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Produtividade e valor nutritivo de pasto de capim-elefante manejado sob princípios agroecológicos

Productivity and nutritive value of an elephantgrass pasture managed under agro-ecologic principles

Resumos

Objetivou-se avaliar o valor nutritivo do capim-elefante, quanto aos teores de PB e FDN e a digestibilidade in vitro da MS (DIVMS), submetido a algumas práticas agroecológicas. Foram usados dois piquetes (0,15 ha cada), onde foi estabelecido o capim-elefante, em 2001, com espaçamento entrelinhas de três metros. Nas entrelinhas, estabeleceram-se aveia (Avena strigosa Schreb.) e azevém (Lolium multiflorum Lam.) no período hibernal e, no estival, permitiu-se o desenvolvimento de espécies de crescimento espontâneo. A adubação foi feita com fertilizantes orgânicos (150 kg de N /ha). No período experimental (24/04/2004 a 05/05/2005), foram conduzidos sete pastejos. Os animais experimentais foram vacas da raça Holandesa que receberam, como complementação alimentar, 3,5 kg/dia de concentrado. Avaliaram-se a massa de forragem inicial, composição botânica do pasto e os componentes estruturais. Para as análises de valor nutritivo do pasto, foram feitas amostragens simulando o pastejo. O delineamento experimental foi de blocos ao acaso com duas repetições (piquetes) e sete tratamentos (pastejos). Os melhores resultados do valor nutritivo foram obtidos no período hibernal. Foram encontradas correlações negativas da PB e DIVMS e positivas da FDN com a biomassa de lâminas foliares do capim-elefante. O capim-elefante, manejado sob princípios agroecológicos, apresentou alto valor nutritivo e produtividade, tanto no verão quanto no inverno, possibilitando que a produção animal seja mais sustentável no decorrer do ano.

digestibilidade in vitro da matéria seca; fibra em detergente neutro; pastos consorciados; proteína bruta


The objective of this work was to evaluate forage nutritive value by determining the crude protein (CP), neutral detergent fiber (NDF), and in vitro dry matter digestibility (IVDMD) from forage submitted to some agro-ecologic practices. Two paddocks, each one with 0.15 ha, were used in the evaluation. The elephantgrass was planted in 2001, spaced 3 m between rows. Mixture of oat and ryegrass during the winter period and spontaneous growing species in the summer period has been planted/left between the rows. It was applied organic fertilizer in the rate of 150 kg/ha of N. Seven grazing cycles were carried out during the experimental period from 04/24/2004 to 05/05/2005. Holstein cows receiving 3.5 kg/daily complementary concentrate feed were used in the evaluation. The initial forage mass, the botanical composition, and the structural components of elephantgrass pastures were evaluated. Hand-plucked samples were collected to analyze the nutritive value. The experimental design utilized was randomized blocks, with two replicates (paddocks) and seven treatments (grazings along the time). The best results for nutritive value were found during the winter period. Negative correlations between CP with IVDMD and positive between NDF with elephantgrass leaf lamina biomass were found. The elephantgrass pasture, managed under agro-ecologic principles, showed high nutritional value and productivity, both during the summer and during the winter, making the animal production more sustainable along the year.

crude protein; dry matter in vitro digestibility; mixed pastures; neutral detergent fiber


FORRAGICULTURA

Produtividade e valor nutritivo de pasto de capim-elefante manejado sob princípios agroecológicos

Productivity and nutritive value of an elephantgrass pasture managed under agro-ecologic principles

Clair Jorge OlivoI; Pablo Santini CharãoII; Lilian Elgalise Techio PereiraII; Magnos Fernando ZiechII; Gilmar MeinerzII; Denise TyskaII

IDepartamento de Zootecnia, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Camobi, CEP: 97119-900, Santa Maria - RS

