Observação do Comportamento Comunicativo: protocolo atualizado de 0 a 72 meses

RESUMO

Objetivo:

descrever a atualização do protocolo Observação do Comportamento Comunicativo na faixa etária de 0 a 72 meses.

Métodos:

a Observação do Comportamento Comunicativo foi revisada e atualizada, com inserção de marcos do desenvolvimento infantil em suas diversas áreas, tornando-se um instrumento de triagem do desenvolvimento infantil.

Resultados:

o protocolo contempla 188 itens, distribuídos em 10 faixas etárias: de zero a 72 meses. Os itens foram organizados da seguinte forma: de zero a 12 meses, divididos por trimestre (quatro faixas etárias); de 12 a 24 meses, por semestre (duas faixas etárias); e, de 24 a 72 meses, divididos por ano (quatro faixas etárias). Os itens contemplam as áreas do desenvolvimento infantil e seus principais marcos. A pontuação é registrada no próprio protocolo, atribuindo a análise da resposta em 0 - não realiza a ação ou comportamento; 1 - realiza de maneira atípica, restrita ou está em aquisição; 2 - realiza adequadamente a ação/comportamento. São necessários poucos materiais para aplicação e ambiente estruturado.

Conclusão:

o protocolo Observação do Comportamento Comunicativo traz impacto direto na avaliação inicial de crianças com ou sem suspeita de atraso no desenvolvimento infantil e deve ser utilizado por profissionais da saúde, no acompanhamento do desenvolvimento infantil típico (rotina) ou em casos em que a criança recebe estimulação específica.

Descritores:
Protocolos; Criança; Desenvolvimento Infantil; Neurociências

ABSTRACT

Purpose:

to describe the updating of the Observation of Communicative Behavior protocol in the age group from 0 to 72 months.

Methods:

the Observation of Communicative Behavior protocol was revised and updated, with the insertion of the child development milestones in its various areas, becoming a child development screening tool.

Results:

the protocol includes 188 items, distributed in 10 age groups from zero to 72 months. The items were organized as follows: from zero to 24 months, divided by quarter (four age groups); from 24 to 36 months per semester (two age groups); and from 36 to 72 months, divided by year (four age groups). The items covered the areas of child development and its main milestones. The score is registered in the protocol and a score of 0 - does not perform the action or behavior, 1 - performs the action in an atypical, restricted manner or it is being acquired, 2 - properly performs the action/behavior, is attributed to the response, after analysis. Few materials and a structured environment are needed to apply the protocol.

Conclusion:

the updating of the Observation of Communicative Behavior protocol has a direct impact on the initial assessment of children with or without suspected delay in child development and should be used by health professionals in monitoring typical child development (routine) or in cases where the child receives specific stimulation.

Keywords:
Protocols; Child; Child Development; Neurosciences

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento infantil é um processo maturacional e interativo, resultando em uma progressão ordenada de habilidades perceptivas, motoras, cognitivas, de linguagem, socioemocionais e de autorregulação¹, destacando-se que, nos primeiros anos, é moldada a arquitetura cerebral, a partir da interação entre herança genética e influências do meio.

Há evidências crescentes de que a identificação de atrasos do neurodesenvolvimento e intervenção precoces têm o potencial de alterar o desenvolvimento adverso e fornecer benefícios significativos de curto e longo prazo para as crianças^2,3. Nesta perspectiva, a compreensão de trajetórias do desenvolvimento normativo, durante a primeira infância, é de fundamental relevância, com olhar nas diferentes interações das habilidades motora, linguística, cognitiva e pessoal-social, uma vez que cada habilidade influencia no desenvolvimento da outra ³.

Neste mesmo sentido, há vasta literatura sobre a importância da vigilância do desenvolvimento infantil, acompanhamento de fatores de risco e proteção, com objetivo principal de favorecer o neurodesenvolvimento, priorizando as janelas de desenvolvimento e estimulação essencial no período de maior plasticidade cerebral, bem como realizar diagnósticos assertivos o mais precocemente possível^4-7.

Desta forma, o prognóstico de crianças com alteração no desenvolvimento global ou específico é mais promissor e há maior possibilidade de atingir o verdadeiro potencial que cada criança pode apresentar⁸.

O conhecimento do desenvolvimento normativo é primordial para a identificação de sinais de risco e os procedimentos de triagens são de extrema relevância para a tomada de medidas que minimizem prováveis atrasos do desenvolvimento⁸, bem como os efeitos deletérios que estes atrasos possam causar no desenvolvimento infantil. Com o procedimento de rastreamento do neurodesenvolvimento e identificação de sinais de risco, é possível a verificação de cada área em particular, por meio de procedimentos diagnósticos adicionais, padronizados ou normatizados para a realidade da população alvo. Conhecer a expectativa do desenvolvimento para cada faixa etária colabora no encaminhamento para estimulação segura, favorecendo que a criança possa desenvolver plenamente seu potencial.

A mensuração do desenvolvimento infantil é fundamental para as determinações clínicas sobre as necessidades das crianças e famílias^8,9.

