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Indicadores de estresse térmico e utilização da somatotropina bovina (bST) em vacas leiteiras mestiças (Bos taurus x Bos indicus) no semi-árido do Nordeste

Heat stress indexes and the use of bovine somatotropin (bST) in crossbred dairy cows (Bos indicus x Bos taurus) raised in a semi-arid region of the Brazilian Northeast

Resumos

O objetivo do presente experimento foi avaliar a resposta ao bST de vacas mestiças (Bos taurus x Bos indicus) criadas no semi-árido do Ceará. Quinze vacas (segunda e terceira parições; 42 a 155 dias pós-parto) receberam cinco aplicações de bST a intervalos de 14 dias e outras 15 foram utilizadas como controle. A dieta dos animais consistiu de capim-elefante e concentrado. Durante a primeira aplicação de bST, a produção de leite dos animais tratados (12,6 kg/dia) não diferiu dos animais controle (11,3 Kg/dia) mas, na segunda e terceira aplicações, a diferença entre os grupos foi significativa (2,0 e 2,2 kg). Na quarta aplicação de bST, houve aumento na diferença entre os grupos (3,0 kg) e, na quinta aplicação, esta diferença foi de 3,4 kg (14,0 kg versus 10,6 kg/dia). A interação tratamento com bST e estágio de lactação não foi significativa. As temperaturas do leite e retal foram maiores (0,6 e 0,1°C, respectivamente) nos animais tratados com bST que nos animais controles, mas estas diferenças não foram significativas. Para o grupo de 30 animais, houve correlações entre produção e temperatura do leite (r = 0, 38 a 0,69). Com base no cálculo do índice de temperatura e umidade, os animais estiveram submetidos a estresse térmico ameno (manhã) ou moderado (à tarde). Portanto, animais mestiços criados no semi-árido do Nordeste aumentaram a produção de leite devido ao bST, sem, no entanto, apresentar indicativos de estresse térmico severo.

Bos indicus; estresse térmico; produção de leite; semi-árido; somatotropina


A study was conducted to evaluate the effects of bST in crossbred dairy cows (Bos indicus x Bos taurus) raised in a semi-arid zone, in the Northeast of Brazil. Fifteen cows (second and third lactation; 42-155 days in milk) received five applications of bST, at 14-day intervals. Other 15 cows were used as controls. The animals were fed with diet consisted in elephant grass and concentrate. During the first application of bST, the milk production of the treated cows (12.6 kg/day) did not differ from the control animals (11.3 kg/day), but in the second and third applications, the difference between the groups was significant (2.0 and 2.3 kg). In the fourth application of bST, there was an increase in the difference between groups (3.0 kg) and in the fifth application, such difference was 3.4 kg (14.0 kg versus 10.6 kg/day). The bST treatment and stage of lactation interaction was not significant. Rectal and milk temperatures were higher (0.1 and 0.6 °C, respectively) in bST treated than in control animals, but differences were not significant. For the group of 30 cows, the daily milk yield was related to milk temperature (r = 0.38 to 0.69). Based on the temperature-humidity index, the cows were under light heat stress in the morning and moderate stress in the afternoon. Therefore, crossbred cows raised in the semi-arid area of Brazil showed responses to bST without apparent signs of severe heat stress.

Bos indicus; Brazil; heat stress; milk yield; semi-arid; somatotropin


Indicadores de Estresse Térmico e Utilização da Somatotropina Bovina (bST) em Vacas Leiteiras Mestiças (Bos taurus x Bos indicus) no Semi-Árido do Nordeste1 1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor, apresentada à UFC. Apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará (FUNCAP).

Joaquim Batista de Oliveira Neto2 1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor, apresentada à UFC. Apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará (FUNCAP). , Arlindo de Alencar Araripe Moura2 1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor, apresentada à UFC. Apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará (FUNCAP). , 3 1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor, apresentada à UFC. Apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará (FUNCAP). , José Neuman Miranda Neiva2 1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor, apresentada à UFC. Apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará (FUNCAP). , Magda Maria Guilhermino4 1 Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor, apresentada à UFC. Apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará (FUNCAP).

