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Características das partes não-integrantes da carcaça de novilhos 5/8Nelore 3/8Charolês abatidos em três estádios de desenvolvimento

Characteristics of non integrant parts of the carcass of 5/8 Nellore 3/8 Charolais steers slaughtered at three maturity stages

Resumos

Foram avaliadas as características das partes não-integrantes da carcaça de novilhos 5/8 Nelore 3/8 Charolês terminados em confinamento e abatidos com 425, 467 e 510 kg. Os períodos de alimentação foram 30, 65 e 94 dias, respectivamente. A idade e peso médio iniciais foram de 660 dias e 361 kg, respectivamente. A dieta alimentar, com relação volumoso:concentrado de 60:40 com base na matéria seca (MS), continha 10,25% de proteína bruta e 3,18 Mcal de energia digestível/kg MS. De acordo com estimativa da equação de regressão, os rendimentos de carcaças quente e fria elevaram com o aumento no peso de abate (P). No entanto, quando expressos por peso de corpo vazio (PCV), houve similaridade entre os diferentes tratamentos. Quando os componentes foram expressos em valores absolutos, couro, total de componentes externos (TCE), fígado, total de órgãos vitais (TOV), total de gorduras internas (TGORD) e total de trato gastrintestinal vazio (TGVZ) apresentaram incremento com o aumento no P. Quando expressos por 100 kg de P e PCV, os componentes couro, TCE, fígado e TGVZ apresentaram similaridade; coração e TOV, decréscimo; e TGORD, acréscimo, com o aumento no P. Houve correlação positiva entre peso de fígado com consumo de matéria seca (r = 0,91) e com energia líquida de mantença (ELm) (r = 0,91) e entre TGORD com ELm (r = 0,78).

consumo de matéria seca; fígado; gordura; mestiços; peso de abate; peso de corpo vazio


The characteristics of the body parts non-integrant of the carcass of 5/8 Nellore 3/8 Charolais steers feedlot finished and slaughtered with 425, 467 and 510 kg, were evaluated. The feeding periods were 30, 65 and 94 days, respectively. The average initial age and weight were 660 days and 361 kg, respectively. The diet, with 60% roughage and 40% concentrate dry matter basis (DM), contained 10.25% of crude protein and 3.18 Mcal of digestible energy/kg DM. According to regression equation estimate, the hot and cold carcass dressing increased as slaughter weight (SW) increased. However, when expressed per empty body weight (EBW), similarity among the different treatments was verified. When the components were expressed in absolute values, rawhide, total external components (TEC), liver, total vital organs (TVO), total internal fats (TFAT) and total empty gastrintestinal tract (TEGT) showed increase with increase in SW. When expressed per 100 kg of body weight and EBW, the rawhide, TEC, liver and TEGT components showed similarity; heart and TVO showed decrease; and TFAT showed increase, with increase in SW. Positive correlations between liver weight with dry matter intake (r=.91) and with net energy maintenance (NEm) (r=.91), and between TFAT with NEm (r=.78) were observed.

crossbreds; dry matter intake; empty body weight; fat; liver; slaughter weight


PRODUÇÃO ANIMAL

Características das partes não-integrantes da carcaça de novilhos 5/8Nelore 3/8Charolês abatidos em três estádios de desenvolvimento

Characteristics of non integrant parts of the carcass of 5/8 Nellore 3/8 Charolais steers slaughtered at three maturity stages

João RestleI; Luís Fernando Glasenapp de MenezesII; Miguelangelo Ziegler ArboitteIII; Leonir Luiz PascoalIV; Paulo Santana PachecoV; João Teodoro PáduaVI

IEngenheiro Agrônomo, PhD. Pesquisador Visitante/CNPq DPA/UFG. E.mail: jorestle@terra.com.br