IICurso de graduação em Zootecnia da UFSM, Santa Maria - RS

RESUMO

Objetivou-se avaliar o valor nutritivo do capim-elefante, quanto aos teores de PB e FDN e a digestibilidade in vitro da MS (DIVMS), submetido a algumas práticas agroecológicas. Foram usados dois piquetes (0,15 ha cada), onde foi estabelecido o capim-elefante, em 2001, com espaçamento entrelinhas de três metros. Nas entrelinhas, estabeleceram-se aveia (Avena strigosa Schreb.) e azevém (Lolium multiflorum Lam.) no período hibernal e, no estival, permitiu-se o desenvolvimento de espécies de crescimento espontâneo. A adubação foi feita com fertilizantes orgânicos (150 kg de N /ha). No período experimental (24/04/2004 a 05/05/2005), foram conduzidos sete pastejos. Os animais experimentais foram vacas da raça Holandesa que receberam, como complementação alimentar, 3,5 kg/dia de concentrado. Avaliaram-se a massa de forragem inicial, composição botânica do pasto e os componentes estruturais. Para as análises de valor nutritivo do pasto, foram feitas amostragens simulando o pastejo. O delineamento experimental foi de blocos ao acaso com duas repetições (piquetes) e sete tratamentos (pastejos). Os melhores resultados do valor nutritivo foram obtidos no período hibernal. Foram encontradas correlações negativas da PB e DIVMS e positivas da FDN com a biomassa de lâminas foliares do capim-elefante. O capim-elefante, manejado sob princípios agroecológicos, apresentou alto valor nutritivo e produtividade, tanto no verão quanto no inverno, possibilitando que a produção animal seja mais sustentável no decorrer do ano.

Palavras-chave: digestibilidade in vitro da matéria seca, fibra em detergente neutro, pastos consorciados, proteína bruta

ABSTRACT

The objective of this work was to evaluate forage nutritive value by determining the crude protein (CP), neutral detergent fiber (NDF), and in vitro dry matter digestibility (IVDMD) from forage submitted to some agro-ecologic practices. Two paddocks, each one with 0.15 ha, were used in the evaluation. The elephantgrass was planted in 2001, spaced 3 m between rows. Mixture of oat and ryegrass during the winter period and spontaneous growing species in the summer period has been planted/left between the rows. It was applied organic fertilizer in the rate of 150 kg/ha of N. Seven grazing cycles were carried out during the experimental period from 04/24/2004 to 05/05/2005. Holstein cows receiving 3.5 kg/daily complementary concentrate feed were used in the evaluation. The initial forage mass, the botanical composition, and the structural components of elephantgrass pastures were evaluated. Hand-plucked samples were collected to analyze the nutritive value. The experimental design utilized was randomized blocks, with two replicates (paddocks) and seven treatments (grazings along the time). The best results for nutritive value were found during the winter period. Negative correlations between CP with IVDMD and positive between NDF with elephantgrass leaf lamina biomass were found. The elephantgrass pasture, managed under agro-ecologic principles, showed high nutritional value and productivity, both during the summer and during the winter, making the animal production more sustainable along the year.

Key Words: crude protein, dry matter in vitro digestibility, mixed pastures, neutral detergent fiber

Introdução

O capim-elefante (Pennisetum purpureum, Schum.) é uma gramínea perene de alto potencial de produção e adaptação às condições climáticas predominantes em quase todo o País. Na maioria das regiões, sua produção está concentrada no período estival, cuja estacionalidade deve-se às baixas precipitações e temperaturas (Deresz, 2001).

Pesquisas normalmente iniciadas na primavera ou no verão demonstram que há diminuição no valor nutritivo do capim-elefante no decorrer da utilização (Lima et al., 2004; Restle et al., 2002). Alguns trabalhos demonstram que o uso do capim-elefante sob pastejo normalmente prolonga sua qualidade (Kessler, 1995) e outros, a melhoria após o primeiro pastejo (Townsend et al., 1994). Estudos conduzidos no decorrer do ano agrícola demonstram que o capim-elefante apresenta melhor valor nutritivo no período hibernal, quando comparado com o período estival, embora apresente menor produção de forragem (Poli, 1992).

Em muitas regiões do Sul do Brasil, essa forrageira poderia ter uma função estratégica durante o outono, período em que as espécies anuais cultivadas apresentam baixa produção de forragem (Sobczak et al., 2005).

