuidado materno-infantil com enfoque em amamentação. Belo Horizonte. Mame bem. Editora METHA. 2019.. Em uma coorte de crianças acompanhadas ambulatoriamente até os dois anos de idade, constatou-se que a maioria das crianças prematuras apresentaram o desenvolvimento neuropsicomotor dentro do esperado para idade e marco adequados1515. Jesus LMR, Basso CSD, Castuglioni L, Monserrat AL, Arroyo MAS. Speech-language-hearing follow-up of preterm children: feeding and neuropsychomotor performance. Rev. CEFAC. 2020;22(4):e15119..

De acordo com um estudo, mais de 95% dos bebês pré-termo, aos seis meses de idade corrigida, já haviam recebido alimentos sólidos1616. Cleary J, Dalton SMC, Harman A, Wright I. Prática atual na introdução de alimentos sólidos para bebês prematuros. Public Health Nutr. 2019;23(1):94-101.. Outro estudo realizado no Rio Grande do Sul mostrou que bebês prematuros receberam alimentos pastosos no momento ideal, aos seis meses, porém líquidos e alimentos sólidos antes do tempo recomendado1717. Brusco TR, Delgado SE. Characterization of the feeding development of preterm infants between three and twelve months. Rev. CEFAC. 2014;16(3):917-28..

No que diz respeito ao aleitamento materno, tema intimamente relacionado à alimentação complementar, observou-se que mais da metade das díades tiveram alta hospitalar em aleitamento materno exclusivo (AME) e dessas mais da metade permaneceram em AME até os 6 meses de vida do bebê. A interrupção da prática do aleitamento, e consequente início da AC, antes do período recomendado nesses bebês está associada a inúmeros fatores, tais como biológicos, psicológicos e socioculturais66. Moraes AS, Aguiar RS. Dificuldades com a amamentação de recém-nascidos prematuros após a alta hospitalar: uma revisão integrativa. Rev. JRG de estudos acadêmicos. 2021;4(8):252-63.. Entre os motivos mais comuns estão sensação de leite insuficiente, crença nos benefícios do chá e necessidade de água1818. Lima KMS, Santos JMJ, Oliveira NTB, Machado GCC, Leite AML. Possíveis motivações para o desmame precoce entre mães adolescentes. 2º Congresso Internacional de Enfermagem. 12º de setembro de 2019;1(1). Available at: https://eventos.set.edu.br/cie/article/view/11367 .
https://eventos.set.edu.br/cie/article/v...
. Um estudo constatou que no Brasil, a prevalência do aleitamento aos seis meses foi de 68,6%1919. Scochi CGS, Ferreira FY, Góes FSN, Fujinaga CI, Ferecini GM, Leite AM. Alimentação láctea e prevalência do aleitamento materno em prematuros durante internação em um hospital amigo da criança de Ribeirão Preto-SP, Brasil. Ciência, Cuidado e Saúde. 2008;7(2):145-54.. Esse número cai substancialmente na população pré termo, outros autores descreveram a prevalência do AME em prematuros aos seis meses em 22%, sendo que 33,3% estavam em aleitamento misto2020. Czechowski AE, Fujinaga CI. Seguimento ambulatorial de um grupo de prematuros e a prevalência do aleitamento na alta hospitalar e ao sexto mês de vida: contribuições da fonoaudiologia. Rev. Soc Bras de Fonoaudiol. 2010;15(4):527-7., números abaixo dos achados nesse estudo.

É provável que o maior percentual de AME no presente estudo se deve ao fato das díades terem seguimento ambulatorial e receberem orientações da equipe multiprofissional. Quase a totalidade dos participantes afirmaram que foram orientados tanto pelo nutricionista quanto pela pediatra do ambulatório quanto à introdução da alimentação complementar. Menos de 1/4 da amostra introduziu outros alimentos na dieta antes dos 6 meses de IGC. Autores, encontraram associação entre a introdução da AC com a baixa escolaridade materna e bebês do sexo masculino1616. Cleary J, Dalton SMC, Harman A, Wright I. Prática atual na introdução de alimentos sólidos para bebês prematuros. Public Health Nutr. 2019;23(1):94-101.. Nesse sentido, outro fato que pode ter contribuído para as taxas favoráveis de AME no presente estudo, é que 79,2% das genitoras tinham ensino médio completo ou superior incompleto. O desmame precoce está associado à baixa escolaridade dos pais e à introdução precoce de outros tipos de leite ou fórmula láctea2121. Alvarenga SC, Castro DS, Leite FMC, Brandão MAG, Zandonade E, Primo CC. Fatores que influenciam o desmame precoce. Rev. Aquichan. 2017;17(1):93-103.. Todavia, outros autores descreveram um número elevado de mães com no mínimo ensino médio completo que passaram pelo desmame precoce2222. Brandt GP, Britto AMA, Leite CCP, Marin LG. Fatores associados ao aleitamento materno exclusivo em maternidade hospitalar de referência no parto humanizado. Rev Bras Ginecol Obstet. 2021;43(2):91-6..

