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Atividade de amilase em quimo de três espécies tropicais de peixes teleostei de água doce

Amylase activity in the chyme of three teleostei freshwater fish

Resumos

O objetivo deste trabalho foi determinar a atividade de amilase no quimo presente nos intestinos médio e posterior, ou reto, em três espécies tropicais de peixes Teleostei de água doce: piracanjuba, Brycon orbignyanus (Valenciennes, 1849), piau, Leporinus friderici (Bloch, 1794), onívoros, e surubim, Pseudoplatystoma coruscans (Agassiz, 1829), preferencialmente carnívoro, visando fornecer referência à nutrição para o ajuste da alimentação artificial. As atividades de amilase foram determinadas usando-se kit BIOCLIN com metodologia modificada por CARAWAY (1959). Os resultados monstraram atividade específica média (2106,33 UA/mg) para amilase do piracanjuba e foram 91,74% menor em comparação ao piau (25.488,14 UA/mg), ambos de hábito alimentar onívoro, enquanto a atividade específica da amilase para o piracanjuba foi 89,06% menor em relação ao surubim (19.246,80 UA/mg), carnívoro, o qual apresentou atividade específica da amilase 24,49% menor em relação à do piau. Os dados sugerem que a grande diferença da atividade específica de amilase entre o piau e o piracanjuba possui ligação com sua morfometria e o complexo arranjo das pregas da mucosa dos intestinos médio e posterior. Além disso, a atividade de amilase do surubim indica possibilidade de uso de ração contendo carboidratos, porém estudos adicionais são necessários para a avaliação do comportamento dessas espécies na alimentação artificial.

atividade de amilase; nutrição animal; piracanjuba; piau; surubim


The objective of this work was to determine the amylase activity in the chyme present in the medium and posterior intestines or in the rectum of three tropical freshwater Teleostei species: piracanjuba, Brycon orbignyanus (Valenciennes, 1849), piau, Leporinus friderici (Bloch, 1974), omnivorous, and surubim, Pseudoplatystoma coruscans (Agassiz, 1829), preferably carnivorous, aiming to provide nutritional reference data for the adjustment of the artificial feeding systems. The amylase activity was determined by the use of BIOCLIN kit with a modified methodology by CARAWAY (1959). The results showed an average specific activity (2.106,33 UA/mg) for piracanjuba amylase and were 91.74% lower as compared to piau (25,488,14 UA/mg), both with an omnivorous feeding habit, while the specific activity for piracanjuba amylase was 89.96% lower as compared to surubim (19,24680 UA/mg), carnivorous, which showed amylase specific activity 24.49% lower as compared to the piau. These data suggest that the greatest difference of amylase specific activity between piau e piracanjuba was related to its morphometry and the complex arrangement of the medium and posterior intestine mucous membrane folds. Furthermore, the surubim amylase activity indicates the possibility of the use of carbohydrate containing diet; however, additional studies are necessary to evaluate the behavior of these species in the artificial feeding.

amylase activity; animal nutrition; piracanjuba; piau; surubim


11 Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor, financiada pelo CNPq e FAPEMIG.

Amylase activity in the chyme of three teleostei freshwater fish

José Teixeira de Seixas FilhoI; Maria Goreti de Almeida OliveiraII; Juarez Lopes DonzeleIII; Andréa Tassis de Mendonça GomideIV; Eliane MeninV

I Pesquisador da Fund. Inst. Pesca do RJ - FIPERJ - Rio de Janeiro - RJ, 24120-190

II Professor do Depto de Bioq. e Biol. Molecular e BIOAGRO./ UFV, Viçosa - 36570-000, MG

