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Níveis de lisina em rações para fêmeas suínas em lactação

Lysine levels in diets for lactating sows

Resumos

Foram utilizadas 65 porcas (Large White x Landrace) com 217,36 ± 21,35 kg para avaliação de diferentes níveis de lisina total (0,950; 1,025; 1,100; 1,175 e 1,250%) na ração para a fase de 21 dias de lactação. Utilizou-se o delineamento experimental de blocos ao acaso, com cinco tratamentos e 13 repetições, sendo a porca considerada a unidade experimental. O consumo total de ração diário foi fixado entre os tratamentos. Os níveis de lisina da ração não influenciaram o peso das matrizes ao desmame, a perda de peso, a espessura de toucinho (ET) das matrizes, a variação na ET, a perda de gordura corporal, o número de leitões desmamados por leitegada e o intervalo desmama-estro. No entanto, foi verificada redução linear na perda de proteína corporal, em kg e em porcentagem, e na produção de leite diária das matrizes suínas com o aumento do nível de lisina na ração. O ganho de peso da leitegada foi influenciado, reduzindo de forma linear com os tratamentos. Os resultados obtidos neste estudo evidenciaram que, ao consumir menores quantidades de lisina, as matrizes mobilizaram suas reservas corporais protéicas para manutenção do desempenho produtivo. Entretanto, a quantidade de proteína mobilizada por estes animais (2,2 kg, correspondente a 6,45% da proteína corporal) não foi suficiente para influenciar os parâmetros produtivos e reprodutivos. O consumo diário de 45 g de lisina total, correspondente a 40 g de lisina digestível, atende às exigências para os desempenhos produtivo e reprodutivo de fêmeas suínas em lactação, enquanto o consumo estimado de 58,9 g de lisina total/dia, correspondente a 53,5 g/dia de lisina digestível, minimiza a perda de proteína corporal durante a lactação.

exigência; lactação; leitões; lisina; matrizes suínas; reprodução


Sixty-five crossbred sows (Landrace x Large White) averaging 217.36 ± 21.35 kg were used to evaluate increasing dietary total lysine levels (0.950, 1.025, 1.100, 1.175, and 1.250%) during 21 days of lactation. The experiment was analyzed as a randomized block design, with five treatments, 13 replicates of one sow per experimental unit. The daily total feed intake was fixed for all treatments. The dietary lysine levels did not affect sow weight at weaning, body weight loss, backfat thickness (BT), BT change, body fat loss, number of weaned piglets per litter and weaning-to-estrus interval. However, there was a linear decrease on body protein loss expressed as kg and percentage and on daily milk production of sows, as the dietary lysine levels increased. The treatments affected litter weight gain, that decreased linearly. The results of this work showed that sows fed decreasing lysine levels retained significant amounts of body protein reserve to maintain their productive performance. However, the protein mobilization of these animals (2.2 kg corresponding to 6.45% of body protein loss) was not enough to affect the productive and reproductive performance. It was concluded that a daily total lysine intake of 45 g, correspondent of 40 g of digestible lysine meets the requirements for productive and reproductive performance of lactating sows and that they require 58.9 g of estimate total lysine/day, that corresponds to 53.5 g/day of digestible lysine to minimize body protein loss during the lactation.

lactation; litter; lysine; requirement; reproduction; sows


MONOGÁSTRICOS

Níveis de lisina em rações para fêmeas suínas em lactação1 1 Parte da tese de Doutorado da primeira autora apresentada à UFV.

Lysine levels in diets for lactating sows

Christiane Garcia Vilela NunesI; Rita Flavia Miranda de OliveiraII; Juarez Lopes DonzeleII; Will Pereira de OliveiraIII; Bruno Alexander Nunes SilvaI; Marvio Lobão Teixeira de AbreuIV

