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Balanço de compostos nitrogenados e produção de proteína microbiana em novilhas leiteiras alimentadas com casca de café em substituição à silagem de milho

Nitrogen compounds balance and microbial protein production in dairy heifers fed with coffee husk in substitution of corn silage

Resumos

Objetivou-se avaliar o efeito da substituição da silagem de milho pela casca de café em dietas para novilhas leiteiras sobre as variáveis ruminais, o balanço de compostos nitrogenados e a produção de proteína microbiana. Foram utilizadas 24 novilhas leiteiras da raça Holandesa, puras e mestiças, distribuídas em um delineamento em blocos casualizados, com quatro tratamentos e seis blocos, formados de acordo com o peso inicial dos animais. Os tratamentos experimentais foram constituídos de quatro níveis de casca de café: 0,0; 7,0; 14,0 e 21,0 (% MS total) em substituição à silagem de milho. Diariamente, todas as novilhas foram alimentadas com 2 kg de concentrado. O consumo de compostos nitrogenados (N) e a excreção de N fecal e urinário aumentaram linearmente com a substituição da silagem de milho pela casca de café, o que resultou em balanço de N positivo, com média de 22,31 g/dia para todas as dietas, porém, a porcentagem de N absorvido em relação ao consumido reduziu linearmente. A concentração de amônia ruminal e a concentração de uréia no plasma (NUS), média de 11,03 e 10,08 mg/dL, respectivamente, não foram afetadas pela inclusão da casca de café na dieta. As excreções de ácido úrico, alantoína e de derivados de purina, as purinas absorvidas, o N microbiano (Nmic) e a eficiência microbiana (Efic M) reduziram linearmente com a substituição parcial da silagem de milho pela casca de café, com redução de 1,08 g/dia of Nmic e de 1,96 gPB/kg NDT de Efic M por unidade de casca de café adicionada à dieta. A inclusão de casca de café em níveis de até 21% MS em dietas para novilhas leiteiras reduz a produção de nitrogênio microbiano e a eficiência microbiana, o que pode prejudicar o desempenho animal.

amônia; derivados de purina; eficiência microbiana; nitrogênio; uréia plasmática


The objective was to evaluate the effect of the substitution of corn silage by coffee husk in diets for dairy heifers on the ruminal variables, nitrogenous compounds and e microbial protein production. Twenty-four dairy Holstein heifers, purebred and crossbred, were assigned to a randomized block design, with four treatments and six blocks, according to the animal initial weight. The treatments were four coffee hulls levels: 0.0, 7.0, 14.0, and 21.0 (% DM total), in substitution of corn silage. Daily, all the heifers was fed with 2 kg of concentrate The nitrogenous (N) compounds intake and and fecal N excretion linearly ncreased with the substitution of corn silage by coffee husk that resulted in positive N balance, with average of 22.31 g/day for all the diets, however, the percentage of N absorbed in relation to the consumed reduced linearly. The ruminal ammonia concentrations and the plasma urea concentration (NUS), average of 11.93 and 10.08 mg/dL respectively, was not affected by the inclusion of coffee husk in the diet. The excreções of acid úrico, alantoína and purina derivatives, the absorbed purinas, the microbial N (N mic) and the microbial efficiency (Efic M) linearly reduced with the partial substitution of corn silage coffee husk. Observing reduction of 1,08 g/day of Nmic and 1.96 gPB/kg NDT of Efic M per unit of coffee husk added to the diet. The inclusion of coffee husk in levels of up to 21% DM in diets for dairy heifers reduces the microbial nitrogen production and the microbial efficiency, what could be harm to the animal performance.

ammonia; microbial efficiency; nitrogen; plasma urea; purine derivatives


RUMINANTES

Balanço de compostos nitrogenados e produção de proteína microbiana em novilhas leiteiras alimentadas com casca de café em substituição à silagem de milho1 1 Parte da dissertação de Mestrado apresentada pelo primeiro autor à UFV

Nitrogen compounds balance and microbial protein production in dairy heifers fed with coffee husk in substitution of corn silage