RESUMO - O objetivo do presente experimento foi avaliar a resposta ao bST de vacas mestiças (Bos taurus x Bos indicus) criadas no semi-árido do Ceará. Quinze vacas (segunda e terceira parições; 42 a 155 dias pós-parto) receberam cinco aplicações de bST a intervalos de 14 dias e outras 15 foram utilizadas como controle. A dieta dos animais consistiu de capim-elefante e concentrado. Durante a primeira aplicação de bST, a produção de leite dos animais tratados (12,6 kg/dia) não diferiu dos animais controle (11,3 Kg/dia) mas, na segunda e terceira aplicações, a diferença entre os grupos foi significativa (2,0 e 2,2 kg). Na quarta aplicação de bST, houve aumento na diferença entre os grupos (3,0 kg) e, na quinta aplicação, esta diferença foi de 3,4 kg (14,0 kg versus 10,6 kg/dia). A interação tratamento com bST e estágio de lactação não foi significativa. As temperaturas do leite e retal foram maiores (0,6 e 0,1°C, respectivamente) nos animais tratados com bST que nos animais controles, mas estas diferenças não foram significativas. Para o grupo de 30 animais, houve correlações entre produção e temperatura do leite (r = 0, 38 a 0,69). Com base no cálculo do índice de temperatura e umidade, os animais estiveram submetidos a estresse térmico ameno (manhã) ou moderado (à tarde). Portanto, animais mestiços criados no semi-árido do Nordeste aumentaram a produção de leite devido ao bST, sem, no entanto, apresentar indicativos de estresse térmico severo.

Palavras-chave:Bos indicus, estresse térmico, produção de leite, semi-árido, somatotropina

Heat stress indexes and the Use of Bovine Somatotropin (bST) in Crossbred Dairy cows (Bos indicus x Bos taurus) Raised in a Semi-Arid Region of the Brazilian Northeast

ABSTRACT - A study was conducted to evaluate the effects of bST in crossbred dairy cows (Bos indicus x Bos taurus) raised in a semi-arid zone, in the Northeast of Brazil. Fifteen cows (second and third lactation; 42-155 days in milk) received five applications of bST, at 14-day intervals. Other 15 cows were used as controls. The animals were fed with diet consisted in elephant grass and concentrate. During the first application of bST, the milk production of the treated cows (12.6 kg/day) did not differ from the control animals (11.3 kg/day), but in the second and third applications, the difference between the groups was significant (2.0 and 2.3 kg). In the fourth application of bST, there was an increase in the difference between groups (3.0 kg) and in the fifth application, such difference was 3.4 kg (14.0 kg versus 10.6 kg/day). The bST treatment and stage of lactation interaction was not significant. Rectal and milk temperatures were higher (0.1 and 0.6 °C, respectively) in bST treated than in control animals, but differences were not significant. For the group of 30 cows, the daily milk yield was related to milk temperature (r = 0.38 to 0.69). Based on the temperature-humidity index, the cows were under light heat stress in the morning and moderate stress in the afternoon. Therefore, crossbred cows raised in the semi-arid area of Brazil showed responses to bST without apparent signs of severe heat stress.

Key Words:Bos indicus, Brazil, heat stress, milk yield, semi-arid, somatotropin

Introdução

A somatotropina bovina (bST) promove aumentos no consumo de matéria seca e na produção de leite, em função das condições de manejo alimentar e sanitário dos rebanhos (BAUMAN et al., 1985; HUBER et al., 1997). O uso do bST em vacas em lactação tem efeitos sobre a partição preferencial de nutrientes para a síntese de leite (TYRRELL et al., 1982), interferindo no metabolismo de vários órgãos e tecidos através de ações diretas (tecido adiposo e fígado) e efeitos indiretos mediados pelo IGF-I (BAUMAN, 1992).