IPós-graduação em Zootecnia – UFV

IIDepartamento de Zootecnia – UFV

IIIBolsista de Iniciação Cientifica – DZO/UFV

IVUFPI

RESUMO

Foram utilizadas 65 porcas (Large White x Landrace) com 217,36 ± 21,35 kg para avaliação de diferentes níveis de lisina total (0,950; 1,025; 1,100; 1,175 e 1,250%) na ração para a fase de 21 dias de lactação. Utilizou-se o delineamento experimental de blocos ao acaso, com cinco tratamentos e 13 repetições, sendo a porca considerada a unidade experimental. O consumo total de ração diário foi fixado entre os tratamentos. Os níveis de lisina da ração não influenciaram o peso das matrizes ao desmame, a perda de peso, a espessura de toucinho (ET) das matrizes, a variação na ET, a perda de gordura corporal, o número de leitões desmamados por leitegada e o intervalo desmama-estro. No entanto, foi verificada redução linear na perda de proteína corporal, em kg e em porcentagem, e na produção de leite diária das matrizes suínas com o aumento do nível de lisina na ração. O ganho de peso da leitegada foi influenciado, reduzindo de forma linear com os tratamentos. Os resultados obtidos neste estudo evidenciaram que, ao consumir menores quantidades de lisina, as matrizes mobilizaram suas reservas corporais protéicas para manutenção do desempenho produtivo. Entretanto, a quantidade de proteína mobilizada por estes animais (2,2 kg, correspondente a 6,45% da proteína corporal) não foi suficiente para influenciar os parâmetros produtivos e reprodutivos. O consumo diário de 45 g de lisina total, correspondente a 40 g de lisina digestível, atende às exigências para os desempenhos produtivo e reprodutivo de fêmeas suínas em lactação, enquanto o consumo estimado de 58,9 g de lisina total/dia, correspondente a 53,5 g/dia de lisina digestível, minimiza a perda de proteína corporal durante a lactação.

Palavras-chave: exigência, lactação, leitões, lisina, matrizes suínas, reprodução

ABSTRACT

Sixty-five crossbred sows (Landrace x Large White) averaging 217.36 ± 21.35 kg were used to evaluate increasing dietary total lysine levels (0.950, 1.025, 1.100, 1.175, and 1.250%) during 21 days of lactation. The experiment was analyzed as a randomized block design, with five treatments, 13 replicates of one sow per experimental unit. The daily total feed intake was fixed for all treatments. The dietary lysine levels did not affect sow weight at weaning, body weight loss, backfat thickness (BT), BT change, body fat loss, number of weaned piglets per litter and weaning-to-estrus interval. However, there was a linear decrease on body protein loss expressed as kg and percentage and on daily milk production of sows, as the dietary lysine levels increased. The treatments affected litter weight gain, that decreased linearly. The results of this work showed that sows fed decreasing lysine levels retained significant amounts of body protein reserve to maintain their productive performance. However, the protein mobilization of these animals (2.2 kg corresponding to 6.45% of body protein loss) was not enough to affect the productive and reproductive performance. It was concluded that a daily total lysine intake of 45 g, correspondent of 40 g of digestible lysine meets the requirements for productive and reproductive performance of lactating sows and that they require 58.9 g of estimate total lysine/day, that corresponds to 53.5 g/day of digestible lysine to minimize body protein loss during the lactation.

Key words: lactation, litter, lysine, requirement, reproduction, sows

Introdução

Vários pesquisadores têm demonstrado que rações com baixos níveis de energia e/ou proteína para matrizes suínas em lactação resultam em menor eficiência reprodutiva e de produção da leitegada. Segundo Webel et al. (2003), qualquer comprometimento do consumo alimentar, ou inadequada densidade de nutrientes na ração de fêmeas em lactação resulta em mobilização de reserva corporal para atender à demanda de produção de leite, podendo haver prejuízo na reprodução. Segundo King & Martin (1989) e Spencer et al. (2003), a perda de tecido corporal tem efeito direto sobre o subseqüente intervalo desmama-estro e sobre o tamanho da leitegada.

Aherne & Foxcroft (2000) relataram que porcas que perderam peso excessivamente, proteína ou gordura, durante a lactação, apresentaram menor chance de entrar em estro no período de dez dias após o desmame e menores taxas de parição e de sobrevivência embrionária.

King (1987) comprovou que o aumento da mobilização de proteína corporal é mais prejudicial para a reprodução que o da gordura, embora ambos sejam essenciais.