A literatura evidencia a importância de um plano que envolva mãe-filho e equipe multidisciplinar em diferentes níveis de atenção da saúde para que haja acompanhamento e promoção efetiva do aleitamento após alta hospitalar, uma vez que a descontinuidade em tempo inoportuno é bastante comum1818. Lima KMS, Santos JMJ, Oliveira NTB, Machado GCC, Leite AML. Possíveis motivações para o desmame precoce entre mães adolescentes. 2º Congresso Internacional de Enfermagem. 12º de setembro de 2019;1(1). Available at: https://eventos.set.edu.br/cie/article/view/11367 .
https://eventos.set.edu.br/cie/article/v...
. O presente estudo trata de díades que recebem acompanhamento ambulatorial em um IHAC e isso pode ter sido decisivo para as taxas de aleitamento tão positivas.

É importante salientar que o tipo de aleitamento pode estar associado à dificuldade alimentar no período de introdução da alimentação complementar. Pesquisadoras que estudaram esse tema, relataram que a recusa alimentar ocorreu principalmente em recém-nascidos pré-termo que estiveram em uso de fórmula2323. Menezes LVP, Steinberg C, Nóbrega AC. Complementary feeding in infants born prematurely. CoDAS. 2018;30(6):e20170157..

Em se tratando da consistência e utensílios para este momento inicial da alimentação da criança, a recomendação para a introdução da AC é de ofertar ao bebê frutas amassadas ou raspadas e pelo menos uma refeição principal, isto é, que contenha cereal ou tubérculo, proteína, leguminosas e hortaliças. A colher deve ser o utensilio a ser utilizado, e as quantidades precisarão ser aumentadas gradativamente ao longo do tempo22. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the internet]. Departamento Científico de Nutrologia. Manual de Alimentação: orientações para alimentação do lactente ao adolescente, na escola, na gestante, na prevenção de doenças e segurança alimentar. 4ª ed. São Paulo: SBP; 2018. [accessed 2021 Aug 19]. Available at: https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=3160985&forceview=1.
https://edisciplinas.usp.br/mod/resource...
. Nesta amostra a maioria das mães ofertou aos seus bebês frutas e ou verduras amassadas utilizando colher, como recomenda a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e Ministério da Saúde. Uma pesquisa feita em Salvador-BA, revelou que todas as crianças prematuras que iniciaram a alimentação complementar com consistência liquidificada apresentaram comportamento defensivo de arquear o corpo durante o processo de introdução da AC2424. Steinberg C, Menezes LVP, Nóbrega AC. Oral motor disorder and feeding difficulty during the introduction of complementary feeding in preterm infants. CoDAS. 2021;33(1):e20190070..

Não foi encontrado no presente estudo indícios de maus hábitos alimentares. Nenhuma mãe declarou ter ofertado aos seus bebês alimentos processados, com alto teor de açúcar, alto teor de sódio, cafeína entre outros. Tais alimentos estão associados ao desenvolvimento de doenças crônicas como diabetes, obesidade e doenças cardiovasculares22. Sociedade Brasileira de Pediatria [homepage on the internet]. Departamento Científico de Nutrologia. Manual de Alimentação: orientações para alimentação do lactente ao adolescente, na escola, na gestante, na prevenção de doenças e segurança alimentar. 4ª ed. São Paulo: SBP; 2018. [accessed 2021 Aug 19]. Available at: https://edisciplinas.usp.br/mod/resource/view.php?id=3160985&forceview=1.
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. Um estudo realizado na Itália com bebês prematuros tardios, com idade gestacional entre 34 e 36 semanas, mostrou que mais da metade deles receberam os primeiros alimentos com baixo valor nutricional, apesar de necessitarem de alimentos ricos em proteína e energia para garantir o crescimento adequado dessa população2525. Gianni ML, Bezze E, Colombo L, Rossetti C, Pesenti N, Roggero P et al. Práticas de alimentação complementar em uma coorte de bebês prematuros atrasados na Itália. Nutrients. 2018;10(12):1861.. Em Belém-PA, crianças a partir dos quatro meses de idade corrigida também receberam alimentos pouco nutritivos e com grande teor de açúcar, como, refrigerante, biscoito recheado, café, bolacha e achocolatado2626. Marques RFSV, Sarni ROS, Santos FPC, Brito DMP. Práticas inadequadas da alimentação complementar em lactentes, residentes em Belém-PA. 2013. [accessed 2021 Nov 29]. Available at: http://files.bvs.br/upload/S/0101-5907/2013/v27n2/a3675.pdf.
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Considera-se como limitações do estudo o número reduzido de participantes, decorrente das dificuldades relacionadas à coleta de dados durante a pandemia da Covid-19 e um possível viés de informação, com dados incompletos a respeito do uso de bicos artificiais, cujo tema não pôde ser discutido pelas autoras.

Conclusão

No presente estudo mais da metade das mães iniciaram a alimentação complementar no tempo recomendado com consistência e utensilio adequados. Além disso, pode-se considerar que o aleitamento aos seis meses de idade gestacional corrigida foi uma prática de sucesso. Trata-se de um grupo vulnerável que precisa de acompanhamento multiprofissional pós alta hospitalar, a fim de que se assegure o incentivo ao aleitamento materno e promova a introdução alimentar complementar segura e saudável.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    06 Jul 2022
  • Aceito
    04 Out 2022
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