Avaliar e realizar diagnóstico de alterações do desenvolvimento em bebês e crianças é de importância inestimável em relação à possibilidade de realizar estimulação essencial, reduzindo ou sanando prejuízos e sequelas ao longo da vida, minimizando consequências no ambiente familiar bem como otimizando os serviços públicos que esta criança venha a precisar⁵.

Diante deste cenário, após anos de experiência na atuação em diagnóstico fonoaudiológico em quadros mais abrangentes do desenvolvimento infantil, realizou-se compilação sobre evolução de habilidades e marcos do desenvolvimento na faixa etária de 0 a 72 meses e organização em um protocolo a ser aplicado de maneira rápida e prática, com recursos acessíveis.

Desta forma, o objetivo deste trabalho é descrever a atualização do protocolo Observação do Comportamento Comunicativo na faixa etária de 0 a 72 meses.

MÉTODOS

Considerando o tema central do estudo, a atualização de protocolo de avaliação, não envolvendo aplicação em seres humanos e sem dados de estudo piloto ou normatização, não foi necessário que este trabalho fosse apreciado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos (CEP).

O protocolo Observação do Comportamento Comunicativo (OCC) foi construído, inicialmente, com o intuito acadêmico, para auxiliar discentes da graduação na observação de comportamentos infantis, para verificar se os comportamentos observados estavam de acordo com as expectativas da idade cronológica das crianças. Em 2010 e 2017, o protocolo foi revisado e a folha de anotação das observações foi reestruturada, a partir de sua versão original^10,11, passando a ser utilizado em clínica escola (universidade), em estágio de diagnóstico fonoaudiológico (crianças com alterações de linguagem como parte de quadros mais abrangentes ou com síndromes genéticas) e em estudos desenvolvidos no grupo de pesquisa institucional.

O atual protocolo OCC, descrito neste artigo, recebeu nova revisão, atualização de folha de anotação das observações e considerou / inseriu marcos do desenvolvimento infantil em suas quatro áreas de base: motora fina-adaptativa, motora grossa, pessoal-social-emocional e linguagem e comunicação. Foi construído com base nos manuais das principais escalas de desenvolvimento normativo^12-15.

A OCC é um instrumento de triagem do desenvolvimento infantil, na faixa etária de 0 a 72 meses, padronizado, seguindo fluxo contínuo do desenvolvimento, considerando a idade cronológica e a evolução dos marcos do desenvolvimento infantil, em suas principais áreas de base. Tem como objetivo favorecer a compreensão dos marcos e a necessidade de intervenção ou encaminhamento para processos de diagnóstico, quando verificado que a criança não está apresentando desenvolvimento e aquisição de habilidades esperados para a faixa etária que se encontra.

A aplicação da OCC é rápida, após uso frequente do protocolo, utilizando cerca de 20 minutos, em média, para conclusão, variando de acordo com a idade e fatores como comportamento, ambiente, prática do avaliador, dentre outros.

O material para aplicação é simples, de fácil manejo e transporte: sino, chocalho, espelho, livro infantil, garrafa de plástico (com tampa de rosquear), bolinhas de papel ou outro material (que caiba na garrafa), jogo de encaixe de formas geométricas (simples), 10 cubos (cores primárias, tamanho aproximado de 2,5 cm), miniaturas (boneca, carro, animais, xícara, copo, prato, colher, cama, escova de cabelo ou pente, telefone), bola (tamanho da bola de tênis), folha sulfite, lápis, tesoura, alfabeto, corda. Em relação ao ambiente, é necessário ser arejado, com boa iluminação, tranquilo (sem ruídos) e ter disponível colchonete, mesa e cadeira infantis.

Em situação lúdica, com atuação espontânea da criança e semidirigida pelo avaliador, os itens pertinentes à idade cronológica são avaliados, considerando três possibilidades de anotação de resposta: 0 - não realiza a ação ou comportamento; 1 - realiza de maneira atípica, restrita ou está em aquisição; 2 - realiza adequadamente a ação/comportamento. É esperado que a criança realize os itens do mês ou faixa etária correspondente à sua idade cronológica. Quando há anotações de resposta em “0” ou “1”, itens da faixa etária anterior devem ser avaliados até que a criança realize 90% dos itens do protocolo referente à determinada faixa etária.

Por ser um instrumento de triagem, quando a criança não apresenta 90% dos itens relacionados à sua idade cronológica, deve ser realizado encaminhamento para avaliação completa e diagnóstico de possíveis alterações do desenvolvimento infantil, bem como realizada reaplicação da OCC em dois ou três meses, após orientação familiar das habilidades que a criança não realizou. Os padrões normativos de pontuação, considerando desvio-padrão, bem como a análise da psicometria deste instrumento estão em fase de desenvolvimento e em futuro breve serão publicados.

RESULTADOS

O protocolo OCC atualizado contempla 188 itens distribuídos na faixa etária de 0 a 72 meses, considerando o ritmo de desenvolvimento e aquisição de habilidades em suas diferentes áreas.