O atendimento da exigência aminoacídica para a preservação da massa corporal e da produção de leite é essencial (Webel et al., 2003). Entre os aminoácidos exigidos pelos suínos, destaca-se a lisina, não somente pelo seu papel direto na formação da proteína do leite, mas também por ser considerada o primeiro aminoácido limitante, sendo utilizada como referência para a formulação de rações. A baixa ingestão de lisina durante a lactação, segundo Yang et al. (2000b), diminui o ganho de peso da leitegada e, conforme Touchette et al. (1998), reduz o número de leitões no segundo parto.

Fêmeas suínas lactantes com 175 kg amamentando dez leitões com ganho de peso médio de 200 g/dia durante a fase de aleitamento (21 dias de lactação) necessitam de 0,91% de lisina total na ração, o que corresponde a 0,79% de lisina digestível, de acordo com o NRC (1998).

Altos níveis de ingestão de lisina digestível, em torno de 45 a 48 g/dia, têm sido utilizados para minimizar a mobilização de proteína corporal de porcas em lactação. Esses níveis de lisina digestível correspondem a níveis médios de 49 a 54 g/dia de lisina total (King et al., 1993; Touchette et al., 1998). Segundo Wilson et al. (1996), a utilização de lisina em níveis acima dos recomendados para o máximo crescimento dos leitões, entre 50 e 60 g/dia, reduz o intervalo desmama-estro de primíparas e aumenta sua produtividade. Estudos envolvendo matrizes multíparas, entretanto, são escassos na literatura.

Com base nestas considerações, este estudo foi conduzido para avaliar rações com diferentes níveis de lisina para fêmeas suínas multíparas aos 21 dias de lactação.

Material e Métodos

O experimento foi conduzido nas instalações da Granja de Melhoramento de Suínos da Universidade Federal de Viçosa, no período de outubro de 2001 a julho de 2002.

Foram utilizadas 65 fêmeas suínas mestiças (Landrace x Large White) de segundo parto em diante, com peso inicial pós-parto de 217,36 ± 21,35 kg. Os animais foram distribuídos em delineamento experimental em blocos ao acaso, com cinco tratamentos (0,950; 1,025; 1,100; 1,175 e 1,250% de lisina total na ração, mantendo-se a mesma relação de aminoácidos) e 13 repetições, sendo a fêmea considerada a unidade experimental. As fêmeas foram distribuídas nos tratamentos de acordo com o peso inicial e a ordem de parto, conforme o seguinte critério: 2º parto e 3º parto em diante.

Durante a fase de gestação, as fêmeas receberam o mesmo manejo alimentar, ou seja: 1,8 kg de ração para a fase de gestação, contendo 3,07 Mcal/kg de energia digestível (ED) e 15% de PB, durante a primeira semana após a cobertura; 2,2 kg de ração para a fase de gestação do 8º ao 100º dia de gestação; e 2,8 kg de ração para a fase de lactação (3,5 Mcal/kg de ED e 17,2% de PB) do 101º dia de gestação até o dia do parto.

Aos 107 dias de gestação, as matrizes foram transferidas do galpão de gestação para a sala de maternidade, onde permaneceram alojadas, individualmente, em gaiolas para estudos de metabolismo (2,20 m de comprimento e 0,70 m de largura), equipadas com comedouro do tipo cocho e bebedouro automático tipo concha. As gaiolas de parição possuíam abrigo escamoteador com lâmpadas incandescentes, que foram mantidas acesas durante todo o período experimental para aquecimento dos leitões.

Durante todo o período experimental, a temperatura no interior das salas de maternidade foi monitorada diariamente, quatro vezes ao dia (8, 10, 13 e 17 h), por meio de termômetros de máxima e mínima, de bulbos seco (TBS) e úmido (TBU) e de globo negro (TGN). Os termômetros foram mantidos entre as gaiolas das matrizes, à meia-altura do corpo dos animais. Por meio dos dados obtidos com o TBS, TBU e TGN, foi calculado o índice de temperatura de globo e umidade (ITGU), segundo Buffington et al. (1981).