Constata-se aumento na produção de calor em animais suplementados com bST, o qual é conseqüên-cia de alterações no metabolismo e produção de leite (TYRRELL et al., 1988). Vacas holandesas tratadas com bST e submetidas a temperaturas elevadas (27 a 40ºC) respondem com aumentos na produção de leite, mas apresentam valores mais elevados de temperatura retal e freqüência respiratória. No entanto, o tratamento com bST não causou alterações nestes parâmetros fisiológicos, quando os animais foram mantidos em condições de termoneutralidade (COLE e HANSEN, 1993; ZOA-MBOE et al., 1989). Outros experimentos realizados na Florida e Georgia (EUA) mostraram também que acréscimos na temperatura ambiente estão associados a reduções na produção de leite em vacas tratadas com bST (ELVINGER et al., 1988; WEST, 1994). Portanto, o uso de bST pode predispor os animais à maior sensibilidade aos efeitos do estresse térmico, evidenciada pelas alterações na freqüência respiratória e temperatura retal. A produção de leite pode também ser influenciada por fatores climáticos, como temperatura ambiente e umidade relativa do ar, dependendo das características individuais de cada animal. A região semi-árida do Nordeste apresenta características únicas de clima no Brasil, mas as interações entre este tipo de ambiente e indicadores de estresse térmico em animais de produção têm sido pouco estudadas.

Animais mestiços (Holandês x Gir) representam grande porcentagem do rebanho leiteiro do Brasil. No Estado do Ceará, a produtividade média dos rebanhos é de 2,5 kg/vaca/dia (IBGE, 1997), mas existem, no entanto, várias propriedades com média de produção superior a 10-12 kg de leite/vaca/dia, devido à utilização de melhor tecnologia. Algumas dessas propriedades utilizam o bST, mas não há uma avaliação dos efeitos do emprego desta prática na realidade daqueles sistemas de produção localizados na região semi-árida. Portanto, este estudo foi conduzido com o objetivo de avaliar as variações no índice de temperatura e umidade e o efeito do bST sobre a produção de leite, temperatura retal e temperatura do leite em vacas mestiças (Bos taurus x Bos indicus) criadas em condições de manejo e ambiente característicos de uma propriedade localizada no semi-árido do Nordeste.

Material e Métodos

Local e instalação do experimento

O experimento foi realizado na Fazenda Caraíbas, município de Quixeramobim-CE, a 200 km de Fortaleza, com 78,0 metros de altitude na sede e coordenadas geográficas de 5º 30' de Latitude sul e 39º 18' de Longitude. A precipitação média é de 707,7 mm/ano, concentrada nos meses de fevereiro a maio (Fundação Cearense de Meteorologia, 1998). No período experimental (agosto a outubro de 1998), a fazenda produzia, em média, 1500 litros de leite/dia, com 125 vacas. A porcentagem de vacas em lactação era de 76% e o grau de sangue da maioria dos animais variava de 3/4 a 7/8 Holandês x Gir, com poucos animais ½ sangue. A fazenda contava com assistência periódica de um médico veterinário e realizava inseminação artificial. O proprietário possuía uma unidade de pausteurização com capacidade para 5000 l/dia, onde era beneficiado todo o leite da fazenda, além de cotas adquiridas de outros produtores da região.

Procedimento experimental

Foram utilizadas trinta vacas mestiças Bos indicus x Bos taurus (3/4 a 7/8 Holandês x Gir), entre a segunda e terceira parição, com 42 a 155 dias pós-parto. A duração do experimento foi de 84 dias, sendo 14 dias de adaptação e 70 dias de período experimental. Após o período de adaptação, um grupo de 15 vacas recebeu cinco aplicações de 500 mg de bST (Monsanto, St. Louis, MO, USA) a intervalos de 14 dias, por via parenteral subcutânea, alternando-se os lados a cada aplicação. O grupo controle também foi formado por 15 animais e não recebeu tratamento algum. Para a formação destes grupos, procurou-se manter uniformidade quanto à idade dos animais, nível de produção, estágio de lactação e ordem de parição. O bST foi aplicado entre 7 e 8 h, logo após a pesagem do leite da manhã. Os grupos foram confinados em um curral de 1350 m2, com livre acesso a áreas de sombra e sol, com comedouros, bebedouros e cocho para mistura mineral.

