Acessibilidade / Reportar erro

Consumo, digestibilidade e produção de leite de cabras leiteiras alimentadas com dietas contendo diferentes níveis de proteína bruta e energia líquida

Intake, digestibility and milk production the dairy goats fed diets containing different level of crude protein and net energy ratio

Resumos

O consumo, a digestibilidade da matéria seca e dos nutrientes, a produção e a composição do leite de cabras foram avaliados em um experimento com quatro dietas isoenergéticas contendo 1,53 mcal de energia líquida/kg MS e 11,4; 16,5; 19,5 ou 22,6% PB. Os efeitos dos níveis de energia e PB foram avaliados considerando as razões dos teores de proteína e a concentração de energia líquida das dietas (PB/EL), de 7,3; 10,8; 12,9 e 14,8. Foram utilizadas oito cabras mantidas em baias individuais, distribuídas em dois quadrados latino 4 <FONT FACE=Symbol>´</FONT> 4. O período experimental foi de 21 dias, com 14 dias de adaptação e sete para coleta. Maiores consumos de MS foram obtidos com as dietas com razões PB/EL diferentes de 7,3. O fornecimento das dietas com menor razão PB/EL resultou em maior consumo de CNF e de EE e redução no consumo de NDT e EL. A digestibilidade de CNF e FDN não foi alterada. Maior digestibilidade do EE foi observada quando utilizada a menor razão PB/EL. A digestibilidade da PB diminuiu com o fornecimento da dieta com menor razão PB/EL (7,32), provavelmente em virtude da adição de de fontes nitrogenadas de alta degradabilidade ruminal (uréia). A digestibilidade da MS diferiu quando comparados os níveis extremos das razões PB/EL e foi menor na razão PB/EL de 7,3. Maior produção de leite foi observada quando comparada a razão PB/EL de 14,8 com as razões PB/EL de 7,3 e 10,8 e nenhuma alteração ocorreu para os componentes do leite. Maior eficiência de uso da MS consumida foi obtida com a dieta com maior razão PB/EL, no entanto, a eficiência de uso do N no leite em relação ao N consumido foi reduzida de maneira inversa.

caprinos; desempenho animal; composição do leite


Intake, digestibility of dry matter and nutrients, milk production and composition were evaluated with four isoenergetic diets containing 1.53 Mcal of net energy/kg DM and 11.4, 16.5, 19.5, and 22.6% CP. The effect of energy and PB levels were evaluated by considering the ratio of protein content and net energy concentration of the diets, obtaining values of 7.3, 10.8, 12.9, and 14.8. Eight goats were assigned to two 4 x 4 latin square design. The experimental period lasted 21 days, with 14 days for adaptation of animals and seven days for samplings. Higher DM intakes were obtained with diets with CP/NE ratio different from 7.3. The supply of the diets with lower CP/NE ratios resulted in higher intakes of NFC and EE and and reduction in TDN and NE intakes. Apparent digestibility of NFC and NDF were not altered. Higher digestibility of EE was observed when lower CP/NE ratio was used. CP digestibility decreased with the supply of diet with lower CP/NE ratio (7.3), probably due to the addition to the diet of nitrogen sources of high ruminal degradability (urea). DM digestibility differed when compared to the extreme levels of CP/NE ratio and lower in the CP/NE ratio of 7.3. Higher milk production was observed when compare 14.8 CP/NE ratio with 7.32 and 10.8 CP/NE ratio and no alteration occurred for milk components. Higher efficiency of consumed DM was obtained with diet with higher CP/NE ratio, whereas, the efficiency of N utilization in milk in relation to N intake was reduced in inverse way.

goats; animal response; milk composition


RUMINANTES

Consumo, digestibilidade e produção de leite de cabras leiteiras alimentadas com dietas contendo diferentes níveis de proteína bruta e energia líquida

Intake, digestibility and milk production the dairy goats fed diets containing different level of crude protein and net energy ratio

Carla Aparecida Florentino RodriguesI; Marcelo Teixeira RodriguesII; Renata Helena BrancoIII; Márcia Maria Cândido da SilvaI; Rodolpho de Almeida Torres FilhoIV; Augusto César de QueirozII