As rações experimentais (Tabela 1) foram formuladas à base de milho, farelo de soja e óleo de soja degomado, de modo a atender às exigências de PB, EM, minerais e vitaminas propostas pelo NRC (1998) e com base nas necessidades de fêmeas com dez leitões por leitegada e com ganho de peso médio da leitegada de 200 g/dia. Os tratamentos consistiram de rações com diferentes níveis de lisina, obtidos pela inclusão L-lisina-HCl (78,5%) em substituição ao inerte (caulim).

Para assegurar que a lisina fosse o primeiro aminoácido limitante nas rações, adotou-se o critério de manter os demais aminoácidos em um nível mínimo correspondente a 105% da relação com a lisina, conforme proposto pelo NRC (1998), com exceção dos aminoácidos valina e triptofano, cujas relações com lisina corresponderam a 89 e 20% de lisina, respectivamente, conforme proposto por Carter et al. (2000), e dos níveis de cálcio e fósforo, cujos valores utilizados foram os propostos por Rostagno et al. (1996).

As rações experimentais foram fornecidas às fêmeas suínas em quantidade fixa de 5,0 kg/dia, em três refeições diárias, para assegurar um consumo de lisina total de 47,5; 51,5; 55,0; 59,0 e 62,5 g/dia, respectivamente, nos cinco diferentes tratamentos. O acesso à água foi à vontade.

As fêmeas foram pesadas até 24 horas após o parto. No momento da pesagem, foram mensuradas as espessuras de toucinho, por meio de ultra-som, com duas medidas realizadas a 6,5 cm da linha dorsal à direita e à esquerda do animal, à altura da 10ª costela (P2), tomando-se como resultado a média das avaliações obtidas nos dois lados.

Posteriormente, as fêmeas foram novamente pesadas e tiveram sua espessura de toucinho mensurada no dia do desmame. Os leitões foram pesados até 24 horas após o nascimento e as leitegadas foram padronizadas em 9 a 10 leitões ao final do 3º dia após o parto.

Os leitões foram manejados (corte de dentes e de cauda, cura do umbigo, marcação e administração de antibiótico) até 24 horas após o nascimento, aplicando-se ferro dextrano no 3º dia. Durante a lactação, os leitões não tiveram acesso à ração, mas tiveram livre acesso à água, fornecida em bebedouros do tipo chupeta. Os leitões foram novamente pesados à desmama.

A partir da desmama (21 dias), as fêmeas passaram a receber 3,0 kg de ração para a fase de lactação (3,5 Mcal/kg de ED e 18,7% de PB). A detecção do estro foi feita todos os dias, pela manhã e à tarde, levando-se a fêmea à baia do cachaço. Foram consideradas em estro as fêmeas que permaneceram imóveis à monta (reflexo de tolerância ao macho – RTM positivo).

Utilizando-se os valores do ganho de peso dos leitões durante a lactação, estimou-se a produção diária de leite, segundo equação proposta por Ferreira (1988). As perdas de proteína e de gordura corporal das fêmeas após o desmame foram estimadas por equações propostas por Whittemore & Yang (1989).

As análises de variância das variáveis estudadas foram realizadas por meio do programa ANOVAG, contido no pacote computacional SAEG 7.1 (Sistema para Análises Estatísticas e Genéticas), desenvolvido na Universidade Federal de Viçosa (1997), e os dados foram submetidos à análise de regressão.

A estimativa da exigência de lisina foi feita com base nos resultados dos desempenhos produtivo e reprodutivo das matrizes e do desempenho dos leitões e da leitegada, utilizando-se os modelos linear, quadrático e/ou descontínuo "Linear Response Plateau" – LRP, descrito por Braga (1983), conforme o melhor ajuste obtido para cada variável.

Resultados e Discussão

As médias das temperaturas observadas nos termômetros de máxima (TMX) e mínima (TMN) e de bulbo seco (TBS), da umidade relativa (UR) e dos valores de índice de temperatura de globo e umidade (ITGU) calculados durante o período experimental são apresentadas na Tabela 2.

A variação de temperatura durante o período experimental indica que os animais foram expostos a períodos de estresse por calor, uma vez que Makkink & Schrama (1998) estabeleceram 12 e 22ºC como as temperaturas críticas mínima e máxima para matrizes suínas em lactação.