Rafael Monteiro Araújo TeixeiraI; José Maurício de Souza CamposII; Sebastião de Campos Valadares FilhoII; Rilene Ferreira Diniz ValadaresIII; André Soares de OliveiraI; Douglas dos Santos PinaI

IDoutorando, Departamento de Zootecnia, UFV, Viçosa-MG, 36570-000

IIDepartamento de Zootecnia-UFV, Viçosa-MG, 36570-000

IIIDepartamento de Veterinária-UFV, Viçosa-MG, 36570-000

RESUMO

Objetivou-se avaliar o efeito da substituição da silagem de milho pela casca de café em dietas para novilhas leiteiras sobre as variáveis ruminais, o balanço de compostos nitrogenados e a produção de proteína microbiana. Foram utilizadas 24 novilhas leiteiras da raça Holandesa, puras e mestiças, distribuídas em um delineamento em blocos casualizados, com quatro tratamentos e seis blocos, formados de acordo com o peso inicial dos animais. Os tratamentos experimentais foram constituídos de quatro níveis de casca de café: 0,0; 7,0; 14,0 e 21,0 (% MS total) em substituição à silagem de milho. Diariamente, todas as novilhas foram alimentadas com 2 kg de concentrado. O consumo de compostos nitrogenados (N) e a excreção de N fecal e urinário aumentaram linearmente com a substituição da silagem de milho pela casca de café, o que resultou em balanço de N positivo, com média de 22,31 g/dia para todas as dietas, porém, a porcentagem de N absorvido em relação ao consumido reduziu linearmente. A concentração de amônia ruminal e a concentração de uréia no plasma (NUS), média de 11,03 e 10,08 mg/dL, respectivamente, não foram afetadas pela inclusão da casca de café na dieta. As excreções de ácido úrico, alantoína e de derivados de purina, as purinas absorvidas, o N microbiano (Nmic) e a eficiência microbiana (Efic M) reduziram linearmente com a substituição parcial da silagem de milho pela casca de café, com redução de 1,08 g/dia of Nmic e de 1,96 gPB/kg NDT de Efic M por unidade de casca de café adicionada à dieta. A inclusão de casca de café em níveis de até 21% MS em dietas para novilhas leiteiras reduz a produção de nitrogênio microbiano e a eficiência microbiana, o que pode prejudicar o desempenho animal.

Palavras-chave: amônia, derivados de purina, eficiência microbiana, nitrogênio, uréia plasmática

ABSTRACT

The objective was to evaluate the effect of the substitution of corn silage by coffee husk in diets for dairy heifers on the ruminal variables, nitrogenous compounds and e microbial protein production. Twenty-four dairy Holstein heifers, purebred and crossbred, were assigned to a randomized block design, with four treatments and six blocks, according to the animal initial weight. The treatments were four coffee hulls levels: 0.0, 7.0, 14.0, and 21.0 (% DM total), in substitution of corn silage. Daily, all the heifers was fed with 2 kg of concentrate The nitrogenous (N) compounds intake and and fecal N excretion linearly ncreased with the substitution of corn silage by coffee husk that resulted in positive N balance, with average of 22.31 g/day for all the diets, however, the percentage of N absorbed in relation to the consumed reduced linearly. The ruminal ammonia concentrations and the plasma urea concentration (NUS), average of 11.93 and 10.08 mg/dL respectively, was not affected by the inclusion of coffee husk in the diet. The excreções of acid úrico, alantoína and purina derivatives, the absorbed purinas, the microbial N (N mic) and the microbial efficiency (Efic M) linearly reduced with the partial substitution of corn silage coffee husk. Observing reduction of 1,08 g/day of Nmic and 1.96 gPB/kg NDT of Efic M per unit of coffee husk added to the diet. The inclusion of coffee husk in levels of up to 21% DM in diets for dairy heifers reduces the microbial nitrogen production and the microbial efficiency, what could be harm to the animal performance.