As áreas de capim-elefante foram adubadas de acordo com as análises de solo e os cortes das forrageiras programados para intervalos entre 45 e 52 dias. Os animais de ambos os grupos receberam capim-elefante picado fornecido à vontade, permitindo sobras de 10%. O concentrado foi fornecido de acordo com a produção de leite, conforme manejo já adotado na fazenda. Com base no consumo durante a fase de adaptação, no peso vivo e na produção de leite de cada vaca, a dieta dos animais foi calculada (NATIONAL RESEARCH COUNCIL - NRC, 1989). As exigências nutricionais não atendidas pelo volumoso foram corrigidas com a utilização de concentrado (22% de proteína bruta, 78% de nutrientes digestíveis totais), à base de milho (69,2 %), farelo de soja (23,9%), calcário (1,4%), fosfato bicálcico (2,4), sal comum (0,8%), uréia (1,8%), sulfato de amônia (0,8%) e premix vitamínico (0,1%) e mineral (0,1%). Em média, cada vaca recebeu 1 kg de concentrado para cada 2,6 kg de leite produzido. O volumoso foi fornecido às 9 e 15 h e o concentrado, por ocasião de cada ordenha.

Medições e coletas de dados

As ordenhas foram realizadas às 3 h e 13h30, com ordenhadeira mecânica para ambos os grupos. Após cada ordenha, foi feita a pesagem do leite, iniciando no período pré-experimental até o final do experimento. A temperatura retal e temperatura do leite foram determinadas em dias diferentes, porém consecutivos, uma vez por semana logo após as ordenhas da manhã (entre 4 e 5 h) e da tarde (entre 14 e 15 h). Diariamente, às 9, 15 e 21 h, realizaram-se leituras referentes à umidade relativa do ar (em %), temperatura do bulbo seco e úmido (°C), temperatura máxima e mínima do ar (°C). Os instrumentos foram instalados na área coberta do experimento. O índice de temperatura e umidade (ITU) é utilizado para avaliar o impacto de elementos climáticos sobre os animais e foi calculado de acordo com a seguinte fórmula: ITU= 0,72 (Tbs+Tbu) + 40,6, em que Tbs é temperatura do bulbo seco (ºC) e Tbu, temperatura do bulbo úmido (ºC) (PIRES et al., 1998). Os seguintes valores foram considerados limites: estresse ameno: ITU = 72-79; estresse moderado: ITU = 80-89; estresse severo: ITU = 90-98.

Análise estatística

O efeito do bST sobre a produção de leite, temperatura retal e temperatura do leite foi avaliado por meio de análise de variância (PROC GLM, SAS, 1997), segundo o modelo:

em que Yijklm refere-se a variáveis dependentes (produção de leite, kg/vaca/dia; temperatura retal, ºC; temperatura do leite, ºC); m, média geral; Ti, efeito do tratamento (bST ou controle); Lj, efeito do estágio de lactação (42 a 100; 101 a 155 dias de lactação); Gk, efeito do grau de sangue (3/4 e 7/8 Holandês x Gir); Pl, efeito da ordem de parição (2a e 3a pariação); eijklm, erro associado a cada observação.

As interações envolvendo estágio de lactação, grau de sangue e ordem de parição não foram significativas. As correlações entre as variáveis (produção de leite, temperatura retal e do leite) foram avaliadas por intermédio do método de Pearson (SAS, 1997).