IZootecnista, doutora em Nutrição de Ruminantes

IIDepartamento de Zootecnia - UFV

IIIIZ - Sertãozinho

IVDoutor em Melhoramento e Genética Animal

RESUMO

O consumo, a digestibilidade da matéria seca e dos nutrientes, a produção e a composição do leite de cabras foram avaliados em um experimento com quatro dietas isoenergéticas contendo 1,53 mcal de energia líquida/kg MS e 11,4; 16,5; 19,5 ou 22,6% PB. Os efeitos dos níveis de energia e PB foram avaliados considerando as razões dos teores de proteína e a concentração de energia líquida das dietas (PB/EL), de 7,3; 10,8; 12,9 e 14,8. Foram utilizadas oito cabras mantidas em baias individuais, distribuídas em dois quadrados latino 4 ´ 4. O período experimental foi de 21 dias, com 14 dias de adaptação e sete para coleta. Maiores consumos de MS foram obtidos com as dietas com razões PB/EL diferentes de 7,3. O fornecimento das dietas com menor razão PB/EL resultou em maior consumo de CNF e de EE e redução no consumo de NDT e EL. A digestibilidade de CNF e FDN não foi alterada. Maior digestibilidade do EE foi observada quando utilizada a menor razão PB/EL. A digestibilidade da PB diminuiu com o fornecimento da dieta com menor razão PB/EL (7,32), provavelmente em virtude da adição de de fontes nitrogenadas de alta degradabilidade ruminal (uréia). A digestibilidade da MS diferiu quando comparados os níveis extremos das razões PB/EL e foi menor na razão PB/EL de 7,3. Maior produção de leite foi observada quando comparada a razão PB/EL de 14,8 com as razões PB/EL de 7,3 e 10,8 e nenhuma alteração ocorreu para os componentes do leite. Maior eficiência de uso da MS consumida foi obtida com a dieta com maior razão PB/EL, no entanto, a eficiência de uso do N no leite em relação ao N consumido foi reduzida de maneira inversa.

Palavras-chave: caprinos, desempenho animal, composição do leite

ABSTRACT

Intake, digestibility of dry matter and nutrients, milk production and composition were evaluated with four isoenergetic diets containing 1.53 Mcal of net energy/kg DM and 11.4, 16.5, 19.5, and 22.6% CP. The effect of energy and PB levels were evaluated by considering the ratio of protein content and net energy concentration of the diets, obtaining values of 7.3, 10.8, 12.9, and 14.8. Eight goats were assigned to two 4 x 4 latin square design. The experimental period lasted 21 days, with 14 days for adaptation of animals and seven days for samplings. Higher DM intakes were obtained with diets with CP/NE ratio different from 7.3. The supply of the diets with lower CP/NE ratios resulted in higher intakes of NFC and EE and and reduction in TDN and NE intakes. Apparent digestibility of NFC and NDF were not altered. Higher digestibility of EE was observed when lower CP/NE ratio was used. CP digestibility decreased with the supply of diet with lower CP/NE ratio (7.3), probably due to the addition to the diet of nitrogen sources of high ruminal degradability (urea). DM digestibility differed when compared to the extreme levels of CP/NE ratio and lower in the CP/NE ratio of 7.3. Higher milk production was observed when compare 14.8 CP/NE ratio with 7.32 and 10.8 CP/NE ratio and no alteration occurred for milk components. Higher efficiency of consumed DM was obtained with diet with higher CP/NE ratio, whereas, the efficiency of N utilization in milk in relation to N intake was reduced in inverse way.

Key word: goats, animal response, milk composition

Introdução

A crescente produção e exploração de caprinos com alto padrão genético e potencial leiteiro requer alimentação específica, uma vez que esses animais possuem maiores exigências para suportar os índices de produtividade. O estabelecimento do nível protéico e de sua relação com a concentração energética da dieta durante a lactação têm sido objeto de trabalhos de vários pesquisadores e profissionais no intuito de alcançar produção mais eficiente e, conseqüentemente, maior produtividade.

Entre os componentes da dieta, a energia é o que mais se relaciona ao consumo de alimento pelo animal. Os animais requerem nutrientes para mantença, crescimento, reprodução, gestação e lactação. O consumo de nutrientes está diretamente relacionado ao consumo de MS e constitui o principal fator limitante à produção de ruminantes, portanto, sua otimização torna-se um componente-chave na formulação de rações e estratégias de alimentação para maximizar a produção (Rodrigues, 1998).

O consumo pode ser controlado por fatores físico, fisiológico ou psicogênicos, como tipo e qualidade dos alimentos, nível de produção de leite, estádio da lactação e manejo.

