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Desempenho de bovinos jovens alimentados com dietas contendo grão úmido de milho ou sorgo

Performance of young cattle fed diets with high moisture corn or sorghum

Resumos

Objetivou-se com este estudo verificar diferenças no desempenho de animais jovens alimentados com dietas contendo grão úmido de milho ou sorgo. Utilizaram-se dois tratamentos experimentais, nos quais a dieta total possuía, como ingrediente energético principal, grão úmido de milho (TMU) ou grão úmido de sorgo (TSU). Noventa novilhos inteiros F1 Red Angus <FONT FACE=Symbol>´</FONT> Nelore, com 8 meses de idade e 240 kg de peso vivo médio inicial, foram alimentados durante 172 dias e divididos nos dois tratamentos, segundo delineamento inteiramente casualizado. Não foi verificada diferença para ganho de peso diário, ganho de peso total e peso final de abate. Com relação à carcaça, a área de olho-de-lombo, a espessura de gordura subcutânea e a espessura de gordura na garupa também não diferiram estatisticamente entre os tratamentos. Concluiu-se que a substituição integral do TMU pelo TSU não alterou o desempenho de bovinos jovens em confinamento.

Nelore; nutrição; Red Angus; ruminantes; silagem; superprecoce


The differences on performance of young cattle fed diets with high moisture corn or sorghum were evaluated in two treatments, where the main energy source of the total diet was composed of high moisture corn (HMC) or sorghum (HMS). Ninety Angus <FONT FACE=Symbol>´</FONT> Nelore crossbred young bulls, averaging 8 month of age and 240 kg BW and fed during 172 days were allotted to two experimental treatments as a completely randomized design. No treatment effect on average daily gain, total weight gain and slaughter final weight was observed. Regarding the carcass, ribeye area, subcutaneous fat thickness and rump fat thickness also did not differ between treatments. In conclusion, the totally replacement of high moisture corn by high moisture sorghum did not affect performance of feedlot young cattle.

Nelore; nutrition; Red Angus; ruminant; silage; young cattle


RUMINANTES

Desempenho de bovinos jovens alimentados com dietas contendo grão úmido de milho ou sorgo1 1 Bolsa concedida pela CAPES

Performance of young cattle fed diets with high moisture corn or sorghum

Mauricio Scoton IgarasiI; Mário de Beni ArrigoniII; André Alves de SouzaI; Antonio Carlos SilveiraII; Cyntia Ludovico MartinsII; Henrique Nunes de OliveiraII

IPrograma de Pós-graduação em Zootecnia

IIDepartamento de Melhoramento e Nutrição Animal - FMVZ/UNESP, Botucatu, SP

RESUMO

Objetivou-se com este estudo verificar diferenças no desempenho de animais jovens alimentados com dietas contendo grão úmido de milho ou sorgo. Utilizaram-se dois tratamentos experimentais, nos quais a dieta total possuía, como ingrediente energético principal, grão úmido de milho (TMU) ou grão úmido de sorgo (TSU). Noventa novilhos inteiros F1 Red Angus ´ Nelore, com 8 meses de idade e 240 kg de peso vivo médio inicial, foram alimentados durante 172 dias e divididos nos dois tratamentos, segundo delineamento inteiramente casualizado. Não foi verificada diferença para ganho de peso diário, ganho de peso total e peso final de abate. Com relação à carcaça, a área de olho-de-lombo, a espessura de gordura subcutânea e a espessura de gordura na garupa também não diferiram estatisticamente entre os tratamentos. Concluiu-se que a substituição integral do TMU pelo TSU não alterou o desempenho de bovinos jovens em confinamento.

Palavras-chave: Nelore, nutrição, Red Angus, ruminantes, silagem, superprecoce

ABSTRACT

The differences on performance of young cattle fed diets with high moisture corn or sorghum were evaluated in two treatments, where the main energy source of the total diet was composed of high moisture corn (HMC) or sorghum (HMS). Ninety Angus ´ Nelore crossbred young bulls, averaging 8 month of age and 240 kg BW and fed during 172 days were allotted to two experimental treatments as a completely randomized design. No treatment effect on average daily gain, total weight gain and slaughter final weight was observed. Regarding the carcass, ribeye area, subcutaneous fat thickness and rump fat thickness also did not differ between treatments. In conclusion, the totally replacement of high moisture corn by high moisture sorghum did not affect performance of feedlot young cattle.