Os itens, respeitando a sequência do desenvolvimento infantil e seus marcos nas quatro grandes áreas de desenvolvimento, foram distribuídos em 10 faixas etárias:

• 1º ano de vida - 0 a 12 meses: divididos por trimestre (quatro faixas etárias);

• 2º ano de vida - 12 a 24 meses: divididos por semestre (duas faixas etárias);

• 3º ao 6º ano de vida - 24 a 72 meses: divididos por ano (quatro faixas etárias).

No Quadro 1 estão distribuídas as quantidades de itens a serem avaliados por faixa etária.

Quadro 1:
Quantidade de itens a serem avaliados por faixa etária

Faixa Etária	Meses	Número de itens
1	0-3 meses	21
2	3-6 meses	22
3	6-9 meses	24
4	9-12 meses	27
5	12-18 meses	19
6	18-24 meses	22
7	24-36 meses	21
8	36-48 meses	16
9	48-60 meses	8
10	60-72 meses	8

Na própria folha de resposta do protocolo OCC, há três colunas para registro da resposta, classificada em “0”, “1” ou “2”.

DISCUSSÃO

O protocolo OCC foi desenvolvido com base na necessidade de instrumento que compilasse marcos do desenvolvimento infantil em suas diversas áreas, com o principal intuito de estudantes e profissionais da área da saúde realizarem verificação de desenvolvimento normativo ou, quando pertinente, observarem sinal de risco para atraso do desenvolvimento infantil^10,11.

A OCC é um instrumento de triagem do desenvolvimento infantil, de fácil aplicação, com folha de resposta autoexplicativa e pontuação padronizada. Os materiais necessários para a aplicação da OCC são de fácil acesso e transporte, possibilitando aplicação em diferentes ambientes. Ressalta-se a importância do conhecimento das expectativas de aparecimento e consistência das habilidades do neurodesenvolvimento para a verificação de que o comportamento observado está dentro da expectativa normativa para a faixa etária que a criança se encontra. Conforme apresentado¹, há uma necessidade urgente de indicadores de desenvolvimento infantil em nível populacional, para permitir o monitoramento contínuo, uma vez que a identificação de crianças em risco (mesmo leve) é essencial ^2-4, pois a literatura tem mostrado evidências da importância de processos de intervenção precoces para reduzir discrepâncias marcantes para o futuro da criança ^2-8.

Autores analisaram a utilização da estratégia de Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI), a qual foi criada com intuito de capacitar profissionais da área da saúde para oferecer assistência integral à saúde das crianças e prevenir agravos nos primeiros anos de vida. Um ponto negativo identificado em sua aplicação foi a ausência dos marcos do desenvolvimento organizados mês a mês, mas sim por períodos etários mais extensos¹⁶. Estes autores consideraram que, principalmente, entre 0 e 24 meses, o ritmo de desenvolvimento é mais intenso, sendo indicada a divisão por meses, quanto às observações dos marcos do desenvolvimento infantil. O protocolo OCC vai ao encontro desta constatação, apresentando seus itens divididos a cada três meses no primeiro ano de vida e a cada 6 meses no segundo ano de vida da criança.

Caminha et al. (2017)⁴ salientam que, a partir de 2004, no Brasil, o compromisso com a vigilância do desenvolvimento infantil foi reafirmado, porém, ainda nos dias atuais, os progressos são pequenos quanto às anotações e registro do desenvolvimento infantil no Cartão da Criança. Ressaltam ainda que a importância em intensificar cuidados nos chamados “1.000 dias críticos” se apresenta em esfera mundial. Reiteram que este contexto precisa ser reconhecido em fóruns nacionais e internacionais de saúde, nos poderes executivo, legislativo e judiciário, como uma questão de direitos humanos^4,17.

Os resultados de um trabalho de revisão de literatura publicada recentemente⁶ apontam para a realidade brasileira de que testes de triagem são usados de forma inapropriada, ou por extrapolarem seus propósitos de maneira inadequada ou por não apresentarem suas características psicométricas, como por exemplo, sua validação. Os achados indicaram que são necessários instrumentos de triagem com validação e não apenas com tradução e adaptação transcultural, por exemplo.

Após conclusão das normas de padronização bem como conhecimento de suas características psicométricas e normatização para a população brasileira, a OCC será disponibilizada e terá impacto positivo e determinante nas triagens do desenvolvimento infantil.

CONCLUSÃO

O protocolo OCC foi descrito de maneira profunda em relação a sua estrutura, conteúdo, aplicação e utilização. Este protocolo traz impacto direto na avaliação inicial de crianças com ou sem suspeita de atraso no desenvolvimento infantil, bem como poderá ser utilizado, por profissionais da área da saúde, no acompanhamento do desenvolvimento infantil típico (rotina) ou em casos em que a criança recebe estimulação específica em uma ou mais áreas do desenvolvimento.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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• Estudo realizado na Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, São Paulo, Brasil.
• Fonte de financiamento: O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Abr 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  28 Out 2022
• Aceito
  29 Nov 2022