A deficiência de alguns nutrientes pode prejudicar o desempenho animal em decorrência da redução na síntese de proteína microbiana no rúmen e da passagem de aminoácidos para o intestino delgado. Segundo Broderick (2003), é complexa a inter-relação entre a quantidade dietética de proteína e de energia utilizada pelos ruminantes.

A energia da dieta visa atender às exigências nutricionais dos animais e disponibilizá-la para produção de carne ou de leite. No período inicial da lactação, a demanda energética é alta e os animais podem apresentar balanço energético negativo. Sabe-se que cada animal responde a esta situação de forma individual por meio de diferentes mecanismos, como a recuperação da capacidade ingestiva, que, por sua vez, não acompanha a velocidade de produção de leite e a mobilização de gorduras corporais.

A quantidade de nitrogênio (N), representada pela concentração de N e pelo perfil de degradação ruminal da fonte de N, a sincronização entre a degradação de proteína e a disponibilidade de energia podem influenciar a produção de leite, os teores de gordura e proteína do leite (Lucci, 1997; Wu & Satter, 2000), as características ruminais (pH, AGV, amônia) e as características plasmáticas, como glicose, uréia e ácidos graxos não-esterificados (AGNE) (Imaizumi et al., 2000; Oliveira Jr. et al., 2000; Broderick, 2003).

A concentração de PB na dieta para cabras com produção média de 3,0 kg de leite é em torno de 16% (NRC, 1981). Vários autores afirmam que a concentração deste nutriente na dieta deve ser de 13 a 16% da MS, dependendo do tipo de proteína, do estádio da lactação e do potencial de produção das cabras (Sahlu et al., 1993).

Assim, objetivou-se avaliar os efeitos dos níveis de PB e energia líquida (EL) das dietas sobre o consumo, a digestibilidade dos nutrientes, a produção e a composição do leite de cabras e a eficiência de uso da MS e nutrientes.

Material e Métodos

O experimento foi realizado nas dependências do Setor de Caprinocultura do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa no período de março a maio de 2004.

Foram utilizadas oito cabras da raça Alpina, primíparas e multíparas, com 60 dias de lactação e peso corporal de 57,14 ± 5,10 kg. Os animais foram confinados em baias individuais com dimensões de 1,5 ´ 2,0 m, com piso ripado e adaptadas para coleta total de fezes e urina, onde foram mantidas durante todo o período experimental.

Os animais foram arranjados em delineamento experimental em dois quadrados latinos 4 ´ 4 para avaliar os efeitos de quatro dietas com diferentes razões entre os níveis de PB e de EL. As concentrações de PB foram de 11,4; 16,5; 19,5; e 22,6%, enquanto o nível de EL foi mantido constante, com média de 1,53 mcal/kg de MS, produzindo razões entre os nutrientes de 7,32; 10,89; 12,93; e 14,89. Os níveis de 16,5% de PB e 1,53 mcal de EL/kg de MS são suficientes para atender às exigências nutricionais de cabras com média produção de leite (NRC, 1981; AFRC, 1993); neste estudo, foram utilizados níveis inferiores e superiores de PB para avaliar as razões PB/EL das dietas.

As dietas (Tabelas 1 e 2) apresentaram concentração constante de FDN oriunda da forragem (28%) e feno de capim-tifton 85 (Cynodon spp.) como base forrageira exclusiva. Como fontes das misturas concentradas, utilizaram-se farelos de soja (Glicine max L.) e de trigo (Triticum aesticum), fubá de milho (Zea mays, L.) e uréia para formulação das dietas acrescidas de fontes de minerais para atender às exigências nutricionais de cabras leiteiras de média produção, de acordo com as recomendações do AFRC (1993). A mesma relação entre proteína degradada no rúmen (PDR) e proteína não-degradada no rúmen (PNDR) foi mantida para todas as dietas que apresentaram valores percentuais de 60:40. Foi acrescentada uréia à dieta com menor nível de PB a fim de se manter a relação PDR:PNDR proposta.

A mistura mineral foi composta de sulfato ferroso, sulfato de cobre, sulfato de manganês, sulfato de zinco, sulfato de cobalto, iodato de potássio, selenito de sódio e cloreto de sódio, em quantidades adequadas para suprir as exigências nutricionais de cabras lactantes.

Cada período experimental teve duração de 21 dias, dos quais 14 foram destinados à adaptação e ao ajuste do consumo voluntário e sete para coleta de dados. Para avaliação dos efeitos dos tratamentos, foram observados o consumo voluntário, a digestibilidade aparente da MS e dos nutrientes e a produção e composição do leite.