Trabalhos conduzidos sobre o valor nutritivo do capim-elefante têm como base o sistema de produção convencional, referente a curtos períodos de avaliação (em torno de três meses), sendo conduzidos três a quatro pastejos (Olivo et al., 2006). Esta análise aponta para a necessidade de se desenvolverem pesquisas a longo prazo, sobretudo sobre a avaliação do capim-elefante manejado dentro de princípios agroecológicos (Sobczak et al., 2005), para se obterem informações mais completas sobre essa forrageira.

Nessa sistemática, os resultados obtidos podem se constituir em subsídios tanto para a agricultura orgânica, que não permite em sua produção o uso de adubos químicos e pesticidas, quanto para a agricultura convencional, na medida em que avalia o capim-elefante em consorciações com espécies de ciclos hibernal e estival.

Acredita-se que a análise do capim-elefante manejado sob princípios agroecológicos, no decorrer do ano, poderia contribuir de forma efetiva para os sistemas forrageiros que envolvem esta espécie, bem como obter informações sobre as variações qualitativas, contribuindo, assim, para a melhoria do conhecimento de sua capacidade nutritiva, com conseqüente implicação no manejo mais sustentável dessa forrageira. Essa assertiva está fundamentada em práticas utilizadas pela agricultura orgânica ou agroecológica, como cultivo mínimo, adubação orgânica e consorciação de espécies, e não no uso de pesticidas.

Objetivou-se com este trabalho avaliar a produtividade e o valor nutritivo do capim-elefante sob pastejo, quanto aos teores de PB, FDN e DIVMS, submetido à estratégia de manejo agroecológica, no decorrer de um ano agrícola.

Material e Métodos

O trabalho foi conduzido nos Laboratórios de Bovinocultura de Leite e de Nutrição Animal, pertencentes ao Departamento de Zootecnia da UFSM, situado na região da Depressão Central (Santa Maria – RS), a 29º 43' de latitude sul e 53º 42' de longitude oeste, com clima subtropical úmido (Moreno, 1961). Os valores da precipitação anual variam de 1.300 a 1.800 mm, com temperatura média de 19,2ºC, sendo a média das mínimas de 9,3ºC, em julho, e a média das máximas de 24,7ºC, em janeiro. Durante o período estival do ano agrícola avaliado, as médias mensais de precipitação ficaram abaixo do normal. No período de dezembro a março, esta redução foi em torno de 60%.

A pesquisa foi conduzida em um pasto manejado sob princípios agroecológicos, destacando-se o cultivo mínimo, a consorciação de espécies, o uso da adubação orgânica em substituição aos fertilizantes minerais, o não no uso de pesticidas e os cuidados com o bem-estar animal.

O capim-elefante, cv. Merckeron Pinda, foi estabelecido no mês de outubro de 2001, em uma área experimental de 0,3 ha em linhas espaçadas 3 m, possibilitando-se, desta forma, a mecanização entre elas. Previamente ao cultivo, foi efetuada a calagem, conforme recomendação da análise do solo. O solo é classificado como Argissolo Vermelho Distrófico Arênico. Em dois anos agrícolas consecutivos, a área foi utilizada sob pastejo com bovinos leiteiros, avaliando-se o capim-elefante com distintas consorciações com forrageiras cultivadas de ciclo hibernal e espécies de crescimento espontâneo de ciclo estival. Anualmente, a pastagem foi adubada com fertilizantes orgânicos, à razão de 150 kg de N/ha, sendo 70% com chorume de suínos e 30% com esterco bovino (coletado por mangueira de espera, armazenado e coberto com lona plástica). A quantidade de P e K foi estimada em 60 e 110 kg/ha/ano, respectivamente.