Resultados e Discussão

Produção de leite

Durante o período de adaptação (14 dias), a produção média de leite/vaca foi de 12,8 ± 0,6 kg/dia. Durante a primeira aplicação de bST, os animais tratados apresentaram produção de leite média de 12,6 ± 0,84 kg/dia e os não tratados, de 11,3 ± 0,84 kg/dia, não havendo diferença significativa (P>0,05; Tabela 1). No período da segunda aplicação de bST, a produção de leite do grupo controle permaneceu inalterada, mas a produtividade dos animais tratados aumentou para 13,3 ± 0,84 kg/dia. Durante a terceira aplicação, a produção média dos grupos bST e controle foi reduzida (12,5 kg/dia e 10,3 kg/dia, respectivamente), mas esta diferença permaneceu significativa. Na quarta e quinta aplicações, a produção média das vacas tratadas com bST foi de 14,2 ± 0,83 e 14,0 ± 0,70 kg/dia, respectivamente, e a produção dos animais controle permaneceu em 11,2 ± 0,77 e 10,6 ± 0,9 kg/dia, respectivamente. Ao final das cinco aplicações de bST, os animais tratados produziram, em média, 2,4 kg de leite/dia a mais do que os animais controle (P<0,05).

No Brasil, FONTES et al. (1997), suplementando vacas mestiças (Bos indicus x Bos taurus) com bST, entre 55 e 199 dias de lactação, obtiveram resposta no início do tratamento de 2,5 kg/dia, com aumentos de produção nas aplicações seguintes de até 3,3 kg/dia, valores estes semelhantes aos descritos no presente estudo. Também no Brasil, SUÁREZ LONDOÑO et al. (1997), suplementando com bST por 140 dias vacas mestiças (Bos indicus x Bos taurus) e holandesas, obtiveram incremento médio na produção de leite de 1,5 kg/vaca/dia para animais confinados e apenas 0,6 kg/vaca/dia para animais semi-confinados, sendo a menor resposta do grupo semi-confinado devido ao tipo de volumoso fornecido (capim gordura e capim-elefante picado). PEEL et al. (1987) obtiveram consistentes aumentos na produção de leite (2 a 5 kg/vaca/dia) em vacas Holandesas tratadas com bST no início, meio e final da lactação. Segundo CHALUPA et al. (1989), animais suplementados com bST tiveram produção de leite 40% acima do grupo controle, com grande variação de resposta relacionada à quantidade da dose de bST, freqüência de aplicações, manejo e outros fatores. PHIPPS et al. (1991) observaram aumentos na produção de leite de 3,5; 3,4; e 3,2 kg/dia em vacas holandesas tratadas com bST aos 90, 120 e 150 dias pós-parto, em diferentes rebanhos na África. Respostas maiores (6,1 kg/vaca/dia) foram também observadas em alguns destes rebanhos, devido ao excelente planejamento alimentar e tardio início do tratamento.

Apesar de a alimentação dos animais ter sido planejada de acordo com as normas do NRC (1989), mudanças no sistema de manejo da fazenda durante o experimento causaram atrasos nos períodos de corte do capim elefante e, conseqüentemente, as plantas foram cortadas com idade acima dos 90 dias. A ausência de resposta na primeira aplicação e diminuição da produção na terceira aplicação de bST são provavelmente conseqüências destes eventos. Nos períodos associados à quarta e quinta aplicação de bST, as forrageiras voltaram a ser cortadas com 45 a 52 dias de idade, coincidente com maiores respostas das vacas ao bST. Segundo BAUMANN et al. (1985), animais suplementados com bST devem ter disponibilidade de alimentos de boa qualidade durante o maior tempo possível e o nível de manejo é a principal influência na resposta da produção.

A ordem de parição e o grau de sangue não representaram fontes significativas de variação na resposta dos animais ao tratamento com bST. De modo semelhante, REMOND et al. (1991) também mostraram que ordem de parição não está associada à resposta das vacas ao bST e FONTES et al. (1997) verificaram que o grau de sangue (1/2 versus ¾ Bos taurus x Bos indicus) não teve influência sobre o tratamento com bST. Foi avaliada também a diferença de resposta ao bST em relação ao estágio de lactação, dividindo-se os grupos de animais em dois subgrupos menores, sendo um com 42 a 100 dias de lactação e o outro com 101 a 155 dias de lactação (Tabela 2). Na quarta e quinta aplicações, a diferença entre os tratamentos foi de 2,3 kg para os animais em início de lactação e 3,5 kg de leite para animais com 101-155 dias de lactação. Provavelmente, devido ao pequeno número de animais em cada subgrupo, estas diferenças não foram significativas (P>0,05). Portanto, animais ¾ e 7/8 Holandês x Gir possuem características diferentes daquelas observadas em animais ½ sangue. Tem sido mostrado que em vacas ½ Bos taurus x ½ Bos indicus as respostas são reduzidas após os 100 dias de lactação (FONTES et al., 1997), enquanto vacas Bos taurus apresentam maior resposta ao tratamento com bST no final da lactação (THOMAS et al., 1991).