IIZootecnista, MSc. Doutorando do PPGZ da UFSM. E.mail: lfgdm@pop.com.br

IIIZootecnista, MSc. Professor substituto do Departamento de Zootecnia da UFSM

IVZootecnista, MSc. Professor Assistente do Departamento de Zootecnia da UFSM

VZootecnista, MSc. Doutorando PPGCA - UFG

VIZootecnista, Dr., Professor Adjunto do Departamento de Produçào Animal - EV/UFG

RESUMO

Foram avaliadas as características das partes não-integrantes da carcaça de novilhos 5/8 Nelore 3/8 Charolês terminados em confinamento e abatidos com 425, 467 e 510 kg. Os períodos de alimentação foram 30, 65 e 94 dias, respectivamente. A idade e peso médio iniciais foram de 660 dias e 361 kg, respectivamente. A dieta alimentar, com relação volumoso:concentrado de 60:40 com base na matéria seca (MS), continha 10,25% de proteína bruta e 3,18 Mcal de energia digestível/kg MS. De acordo com estimativa da equação de regressão, os rendimentos de carcaças quente e fria elevaram com o aumento no peso de abate (P). No entanto, quando expressos por peso de corpo vazio (PCV), houve similaridade entre os diferentes tratamentos. Quando os componentes foram expressos em valores absolutos, couro, total de componentes externos (TCE), fígado, total de órgãos vitais (TOV), total de gorduras internas (TGORD) e total de trato gastrintestinal vazio (TGVZ) apresentaram incremento com o aumento no P. Quando expressos por 100 kg de P e PCV, os componentes couro, TCE, fígado e TGVZ apresentaram similaridade; coração e TOV, decréscimo; e TGORD, acréscimo, com o aumento no P. Houve correlação positiva entre peso de fígado com consumo de matéria seca (r = 0,91) e com energia líquida de mantença (ELm) (r = 0,91) e entre TGORD com ELm (r = 0,78).

Palavras-chave: consumo de matéria seca, fígado, gordura, mestiços, peso de abate, peso de corpo vazio

ABSTRACT

The characteristics of the body parts non-integrant of the carcass of 5/8 Nellore 3/8 Charolais steers feedlot finished and slaughtered with 425, 467 and 510 kg, were evaluated. The feeding periods were 30, 65 and 94 days, respectively. The average initial age and weight were 660 days and 361 kg, respectively. The diet, with 60% roughage and 40% concentrate dry matter basis (DM), contained 10.25% of crude protein and 3.18 Mcal of digestible energy/kg DM. According to regression equation estimate, the hot and cold carcass dressing increased as slaughter weight (SW) increased. However, when expressed per empty body weight (EBW), similarity among the different treatments was verified. When the components were expressed in absolute values, rawhide, total external components (TEC), liver, total vital organs (TVO), total internal fats (TFAT) and total empty gastrintestinal tract (TEGT) showed increase with increase in SW. When expressed per 100 kg of body weight and EBW, the rawhide, TEC, liver and TEGT components showed similarity; heart and TVO showed decrease; and TFAT showed increase, with increase in SW. Positive correlations between liver weight with dry matter intake (r=.91) and with net energy maintenance (NEm) (r=.91), and between TFAT with NEm (r=.78) were observed.

Key Words: crossbreds, dry matter intake, empty body weight, fat, liver, slaughter weight

Introdução

Importante alternativa para o avanço na produção de carne bovina e a remuneração por animal abatido seria o aumento do peso de abate dos animais. Isto porque o peso de abate, os pesos e os rendimentos de carcaça quente e/ou fria são as principais características envolvidas no processo de comercialização entre frigorífico e produtor (Restle et al., 1997a; Costa et al., 2002a; Arboitte et al., 2004a).

No entanto, cada vez mais os componentes não-integrantes tornam-se importante fonte de receita para os frigoríficos, que os comercializam tanto no mercado interno quanto no externo. Apesar de o produtor não receber remuneração por estes componentes, estes são importantes, pois afetam o rendimento de carcaça e as exigências nutricionais, principalmente a de energia líquida de mantença (Galvão et al., 1991; Jorge et al., 1999; Véras et al., 2001; Pacheco et al., 2005a). Com isso, em bovinos de corte, a avaliação dos componentes do corpo vazio deve ser utilizada como informação auxiliar no entendimento de características relacionadas ao desempenho e à carcaça dos animais (Pacheco et al., 2005a).