O estudo foi conduzido no ano seguinte, entre 25/4/2004 e 5/5/2005, perfazendo um total de 375 dias de avaliação. Em meados de abril, foi feita a semeadura da mistura constituída por aveia (Avena strigosa Schreb. cv. Preta comum) e azevém (Lolium multiflorum Lam.) nas entrelinhas do capim-elefante, mediante preparo superficial de solo. A densidade de semeadura foi de 80 e 40 kg/ha de aveia e azevém, respectivamente. No final da utilização, em outubro, realizou-se a roçada das touceiras de capim-elefante, visando uniformizar o pasto. Nas entrelinhas, foi usada grade (meia-trava) para escarificar levemente o solo, estimulando-se, dessa forma, o desenvolvimento de espécies de crescimento espontâneo. Para adubação, utilizaram-se os mesmos fertilizantes, aplicando-se 50 e 100 kg de N/ha, respectivamente, nos períodos hibernal (24/4 a 5/10/2004) e estival (6/10/2004 a 5/5/2005). O critério de utilização do pasto, durante o período hibernal, teve como base as espécies cultivadas anuais. Os animais tinham acesso ao pasto quando as espécies apresentavam altura de 20 cm e retirados quando o resíduo apresentava cerca de 10 cm, aproximadamente. No período estival, o critério de utilização do pasto baseou-se na altura do capim-elefante, entre 100 e 120 cm, procurando-se manter o resíduo de lâmina foliar de pós-pastejo próximo a 25% (Hillesheim, 1995). Para calcular a quantidade de animais, procurou-se manter a oferta de forragem entre 8 e 10 kg de MS do pasto/100 kg de peso vivo/ dia. O período de ocupação variou de um a dois dias. Utilizaram-se vacas da raça Holandesa, em lactação, com peso médio de 517 ± 23,25 kg e produção de leite de 15,18 ± 0,71 kg. Cada animal recebeu diariamente 3,5 kg de concentrado (20% PB), dividido entre as ordenhas da manhã e da tarde. No período hibernal, os animais receberam, além de concentrado, 3,6 kg de MS de silagem de milho.

Para estimar a massa de forragem inicial, foram coletadas quatro amostras de 1,5 m2 (3 m x 0,5 m) antecedendo cada pastejo. Os cortes foram efetuados a 50 cm do solo para o capim-elefante e rente ao solo para as espécies presentes na entrelinha. As amostras foram homogeneizadas, retirando-se uma sub-amostra para estimativa da composição botânica do pasto, que, posteriormente foi encaminhada à estufa, para determinação do teor de MS. A estimativa da massa de forragem inicial também foi usada para o cálculo da carga animal a ser utilizada. Após o pastejo, foi estimada a porcentagem de lâminas foliares do capim-elefante, visando monitorar o manejo adotado na retirada dos animais do pasto no período estival.

Para estimar o valor nutritivo do pasto, foram coletadas amostras simulando o pastejo (Euclides et al., 1992), após a observação do comportamento ingestivo dos animais por 15 minutos, no início e final do pastejo. As amostras foram secas em estufa a 65ºC e, posteriormente, analisadas quanto aos teores de PB, pelo método de Kjeldahl (AOAC, 1984); FDN, pelo método de Robertson & Van Soest (1981); e digestibilidade in vitro da MS (DIVMS), pela técnica de Tilley & Terry (1963), tendo como referência o valor médio das amostras (início e final dos pastejos). O delineamento experimental foi de blocos ao acaso com duas repetições (piquetes) e sete tratamentos (pastejos). O critério de bloqueamento foi o declive do terreno. Os dados das variáveis de valor nutritivo foram submetidos à análise de regressão, retirando-se o efeito dos piquetes, sendo escolhida a melhor equação, ajustada de acordo com o coeficiente de determinação e a significância dos coeficientes de regressão. O seguinte modelo estatístico foi utilizado: YIJ = µ + bi + b1xij + eij, em que YIJ são os parâmetros estimados; i, o índice de piquetes; j, o índice de pastejos; µ, a média geral; bi, o efeito dos piquetes; b1, o coeficiente de regressão entre os dados de pastejo e os parâmetros estimados; xij, os dados de pastejo em dias; e eij, o resíduo. Para auxiliar na discussão e no entendimento dos resultados, incluíram-se os dados quantitativos do pasto e do desempenho animal utilizados nas análises de correlação, além das variáveis de valor nutritivo. Adotou-se o nível de significância de 5%. As análises de regressão e correlação foram realizadas com auxílio do programa estatístico SAS (1997).