Key words: ammonia, microbial efficiency, nitrogen, plasma urea, purine derivatives

Introdução

O melhoramento de índices zootécnicos como taxa de natalidade, idade à primeira cria e produção de leite, indicadores de maior eficiência biológica, deve ser objetivo em todo sistema de produção. Para a atividade leiteira se tornar mais competitiva, inclusive em relação a outras explorações agrícolas, são necessários conhecimento e tecnologias mais apropriados à produção econômica animal. Além disso, as eficiências produtiva e reprodutiva e a redução da idade à primeira cria são fatores relevantes para avaliação do desempenho (Ruas et al., 2004) e fundamentais para melhoria na eficiência e competitividade na exploração da atividade leiteira.

A idade à puberdade é uma característica que depende diretamente da nutrição. De acordo com Wiltbank et al. (1973), nível nutricional adequado ao potencial de desenvolvimento do animal pode contribuir para diminuir a idade ao primeiro estro. No entanto, verifica-se em geral negligência quanto ao manejo e à alimentação de novilhas, com fornecimento de suprimento dietético incompatível com a elevada exigência desses animais para crescimento, o que pode comprometer o ganho de peso e favorecer o aumento na idade ao primeiro parto (Chizzotti, 2006). O elevado custo com alimentação destes animais, ainda não compensado pela produção de leite, é a principal causa dessa baixa produtividade.

Como alternativa para manter os ganhos de peso ideais em novilhas leiteiras com menor custo, sugere-se o uso de alimentos alternativos, como a casca de café, um resíduo do beneficiamento do grão de café. Diversos estudos têm demonstrado que este subproduto contém nutrientes em quantidades adequadas para ser usado na alimentação de ruminantes (Cabezas et al., 1974).

Ribeiro Filho (2000) testou a inclusão de casca de café no concentrado nos níveis de 0, 10, 20, 30 e 40% em substituição ao milho desintegrado com palha e sabugo (MPDS) para novilhos mestiços Holandês ´ Zebu e observaram que o uso de casca de café não afetou o consumo de MS e nutrientes e o desempenho animal, constituindo alternativa viável ao MPDS no nível de 30% do concentrado.

Vilela (1999) avaliou a inclusão de 0, 15, 30 e 60% de casca de café melosa (sem pergaminho) em substituição ao volumoso (cana-de-açúcar e capim-elefante) para novilhos mestiços de Nelore castrados alimentados com cana-de-açúcar (Saccharum officinarum) (85%) e de capim-elefante (Pennisetum purpureum, Schum) picado (15%) como volumoso e observou que o fornecimento de casca de café melosa (Coffea arabica,L.) aumentou linearmente os consumos de MS e de PB da dieta total, com aumentos de 0,0268 kg de MS e de 0,0071 kg de PB para cada 1% de casca de café adicionada. O ganho de peso e a relação receita/despesa tiveram efeito quadrático, o que permitiu estabelecer nível ótimo de 42% de substituição do volumoso pela casca de café melosa.

Na literatura constam diversos trabalhos sobre o uso de casca de café para ruminantes, no entanto, poucos discorrem sobre a inclusão de casca de café em dietas para novilhas leiteiras, principalmente constituindo parte do volumoso.

Este estudo foi realizado com o objetivo de avaliar os parâmetros ruminais, o balanço de compostos nitrogenados e a produção de proteína microbiana em novilhas leiteiras alimentadas com dietas formuladas com casca de café em substituição parcial à silagem de milho.

Material e Métodos

O experimento foi conduzido durante o período de julho a outubro de 2003 na Unidade de Ensino, Pesquisa e Extensão em Gado de Leite (UEPE-GL) do Departamento de Zootecnia (DZO) da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa-MG, a 649 m de altitude, 20º 45' 20'' de latitude sul e 42º 52' 40'' de longitude oeste. O clima da região é do tipo Cwa, segundo classificação de Köppen, com duas estações definidas: seca (de abril a setembro) e águas (de outubro a março). A precipitação média anual é de 1.341,2 mm e as temperaturas médias máximas e mínimas são 26,1 e 14,0ºC, respectivamente (UFV, 1997b).

Foram utilizadas 24 novilhas leiteiras da raça Holandesa, puras e mestiças, com 10 meses de idade e peso médio inicial de 180 kg. O delineamento experimental adotado foi em blocos casualizados, com seis blocos formados de acordo com o peso inicial dos animais considerando cada animal uma unidade experimental.