Os animais foram alimentados duas vezes ao dia, às 8 e às 16h com a mistura completa de feno de capim-tifton 85 e concentrado. O consumo voluntário foi calculado pela diferença entre o fornecido e as sobras; a sobra observada diariamente correspondeu a 10% da quantidade oferecida, de modo a garantir o consumo ad libitum de alimentos e de água pelos animais. Amostras compostas de sobras para cada unidade experimental, representada pelo animal, referentes a cada período experimental foram congeladas para análises posteriores.

Os animais foram pesados após a ordenha e anteriormente ao oferecimento do alimento pela manhã, no início e ao final de cada período de coleta.

A produção e a composição do leite foram calculadas com base em duas ordenhas diárias, às 6 e às 14 h, e em quatro coletas durante o período experimental: ordenha da tarde do primeiro dia; ordenha da manhã do segundo dia; ordenha da tarde do sexto dia; e ordenha da manhã do sétimo dia. As amostras foram analisadas quando aos teores de PB, lactose, gordura e sólidos totais. As análises quantitativas do leite foram realizadas no Laboratório de Qualidade do Leite da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Gado de Leite em Juiz de Fora, MG). A análise de uréia do leite foi realizada utilizando-se kits específicos da Labtest Diagnóstica determinação dos níveis de uréia no leite conforme técnica descrita por Magalhães (2003).

Durante os primeiros cinco dias do período de coleta, efetuaram-se coletas totais de fezes e urina para determinação da digestibilidade in vivo. As fezes foram coletadas em telas a cada 24 horas. A urina foi coletada a cada 24 horas em recipientes plásticos contendo 20 mL de solução de H2SO4 40% (v/v). Diariamente, as fezes e a urina, depois de coletadas e pesadas, foram amostradas em alíquotas de 10% e congeladas para posteriores análises laboratoriais.

As amostras dos alimentos fornecidos e das sobras foram analisadas quanto aos teores de MS e nitrogênio total (NT) para estimativa das concentrações de PB, EE e cinzas, utilizando-se as técnicas descritas por Silva & Queiroz (2002). Foram determinados ainda os teores de FDN e FDA, segundo Van Soest et al. (1991); nitrogênio insolúvel em detergente neutro (NIDN), nitrogênio insolúvel em detergente ácido (NIDA), segundo técnicas descritas por Licitra et al. (1996); lignina em detergente ácido (LDA) utilizando-se técnicas descritas por Silva & Queiroz (2002). As fezes foram analisadas para determinação das concentrações de MS, PB, EE, cinzas, FDN, FDA e LDA.

A concentração de CNF foi estimada segundo Van Soest et al. (1991), a partir da equação:

CNF = 100 - (%PB + %EE + %CZ + %FDN)

O valor de energia dos alimentos foi estimado segundo o NRC (2001) utilizando-se a equação:

NDT = PBd + CNFd + FDNd + AGd ´ 2,25 -7

em que PBd = PB*Exp[-1,2*PIDA/PB] para volumosos; PBd = [1 - (0,4*PIDA/PB)]*PB para concentrados; CNFd = 0,98*CNF; FDNd = 0,75* (FDNp - LDA)*[1-(LDA/FDNp)0,667]; FDNp = FDN - PBIND; AGd = EE -1; e 7 referem-se ao NDT metabólico fecal, em que PBd = PB verdadeiramente digestível; CNFd = carboidratos não-fibrosos verdadeiramente digestíveis; FDNd = FDN digestível; AGd = ácidos graxos verdadeiramente digestíveis; e LDA = lignina.

Para quantificação do valor de energia das dietas, foram utilizados os dados da digestibilidade aparente obtidos no experimento aplicando-se a equação:

NDT (%) = dCNF + dPB + (dEE*2,25) + d FDN

em que "d" representa a digestibilidade aparente do respectivo componente. Para conversão dos valores de NDT para energia líquida de lactação (EL 3x), energia metabolizável (EM) e energia digestível (ED), foram utilizadas as equações descritas pelo NRC (2001):

EL 3x (mcal/kg) = 0,0245*NDT (%) - 0,12;

EM (mcal/kg) = 1,01*ED (mcal/kg) - 0,45;

ED (mcal/kg) = 0,04409*NDT (%).