Resultados e Discussão

Durante a avaliação, foram conduzidos sete ciclos de pastejo três – no período hibernal e quatro no estival, com tempo médio de 44 e 40 dias, respectivamente. Considerando-se que, no período estival, a maior contribuição foi do capim-elefante (Tabela 1), o tempo de pastejo verificado está dentro das recomendações de Hillesheim (1995), segundo as quais podem-se obter valores de digestibilidade verdadeira acima de 65%, mantendo-se períodos de crescimento de 42 dias, aproximadamente. Ciclos mais curtos poderiam ser observados caso a distribuição de chuvas, entre os meses de dezembro e março (mantida abaixo de 40% da média climática da região), tivesse sido regular. Segundo Deresz (2001), vacas submetidas ao pastejo de capim-elefante com 30 dias de descanso produzem mais leite em relação àquelas sob pastejo com período de descanso de 45 dias.

Observa-se que a massa de forragem inicial média por pastejo foi menor no período estival, em decorrência da roçada efetuada no início da primavera. A biomassa de lâminas foliares do capim-elefante, no entanto, foi maior nesse período (Tabela 1).

A menor contribuição de lâmina foliar do capim-elefante (1,9%) ocorreu no segundo pastejo, em agosto, em razão da ação cumulativa do frio e das geadas. Nos demais pastejos do período hibernal, em junho e setembro, a participação foi de 8,9%.

A massa de forragem das espécies de crescimento espontâneo entre as touceiras do capim-elefante foi constituída basicamente pelo Paspalum conjugatum e gervão (Stachytarphetta polyura Schauer). Também no período estival, verificou-se maior participação de outras espécies. No período hibernal, a pequena participação das espécies de crescimento espontâneo decorre da presença de aveia e azevém.

A taxa de lotação verificada durante o período estival pode ser considerada baixa se comparada aos resultados de pesquisas conduzidas em pastos de capim-elefante estabelecidos singularmente, nas quais foram obtidos valores entre 3,05 (Lima et al., 2004), 4,0 (Ruviaro, 1994) e 4,5 vacas/ha (Deresz, 2001), com níveis variáveis de complementação alimentar. Deve-se considerar, no entanto, que as espécies de crescimento espontâneo produzem menor massa de forragem que o capim-elefante (Sobczak et al., 2005; Olivo et al., 2006) e que os resultados de pesquisa utilizados para comparação, normalmente, avaliam períodos mais curtos, coincidindo com o ápice de produção do capim, obtendo-se, assim, lotações mais altas. Durante o período hibernal, a lotação obtida foi semelhante às médias normalmente encontradas em pastos constituídos por aveia e azevém, com nível similar de adubação (Rocha et al., 2003). Olivo (1982), trabalhando com esse consórcio de forrageiras, obteve lotação de 2,0 vacas/ha, mas com maior complemen-tação alimentar dos animais.

Com relação à utilização do pasto, no qual se considerou a oferta de forragem entre 8 e 10 kg de MS/100 kg de peso vivo, estima-se que este manejo não tenha influenciado a avaliação do valor nutritivo. Esta ponderação baseia-se no resíduo de lâmina foliar médio (20,5%), mantido no período estival, que está próximo das recomendações de Hillesheim (1995), considerando-se o manejo e a perenização do capim e no período hibernal, pelo resíduo de pós-pastejo do consórcio constituído por aveia e azevém.