III Professor do Depto de Zootecnia/UFV, Viçosa - 36570.000, MG

IV Zootecnista, Bolsista de DTI do DBA/UFV, Viçosa - 36570-000, MG

V Professor do Depto de Biologia Animal/UFV, Viçosa - 36570.000, MG

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi determinar a atividade de amilase no quimo presente nos intestinos médio e posterior, ou reto, em três espécies tropicais de peixes Teleostei de água doce: piracanjuba, Brycon orbignyanus (Valenciennes, 1849), piau, Leporinus friderici (Bloch, 1794), onívoros, e surubim, Pseudoplatystoma coruscans (Agassiz, 1829), preferencialmente carnívoro, visando fornecer referência à nutrição para o ajuste da alimentação artificial. As atividades de amilase foram determinadas usando-se kit BIOCLIN com metodologia modificada por CARAWAY (1959). Os resultados monstraram atividade específica média (2106,33 UA/mg) para amilase do piracanjuba e foram 91,74% menor em comparação ao piau (25.488,14 UA/mg), ambos de hábito alimentar onívoro, enquanto a atividade específica da amilase para o piracanjuba foi 89,06% menor em relação ao surubim (19.246,80 UA/mg), carnívoro, o qual apresentou atividade específica da amilase 24,49% menor em relação à do piau. Os dados sugerem que a grande diferença da atividade específica de amilase entre o piau e o piracanjuba possui ligação com sua morfometria e o complexo arranjo das pregas da mucosa dos intestinos médio e posterior. Além disso, a atividade de amilase do surubim indica possibilidade de uso de ração contendo carboidratos, porém estudos adicionais são necessários para a avaliação do comportamento dessas espécies na alimentação artificial.

palavras-chave:atividade de amilase, nutrição animal, piracanjuba, piau, surubim

ABSTRACT

The objective of this work was to determine the amylase activity in the chyme present in the medium and posterior intestines or in the rectum of three tropical freshwater Teleostei species: piracanjuba, Brycon orbignyanus (Valenciennes, 1849), piau, Leporinus friderici (Bloch, 1974), omnivorous, and surubim, Pseudoplatystoma coruscans (Agassiz, 1829), preferably carnivorous, aiming to provide nutritional reference data for the adjustment of the artificial feeding systems. The amylase activity was determined by the use of BIOCLIN kit with a modified methodology by CARAWAY (1959). The results showed an average specific activity (2.106,33 UA/mg) for piracanjuba amylase and were 91.74% lower as compared to piau (25,488,14 UA/mg), both with an omnivorous feeding habit, while the specific activity for piracanjuba amylase was 89.96% lower as compared to surubim (19,24680 UA/mg), carnivorous, which showed amylase specific activity 24.49% lower as compared to the piau. These data suggest that the greatest difference of amylase specific activity between piau e piracanjuba was related to its morphometry and the complex arrangement of the medium and posterior intestine mucous membrane folds. Furthermore, the surubim amylase activity indicates the possibility of the use of carbohydrate containing diet; however, additional studies are necessary to evaluate the behavior of these species in the artificial feeding.

Key Words: amylase activity, animal nutrition, piracanjuba, piau, surubim

Introdução

Várias espécies tropicais de peixes Teleostei de água doce são criadas em cativeiro, tanto para manutenção da biodiversidade por meio de programas de repovoamento, quanto para criação comercial. Contudo, essas espécies ainda recebem arraçoamento de maneira imprópria, por falta de maior entendimento sobre suas necessidades nutricionais, o que vem acarretando problemas para essa atividade zootécnica.