Para conversão da produção de leite para 3,5% de gordura, utilizou-se a fórmula de Gaines (1928), sugerida pelo NRC (2001): LCG 3,5% = (0,4255 ´ kg de leite) + [16,425 ´ (%gordura / 100) ´ kg de leite]. A correção para 4% de gordura foi realizada segundo o NRC (2001) utilizando-se a seguinte fórmula: LCG 4% (kg/dia) = 0,4 ´ leite (kg/dia) + 15 ´ gordura (kg/dia). A correção do leite para sólidos totais foi realizada conforme Tyrrel & Reid (1965) utilizando-se a equação: LCST = (12,3 ´ g de gordura) + (6,56 ´ g de sólidos não gordurosos) - (0,0752 ´ kg de leite).

A eficiência líquida de utilização da energia metabolizável consumida para produção de leite foi calculada por meio do consumo de energia metabolizável e da produção de leite, utilizando-se a equação: eficiência (ELp/CEMp-m), em que ELp é a energia liquida utilizada para produção de leite e CEMp-m é o consumo de EM subtraído do consumo de energia metabolizável para mantença. A eficiência bruta de utilização da EM para lactação foi calculada por meio do consumo de energia líquida para mantença (CELm), segundo Luo et al. (2004), utilizando-se a equação: eficiência bruta [(CELm + Elp) / CEM]. O valor de energia líquida do leite foi calculado a partir dos dados de vacas leiteiras (NRC, 2001). A equação utilizada foi: EL (mcal/kg) = 0,0929 ´ G (%) + 0,0547 ´ PB (%) + 0,0395 ´ Lac (%), em que G, PB e Lac são, respectivamente, os conteúdos de gordura, proteína bruta e lactose do leite.

A análise dos dados foi feita pelo procedimento GLM do SAS (SAS, 1990) e os efeitos das dietas foram avaliados a 5% de probabilidade utilizando-se o teste Tukey.

Resultados e Discussão

Os consumos de MS (kg/dia e g/kg0,75), PB (g/dia), EL (mcal/dia), EE (g/dia), CNF, CT e NDT (kg/dia) diferiram (P<0,05) entre as razões PB/EL avaliadas (Tabela 3). Maiores consumos de MS, PB, NDT (kg/dia) e EL (mcal/dia) foram observados quando fornecidas as dietas com maior razão PB/EL. O consumo de EE (g/dia) diminuiu com o aumento da razão PB/EL na dieta.

O consumo de CNF (kg/dia) foi maior quando fornecida a dieta com menor razão PB/EL. O consumo de carboidratos totais (kg/dia) foi influenciado pelas dietas. Apesar de o aumento geral no consumo de MS e de alguns nutrientes (kg/dia) ter ocorrido com a utilização de dietas com maior proporção de proteína em relação à energia disponível, o consumo de EL expresso em relação ao tamanho metabólico manteve-se constante, o que sugere efeito positivo da adição de proteína como fator de estímulo ao consumo de MS pelos animais.

Resultados semelhantes foram obtidos por Fonseca et al. (2006), em experimento no qual forneceu dietas contendo quatro níveis de PB (11,5; 13,5; 15,5 e 17,5%), isoenergéticas (31% de FDN): MS, 2,10 kg/dia e 4,19% do PV; MO 2,02 kg/dia; CNF 1,05 kg/dia; CT 1,62 kg/dia; e NDT, 1,66 kg/dia; PB, 336,75 g/dia; FDN, 568 g/dia e 1,12% do PV; e EE, 50,5 g/dia. Esses autores observaram que o consumo de MS pelas cabras apresentou resposta positiva ao aumento do conteúdo de PB e da razão PB/EL na dieta.

A média do consumo de MS em % do peso vivo observada nesta pesquisa (3,32% PV) foi semelhante à observada por Silva Sobrinho et al. (1991), de 3,85% do PV, e inferior à descrita por Fonseca et al. (2006), de 4,21% do PV.