Observou-se comportamento quadrático ascendente para o teor de PB do pasto anual de inverno, justificado pela maior participação do azevém, que apresenta melhor qualidade e é mais tardio em relação à aveia (Tabela 2). Para o capim-elefante, verificou-se comportamento cúbico com início ascendente. Considerando-se ambos os períodos (hibernal e estival), as médias de PB do capim-elefante foram de 17,17 e 13,37%, respectivamente, sendo estatisticamente diferentes (P<0,05). Questionam-se os valores obtidos no período hibernal com teores entre 14,7 e 18,8%. Estes teores são similares e até mesmo superiores a alguns pastos cultivados de inverno (Kessler, 1995) que, convencionalmente, apresentam valores mais altos de PB que as de ciclo estival (Euclides et al., 1992). Trabalhando na estação seca, em Minas Gerais, com capim-elefante cv. Napier, sob diferentes períodos de ocupação, Fonseca et al. (1998) observaram valores de PB de 6,84 e 7,78%, em 1994 e 1995, respectivamente. Botrel et al. (2000), avaliando diferentes cultivares de capim-elefante nos períodos seco e chuvoso, verificaram valores médios de 11,53 e 7,22%, respectivamente. Polli (1992), estudando diferentes cultivares de capim-elefante no Rio Grande do Sul, verificou teores de PB de 6,43% em janeiro e 13,36% em julho, valores semelhantes aos observados neste trabalho, em que os teores de PB do capim-elefante foram mais elevados no período hibernal.

Durante o período estival, observa-se (Figura 1) que o maior teor de PB (15,99%) ocorreu no último pastejo, efetuado em abril. Segundo Poli (1992), as plantas, ao se desenvolverem, elevam seus teores de MS, parede celular, celulose, fibra e lignina e diminuem os de PB e DIVMS, comportamento mais acentuado no verão, época em que o crescimento das plantas tropicais é mais intenso, em relação ao inverno. Comportamento similar ao deste trabalho foi verificado por Kessler (1995), no cv. Porto Rico HB 534-A, ao obter, entre dezembro e abril, teores crescentes de PB, em amostras colhidas por simulação de pastejo. Segundo este autor, este comportamento se deve ao estímulo à rebrota, após o pastejo inicial, havendo maior participação de folhas mais novas que normalmente apresentam maior teor de PB e digestibilidade. Townsend et al. (1994), trabalhando também na região central do RS com a mesma cultivar, verificaram teores de PB de 10,3; 8,0 e 5,8% para a parte aérea da planta (corte a 20 cm do solo), para a seqüência de três ciclos de pastejo, de novembro a março; de 15,5; 9,8 e 8,1% para as folhas; e de 8,9; 11 e 10,9%, em amostras de simulação de pastejo. Prosseguindo esta pesquisa, no ano seguinte, Ruviaro (1994) verificou, em avaliação de curta duração (cerca de dois meses), teor médio de 19,3%. Valores médios dos teores de PB próximos aos verificados neste trabalho foram encontrados por Aroeira et al. (1999) e Lima et al. (2004). Deresz (2001) verificou teor médio de 15,6%, também obtido com amostras de simulação de pastejo, entre os meses de janeiro e abril.


Considerando-se as médias obtidas (Tabela 2), a correlação encontrada entre a PB e a biomassa de lâmina foliar (-0,6332; P= 0,0194) indica que, no período hibernal, a carga suportada pelo pasto foi menor, embora este apresentasse melhor qualidade.

As espécies de crescimento espontâneo de ciclo estival, com destaque para o gênero Paspalum, apresentaram valor de PB similar ao capim-elefante (Tabela 2), confirmando as observações de Euclides et al. (1992) de que há pouca diferença no valor nutritivo de forrageiras tropicais, quando comparadas sob as mesmas condições. Valores próximos às médias de PB do capim-elefante observadas neste trabalho (Tabela 2) foram obtidos por Veiga (1985), no cv. Anão, com teores entre 12,6 e 15,2%.

Verificou-se menor valor (P<0,05) dos teores de FDN do pasto no período hibernal, em decorrência da presença de aveia e azevém e também do capim-elefante (Tabela 2), corroborando os menores valores de FDN (P<0,05) verificados nessas espécies no referido período. Para os teores de FDN do capim-elefante, verificou-se efeito cúbico, com início descendente (Figura 1). O comportamento desta variável foi antagônico ao da PB e da digestibilidade. Essa relação, normalmente esperada, é confirmada pela correlação inversa verificada entre o teor de FDN do capim-elefante com a PB (-0,6783; p= 0,077) e a DIVMS do capim (-0,9199; P=0,0001).