Notadamente, o couro, além dos órgãos internos, representa uma parcela significativa da receita dos frigoríficos. O couro é, sem dúvida, o componente de maior importância, se considerado o valor agregado que recebe do abate até a transformação em produtos comerciais. O peso do couro é influenciado pelo peso de abate e pelo grupo genético dos animais (Galvão et al., 1991; Signoretti et al., 1999; Pacheco et al., 2005a), podendo ocorrer decréscimo (Galvão et al., 1991) ou acréscimo em seu peso (Signoretti et al., 1999; Jorge & Fontes, 2001) quando expresso em relação ao peso de corpo vazio, com o aumento no peso de abate dos animais.

Em relação aos demais componentes do corpo vazio, o aumento no peso de abate dos animais pode resultar em diferentes comportamentos. Nos estudos de Oliveira et al. (1992) e Signoretti et al. (1999), houve decréscimo no peso relativo dos órgãos internos relativos no peso de corpo vazio com o aumento do peso dos animais. Similaridade no peso dos órgãos vitais ajustado para peso de corpo vazio de novilhos abatidos em diferentes estádios de maturidade (405, 450 e 500 kg) foi relatada por Jorge et al. (1999), enquanto Galvão et al. (1991) verificaram redução no peso de pés e cabeça/100 kg de corpo vazio com o avanço da maturidade dos animais de 90 para 110% do peso adulto.

Este trabalho foi realizado objetivando-se avaliar os componentes não-integrantes da carcaça de novilhos 5/8 Nelore 3/8 Charolês terminados em confinamento, abatidos em três estádios de maturidade.

Material e Métodos

O experimento foi realizado no Setor de Bovinocultura de Corte do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), situada na Depressão Central do estado do Rio Grande do Sul, com coordenadas 29º42' de latitude Sul e 54º42' de longitude Oeste e 96 metros de altitude.

Foram utilizados 18 novilhos do grupo genético 5/8Nelore 3/8Charolês, contemporâneos e provenientes do mesmo rebanho, com idade, peso e estado corporal médio iniciais de 660 dias, 361 kg e 2,91 pontos (escala de 1 a 5 segundo Restle, 1972), respectivamente. Os animais foram distribuídos em três tratamentos, que corresponderam aos pesos de abate pretendidos de 420, 460 e 500 kg, obtendo-se pesos reais de 425, 467 e 510 kg. Os períodos de alimentação foram 30, 65 e 94 dias, respectivamente.

Os animais, alimentados duas vezes ao dia, receberam a metade da dieta pela manhã (8 h) e o restante à tarde (16 h). Diariamente, pela manhã, eram retiradas e pesadas as sobras de alimento do dia anterior, para ajuste da quantidade de alimento ofertado e posterior cálculo do consumo. A quantidade de matéria seca (MS) fornecida diariamente foi 10% superior ao consumo voluntário observado. A dieta foi calculada segundo o NRC (1996), objetivando ganho de peso médio de 1,600 kg/animal/dia.

Na Tabela 1, encontra-se a composição percentual dos componentes da dieta experimental, expressos em MS, utilizando-se relação volumoso:concentrado de 60:40. O volumoso foi representado por silagem de milho de alta qualidade (46,5% de grãos na massa ensilada), enquanto a dieta apresentou em média 10,25% de proteína bruta e 3,18 Mcal de energia digestível/kg de MS.

Conforme os animais dos tratamentos atingiram o peso pré-determinado, foram pesados (peso de abate) após jejum de sólidos de 14 horas, transportados ao frigorífico comercial e abatidos segundo o fluxo normal do estabelecimento.