Broderick (2003) alimentou bovinos com dietas contendo três níveis de PB (médias de 15,1; 16,65; 18,4%) e três de EL (médias de 1,54; 1,59; 1,62 mcal/kg de MS) e, no cálculo das razões PB/EL para melhor comparação aos dados do experimento, obteve os valores 9,80; 10,46 e 11,36. O aumento da razão PB/EL proporcionou maiores consumos de MS e PB. Badamana & Sutton (1992) alimentaram cabras com feno e concentrado contendo 11; 18 e 25% de PB e 1,48; 1,54 e 1,52 mcal de EL/kg de MS e, nos cálculos das razões PB/EL, obtiveram os valores de 7,57; 11,82 e 16,78. Esses autores relataram que o consumo de MS aumentou de 1,57 a 1,81 kg/dia com o aumento da razão PB/EL, mas a diferença entre as dietas com razão PB/EL de 16,78 e 11,82 foi pequena e não-significativa. Sahlu et al. (1993) alimentaram cabras com dois níveis de PB (13 e 17%), isoenergéticas (1,4 mcal de EL/kg de MS) e, ao fazerem os cálculos das razões PB/EL, encontraram os valores de 9,28 e 12,13. Esses autores observaram que os tratamentos não influenciaram o consumo de MS (média de 2,88 kg/dia e 4,7% do PV), mas afetaram o consumo de PB, que aumentou de 345 a 531 g/dia com o aumento da razão PB/EL.

Os coeficientes de digestibilidade de MS, MO, PB e EE diferiram (P<0,05) entre as dietas (Tabela 4). As maiores razões PB/EL proporcionaram maiores coeficientes de digestibilidade, o que sugere maior equilíbrio entre os nutrientes, gerando maiores valores de digestibilidade para as razões mais elevadas de PB/EL. A digestibilidade da FDN não foi influenciada pelas dietas, o que pode ser explicado pela concentração constante de FDNf das dietas experimentais e pelo fato de que as variações entre as dietas não provocaram diferenças no ambiente ruminal suficientes para alterar a degradação deste nutriente. Em média, o valor de digestibilidade da fibra foi de 56,76%. Comportamento semelhante foi observado para a digestibilidade da fração de CNF, que apresentou valor médio de 86,94%.

Os valores obtidos para os coeficientes de digestibilidade de MS foram semelhantes aos observados por Carvalho et al. (2006), em cabras alimentadas com dietas isoprotéicas (18% PB) com diferentes níveis de FDNf (20; 27; 34; 41 e 48% FDNf) de 75,24; 74,19; 72,64; 70,10 e 69,63%, respectivamente, para os níveis de FDNf. Os resultados obtidos neste estudo foram similares ainda aos relatados por Badamana & Sutton (1992), que alimentaram cabras com dietas contendo razões PB/EL de 7,57; 11,82 e 16,78 e observaram que as dietas não influenciaram os coeficientes de digestibilidade de MS e MO, mas afetaram os coeficientes de digestibilidade de FDN e de N total.

Broderick (2003) alimentou bovinos com dietas contendo as razões PB/EL de 9,80; 10,46 e 11,36 e observou que a maior razão PB/EL proporcionou maiores coeficientes de digestibilidade de FDN e N total.

Neste estudo, as razões PB/EL das dietas influenciaram a produção de leite, mas não alteraram a composição do leite (Tabela 5). As produções de leite, a produção de leite corrigida para gordura e para sólidos totais diferiram (P<0,05) entre as dietas. Além disso, as produções de proteína, lactose, sólidos totais e sólidos não-gordurosos em g/dia foram influenciadas (P<0,05) pelas dietas, uma vez que as maiores razões PB/EL resultaram em maiores produções, o que pode ser explicado pelo aumento da disponibilidade de nutrientes em decorrência do aumento no consumo de MS.

Resultados semelhantes foram obtidos por Badamana & Sutton (1992), que avaliaram as razões PB/EL de 7,57; 11,82 e 16,78 e observaram que as maiores razões promoveram aumento na produção de leite de cabras (1,57; 1,75 e 2,08, respectivamente), mas não influenciaram os constituintes lácteos.

Wu & Satter (2000) observaram aumento da produção de leite de vacas com o aumento da razão PB/EL calculada. Broderick (2003) relatou que a produção de leite de vacas e a produção de gordura e proteína do leite foram influenciadas pelo aumento da razão PB/EL calculada. Bach et al. (2000) alimentaram vacas com dietas contendo dois níveis de PB (18 e 15%), isoenergéticas (1,75 mcal de EL.kg de MS) e razões PB/EL calculadas de 10,28 e 8,56. Esses autores observaram que as concentrações de N-uréia no leite (NUL) e no plasma foram maiores nos animais alimentados com a dieta com razão PB/EL de 10,28. Entretanto, observaram que a eficiência de utilização do N para síntese de proteína do leite foi melhor nos animais alimentados com a dieta com razão PB/EL de 8,56.