A diminuição no teor de FDN no decorrer do período hibernal, de 58,3 para 46,7% nos meses de agosto e setembro, respectivamente, indica melhoria de sua qualidade justificada, em parte, pela rebrota do capim-elefante nos meses de agosto e setembro, em decorrência da elevação gradual da temperatura e do fotoperíodo. No início do período estival, ocorreu aumento da FDN do capim-elefante, justificado pela maior produção de massa de forragem (Kessler, 1995), elevando-se também os teores de celulose (Euclides et al., 1992). A análise de correlação entre o teor de FDN e a biomassa de lâminas foliares do capim-elefante (0,5762; P = 0,031) confirma a referida assertiva. As médias de FDN entre os períodos (Tabela 2) demonstram que os valores mais elevados (P<0,05) foram obtidos no período estival.

Deresz (2001) na estação das águas, obteve valores de FDN entre 66,5 e 67,2%, avaliando períodos de descanso de 30 e 45 dias, respectivamente. Lima et al. (2004) obtiveram teores de 76,3 e 75,1% para as folhas de capim-elefante no pré e pós-pastejo, respectivamente, com períodos de descanso de 40 dias.

Para os teores de DIVMS do pasto (Tabela 2), verificou-se diferença entre as médias (P<0,05), observando-se maiores valores no período hibernal, em razão da presença do consórcio constituído por aveia e azevém, com teores entre 84,5 e 89,1%. Para a DIVMS do capim-elefante, verificou-se efeito cúbico, com início ascendente (Figura 1). Esse comportamento foi análogo ao do teor de PB, sendo confirmado pela correlação encontrada entre os parâmetros (0,5849; P = 0,028). A associação inversa verificada entre a DIVMS e a porcentagem de lâminas foliares do capim-elefante (-0,5983; P = 0,0238) indica que a melhor qualidade desta forrageira foi observada durante o período hibernal, sendo confirmada pela diferença (P<0,05) encontrada entre as médias obtidas (Tabela 2).

Analisando-se o período estival, pesquisas conduzidas com o mesmo cultivar sob nível similar de adubação nitrogenada normalmente apontam declínio na digestibilidade.

Townsend et al. (1994) observaram teores de 63,6 e 59,0% para a seqüência de três ciclos de pastejo. Niederauer (1993) verificou valores de 64,8; 60,1 e 58,5% para folhas também em três avaliações, de novembro a março. Kessler (1995), no entanto, verificou aumento na DIVMS do capim-elefante, observando valores de 64,7 e 69,1%, nos meses de dezembro e abril, respectivamente.

Associando-se as variáveis de valor nutritivo do capim-elefante ao desempenho animal obtido no pasto, observou-se comportamento inverso da lotação com a PB (- 0,6147; P= 0,0194), não sendo verificadas correlações com a DIVMS e a FDN. Considerando-se o valor nutritivo do pasto, verificou-se relação inversa da lotação com a PB (-0,7193; P = 0,0037) e direta com a FDN (0,6177; P = 0,0186). Estes resultados confirmam que, no período estival, o desempenho animal foi melhor, embora as variáveis de valor nutritivo tenham sido inferiores.

Conclusões

As variáveis de valor nutritivo avaliadas foram melhores no período hibernal em comparação ao estival. Este comportamento está associado inversamente à biomassa de lâminas foliares do capim-elefante. Porém, a produtividade foi superior no período estival, em razão da maior biomassa de lâminas foliares do capim-elefante, se comparada ao período hibernal.

O capim-elefante em consorciação com espécies forrageiras de ciclos estival e hibernal, manejado sob princípios agroecológicos, pode ser utilizado no decorrer do ano agrícola, em região climática similar à deste trabalho, por seu potencial de produção de massa de forragem e valor nutritivo.

Literatura Citada

Recebido: 8/5/2006

Aprovado: 4/6/2007

Correspondências devem ser enviadas para: clairo@ccr.ufsm.br

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Nov 2007
  • Data do Fascículo
    Dez 2007

Histórico

  • Aceito
    04 Jun 2007
  • Recebido
    08 Maio 2006
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