No momento do abate, foram coletados os pesos dos seguintes componentes: sangue; cabeça (incluindo orelhas e chifres), vassoura da cauda, patas e couro (denominados componentes externos); coração, rins, fígado, baço e pulmões (denominados órgãos vitais); rúmen-retículo, omaso, abomaso e intestinos delgado e grosso vazios (denominados trato gastrintestinal vazio); gorduras inguinal, renal, ruminal e de toalete (denominadas gorduras internas).

As meia-carcaças (direita e esquerda) foram identificadas, sendo o peso de carcaça quente obtido anteriormente à entrada das mesmas na câmara de resfriamento.

O peso de corpo vazio foi obtido pelo somatório dos pesos de carcaça quente, sangue, componentes externos, órgãos vitais, trato gastrintestinal vazio e gorduras internas.

Após 24 horas de resfriamento em câmara fria a 2ºC, as carcaças foram novamente pesadas, obtendo-se o peso de carcaça fria. A partir dos pesos de abate, de corpo vazio, de carcaça quente e de carcaça fria, calculou-se os rendimentos de carcaça quente e fria em relação ao peso de abate e de corpo vazio.

O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado, com três tratamentos e seis repetições, considerando cada animal uma unidade experimental.

Os dados e características de desempenho dos animais, apresentadas por Arboitte et al. (2004 b), foram submetidos às análises de regressão e correlação de Pearson por intermédio do programa estatístico SAS (1997).

O modelo matemático utilizado foi:

Yijlm = B0 + Pi i + B1P jl + E ijlm,

em que: Yijlm = variáveis dependentes; B0; B1 = parâmetros da equação a serem estimados; Pi i = efeito do i-ésimo peso inicial dos novilhos, utilizado como covariável; P jl = peso da abate na l-ésima repetição do j-ésimo tratamento; Eijlm = erro experimental aleatório, NID (0, s²).

Os dados foram testados quanto à normalidade, pelo teste de Shapiro-Wilk (SAS, 1997), sendo efetuada quando necessário, a transformação da raiz quadrada dos dados das variáveis.

Resultados e Discussão

Na Tabela 2, constam os resultados referentes a algumas características de desempenho dos animais deste estudo, segundo Arboitte et al. (2004b).

Os valores médios referentes ao peso de corpo vazio (PCV), rendimentos de carcaça quente e fria expressos por peso de abate (P) e por peso de corpo vazio encontram-se na Tabela 3.

Verifica-se que os rendimentos de carcaça quente e fria expressos por 100 kg de peso de abate elevaram de 0,026 e 0,028%, respectivamente, para cada kg de aumento no peso de abate, segundo estimativas das equações de regressão. No entanto, quando expressos por peso de corpo vazio, houve similaridade entre os diferentes tratamentos, com média de 63,04 e 61,67%, respectivamente.

Na Tabela 4, constam os valores médios referentes ao peso absoluto e relativo ao P e PCV dos diferentes componentes externos, de acordo com o peso de abate.

Houve resposta linear nos pesos absolutos de patas e couro com o aumento no peso de abate, com acréscimo mais proeminente neste último componente, elevando 22,5% dos 425 aos 467 kg e 3,8% dos 467 aos 510 kg. Para o frigorífico, o resultado verificado para o peso absoluto de couro é importante, uma vez que representa maior receita por unidade comercializada. Avaliando os componentes não-integrantes da carcaça de novilhos jovens e superjovens dos grupos genéticos 5/8 Nelore 3/8 Charolês e 5/8 Charolês 3/8 Nelore, Pacheco et al. (2005a) comentaram que, para o frigorífico, seria mais vantajoso o abate de animais mais pesados, conseqüentemente, com maior peso de couro (e não necessariamente com maior idade) e/ou o abate de genótipos com maior predominância de sangue zebuíno.