Os altos valores de ITGU (77,6 e 75,4) determinados no período da tarde, durante o experimento, caracterizam o estresse térmico a que os animais foram submetidos.

Os valores observados para os consumos de ração e lisina (total e digestível) e para o consumo de EM médio diário das matrizes durante o período de lactação são apresentados na Tabela 3.

O consumo de ração médio diário não variou (P>0,10) entre os animais dos tratamentos. O fornecimento de ração na quantidade fixa de 5 kg/matriz/dia justifica o fato de o consumo de ração não ter variado entre os tratamentos, embora os animais não tenham alcançado o consumo pré-fixado, tendo consumido em média 4,74 kg de ração/dia. A ocorrência de períodos de altas temperaturas durante o experimento pode ter contribuído para que o consumo pré-estabelecido não tenha sido alcançado.

Os tratamentos influenciaram (P<0,01) os consumos de lisina total e digestível, que aumentaram de forma linear, respectivamente, segundo as equações: = 2,22937 + 45,3010 Lis total (r2 = 0,97) e = - 3,22143 + 45,3510 Lis total (r2 = 0,98).

A relação direta entre o consumo de lisina e sua concentração na ração se justifica pelo fato de o consumo de ração não ter variado entre os tratamentos.

Esses resultados foram semelhantes aos obtidos por Cota et al. (2003) e Paiva et al. (2005), em estudos conduzidos para avaliar níveis de lisina em rações para fêmeas suínas primíparas em lactação.

Conforme apresentado na Tabela 4, os níveis de lisina da ração não influenciaram (P>0,10) o peso das matrizes ao desmame e a perda de peso das fêmeas durante o período de lactação. Esses resultados foram semelhantes aos obtidos por Cota et al. (2003), Knabe et al. (1996) e Yang et al. (2000a), que não constataram redução significativa da perda de peso das matrizes durante a lactação em função dos níveis de lisina da ração. De forma similar, King et al. (1993), avaliando diferentes consumos de lisina total por fêmeas suínas (17 a 55 g/dia), não observaram diferenças na perda de peso durante o período de lactação.

Por outro lado, relação inversa entre o consumo de lisina e a perda de peso das matrizes durante o período de lactação foi observada por Touchette et al. (1998), Jones & Stahly (1999) e Yang et al. (2000b). Essa variação entre os estudos pode ser decorrente das diferenças no grupo genético, no nível de produção, na condição ambiental e no tamanho da leitegada.

Embora os tratamentos não tenham influenciado a perda de peso das fêmeas suínas durante a lactação, constatou-se que, entre os níveis de 0,95 e 1,18% de lisina na ração, a perda de peso reduziu em 78,12%. Esses resultados evidenciam que, quando consomem menores quantidades de lisina, as matrizes mobilizam mais suas reservas corporais para manutenção do desempenho produtivo, o que corrobora os relatos de Mejia-Guadarrama et al. (2002) de que, quando a ingestão de proteína durante a lactação é baixa, a alta reserva de proteína corporal pode minimizar as alterações no desempenho reprodutivo das fêmeas. Tokach et al. (1992) afirmaram ainda que o aumento na concentração de lisina na ração de fêmeas suínas lactantes reduz a perda de peso durante a lactação.

Segundo Kim & Easter (2001), matrizes de linhagens modernas têm maior capacidade para produção de leite, de modo que o aumento da produção de leite requer que a fêmea tenha maior consumo de ração ou que mobilize com maior intensidade os nutrientes dos tecidos corporais.

Constatou-se que os níveis de lisina da ração não influenciaram (P>0,10) a variação na espessura de toucinho (ET) das matrizes durante o período de lactação, como reportado por Touchette et al. (1998), Cota et al. (2003), Clowes et al. (2003), Paiva et al. (2005) e Yang et al. (2000a, b), que também não verificaram efeito significativo do aumento do consumo de lisina sobre a variação na ET durante a lactação.

Avaliando a exigência de aminoácidos de fêmeas suínas de diferentes genótipos durante a lactação, Sauber et al. (1998) verificaram que as porcas com alto potencial para deposição de carne magra perderam menos espessura de toucinho que as de baixo potencial, embora a variação de peso corporal tenha sido similar entre os genótipos.