A eficiência entre a produção de leite e o consumo de MS (PL/CMS em kg/kg) diferiu entre as dietas, uma vez que o aumento da produção de leite foi acompanhado pelo aumento do consumo de MS. Entretanto, a eficiência de utilização de N (N leite/CN em g/g) decresceu, indicando que o N não utilizado para produção de N no leite foi excretado na urina. Resultado semelhante de eficiência de utilização do N foi observado por Broderick (2003) em experimento com bovinos. Esse autor relatou que o aumento no consumo de MS de acordo com a razão PB/EL não foi acompanhado pela produção de leite (PL).

As razões PB/EL das dietas não influenciaram as eficiências de utilização líquida e bruta da EM (Figura 1), no entanto, verificou-se variação nas eficiências de utilização líquida (0,63) e bruta (0,66) da EM quando fornecida a dieta com razão PB/EL de 7,32 até os valores de 0,85 (líquida) e de 0,68 (bruta) quando a razão PB/EL foi de 14,89. Branco (2005), em pesquisa com cabras, observou que a dieta com razão PB/EL de 11,24 proporcionou melhor eficiência de utilização da EM para produção de leite e que para a razão PB/EL de 13,31, o valor de eficiência de utilização bruta da EM (0,94) foi o mais alto.


Conclusões

A sincronização entre degradação de proteína e disponibilidade de energia no rúmen é importante para o desempenho dos animais, pois as razões proteína bruta/energia líquida influenciaram o desempenho animal. Entretanto, as razões PB/EL, dentro dos limites estudados, não foram suficientes para causar alterações na composição do leite.

O aumento observado na eficiência de uso da matéria seca para a produção de leite, assim como o decréscimo na eficiência de uso da proteína consumida que foi depositada no leite, permite sugerir que a otimização de sincronização entre proteína e energia disponível, para o nível considerado de produção de leite, seja de 10,9 a 12,9 da razão proteína bruta/energia líquida.

Agradecimento

Ao Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, pela oportunidade e pelas condições de realizações deste trabalho.

Ao CNPq, pela concessão da bolsa de estudo.

Aos Professores, pelos ensinamentos e pela orientação durante o curso. Aos funcionários do Departamento de Zootecnia, em especial aos do Setor de Caprinocultura e do Laboratório de Nutrição Animal, pelo apoio durante os experimentos e as análises.