Nesse sentido, estudos têm sido realizados com o objetivo de conhecer as necessidades nutricionais das espécies nativas com potencial zootécnico, no intuito de proporcionar às piscigranjas soluções que minimizem problemas comumente vividos, como menor ganho de peso, sinais de deficiência alimentar, variação na taxa de ingestão de alimentos, problemas que resultam em baixa produtividade e mortalidade elevada, permitindo, assim, ampliar conhecimentos sobre essas espécies tropicais, que se encontram em plena expansão de criação. Vários autores têm estudado o hábito alimentar de peixes tropicais (CYRINO, 1984; CASTAGNOLLI, 1992, 1997; e PEZZATO, 1997) e o relacionamento do arranjo do intestino com hábitos alimentares (AL-HUSSAINI, 1947; NIKOLSKY, 1963; PREJS, 1981; MENIN, 1988; MENIN e MIMURA, 1992; e SEIXAS FILHO et al., 1998). A habilidade de um organismo para digerir partículas de alimento depende da presença e da quantidade apropriada de enzimas digestivas (SMITH, 1980). A atividade enzimática de amilase (EC 3.2.1.1) para os peixes de clima temperado durante as diferentes fases do ciclo de vida tem sido pesquisada por diversos autores (ANDREWS, 1954; KITAMIKADO e TACHINO, 1960; KAWAI e IKEDA, 1973a e b; OVERNELL, 1973; KAPOOR et al., 1975; DABROWSKI et al., 1992; ABI-AYAD e KESTEMONT, 1994; CAHU e ZAMBONINO INFANTE, 1994; e NAKAGAWA et al., 1995).

Por outro lado, a composição da dieta pode influenciar a produção de enzimas digestivas. NAGASE (1964), trabalhando com tilápia mossambica (Sarotherodon mossambicus), e REIMER (1982), estudando o matrinchã (Brycon cf. melanopterus), relataram que a atividade da amilase é aumentada com uma dieta rica em amido.

ONISHI et al. (1976) relataram mudanças nos níveis de protease e amilase, em carpa, após alimentação, comparando a freqüência da administração do alimento, uma e duas vezes ao dia, e concluíram que a síntese e secreção de enzimas, em resposta à alimentação não é transitória, e que existe um tempo "lag" entre a redução da quantidade do alimento no trato digestivo e o aumento na atividade da enzima digestiva.

SABAPATHY e TEO (1993), estudando a presença de enzimas digestivas no tubo digestivo do Sigamus canaliculatus, de hábito alimentar onívoro, e do carnívoro Latus calcarifer, relataram que as atividades de amilase foram menores para o carnívoro. Contudo, ambos são capazes de digerir carboidratos e proteínas em suas dietas.

KUZ'MINA (1996) estudou a influência da idade na atividade enzimática em peixes de água doce, em predadores facultativos bentofágicos adultos, como em Perca flavescens e em bentofágicos, Abramis brama e Eupomotis gibbosus, mencionando, ainda, que a atividade enzimática total relativa (g-1 peso do corpo) evidenciou, para esses peixes, índice informativo do suprimento de enzimas digestivas ainda mais importante que o da atividade enzimática padrão normalmente relatada.

O objetivo do presente trabalho foi determinar a atividade enzimática da amilase no quimo presente nos intestinos médio e posterior, ou reto, de peixes Teleostei: piracanjuba, Brycon orbignyanus (Valenciennes, 1849), piau, Leporinus friderici, Bloch, 1794, onívoros, e surubim, Pseudoplatystoma coruscans (Agassiz, 1829), carnívoro, visando fornecer referência à nutrição para o ajuste da alimentação artificial, a fim de dar subsídios na definição de um padrão alimentar.

Material e Métodos

Os exemplares de piracanjuba, Brycon orbignyanus (Valenciennes, 1849), piau, Leporinus friderici, Bloch, 1794, e surubim, Pseudoplatystoma coruscans (Agassiz, 1829), utilizados nos estudos de atividade enzimática foram coletados dos viveiros da Estação de Pesquisas e Desenvolvimento Ambiental de Volta Grande - CEMIG, em Conceição das Alagoas, MG, com auxílio de redes de arrasto. A água dos viveiros apresentava temperatura média de 25°C, pH de 6,50, oxigênio dissolvido de 8,70 ppm e condutividade de 0,032 ms/cm.