Parâmetros fisiológicos (temperatura do leite e temperatura retal) e ambiente

A temperatura retal não foi influenciada pelo bST (P>0,05). Em média, os animais tratados apresentaram temperatura retal de 38,7 ± 0,04ºC pela manhã e 38,9 ± 0,04ºC à tarde e os animais do grupo controle, 38,7 ± 0,03ºC pela manhã e 38,8ºC ± 0,04 à tarde (Figura 1). A diferença de temperatura retal entre os períodos da manhã e tarde foi de 0,2ºC para as vacas que receberam bST e 0,1ºC para o grupo controle (P>0,05; Figura 1). Em concordância com os resultados acima, ZOA-MBOE et al. (1989), trabalhando com vacas holandesas no Estado da Georgia (USA), detectaram aumento da temperatura retal (39,99 versus 39,81ºC), devido ao tratamento com bST, em ambiente com temperaturas de 21,2 e 32,7ºC e umidade relativa do ar (UR) de 50 a 90%. No entanto, esta diferença de 0,1ºC foi significativa. ELVINGER et al. (1992) também encontraram aumentos de 0,1ºC na temperatura retal em animais tratados com bST, sob temperaturas entre 27 e 33ºC e umidade relativa de 77 a 85%, embora esta variação de 0,1ºC não tenha sido significativa (P>0,05). Nesses estudos, os resultados das análises estatísticas foram diferentes para a mesma variação de temperatura retal (0,1ºC) encontrada nos grupos de vacas do presente experimento. A razão destas diferenças não é clara mas pode está relacionada a variações na homogeneidade dos grupos dos animais avaliados nos diferentes ambientes.


Estudos têm mostrado que condições de estresse térmico mais severas apresentam efeitos significativos sobre os animais tratados com bST. COLE e HANSEN (1993), trabalhando com vacas holandesas submetidas a temperaturas de 33 a 40ºC e umidade relativa de 78 a 90%, observaram aumentos (P<0,01) na temperatura retal dos animais tratados com bST que variaram de 0,3 a 0,4ºC. ELVINGER et al. (1992), trabalhando com 34 vacas holandesas sob temperaturas de 37 a 43ºC e umidade relativa de 85 a 95%, verificaram aumentos de 0,6ºC (P<0,01) na temperatura retal devido ao uso do bST.

Os animais que receberam bST apresentaram valores mais elevados de temperatura do leite do que os animais controle pela manhã (35,5 ± 0,29ºC versus 35,1 ± 0,10ºC) e à tarde (36,8 ± 0,23ºC versus 36,2 ± 0,15ºC), embora estas diferenças de 0,4 e 0,6ºC não tenham sido significativas (P>0,05, Figura 2). Dentro de cada grupo de animais, a temperatura do leite apresentou aumentos significativos (P<0,05) entre os períodos da manhã e da tarde, com diferenças médias de 1,3ºC para os animais tratados e 1,1ºC para o grupo controle. WEST et al. (1991) observaram que vacas Holandesas (n=6) e Jersey (n=8) tratadas com bST e mantidas em temperaturas de 22 a 35ºC (72% UR) apresentaram aumentos (P<0,01) de 0,3 a 0,6ºC na temperatura do leite em relação aos grupos controle. Dado que o número de animais no citado experimento foi semelhante ao utilizado no presente trabalho, a uniformidade do rebanho e, conseqüentemente, menor variabilidade dentro dos grupos tratados e controle provavelmente influenciaram os resultados dos testes estatísticos.