As novilhas foram alojadas em baias individuais cobertas, com comedouros individuais de concreto e bebedouros automáticos, com 8,0 m2 de área, 5,6 m2 de piso cimentado e 2,4 m2 de área para descanso, utilizando-se cepilho de madeira como cama. As baias foram limpas diariamente e as camas trocadas sempre que necessário.

Os tratamentos foram constituídos de quatro níveis de casca de café (0,0; 10,7; 20,7 e 30,7% na matéria natural) em substituição à silagem de milho, resultando em substituições médias de 0,0; 7,0; 14,0 e 21,0% na MS total das dietas, respectivamente. O volumoso foi oferecido à vontade, em quantidade suficiente para permitir no máximo 10% de sobras na MS. Um concentrado foi preparado e fornecido em quantidade de 2,0 kg/animal/dia para atender às exigências de ganhos de 800 g/dia, segundo o NRC (2001). As dietas (Tabelas 1 e 2) foram fornecidas duas vezes ao dia, às 8h30 e 16h30, na forma de mistura completa.

O experimento constou de 21 dias de adaptação às dietas e mais três períodos experimentais de 28 dias, perfazendo um total de 84 dias para a coleta de dados e avaliação do desenvolvimento dos animais. No período de adaptação, os animais foram tratados contra endo e ectoparasitas e receberam vitamina ADE injetável.

Amostras "spot" de urina foram obtidas no 82º dia do período experimental, aproximadamente 4 horas após a alimentação matinal, durante micção estimulada por massagem na vulva. A urina foi filtrada e alíquotas de 10 mL foram diluídas em 40 mL de ácido sulfúrico 0,036 N. Essas amostras tiveram seu pH ajustado para abaixo de 3 para evitar destruição bacteriana dos derivados de purina (DP) e precipitação do ácido úrico. Posteriormente, as amostras foram acondicionadas em recipientes plásticos, devidamente identificados, e congeladas para análises dos níveis de uréia, creatinina, alantoína e ácido úrico.

No 83º dia de experimento, aproximadamente 4 horas após a alimentação matinal, foram coletadas amostras de sangue de todos os animais, por punção na veia coccígena, utilizando-se tubo de ensaio com gel separador e acelerador de coagulação. Logo após a coleta, as amostras de sangue foram centrifugadas (350 g por 15 minutos). Amostras do soro sangüíneo foram coletadas, acondicionadas em recipientes de vidros, identificadas e congeladas para posteriores análises de uréia.

A determinação da uréia na urina e no plasma sangüíneo foi realizada segundo o método diacetil modificado (kits comerciais Labtest). Os níveis creatinina foram determinados nas amostras de urina spot com o uso de kits comerciais (Labtest), pelo método de ponto final, com utilização de picrato e acidificante. A excreção diária de creatinina (EC) foi estimada conforme proposto por Chizzotti (2006): EC (g/dia) = 32,27 0,01093*PV (kg). A concentração de creatinina na amostra spot de urina foi utilizada para estimar o volume urinário e a excreção de ácido úrico e alantoína.

As análises de derivados de purinas (ácido úrico e alantoína) foram feitas pelo método colorimétrico, segundo Fujihara et al. (1987), descrito por Chen & Gomes (1992). A excreção total de DP foi calculada pela soma das quantidades de ácido úrico e alantoína excretadas na urina, expressas em mmol/dia, que, somadas, representam aproximadamente 98% das excreções diárias dos derivados de purina (Rennó et al., 2000).

As purinas microbianas absorvidas (PA, mmol/dia) foram calculadas considerando as excreções dos derivados de purinas (v, mmol/dia), utilizando-se a fórmula = 0,85 PA + 0,385 PV0,75, em que 0,85 é a recuperação das purinas absorvidas como derivados urinários de purinas e 0,385 PV0,75 a excreção endógena de derivados de purinas na urina (Verbic et al., 1990).