Não houve efeito (P>0,10) dos tratamentos sobre a perda de gordura corporal, apesar da queda gradativa em até 70% entre os níveis de 0,95 e 1,18% de lisina na ração. De forma semelhante, Mejia-Guadarrama et al. (2002) também não observaram efeito do consumo de lisina (20,7 x 46,2 g/dia) sobre a variação na gordura corporal de fêmeas suínas em lactação. Todavia, o padrão de resposta de variação na gordura corporal obtido nesse estudo contrasta com aqueles encontrados por Clowes et al. (2003) e Sauber et al. (1998), que verificaram variação significativa da perda de gordura corporal com o aumento do nível de lisina da ração.

Considerando os altos valores dos coeficientes de variação das variáveis: perda de ET e variação de gordura corporal, pode-se afirmar que o número de repetições utilizado para avaliar esses parâmetros provavelmente constituiu no principal fator para que as respectivas diferenças de até 61,7 e 70% não fossem significativas.

Os níveis crescentes de lisina da ração influenciaram (P<0,07) a perda de proteína corporal, expressa em kg e em porcentagem, que foi reduzida de forma linear, segundo as equações: = 5,13188 3,73556 Lis total (r2 = 0,74) e = 15,1295 11,3144 Lis total (r2 = 0,74), respectivamente. Redução da proteína corporal em matrizes suínas em função do aumento do nível de lisina na ração foi observada também por Sauber et al. (1998) e Clowes et al. (2003). Do mesmo modo, Mejia-Guadarrama et al. (2002) verificaram que, ao final da lactação, as matrizes que consumiram 20,7 g de lisina total/dia apresentaram 3,1% menos proteína corporal que aquelas que consumiram, em média, 46,2 g de lisina/dia.

Com base nos resultados deste estudo, estimou-se que as matrizes lactantes devem consumir 58,9 g de lisina total/dia para minimizar as perdas de suas reservas corporais. Essa estimativa corrobora os resultados obtidos por Touchette et al. (1998), que verificaram que, quando as fêmeas suínas consumiram menos que 58 g de lisina total/dia precisaram mobilizar significativas quantidades de reservas protéicas corporais para manter o desempenho produtivo. Segundo Brendemuhl et al. (1989), o decréscimo da proteína corporal é resultante da mobilização da proteína do músculo esquelético e das vísceras.

A produção de leite diária das porcas reduziu (P<0,05) de forma linear à medida que se elevou o nível de lisina da ração, de acordo com a equação: = 12,1667 3,73239 Lis total (r2 = 0,72).

Considerando-se que o tamanho da leitegada é um dos principais fatores que influenciam a produção de leite (Audist et al., 1998) e que cada leitão a mais na leitegada demanda 476 g de proteína para deposição corporal e crescimento da glândula mamária da matriz (Kim et al., 1999) e 606 g de proteína no leite produzido adicionalmente (Kim & Easter, 2001) no período de 21 dias de lactação, pode-se justificar a redução na produção de leite ocorrida neste estudo pelas diferenças no número de leitões desmamados (Tabela 5) entre os tratamentos.

Portanto, especificamente neste estudo, a redução significativa na perda de proteína e a redução não-significativa na perda de gordura corporal poderiam ser justificadas também pela redução na produção de leite, além do efeito do aumento do consumo de lisina entre os tratamentos. Relação direta entre a mobilização de proteína corporal e a produção de leite foi constatada por Revell et al. (1998), que relataram que a mobilização das reservas de proteína corporal é utilizada para compensar o déficit protéico da ração e manter a produção de leite durante a lactação.

Com os resultados verificados para produção de leite, ficou evidenciado que a síntese de proteína do leite parece ter maior prioridade que a deposição de proteína corporal. Assim, a produção de leite é normalmente maximizada em nível de ingestão de lisina muito menor que a requerida para o balanço positivo de nitrogênio (King et al., 1993).