Uma vez que não houve diferença entre os grupos para temperatura do leite, foram realizadas análises de correlação com todos os 30 animais do experimento. Houve correlações entre a produção diária de leite e a temperatura do leite pela manhã e à tarde (r= 0,38 a 0,69; P < 0,05; Tabela 3). Sabe-se que vacas com maior produção estão mais sujeitas a efeitos do ambiente e variações na temperatura do leite estão associadas a maiores produções (WEST et al., 1991). Os resultados apresentados nesta pesquisa mostram a mesma tendência descrita por outros autores, ou seja, que há uma associação entre aumento da produção e temperatura do leite. De acordo com a literatura consultada, este experimento é o primeiro a mostrar correlações entre produção e temperatura do leite em vacas criadas no semi-árido do Nordeste. A razão da existência desta correlação não é clara, mas, provavelmente, o bST não provocou alteração no metabolismo dos animais a ponto de causar aumento substancial na temperatura retal. No entanto, variações na temperatura do leite estiveram mais associadas à produção, sugerindo que a glândula mamária pode ter maior dificuldade de dissipar o calor, devido à localização na cavidade inguinal e intenso fluxo sangüíneo. As correlações entre temperatura do leite e produção podem indicar que, em vacas com maior produção de leite, há a possibilidade de estresse térmico mais severo.

Na propriedade onde foi realizado o experimento, as médias de temperatura máxima e mínima foram 37,7 e 20,1ºC, respectivamente, com variações de umidade relativa do ar entre 48 e 70% (Tabela 4). Com a avaliação do índice de temperatura e umidade (ITU), no período da manhã, verificou-se que os animais estiveram submetidos a estresse ameno, com temperatura ambiente e umidade relativa média de 26,8ºC e 61%, respectivamente (Figura 3). À tarde, no período de 14 a 25 de agosto, houve estresse ameno e durante o restante do período, estresse moderado, com temperatura média e umidade relativa de 33,2ºC e 48%, respectivamente. Foi detectado, durante o período experimental, um ponto máximo com estresse severo durante apenas uma tarde (ITU = 90), devido principalmente a mudanças na umidade relativa do ar. À noite, as temperaturas reduzidas evitaram aumentos do estresse térmico para os animais (Figura 3). Apesar das altas temperaturas ambientais durante o período da tarde (temperatura máxima de 37,7ºC) durante o experimento, esta condição foi amenizada pela baixa umidade (48%). A variação do consumo de matéria seca entre o dia e a noite não foi avaliada neste experimento. No entanto, as alterações observadas no Índice de Temperatura e Umidade podem sugerir que houve algum tipo de adaptação dos animais com relação ao hábito de consumo. SCHENEIDER et al. (1984) observaram que vacas mantidas sob estresse térmico consomem mais alimento durante as noite frias do que no decorrer do dia. O mesmo comportamento foi citado por PIRES et al. (1998), observando alteração no padrão de alimentação das vacas, com as mesmas alimentando-se mais durante o período noturno, evitando assim a ingestão de alimentos entre as 6h30 e 17 h.


Conclusões

Vacas Bos taurus x Bos indicus (3/4 a 7/8 Holandês x Gir) apresentam respostas significativas ao tratamento com bST exógeno, sem, no entanto, ocorrerem alterações nos indicadores de estresse térmico avaliados (temperatura retal e do leite).

As condições de temperatura e umidade relativa do ar em local sombreado, no semi-árido, não apresentam limitações ao conforto e produção dos animais.

Recebido em: 07/06/00

Aceito em: 08/11/00

2 Professor Adjunto - Departamento de Zootecnia - Universidade Federal do Ceará. Av. Mister Hull, s/n Campus do Pici - Fortaleza - CE - 60.021 - 970.

3 Correspondência. E-mail: amoura@ufc.br

4 Pesquisadora - Instituto de Zootecnia - Ribeirão Preto - SP.

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  • 1
    Parte da dissertação de mestrado do primeiro autor, apresentada à UFC. Apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Ceará (FUNCAP).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Set 2001
    • Data do Fascículo
      Abr 2001

    Histórico

    • Aceito
      08 Nov 2000
    • Recebido
      07 Jun 2000
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