A síntese ruminal de compostos nitrogenados (Nmic, gN/dia) foi calculada considerando as purinas microbianas absovidas (PA, mmol/dia) utilizando-se a equação Nmic = (70 * PA)/(0,83 * 0,116 * 1000), em que 70 representa o conteúdo de N nas purinas (mg N/mmol), 0,83 a digestibilidade intestinal das purinas microbianas e 0,116 a relação N-purina:N-total nas bactérias (Chen & Gomes, 1992).

O contéudo ruminal foi coletado utilizando-se sonda esofágica, segundo Ortolani (1981), para determinação do pH e da concentração de amônia ruminal nos tempos zero (imediatamente antes da alimentação) e 3 horas após a alimentação matinal do 84º dia de experimento. O conteúdo ruminal foi filtrado em gaze e o pH foi medido imediatamente por meio de peagâmetro digital. Após a determinação do pH, retirou-se uma alíquota de 40 mL de líquido ruminal, que foi transferida para um recepiente de vidro devidamente identificado contendo 1 mL de HCl (1:1). A amostra foi congelada a -20ºC para posterior análise de N amoniacal.

Os compostos nitrogenados amoniacais do líquido ruminal foram determinados por adaptação do método de Kjeldahl, omitindo-se a fase de digestão. O líquido de rúmen foi descongelado e centrifugado a 1000 x g por 15 minutos para retirada de uma amostra (2 mL) do sobrenadante, que foi transferida para tubo de ensaio e adicionada de água destilada e 15 mL de hidróxido de potássio (2N). Após a adição de KOH, a amostra de líquido ruminal foi imediatamente destilada em 20 mL de ácido bórico, obtendo-se volume de aproximadamente 100 mL de líquido destilado. Posteriormente, procedeu-se à titulação com HCl (0,005 N), conforme técnica de Fenner (1965), adaptada por Vieira (1980).

Os resultados foram submetidos às análises de variância e de regressão, a 5% de significância, utilizando-se o programa SAEG, versão 8.1 (UFV, 2000). A escolha do melhor modelo foi feita com base no coeficiente de determinação e na significância dos coeficientes de regressão utilizando-se o teste t de Student a 5% de probabilidade.

O consumo de N total (Tabela 3) aumentou linearmente (P<0,05) com a adição de casca de café na dieta, com aumento de 0,51 g por unidade de casca adicionada (% da MS). Esse resultado pode ter sido ocasionado pelo aumento de 3 g no consumo de PB (P<0,05) por unidade de casca de café adicionada na dieta (% da MS), decorrente do aumento no consumo de MS (v = 5,78464 + 0,0193667*NC, em que NC é o nível de casca de café), uma vez que as dietas eram isonitrogenadas. Observou-se ainda aumento linear (P<0,05) nas excreções de N fecal e N urinário, que elevaram 0,45 e 0,26 g a cada unidade de casca de café adicionada, respectivamente.

Esse aumento na excreção de N fecal pode estar relacionado às maiores concentrações de NIDN e NIDA nas dietas (Tabela 2) e à redução no coeficiente de digestibilidade da PB, uma vez que a redução na digestibilidade da PB foi de 0,163 unidades percentuais para cada unidade de casca de café adicionada (% MS). O NIDN apresenta alguma digestibilidade, porém de lenta degradação no rúmen, enquanto o NIDA parece ser resistente e praticamente indigestível e está associado à lignina e a outros compostos de difícil degradação (Van Soest & Mason, 1991; Licitra et al., 1996). Souza (2003) também verificou aumento na excreção de N fecal de 0,45 g/unidade de casca adicionada em experimento com novilhas leiteiras em condições semelhantes.

O aumento na excreção de N urinário pode ter sido ocasionado pelo aumento no consumo de PB à medida que a silagem de milho foi substituída pela casca de café. Segundo Van Soest (1994), a excreção de N na urina é maior quando a concentração de PB na dieta e a ingestão de N pelo animal aumentam. Valadares et al. (1997), em pesquisa com zebuínos, verificaram aumentos na excreção de N-urina nos animais alimentados com as dietas com maiores concentrações de PB e registraram valor médio de 33,88 g/dia para os animais alimentados com dietas com 12% de PB.