Key Words: Nelore, nutrition, Red Angus, ruminant, silage, young cattle

Introdução

A maior eficiência na conversão de alimento em carne em animais jovens é citada por diversos autores (Myers et al., 1999; Schoonmaker et al., 2002a, b), sendo resultado dos menores requerimentos energéticos de mantença, o que proporciona maior direcionamento da energia para ganho de peso (NRC, 1996). A eficiência de ganho de peso e as características de carcaça são os maiores determinantes da eficiência de sistemas de produção de carne bovina.

Ressaltando a importância da manipulação de fontes energéticas na nutrição animal, a fim de obter otimização entre eficiência biológica e econômica, verifica-se que as fontes de amido mais comumente utilizadas são os grãos de cereais, especialmente o milho e o sorgo, nos quais o amido representa aproximadamente 70% da matéria seca - MS (Rooney & Pflugfelder, 1986). Schoonmaker et al. (2002a) discutiram que os sistemas produtivos de bovinos jovens inteiros sob dietas de alta densidade energética, ou seja, dietas de alto grão possibilitaram excelentes resultados no desempenho e nas características de carcaça.

Jobim & Reis (2001) descreveram que os grãos de milho, mesmo quando triturados ou parcialmente quebrados, são protegidos pelo pericarpo, o qual é muito resistente à degradação microbiana e à digestão enzimática no intestino delgado. Estudos com silagem de grãos úmidos de milho constataram aumento na digestibilidade da matéria orgânica, principalmente em razão do aumento na digestão do amido, o que torna a ensilagem de grãos úmidos uma notável alternativa na estratégia nutricional para a alimentação animal (Huntington, 1997).

Além da considerável melhoria no desempenho animal, a silagem de grãos úmidos representa interessantes vantagens agronômicas, como antecipação da colheita em cerca de 30 dias (otimização do uso da terra) e redução nas perdas no campo (fatores climáticos, ataque de insetos e pássaros predadores) e nas perdas qualitativas e quantitativas do grão durante a armazenagem (Costa et al., 1999).

A silagem de grão úmido pode ser definida como o produto da conservação em meio anaeróbio de sementes ou grãos de cereais logo após a maturação fisiológica, com teor de umidade em torno de 28%, na amplitude de 25 a 30%. O processo de fermentação da ensilagem de grãos com alta umidade tem como princípio a fermentação bacteriana, destacando-se o nível de oxigênio (anaerobiose), a concentração de carboidratos solúveis, a umidade e a população microbiana como características que afetam o processo (Costa et al., 1999).

O grão úmido deve ser colhido quando atingir a maturidade fisiológica, momento em que não ocorre mais depósito de nutrientes no grão e este atingiu maior peso seco. O milho alcança esse estado fisiológico em torno de 30 a 35% de umidade no grão e o sorgo, de 25 a 30%, segundo Clark (1988). Jobim & Reis (2001) relataram que o ponto ideal para a colheita do milho será quando o grão apresentar entre 32 e 35% de umidade, em torno de 50 dias após a polinização, momento em que a espiga apresenta brácteas secas e a formação de uma lâmina preta na base do grão.

O processamento de grãos úmidos de milho e sorgo através da ensilagem promove alterações químicas e físicas nas moléculas do amido, facilitando a ação das enzimas amilolíticas na digestão microbiana e das enzimas pancreáticas na digestão que ocorre no intestino delgado (Owens et al., 1997).

O aumento da degradabilidade ruminal do amido tem-se mostrado vantajoso no sentido de maximizar a capacidade fermentativa do rúmen, elevando a síntese da proteína microbiana e a produção de ácidos graxos voláteis, particularmente do ácido propiônico, o principal precursor gluconeogênico em ruminantes (Rooney & Pflugfelder, 1986). O resultado final pode ser o maior fluxo líquido de energia na veia porta, aumento na síntese de glucose pelo fígado e maior disponibilidade de aminoácidos para síntese da proteína muscular (Theurer et al., 1995).

Ladely et al. (1995) trabalharam com diferentes dietas para novilhos em terminação, observando menor consumo de MS, maior ganho de peso e, portanto, maior conversão alimentar quando os animais foram alimentados com silagem de milho úmido em relação aos alimentados com grão seco laminado. Hibberd et al. (1985) observaram aumento significativo na digestibilidade da proteína quando grãos úmidos de milho ou de sorgo substituíram grãos secos moídos nas dietas de novilhos em crescimento.