Coleta dos animais

Os animais foram alimentados durante 24 horas antes da coleta; os onívoros receberam ração comercial (Tabela 1) e o carnívoro, fragmentos de peixes e juvenis vivos de tilápia. Os dez exemplares de cada espécie, utilizados nesse estudo, sofreram imediata contenção fisiológica após a coleta por meio de secção transversal da medula espinhal, após a região occipital, sendo, em seguida, imersos em água a 4°C, permanecendo nessa temperatura durante o período em que foram manipulados. Os exemplares foram, então, transferidos para o laboratório da referida Estação, identificados e submetidos às medidas de peso e comprimento-padrão (conforme RICKER, 1968).

Obtenção do quimo

Os animais sofreram incisão longitudinal ventral, após a retirada do tecido adiposo que envolvia o tubo digestivo, o qual foi isolado por meio de ligaduras duplas na porção cranial do esôfago e na porção caudal do intestino posterior, ou reto, anteriormente ao ânus. Foram isolados os intestinos médio e posterior, ou reto, do intestino anterior (esôfago e estômago), também por meio de ligaduras duplas, para evitar extravasamento do quimo das regiões a serem estudadas.

As amostras utilizadas para a determinação da atividade de amilase foram retiradas de um "pool" composto pelo quimo dos intestinos médio e posterior (Brycon orbignyanus e Leporinus friderici) e do intestino médio e reto (Pseudoplatystoma coruscans), pesado, acondicionado em saco plástico e armazenado a -20°C.

Preparo das amostras para as análises de atividade enzimática

Em razão das características morfométricas dos intestinos médio e posterior de Brycon orbignyanus e intestino médio e reto de Pseudoplatystoma coruscans, o quimo dos exemplares considerados neste trabalho, coletado e armazenado conforme especificações anteriores, foi descongelado em banho de gelo e dele foram utilizados 0,125 mg, diluídos em 2,5 mL de água deionizada a 4°C, sendo, em seguida, triturado e homogeneizado, com auxílio de bastão de vidro. Após esse processo, foi centrifugado a 35.000 g, 4°C por 20 minutos. Para o piau, o quimo obtido em quantidades muito pequenas, também em virtude das características morfométricas, menor calibre de intestino, foi coletado e armazenado em frascos "eppendorff" e centrifugado da mesma forma descrita anteriormente. O sobrenadante do material obtido dos exemplares de todas as espécies foi utilizado para a determinação da atividade de amilase.

Atividade de amilase

Asatividades foram determinadas utilizando-se o kit BIOCLIN com metodologia modificada de CARAWAY (1959), consistindo na incubação do sobrenadante em presença de amido e tampão fosfato de pH 7,0. Em presença de iodo, o amido solúvel apresentava coloração azulada. Pela ação da amilase, ocorreu hidrólise do amido, desaparecendo progressivamente a cor azul. Os valores foram expressos em porcentagem de Unidade de Amilase (UA).

Determinação da concentração de proteína

A determinação da concentração de proteína total da amostra foi realizada por meio da leitura de absorção a 260 e 280 nm, segundo método descrito por WARBURG e CHRISTIAN (1941).

Análise estatística

As médias foram comparadas pelo teste "t", a 5% de probabilidade.

Resultados e Discussão

As médias dos pesos e dos comprimentos dos exemplares de piracanjuba, piau e surubim encontram-se na Tabela 2. Constatou-se que os exemplares de piau apresentaram menor (P<0,05) peso corporal em relação aos exemplares de piracanjuba e surubim, cujos pesos não variaram entre si e, menor (P<0,05) valor de comprimento-padrão em relação ao surubim. O comprimento-padrão apresentado pelos exemplares de piracanjuba foi menor (P<0,05) que o do surubim e não variou em relação ao apresentado pelo piau, embora tenha sido observada diferença de 49,8% entre esses valores.

A variação da atividade específica de amilase nos exemplares da mesma espécie, provavelmente, esteve relacionada à quantidade de substrato ingerido (alimentação) e ao intervalo de tempo de administração de cada um, uma vez que foi coletado um "pool" de quimo dos intestinos médio e posterior (piracanjuba e piau) e intestino médio e reto de surubim, em razão da pouca quantidade de material, de acordo com as características morfométricas intestinal de cada espécie, principalmente o piau, que apresentou o menor calibre dos intestinos.