O balanço de N não foi influenciado pela adição de casca de café nas dietas e apresentou valor médio de 22,31 g/dia, o que provavelmente foi ocasionado por aumentos lineares em relação ao consumo de N e às excreções de N nas fezes e na urina.

O NRC (2001) preconiza exigência líquida de proteína de 156 g/dia, ou seja, em torno de 25 g/dia de N, para animais com 225 kg e ganho 0,800 kg/dia de proteína. Quando se compara o balanço de N deste estudo à exigência líquida de N para crescimento preconizado pelo NRC (2001), verifica-se que a utilização da casca de café possibilitou atender à exigência líquida de N para ganho de peso de 0,800 kg/dia.

A porcentagem de N retido em relação ao N consumido decresceu (P<0,05) 0,24 unidades percentuais a cada unidade de casca adicionada. Cabezas et al. (1974) observaram que a eficiência de utilização do N absorvido pelo animal reduz significativamente quando se aumenta o nível de polpa de café na ração e obtiveram valor de 15,1% de nitrogênio retido em bezerros holandeses alimentados com dieta com 24% de polpa de café.

Os valores de pH ruminal determinados 0 (pH 0) e 3 (pH 3) horas após a alimentação não foram influenciados pelos níveis de casca de café na dieta (Figura 1) e mantiveram-se em 7,31 e 6,88 para 0 e 3 horas, respectivamente. Esses valores estão na faixa ideal para manutenção das condições ecológicas no rúmen para crescimento e metabolismo microbiano. Segundo Van Soest (1994), a faixa ideal de pH para a atividade normal de rúmen é de 6,7 ± 0,5. Essa eqüidade entre as dietas quanto ao valor de pH pode ter sido influenciada pela aproximação nos teores de FDN (Tabela 2) entre a silagem de milho e a casca de café. Segundo Mertens (2001), a FDN ingerida e a forma física do alimento estão correlacionadas à atividade mastigatória, ao tempo de ruminação e ao pH ruminal.


O teor em mg/dL de amônia no líquido ruminal nos tempos 0 (zero) e 3 (três) horas após a alimentação e o teor de N uréico no soro sangüíneo (NUS) não diferiram (P>0,05) entre os animais (Figura 2) e apresentaram médias de 3,33; 11,93 e 10,08, respectivamente. Muitos estudos comprovam que, em concentrações de amônia próximas de 5 mg/dL, ocorrem máximo crescimento microbiano e digestão da matéria orgânica (Hoover, 1986). Segundo Pinzon & Wing (1976), elevadas concentrações de amônia resultam em maior absorção líquida de N, conversão em uréia e conseqüente perda urinária.


A elevada concentração sérica de uréia está relacionada à utilização ineficiente da proteína bruta da dieta (Broderick & Clayton, 1997). Uma vez que os teores de NUS têm sido utilizados para obtenção de informações sobre o perfil da nutrição protéica de ruminantes envolvendo suas respostas metabólicas a determinadas dietas (Chizzotti, 2006), pode-se inferir que a utilização da casca de café em dietas para novilhas leiteiras nos níveis avaliados não ocasiona problemas metabólicos quanto à utilização da proteína, pois os níveis de NUS não foram afetados significativamente pela adição de casca de café nas dietas.

As excreções urinárias de uréia (U-urina) e N uréia (NU-urina) aumentaram de forma linear (P<0,05) à medida que se substituiu a silagem de milho pela casca de café nas dietas, embora o NUS não tenha sido influenciado (Tabela 4) pelos níveis de casca de café nas dietas. Esse aumento na excreção de U-urina e NU-urina pode ter sido provocado pelo aumento no consumo de N total.

Apesar do aumento linear na excreção de U-urina e de NU-urina, os valores observados foram similares aos encontrados por Valadares et al. (1997), de 58,83 e 27,41 g/dia para U-urina e NU-urina, em zebuínos alimentados com dietas com 12% de PB. Chizzotti (2006), em pesquisa com novilhas leiteiras, encontrou excreção urinária de N uréico de 22,37 g/dia em animais com 235 kg consumindo silagem de milho e concentrado com 25,45% de PB.