Quando expressos em percentagem do P e do PCV, o componente cabeça apresentou decréscimo, enquanto o couro se manteve inalterado com o aumento no peso de abate dos animais, demonstrando que estes componentes não acompanham proporcionalmente o crescimento do P e PCV. Em seu estudo, Galvão et al. (1991) observaram decréscimo no peso do componente couro à medida que aumentou o grau de maturidade dos novilhos, passando de 11,43 kg/100 kg de peso de corpo vazio nos animais abatidos com 90% do peso adulto para 10,64 kg/100 kg de peso de corpo vazio nos novilhos abatidos com 110% do peso adulto. No estudo de Jorge & Fontes (2001), que avaliaram o desenvolvimento relativo das partes do corpo de novilhos zebuínos de quatro raças a partir dos coeficientes de alometria, cabeça, pés e couro apresentaram coeficientes menores que um, ou seja, as intensidades de desenvolvimento dessas partes do corpo foram inferiores à do peso corporal vazio, refletindo a maturidade mais precoce destes componentes.

Ainda na Tabela 4, analisando o peso absoluto total dos componentes externos, verifica-se aumento de 144 g/kg no P, conforme estimativa da equação de regressão, com o maior ímpeto de crescimento verificado dos 425 aos 467 kg (10,7%), reduzindo para 4,7% dos 467 aos 510 kg. No entanto, quando ajustado para P e PCV, houve similaridade para esta característica com o aumento no peso de abate.

As médias expressas em valores absolutos e relativos a 100 kg de peso de abate e de corpo vazio para sangue e órgãos vitais, de acordo com os diferentes estádios de maturidade, constam na Tabela 5.

Quanto ao componente sangue, houve incremento linear, quando expresso em valores absolutos, e similaridade, quando ajustado para peso de abate e de corpo vazio, com o aumento no peso de abate. Em valores absolutos, estes resultados estão de acordo com os relatados por Jesse et al. (1976), que, ao abaterem novilhos Hereford com 227; 341; 454 e 545 kg, constataram quantidade de sangue de 6,64; 9,28; 12,64 e 13,28 kg, respectivamente.

Alguns estudos demonstraram que a variação no peso de sangue acompanha a variação no peso de órgãos vitais e de trato digestivo vazio (Ribeiro et al., 2001; Pacheco et al., 2005a), o que seria necessário para acompanhar as variações na taxa metabólica nos animais. Neste ensaio, o peso de sangue correlacionou-se positivamente com total de órgãos vitais (r = 0,40; P = 0,1013), com total do trato digestivo vazio (r = 0,32; P = 0,1974) e com total de gorduras internas (r = 0,44; P = 0,0673).

Em valores absolutos, fígado apresentou aumento com o avanço no estádio de maturidade dos animais. Enquanto que os pesos dos órgãos internos, coração, pulmão e rins decresceram frente ao aumento no peso de abate quando ajustados para PCV. Segundo Berg & Butterfield (1976), órgãos internos e vísceras apresentam desenvolvimento precoce e o fenômeno ocorre com maior intensidade nos estádios iniciais da vida do animal. No entanto, avaliando os coeficientes de alometria de diversos componentes não-integrantes da carcaça de novilhos zebuínos, Jorge & Fontes (2001) verificaram que fígado e baço apresentaram intensidade de crescimento igual ou superior à do peso de corpo vazio.

O conjunto dos órgãos internos apresentou aumento de 17 g/kg de aumento no peso dos animais, de acordo com estimativa da equação de regressão, sendo o fígado o principal órgão participante deste acréscimo (10 g/kg de aumento de peso). Contudo, quando foram expressos em relação a 100 kg do P e PCV, o comportamento dos dados inverteu-se, com equações de regressão estimando decréscimos frente ao aumento no peso de abate. Em sua revisão, Cumby (2000) relatou que o tamanho e a taxa metabólica dos órgãos são diferentes em relação às demais partes do corpo do animal, podendo estar diretamente relacionados ao consumo de alimentos e às exigências energéticas, principalmente de energia líquida de mantença. Dos órgãos vitais, Owens et al. (1993) e Ferrel & Jenkins (1998) citaram que o fígado é o mais alterado frente às variações no consumo de alimentos, exigências energéticas e taxas metabólicas, pois participa ativamente no metabolismo dos nutrientes. Observou-se que o consumo de matéria seca (em kg, em percentagem do peso vivo e por unidade de tamanho metabólico) não foi alterado, o ganho de peso médio diário (kg) reduziu linearmente e a exigência de energia líquida de mantença (ELm), em Mcal, elevou linearmente com o aumento no peso de abate dos animais. De acordo com análise de correlação entre estas três características e o peso de fígado (kg), os coeficientes obtidos foram de 0,91 (P = 0,0128), -0,07 (P = 0,7915) e 0,91 (P = 0,0122), respectivamente. Pacheco et al. (2005a) verificaram que a correlação entre peso de fígado (em valores absolutos) e exigência de energia líquida de mantença (Mcal) foi de 0,57.