Observou-se variação na atividade específica de amilase no quimo dos exemplares de piracanjuba, sendo a menor de 1,018 x 103 UA/mg no exemplar que apresentou peso e comprimento de 369,83 g e 25,50 cm, respectivamente. A maior atividade foi de 2915 x 103 UA/mg para o exemplar que apresentou peso de 557,32 g e 28,50 cm de comprimento. Foi verificada a atividade por peso e comprimento do animal e obteve-se variação de 4,659 x 10-1 UA/g a 8,471 x 10-1 UA/g e 8,658 UA/cm a 12,874 UA/cm, respectivamente.

Para os exemplares de piau, a atividade específica de amilase variou de 0,831 x 104 UA/mg, para o exemplar com peso e comprimento de 161,70 g e 19,00 cm, respectivamente, a 5,230 x 104 UA/mg para o com peso de 106,99 g e comprimento de 16,50 cm, sendo nesses animais observadas a menor e a maior atividade por peso e comprimento, respectivamente.

Nos exemplares de surubim, a atividade específica variou de 0,816 x 10-4 UA/mg (658,00 g e 43,50 cm) a 3,233 x 10-4 UA/mg (630,33 g e 42,00 cm) e a atividade por peso e comprimento foi de 4,140 UA/g (658,00 g e 43,50 cm) a 12,532 UA/g (226,83 g e 30,00 cm) e 62,629 UA/cm (658,00 g e 43,50 cm) a 94,754 UA/cm (226,83 g e 30,00 cm), respectivamente.

Pelas médias obtidas da atividade específica de amilase das três espécies em estudo, 25.488,14 UA/mg e 19.246,80 UA/ mg, respectivamente (Tabela 3), pode-se observar que aquela obtida para o piau e o surubim não apresentaram diferenças significativas entre si. Por outro lado, o piracanjuba apresentou menor média de atividade específica, em relação às outras espécies, ou seja, 2.106,33 UA/mg, o que diferiu (P<0,05) do piau e do surubim.

Para a relação da atividade específica com o peso e o comprimento, todas as espécies apresentaram diferença significativa (P<0,05) entre si. Os resultados demonstraram atividade específica média de 91,74% menor (2.106,33 UA/mg) para amilase do piracanjuba em relação à do piau (25.488,14 UA/mg), ambos de hábito alimentar onívoro, enquanto a atividade para o piracanjuba foi de 89,06% menor em relação à do surubim (19.246,80 UA/mg), carnívoro, o qual apresentou atividade específica de 24,49% menor em relação à do piau.

O fato de a média da atividade específica de amilase ter apresentado maiores valores para surubim em relação à piracanjuba, peixe de hábito alimentar, preferencialmente carnívoro, e ter mantido semelhança em relação a ordem de grandeza com a do piau, espécies de hábito alimentar onívoro, provavelmente, deveu-se às condições de criação em que se encontrava, sugerindo plasticidade do complexo enzimático dessa espécie como a encontrada por DABROWSKI et al. (1992), que observaram maior atividade de amilase em alevinos de Salvelinus alpinus, alimentados com alta proteína nas dietas iniciais, principalmente quando a farinha de peixe foi parcialmente substituída pela farinha de soja. Deve-se considerar, ainda, a possibilidade da necessidade de amilase neste hábito alimentar para digerir o glicogênio presente nos tecidos de suas presas, conforme sugerido por SABAPATHY e TEO (1993), quando estudaram essa atividade em Latus calcarifer, carnívoro.

Estudos da atividade de amilase em peixes carnívoros têm sido realizados por vários autores: KAPOOR et al. (1975) em exemplares de peixes adultos, sob condições naturais, CAHU e ZAMBONINO INFANTE (1994) em larvas de Dicentrarchus labrax, quando alimentadas com dietas contendo 12% de amido, e KAWAI (1973b), que relatou no peixe carnívoro, Centropristes striatus atividade de amilase onze dias após a larvicultura, aumentando gradualmente com o crescimento, não ficando clara a sua significância.