Não houve efeito (P>0,10) dos tratamentos sobre o intervalo desmama-estro (IDE) dos animais. De forma semelhante, Touchette et al. (1998), Cota et al. (2003), Paiva et al. (2005) e Mejia-Guadarrama et al. (2002) também não verificaram efeito do nível de lisina da ração sobre o IDE. Por outro lado, King (1987), em trabalho de revisão, e Jones & Stahly (1999) relataram que matrizes suínas submetidas a severa restrição protéica (15 g/dia de lisina total) apresentaram aumento do intervalo desmama-estro.

Com base nos resultados dos trabalhos e considerando-se o relato de Touchette et al. (1998) de que a perda de proteína durante a lactação foi determinante do prolongado intervalo desmama-estro, pode-se inferir que a máxima quantidade de proteína mobilizada pelas porcas nesse estudo (2,2 kg, correspondente a 4,87% da proteína corporal) não foi suficiente para influenciar esse parâmetro.

Essa proposição corrobora o relato de Clowes et al. (2003) de que a fêmea suína pode mobilizar de 9 a 12% de suas reservas protéicas corporais sem apresentar efeitos negativos no desempenho reprodutivo, como o IDE.

Os resultados de ganho de peso dos leitões e da leitegada durante o período de lactação estão apresentados na Tabela 5. Os tratamentos não influenciaram (P>0,10) o número de leitões desmamados por leitegada, embora tenha havido variação de até 0,85 leitões entre os níveis de 0,95 e 1,18% de lisina da ração. Resultados semelhantes foram obtidos por Touchette et al. (1998) e Clowes et al. (2003), que não verificaram efeito dos níveis de lisina da ração sobre o número de leitões desmamados/matriz.

A princípio, não haveria explicação biológica para associar a diferença observada no consumo de lisina das matrizes em lactação (44 a 58 g/dia) à variação no número de leitões na leitegada durante o aleitamento.

Os dados de número de leitões desmamados por tratamento e os de perda de ET obtidos neste estudo revelaram relação direta entre esses dois parâmetros, o que seria indicativo do aumento da exigência de energia para produção de leite no caso de maior tamanho de leitegada. Resultados encontrados por Maes et al. (2004) confirmam que matrizes que desmamaram maior número de leitões apresentam maior perda de espessura de toucinho durante a lactação.

Não houve variação (P>0,10) nos ganhos de peso diário e total dos leitões entre os tratamentos, revelando que as produções de leite nos diferentes tratamentos foram suficientes para manter o ganho de peso dos leitões.

Esses resultados confirmam a proposição anterior de que parte da redução na produção de leite resultou da variação do número de leitões da leitegada.

Considerando que o ganho de peso diário dos leitões não variou entre os níveis de lisina da ração, pode-se inferir que a variação observada no ganho de peso diário da leitegada estaria diretamente associada ao número de leitões desmamados em cada tratamento.

A redução do desempenho diário da leitegada está de acordo com a redução da produção de leite e da perda de proteína corporal, em kg e em porcentagem, pelas porcas.

Os tratamentos influenciaram (P>0,03) ainda o ganho de peso da leitegada, que reduziu de forma linear, segundo a equação: = 2908,87 879,531 Lis total (r2 = 0,76). Este resultado difere dos obtidos por Cota et al. (2003), Thaler et al. (1992) e Dourmad et al. (1998), que não verificaram variação no peso da leitegada com o aumento do nível de lisina da ração durante o período de 21 dias de lactação.

Conclusões

O consumo diário de 45 g de lisina total, correspondente a 40 g de lisina digestível/dia, atende às exigências para o desempenho reprodutivo de fêmeas suínas em lactação e para o desenvolvimento da leitegada.

Fêmeas suínas exigem 58,9 g de lisina total/dia, correspondente a 53,5 g de lisina digestível/dia, para minimizar a perda de proteína corporal durante a lactação.

Literatura Citada

Recebido: 24/08/05

Aprovado: 24/03/06

Correspondências devem ser enviadas para: flavia@ufv.br

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  • 1
    Parte da tese de Doutorado da primeira autora apresentada à UFV.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Nov 2006
    • Data do Fascículo
      Ago 2006

    Histórico

    • Aceito
      24 Mar 2006
    • Recebido
      24 Ago 2005
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