Houve redução linear (P<0,05) para as excreções urinárias de ácido úrico (ACU), alantoína (ALU) e derivados de purina (DP) (Tabela 5), com decréscimos 0,10; 1,20 e 1,30 mmol/dia para cada unidade de casca de café adicionada às dietas, respectivamente. Souza (2003) também constatou redução linear na excreção de DP e estimou decréscimos de 0,873 mmol/dia para cada unidade de casca adicionada ao concentrado em dietas para novilhas leiteiras.

Observou-se redução linear (P<0,05) para as purinas absorvidas (PA), que apresentaram redução de 1,49 mmol/dia por unidade de casca adicionada. Souza (2003), avaliando a quantidade de PA, estimou decréscimos de 0,95 mmol/dia por unidade de casca adicionada quando utilizou casca de café no concentrado de novilhas leiteiras.

A relação alantoína:derivados de purinas (A/DP) não foi influenciada pelos níveis de casca de café. O valor médio foi de 89,65%, levemente inferior aos encontrados por Rennó (2003) e Chizzotti (2006), de 91,70 e 91,75%, respectivamente. Verbic et al. (1990), Leão (2002) e Souza (2003) encontraram valores de 85, 87,90 e 87,9%, respectivamente. Portanto, os dados de excreção dos derivados de purina estão dentro da faixa normal reportada na literatura.

A produção de Nmic reduziu linearmente (P<0,05) com a adição de casca de café no volumoso e apresentou decréscimo de 1,08 g/dia por unidade de casca adicionada. Com o aumento da quantidade de casca de café nas dietas, o consumo de MS aumentou, no entanto, observou-se redução na digestibilidade dos nutrientes e na disponibilidade de energia, que, segundo Clark et al. (1992), juntamente com a proteína, são os fatores nutricionais que mais limitam o crescimento microbiano.

A baixa disponibilidade de energia e proteína parece ser a principal causa da redução na produção de Nmic com a utilização de casca de café em dietas para novilhas, pois, neste estudo, com a inclusão de casca de café nas dietas, houve aumento na ingestão de MS, que pode ser atribuído a dois fatores: aumento na taxa de passagem proporcionado pela redução no tamanho de partículas; e/ou redução na disponibilidade de energia verificado pela redução no NDTobs (= 63,6460 - 0,191061*NC, em que NC é o nível de casca de café), ou seja, o animal aumenta o consumo para equilibrar o déficit de energia. Além dessa possível deficiência de energia, com a utilização de casca de café nas dietas pode ter ocorrido menor disponibilidade de proteína, pois, apesar de o balanço de N não ter sido influenciado pela adição da casca de café, a porcentagem do N retido em relação ao consumido reduziu linearmente, indicando ineficiência no aproveitamento deste nutriente com a inclusão de casca de café.

A eficiência de síntese microbiana apresentou decréscimo linear (P<0,05) com a adição de casca de café nas dietas, estimando-se redução de 1,96 g PB/kg NDT por unidade de casca adicionada. Como a proteína microbiana pode suprir 50 a 100% da proteína metabolizável exigida (NRC, 1996), esta redução na eficiência de síntese microbiana com a substituição parcial da casca de café pode ser um dos principais fatores na redução dos ganhos de peso diários (= 1,06308 - 0,00551424*NC, em que NC é o nível de casca de café) observados nas novilhas.

Conclusões

A determinação de proteína microbiana com base nos derivados de purina permitiu verificar que a substituição da silagem de milho pela casca de café em dietas de novilhas leiteiras reduziu a produção de proteína microbiana, o que pode prejudicar o desempenho dos animais em comparação ao uso de apenas silagem de milho como volumoso.

Literatura Citada

Recebido: 31/7/2006

Aprovado: 9/5/2007

Correspondências devem ser enviadas para: rafaelaldeia@hotmail.com

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  • 1
    Parte da dissertação de Mestrado apresentada pelo primeiro autor à UFV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Out 2007
    • Data do Fascículo
      Out 2007

    Histórico

    • Recebido
      31 Jul 2006
    • Aceito
      09 Maio 2007
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