O grão úmido de sorgo também apresenta elevação na digestibilidade. Em experimento com novilhos canulados no duodeno e no íleo, Hill et al. (1991) verificaram maior digestibilidade ruminal e total do grão de sorgo úmido quando comparado ao grão de sorgo seco.

A utilização de grãos de sorgo nas dietas de bovinos tem aumentado nos últimos anos, devido, principalmente, aos seus benefícios agronômicos (resistência à seca, fungos e predadores). Muitos produtores não utilizam o grão de sorgo pela sua qualidade variável e seu menor valor nutritivo em relação ao milho. Variações na digestibilidade e, conseqüentemente, no desempenho animal podem ser explicadas parcialmente pelos efeitos de variedade (genótipo) e pelas técnicas de processamento (Hibberd et al., 1985). Dependendo do processamento físico do grão para a alimentação, o sorgo tem apresentado 85 a 100% do valor nutricional do milho e valor econômico em torno de 90% do valor do milho, no sistema de produção dos Estados Unidos (Pedersen et al., 2000).

Costa et al. (1999) destacaram que, no Brasil, ainda são escassas as informações no meio científico sobre o uso da silagem de grãos úmidos na alimentação animal, apesar do crescente emprego desta tecnologia no setor produtivo, especialmente de bovinos em sistemas intensivos de produção. Nesse sentido, objetivou-se, com este trabalho, verificar a viabilidade de utilização da silagem de grão úmido de sorgo em substituição total à silagem de grão úmido de milho, na resposta ao desempenho de bovinos jovens em confinamento.

Material e Métodos

O experimento foi desenvolvido no Confinamento Experimental do Projeto Temático Crescimento de Bovinos de Corte no Modelo Biológico Superprecoce da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, UNESP, campus de Botucatu. Os animais, oriundos de fazenda comercial, foram criados do nascimento à desmama em pastagens cultivadas (Panicum maximun) e receberam suplementação de concentrado no sistema de creep-feeding. Após o desmame, os animais foram confinados em instalações do experimento, sendo identificados e tratados contra endo e ectoparasitas.

Noventa bezerros F1 Red Angus ´ Nelore, machos inteiros e desmamados com aproximadamente 210 dias de idade, foram distribuídos aleatoriamente em seis baias (10x 30 m), com 15 animais em cada uma. Assim, totalizaram-se dois tratamentos com três baias cada.

A colheita do grão úmido de milho e de sorgo foi realizada com uma colheitadeira automotriz e os grãos resultantes, moídos e acondicionados em silos tipo "bag". O milho (híbrido 333B – Dekalb) foi colhido no estádio de maturação fisiológica e o sorgo (híbrido 3KB58 - Dekalb), com aproximadamente 70% de MS nos grãos.

Os tratamentos foram constituídos por dieta total com silagem de grão úmido de milho, como ingrediente energético principal (TMU), e dieta total com silagem de grão úmido de sorgo, como ingrediente energético principal (TSU). As dietas foram formuladas com a utilização do Software CNCPS versão 4.0 (CNCPS, 2000), de modo a serem isoenergéticas e isoprotéicas para os tratamentos experimentais, objetivando-se ganho de 1,4 kg.dia-1 (Tabela 1).

O premix foi formulado para atender às exigências mineral e protéica dos animais (Tabela 2). A composição química-bromatológica dos ingredientes constituintes da dieta está apresentada na Tabela 3.

Os animais receberam ração total ad libitum, fornecida duas vezes ao dia, às 9 e 16 h. O consumo da dieta foi mensurado pela pesagem do alimento fornecido diariamente, sendo calculado o total fornecido a partir de uma análise visual de sobra no cocho, para que não ultrapassasse valores superiores a 5% do total fornecido diariamente.

Foram coletadas amostras das dietas experimentais fornecidas a cada sete dias, formando uma amostra composta para um período de 28 dias, que foram acondicionadas em sacos plásticos e armazenadas em freezer (-4ºC) para análises posteriores.