Os pesos absolutos e relativos a 100 kg de P e PCV das diferentes gorduras internas, de acordo com o peso de abate encontram-se na Tabela 6.

Os pesos de gordura ruminal e inguinal incrementaram linearmente frente ao aumento no peso de abate dos animais, tanto em valores absolutos quanto em percentagem do peso de abate e de corpo vazio, de modo que a primeira apresentou maior acréscimo (97 g/kg de aumento no peso de abate), conforme estimativa da equação de regressão. Segundo análise dos coeficientes de alometria estimados no estudo de Restle et al. (2005), que trabalharam com os mesmos animais utilizados neste estudo, verificou-se que, quando relacionado com o aumento no peso de corpo vazio, as gorduras inguinal e ruminal apresentaram coeficientes de 3,67 e 3,27, respectivamente, superiores aos coeficientes das gorduras de toalete (2,29) e renal (1,80), indicando que as gorduras internas apresentam crescimento mais acentuado em relação ao aumento no peso de corpo vazio, ou seja, maturidade mais tardia. Apesar de serem poucos os estudos que quantificaram coeficientes de alometria dos componentes do corpo vazio em relação ao peso de corpo vazio, vários resultados de trabalhos envolvendo terminação de novilhos demonstraram que existe alteração na composição do ganho de peso com o avanço no período de alimentação, passando a depositar mais tecido adiposo que muscular (Berg & Butterfield, 1976; Restle et al., 1997 b; Bail et al., 2000; Restle et al., 2000; Costa et al., 2002b; Restle et al., 2003; Arboitte et al., 2004b; Pacheco et al., 2005b).

Com o aumento no peso de abate, houve maior porcentagem de gordura de toalete, quando expresso em valores absolutos, e similaridade, quando ajustados para peso de abate e de corpo vazio. Verifica-se que, para todos os pesos de abate, houve penalização das carcaças com o recorte do excesso de gordura, mesmo para aquelas dos animais abatidos com 425 kg, que apresentaram espessura de gordura subcutânea dentro dos limites exigidos pelos frigoríficos (Arboitte et al., 2004a), o que representa perdas econômicas ao produtor, posto que o acúmulo de gordura é um processo menos eficiente que o acúmulo dos demais tecidos que compõem a carcaça, resultando em maior gasto com alimentação. Para o frigorífico, este tipo de gordura também representaria prejuízo econômico se estivesse incluída no peso de carcaça, uma vez que após resfriamento, seria comercializada separadamente por preço inferior, embutindo-se, ainda, todos os demais custos de produção. Somente não teriam prejuízos se existissem mercados com demanda por carcaças com maior quantidade de gordura, como por exemplo, países asiáticos.

Observou-se avanço linear no peso total das gorduras internas com o aumento do peso de abate, independentemente da forma de expressão. De acordo com estimativa da equação de regressão, cada kg de aumento do peso de abate representou incremento de 177 g no peso total de gorduras internas. Para o produtor, a importância deste resultado se deve à relação positiva entre exigências energéticas e peso das gorduras internas. Conforme NRC (1996), o teor de gordura interna e o peso adulto são características importantes na estimativa das exigências energéticas dos animais, principalmente a ELm. Gesualdi Jr. et al. (2001) acrescentam que incrementos nos requerimentos para mantença de animais com excesso de gorduras internas, também ocorre pelo fato de a atividade metabólica destes tecidos ser maior que nos tecidos periféricos. Neste estudo, a correlação entre gorduras internas e ELm foi de 0,78 (P=0,0660).