Por outro lado, KUZ'MINA (1996) comentou que a atividade de enzimas digestivas é influenciada pelo comportamento alimentar e composição bioquímica do alimento, sendo que a atividade de amilase, para o peixe em condições naturais observados, reduziu significativamente no adulto de peixes carnívoros.

Em relação aos peixes de hábito alimentar onívoro, observou-se que o fato da média da atividade específica de amilase do piau ter-se apresentado maior que a encontrada para a outra espécie onívora em questão, o piracanjuba, não foi atribuída à influência do nível de amido da dieta, conforme observado por NAGASE (1964), trabalhando com Sorotherodon mossambicus, e REIMER (1982), com Brycon cf melanopteru, uma vez que as duas espécies receberam a mesma ração comercial. Por outro lado, esses níveis de atividade específica de amilase em piau podem ser justificados pelo fato de, assim como nos outros membros da família Anostomidae, em condições de alimentação natural, ser um onívoro, preferencialmente herbívoro (MENIN, 1988; CASTAGNOLLI, 1992).

Os dados obtidos permitem que se façam algumas inferências sobre a fisiologia digestiva do piau, ou seja, esta espécie possui maior potencial para a digestão de amido que a piracanjuba, o que, nas condições em que se encontravam, pode estar relacionado com a deficiência nutricional, em razão do uso de ração comercial, que pode não ser adequada às exigências nutricionais dessa espécie. ABI-AYAD e KESTEMONT (1994) também verificaram maior atividade de amilase, em Carassius auratus, alimentados com ração artificial quando comparada àquela dos que receberam dieta natural; além disso, a alta atividade específica de amilase pode estar relacionada com a estrutura do intestino, que, conforme MENIN (1988), tem arranjo em N e, conseqüentemente, a espécie deve estar adaptada para alimentação com valores nutricionais intermediários entre os ictiófagos e os dos herbívoros ou dos iliófagos, apresentando comprimento intestinal intermediários entre as espécies iliófagas e carnívoras.

A maior atividade específica de amilase observada para piau, em relação à piracanjuba, pode estar relacionada ao fato de o piau apresentar menor comprimento do intestino e arranjo intestinal menos complexos que o da piracanjuba, o que leva à redução da taxa de passagem do alimento, que passa a sofrer ação prolongada das enzimas digestivas. Por outro lado, um intestino mais longo, com arranjo mais complexo que o de piau, foi observado em piracanjuba por SEIXAS FILHO (1998). Deve ser considerado o fato de que o amido possa ser amplamente hidrolizado e, provavelmente, possuir importante papel no metabolismo energético dessa espécie. Resultados semelhantes foram encontrados por SABAPATHY e TEO (1993), que estudaram o mesmo assunto em Sigannus canaliculatus, de hábito alimentar onívoro.

Estudos futuros são necessários para que se possam obter maiores entendimentos sobre a fisiologia digestiva para essas espécies de peixes tropicais, a fim de fornecer subsídios à recomendação mais segura de uma dieta que possa atender melhor as necessidades do animal e os interesses zootécnicos.

Conclusões

A grande diferença da atividade de amilase apresentada entre o piau e o piracanjuba sugere estreita ligação com a morfometria e o complexo arranjo das pregas da mucosa dos intestinos médio e posterior.

A atividade de amilase apresentada no surubim sugere a possibilidade de utilização de dieta artificial na sua alimentação.

Recebido em: 27/03/98

Aceito em: 16/03/99

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  • 1
    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor, financiada pelo CNPq e FAPEMIG.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Out 2012
    • Data do Fascículo
      1999

    Histórico

    • Recebido
      27 Mar 1998
    • Aceito
      16 Mar 1999
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