O pH da silagem foi medido por intermédio de um potenciômetro digital (Digimed TE-902). Os teores de MS, matéria mineral (MM), proteína bruta (PB) e extrato etéreo (EE) foram analisados segundo os protocolos da AOAC (1990), ao passo que os de fibra em detergente neutro (FDN), fibra em detergente ácido (FDA) e lignina, segundo metodologia proposta por Van Soest et al. (1991). A correção de cinzas foi realizada no cálculo de FDN e FDA. Os teores de NDIN e NIDA foram mensurados conforme metodologia proposta por Krishnamoorthy et al. (1982) e os de carboidratos não-fibrosos (CNF) e NDT, pelas fórmulas sugeridas por Weiss (NRC, 2001).

O período experimental foi de 172 dias, em que os 40 primeiros foram destinados à adaptação dos animais às dietas experimentais. A avaliação do desempenho animal (ganho de peso diário - GPD, ganho de peso total - GP e peso final - PF) foi realizada com a efetuação de pesagens em intervalos de 28 dias, sempre antes da primeira refeição do dia (9 h) e com jejum alimentar de sólidos de 16 horas. O peso vivo inicial foi obtido após a fase de adaptação.

A avaliação das características de carcaça (área de olho-de-lombo - AOL e espessura de gordura subcutânea - EGS) dos animais foi realizada a partir de imagens obtidas entre a 12ª e 13ª costelas, conforme metodologia descrita por Herring et al. (1994), por um profissional treinado e habilitado. Na ocasião da última pesagem dos animais experimentais, foi mensurada a espessura de gordura na altura garupa do animal (picanha, junção entre Bíceps femoris e gluteos medius). Foi utilizado o aparelho de ultra-sonografia veterinária PIE MEDICAL - Scanner 200, com uma sonda linear de 17,2 cm e 3,5 MHz (Sector Curved Array Scanner, modelo 51B04UM02). As imagens foram analisadas em softwares específicos para o aparelho (PIE MEDICAL, Inc.)

O experimento caracterizou-se em um delineamento inteiramente casualizado, com dois tratamentos (TMU e TSU) e 45 repetições por tratamento. Cada animal correspondeu a uma unidade experimental. A análise dos dados obtidos das diversas variáveis foi realizada pelo procedimento GLM (General Linear Model) (SAS, 1998). Utilizou-se o teste Tukey para comparação das médias entre as causas de variação, adotando-se nível de significância de 5%.

Resultados e Discussão

Comparando-se a densidade energética dos dois grãos de cereais ensilados sob alta umidade, verificou-se que o sorgo obteve 98,8% do NDT do milho (Tabela 3). Os valores obtidos neste experimento corroboram os verificados por Huck et al. (1999), sendo que a silagem de grão úmido de sorgo apresentou 96% da energia líquida para ganho de peso do milho floculado, de 1,60 e 1,68 Mcal/kg, respectivamente. Resultados semelhantes foram apresentados por Rooney & Pflugfelder (1986), sendo que várias pesquisas indicam que o sorgo apresenta valor nutricional de 93 a 96% em comparação ao do milho.

O desempenho animal não foi influenciado estatisticamente pelos tratamentos com diferentes ingredientes energéticos da dieta (milho ou sorgo), uma vez que as variáveis peso vivo final (PVF), ganho de peso diário (GPD), AOL, EGS e espessura de gordura na garupa (EGG) não apresentaram diferença (P>0,05) entre os tratamentos (Tabela 4). Resultados semelhantes foram obtidos por Passini et al. (2003), que, avaliando a terminação de novilhos superprecoces sob dietas à base de ingredientes energéticos de silagem de grão úmido de sorgo ou grão seco de milho, também não verificaram diferença no GPD, PVF, na EGS e AOL.

Huck et al. (1999) também não verificaram diferença no desempenho e nas características de carcaça de novilhas alimentadas com silagem de grão úmido de sorgo a 35% de umidade e milho floculado, quando fornecidos em iguais proporções da dieta total (78% da MS total da dieta). Segundo esses autores, a umidade do grão entre 30 e 35% acarretou melhoria no processo fermentativo, com aumento na produção de ácido láctico, proporcionando redução mais acentuada no pH. Houve também aumento de 6% na eficiência de ganho, quando se elevou a umidade de 25 para 35% na ensilagem do grão de sorgo, devido, principalmente, à maior disponibilidade do amido às enzimas amilolíticas.