Na Tabela 7, estão apresentados os resultados referentes aos pesos absolutos e relativos a 100 kg de peso de abate e de corpo vazio dos componentes do trato gastrintestinal vazio, de acordo com o peso de abate dos animais.

Com exceção dos pesos absolutos de abomaso, intestinos delgado + grosso, total do trato gastrintestinal vazio e do peso ajustado para PCV de rúmen + retículo, que apresentaram incremento, os demais componentes expressos nas diferentes maneiras não diferiram com o avanço no peso de abate dos animais. No estudo de Galvão et al. (1991), não se verificaram diferenças no peso relativo do trato gastrintestinal + mesentério e no comprimento do intestino grosso. No entanto, houve acréscimo no comprimento do intestino delgado quando os autores avaliaram carcaças de novilhos Nelore e seus mestiços meio sangue Limousin e Marchigiana, abatidos com pesos equivalentes a 90, 100 e 110% do peso adulto. Por outro lado, Jorge et al. (1999) observaram declínio do conjunto rúmen + retículo + omaso + abomaso e intestino delgado, expressos em relação a 100 kg de peso de corpo vazio, quando o peso de abate elevou de 405 para 500 kg.

Vários estudos (Signoretti et al., 1999; Véras et al., 2001; Gesualdi Jr. et al., 2001) demonstraram que a variação no peso de abomaso está relacionada principalmente ao efeito nutricional. Segundo Ferrel et al. (1976), este órgão participa ativamente do processo de digestão, podendo ser maior em animais que recebem altos níveis de concentrado. Pacheco et al. (2005a) acrescentaram que, mesmo com a mesma relação volumoso:concentrado, o peso de abomaso pode apresentar variação em razão do tipo de seleção feita por parte dos animais, ou seja, priorizando em maior ou menor grau a fração concentrado.

Em relação aos demais componentes do trato digestivo, resultados de estudos avaliando os componentes não-integrantes da carcaça de bovinos demonstraram que o peso destes componentes pode variar de acordo com consumo de alimentos, histórico nutricional, grupo genético dos animais (Hoog, 1991; Santos et al., 2003; Pacheco et al., 2005a) e tipo da dieta (volumosa ou concentrada) (Gesualdi Jr. et al., 2001; Ribeiro et al., 2001). Segundo dados de desempenho constantes na Tabela 2 (Arboitte et al., 2004 b), o consumo de matéria seca, expresso em kg, em percentagem do peso vivo e por unidade de tamanho metabólico, não variou com o aumento no peso de abate. A relação entre consumo de matéria seca e peso do trato digestivo vazio foi positiva (r = 0,52), embora não-significativa (P = 0,2926).

Conclusões

O incremento no peso de abate proporcionou maiores rendimentos de carcaças quente e fria, quando expressos por peso de abate, e similaridade, quando expressos por peso de corpo vazio.

Em valores absolutos, o peso total dos componentes externos, total de órgãos vitais, total de gorduras internas e total do trato gastrintestinal vazio elevaram com o aumento no peso de abate. No entanto, quando ajustados para peso de abate e peso de corpo vazio, os pesos totais dos componentes externos e do trato gastrintestinal vazio apresentaram similaridade, o total de órgãos vitais decresceu e o total de gorduras internas elevou com o aumento no peso de abate.

Houve relação positiva entre pesos absolutos de fígado, total de gorduras internas e total do trato gastrintestinal vazio com as características de desempenho consumo de matéria seca, em kg, e exigência de energia líquida de mantença, em Mcal.

Literatura Citada

Recebido em: 16/08/04

Aceito em: 13/03/05

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Ago 2005

Histórico

  • Recebido
    16 Ago 2004
  • Aceito
    13 Mar 2005
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