Literatura Citada

Recebido: 3/4/2006

Aprovado: 8/5/2007

Correspondências devem ser enviadas para: carlaafr@hotmail.com

  • AGRICULTURAL AND FOOD RESEARCH COUNCIL - AFRC. Energy and protein requirements of ruminants An advisory manual prepared by the AFRC technical committee on responses to nutrients. Wallingford: CAB International, 1993. 159p.
  • BACH, A.; HUNTINGTON, G.B.; CALSAMIGLIA, S. et al. Nitrogen metabolism of early lactation cows fed diets with two different levels of protein and different amino acid profiles. Journal of Dairy Science, v.83, p.2585-2595, 2000.
  • BADAMANA, M.S.; SUTTON, J.D. Hay intake, milk production and rumen fermentation in British Saanen goats given concentrates varying widely in protein concentration. Animal Production, v.54, p.395-403, 1992.
  • BRANCO, R.H. Desempenho de cabras em lactação alimentadas com dietas contendo diferentes níveis de fibra oriunda da forragem Viçosa, MG: Universidade Federal de Viçosa, 2005. 118p. Tese (Doutorado em Zootecnia) - Universidade Federal de Viçosa, 2005.
  • BRODERICK, G.A. Effects of varying dietary protein and energy levels on the production of lactating dairy cows. Journal of Dairy Science, v.86, p.1370-1381, 2003.
  • CARVALHO, S.; RODRIGUES, M.T.; BRANCO, R.H. et al. Comportamento ingestivo de cabras Alpinas em lactação alimentadas com dietas contendo diferentes níveis de fibra em detergente neutro proveniente da forragem. Revista Brasileira de Zootecnia, v.35, n.2, p.562-568, 2006.
  • FONSECA, C.E.M.; VALADARES, R.F.D.; VALADARES FILHO, S.C. et al. Produção de leite em cabras alimentadas com diferentes níveis de proteína na dieta: consumo e digestibilidade dos nutrientes. Revista Brasileira de Zootecnia, v.35, n.3, p.1162-1168, 2006.
  • IMAIZUMI, H.; SANTOS, F.A.P.; SIMAS, J.M.C. et al. Efeito de fontes e níveis crescentes de proteína degradável no rúmen sobre os parâmetros ruminais e sangüíneos de vacas leiteiras em final de lactação. In: REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 37., 2000, Viçosa, MG. Anais... Viçosa, MG: Sociedade Brasileira de Zootecnia, 2000. (CD-ROM).
  • LICITRA, G.; HERNANDEZ, T.M.; van SOEST, P.J. Standardization of procedures for nitrogen fractionation of ruminants feeds. Animal Feed Science and Technology, v.57, p.347-358, 1996.
  • LUCCI, C.S. Nutrição e manejo de bovinos leiteiros. 1.ed. São Paulo: Manole, 1997. 169p.
  • LUO, J.; GOETSCH, A.L.; NSAHLAI, I.V. et al. Maintenance energy requirements of goats: predictions based on observations of heat and recovered energy. Small Ruminant Research, v.53. p.221-230, 2004.
  • MAGALHÃES, A.C.M. Teores de nitrogênio uréico no leite e no plasma de vacas mestiças Viçosa, MG: Universidade Federal de Viçosa, 2003, 46p. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária) - Universidade Federal de Viçosa, 2003.
  • MORAND-FEHR, P.; SAUVANT, D. Composition and yield of goat milk as affected by nutritional manipulation. Journal of Dairy Science, v.63, p.1671-1680, 1980.
  • NATIONAL RESEARCH COUNCIL - NRC. Nutrient requirements of goats Washington, D.C.: National Academy of Science, 1981. 91p.
  • NATIONAL RESEARCH COUNCIL - NRC. Nutrient requirements of dairy cattle 7.ed.rev. Washington: National Academy of Science, 2001. 381p.
  • OLIVEIRA JR., R.C.; SUSIN, I.; PIRES, A.V. et al. Efeito de níveis de grão de soja na dieta de cabras. 1. Consumo e digestibilidade dos nutrientes. In: REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 37., 2000, Viçosa, MG. Anais...Viçosa, MG: Sociedade Brasileira de Zootecnia, 2000. (CD-ROM).
  • RODRIGUES, M.T. Uso de fibras em rações de ruminantes. In: CONGRESSO NACIONAL DOS ESTUDANTES DE ZOOTECNIA, 1998, Viçosa, MG. Anais... Viçosa, MG: Universidade Federal de Viçosa, 1998. p.139-171.
  • SAHLU, T.; FERNANDEZ, J.M.; JIA, Z.H. et al. Effect of source and amount of protein on milk production in dairy goats. Journal of Dairy Science, v.76, p.2701-2710, 1993.
  • SILVA, D.J.; QUEIROZ, A.C. Análise de alimento: métodos químicos e biológicos. Viçosa, MG: Universidade Federal de Viçosa, 2002. 235p.
  • SILVA SOBRINHO, A.G.; RODRIGUES, M.T.; GARCIA, J.A. et al. Composição corporal e exigências nutricionais de proteína para cabras em lactação. Revista Brasileira de Zootecnia, v.20, n.6, p.614, 1991.
  • STATISTICAL ANALISYS SYSTEM - SAS. User's guide: statistics. version 6, 4.ed. Cary: 1990. p.1686.
  • TYRREL, H.F.; REID, J.T. Prediction of energy value of cows milk. Journal of Dairy Science, v.48, n.9, p.1215-1223, 1965.
  • Van SOEST, P.J.; ROBERTSON, J.B.; LEWIS, B.A. Methods of dietary fiber, neutral detergent fiber, and nonstarch polyssaccharides in relation to animal nutrition. Journal of Dairy Science, v.74, p.3583-3597, 1991.
  • Van SOEST, P.J. Nutritional ecology of the ruminant 2.ed. Ithaca: University of Cornell, 1994. 476p
  • WU, Z.; SATTER, L.D. Milk production during the complete lactation of dairy cows fed diets containing different amounts of protein. Journal of Dairy Science, v.83, p.1042-1051, 2000.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Out 2007
  • Data do Fascículo
    Out 2007

Histórico

  • Aceito
    08 Maio 2007
  • Recebido
    03 Abr 2006
Sociedade Brasileira de Zootecnia Universidade Federal de Viçosa / Departamento de Zootecnia, 36570-900 Viçosa MG Brazil, Tel.: +55 31 3612-4602, +55 31 3612-4612 - Viçosa - MG - Brazil
E-mail: rbz@sbz.org.br