Theurer (1986), sumarizando vários trabalhos com diferentes formas de processamento do grão de cereais, verificou maior digestibilidade ruminal para o amido proveniente do milho (7 a 9 pontos percentuais) em relação ao amido proveniente do sorgo. Analisando-se os dados de digestibilidade in vitro de Pedersen et al. (2000), nota-se que o sorgo seco apresentou digestibilidade da MS e do amido 14,3 e 15,6% inferiores em relação ao grão seco de milho, respectivamente. Também trabalhando com silagem de grãos de alta umidade, Huntington (1997) verificou valores para a digestibilidade ruminal do amido do milho e sorgo de 89,9 e 73,2%, respectivamente, sendo o sorgo 18,6% menos degradado no rúmen que o milho.

Galyean et al. (1976) obtiveram valor de digestibilidade ruminal de 89,3% para o amido da silagem de grão úmido de milho, enquanto Nocek & Taminga (1991), de 86,2% para silagem de grão úmido de sorgo e entre 83 e 89% para silagem de grão úmido de milho. Passini et al. (2003) encontraram valor de digestibilidade total da MS de 93,58 e 96,71%, respectivamente, para a silagem de grão úmido de milho e a silagem de grão úmido de sorgo. Com base na revisão de trabalhos citados na literatura, infere-se que a degradabilidade do grão úmido de sorgo situa-se entre +3 e -20% em relação à degradabilidade do grão úmido de milho (Theurer, 1986; Huntington, 1997; Pedersen et al, 2000; Passini, 2001).

Considerando-se menor degradabilidade ruminal para o sorgo em relação ao milho, esperar-se-ia maior quantidade de grão de sorgo digerido pós-rúmen, principalmente no intestino delgado, o que pode explicar resultados de desempenho semelhantes entre os dois tratamentos testados neste trabalho. O questionamento sobre a eficiência da digestão intestinal do amido foi amplamente discutido na década de 80, destacando-se como fatores limitantes a quantidade de enzimas (Orskov, 1986) ou a superfície para a atuação enzimática e o tempo de passagem da digesta pelo trato digestivo (Owens et al., 1986). Contudo, Hill et al. (1991) verificaram que maiores quantidades de amido atingindo o intestino delgado ocasionaram aumento na digestão intestinal do amido, promovendo correlação linear positiva nessas duas variáveis (r2 = 0,99). A mesma correlação foi verificada no intestino grosso (r2 = 0,71).

Richards et al. (2002) verificaram que, em ruminantes alimentados com dietas em que alta quantidade de amido atingiu o duodeno, aumentou-se a quantidade de amido desaparecido pós-rúmen, uma vez fornecida proteína simultaneamente para o intestino delgado. Concordando, Hibberd et al. (1985) descreveram que aumentos na digestão de amido no intestino delgado são possíveis com o fornecimento adequado de proteína metabolizável. Esses autores relataram que maiores teores de proteína metabolizável atingindo o duodeno promovem maior liberação de enzimas amilolíticas, elevando a digestão intestinal de amido. As dietas experimentais utilizadas apresentaram valores de proteína metabolizável suficientes para ganho de peso de 1,92 e 1,79 kg.dia-1, para os tratamentos experimentais TMU e TSU, respectivamente. Assim, o teor de proteína metabolizável nas dietas pode ter possibilitado a digestão de elevadas quantidades de amido no intestino.

A literatura cita alta digestibilidade intestinal e total para a silagem de grão úmido de sorgo. Em sua revisão, Huntington (1997) sumarizou digestibilidade intestinal do amido de 46% e total de 92,8%, considerando-se o grão úmido de sorgo. Hibberd et al. (1985), trabalhando com grão de sorgo reconstituído (grão seco ensilado com acréscimo de água até atingir 30% de umidade), sendo duas variedades em relação ao teor de tanino, verificaram que 67,5 e 70,9% do amido que atingiu o intestino delgado foi digerido nesse sítio, enquanto 94,8 e 98,4% do amido consumido foi digerido no trato total, respectivamente, para a variedade de alto e baixo tanino. Os autores também verificaram que 95,2% do tanino foram degradados no rúmen.

Geralmente, o processamento de grãos é associado a aumento na eficiência de utilização de nutrientes pelos microrganismos ruminais e no trato total (Nocek & Taminga, 1991). Contudo, caso grande parte do amido seja digerido no rúmen, menores quantidades absolutas serão digeridas na porção pós-rúmen, devido à reduzida quantidade de digesta potencialmente digestível deixando o rúmen (Richards et al., 2002). Assim, materiais com menor degradabilidade ruminal, mas potencialmente digestíveis na porção intestinal, como o caso da silagem de grão úmido de sorgo, podem ser digeridos em maiores quantidades no intestino, em razão da maior quantidade de amido escoando pós-rúmen (Nocek & Taminga, 1991). Esses autores encontraram correlação significativa (P<0,001), de 0,82, entre a elevação da quantidade de amido escapando do rúmen e a quantidade de amido digerida nos intestinos.

Outra questão que envolve a eficiência da digestão intestinal do amido é o consumo de glicose pelo metabolismo dos tecidos viscerais (PDV, portal drain viscera). O fluxo líquido de glicose na veia porta, que é a diferença entre absorção de glicose pelo intestino e o gasto de glicose pelos tecidos vicerais, reflete em ganhos no desempenho animal. Na revisão de Nocek & Taminga (1991), nota-se que a energia metabolizável utilizada pelo PDV em novilhas foi superior em dietas com maior teor de volumoso do que em dietas com maior teor de concentrado, tendo o custo da energia de mantença aumentado em mais de 50%, em decorrência do metabolismo digestivo. Wheighart et al. (1986) realizaram uma análise de regressão e verificaram fluxo líquido positivo de glicose na veia porta (pós PDV), quando o consumo diário de energia digestível foi superior a 23 Mcal. Nesse sentido, infere-se que, em algumas dietas de alto concentrado, assim como as deste experimento (Tabela 3), poderia ter ocorrido menor consumo de glicose pelos tecidos viscerais, promovendo maior desempenho dos animais.

O processamento de grão de cereais tem sido reportado como o responsável pelo aumento no desempenho animal (Galyean et al., 1979; Zinn et al., 2002), devido à elevação da energia líquida da dieta (NRC, 1996). Entretanto, Fulton et al. (1979) constataram que aumentos na degradabilidade ruminal do amido de cereais, graças ao seu processamento, podem ser não compensadores, em razão da excessiva produção de ácidos graxos no rúmen, retratando uma situação de acidose subclínica, o que pode resultar em desempenhos similares entre animais alimentados com dietas com diferentes níveis de processamento de grãos. Gorocica-Buenfil & Loerch (2005), alimentando animais jovens em confinamento com milho moído finamente ou grão inteiro, verificaram que o processamento do grão não promoveu benefícios adicionais, sendo que o ganho de peso, a eficiência alimentar e as características de carcaças não foram alterados, devido, provavelmente, a distúrbios ruminais.

Nesse mesmo sentido, a utilização conjunta de fontes de amido com diferentes degradabilidades apresenta efeito associativo pela diminuição do risco do quadro de acidose subclínica, promovida pela dieta de ruminantes com alta concentração de grãos (Stock et al., 1991; Gorocica-Buenfil & Loerch, 2005). Mendonza et al. (1998) citaram que, na Universidade de Nebraska, nove estudos realizados com a utilização combinada de grão úmido de milho (67 a 75% da dieta) e grão de sorgo laminado (33 a 25%), resultaram em ganho de peso 2,7% superior e 4,6% mais eficiente que a média obtida nos animais alimentados com os dois grãos isolados, devido, possivelmente, ao efeito associativo da utilização de fontes de amido de diferentes degradabilidades ruminais.

A menor degradabilidade ruminal da silagem de grão úmido de sorgo, em comparação à silagem de grão úmido de milho, provavelmente foi compensada pelos benefícios obtidos com a diminuição dos riscos de distúrbios ruminais e o aumento na digestão intestinal. A explicação da similaridade em desempenho animal entre as duas dietas experimentais não é totalmente clara, sendo provavelmente o resultado de interações características do amido ´ digestão pós-rúmen ´ acidose subclínica.

Conclusões

A utilização de grão úmido de sorgo, em relação ao grão úmido de milho, como principal ingrediente energético da dieta, não alterou o desempenho de bovinos jovens, em confinamento, alimentados com dieta de alto grão.

Literatura Citada

Este artigo foi recebido em 26/1/2006 e aprovado em 17/9/2007

Correspondências devem ser enviadas para msigarasi@hotmail.com

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    Bolsa concedida pela CAPES
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Mar 2008
    • Data do Fascículo
      Mar 2008

    Histórico

    • Aceito
      17 Set 2007
    • Recebido
      26 Jan 2006
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