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Zona de conforto térmico de ovinos da raça Santa Inês com base nas respostas fisiológicas

Thermal comfort zone of Santa Ines sheep based on physiological responses

Resumos

Objetivou-se estabelecer a zona de conforto térmico para ovinos da raça Santa Inês por meio da comparação das respostas fisiológicas em diferentes opções de temperatura em câmara bioclimática. O experimento teve duração de 71 dias e foi conduzido utilizando-se sete borregas da raça Santa Inês por tratamento. Os tratamentos foram as faixas de temperatura de 10, 15, 20, 25, 30, 35 e 40°C, com três repetições (dias de exposição) e cinco dias de intervalo. O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado. Os dados meteorológicos coletados foram temperatura de bulbo seco, temperatura de bulbo úmido e temperatura de globo negro e os fisiológicos, frequência respiratória, frequência cardíaca, temperatura retal, temperatura timpânica, taxa de sudação e pressão arterial. Os mecanismos fisiológicos de dissipação de calor mostraram-se eficientes em manter a homeotermia dos animais em todas as temperaturas avaliadas. A temperatura de 25°C pode ser considerada a zona de conforto térmico para borregas da raça Santa Inês em ambiente com umidade relativa de 65%.

borregas; câmara bioclimática; estresse térmico


The objective was to establish the thermal comfort zone for Santa Ines sheep by comparing the physiological responses at different options of temperatures in bioclimatic chamber. The experiment lasted 71 days and was conducted with the use of seven Santa Ines lambs per treatment. The treatments were temperature ranges of 10, 15, 20, 25, 30, 35 and 40ºC with tree replicates (exposure days) and a five-day interval. The experimental design was completely randomized. Meteorological data collected were: dry bulb temperature; wet bulb temperature and black globe temperature. Physiological data analyzed were: respiratory rate, heart rate, rectal temperature, tympanic temperature, sweating rate and blood pressure. The physiological mechanisms of heat dissipation are shown to be effective in maintaining the homeothermy of the animals studied at all temperatures. The temperature of 25ºC can be determined as the thermal comfort zone for Santa Ines lambs in an environment with relative humidity of 65%.

bioclimatic chamber; heat stress; lambs


RUMINANTES

Antônio Eustáquio FilhoI; Sônia Martins TeodoroII; Modesto Antônio ChavesII; Paulo Eduardo Ferreira dos SantosI; Marcos Welber Ribeiro da SilvaI, III; Rogério Mendes MurtaI, IV; Gleidson Giordano Pinto de CarvalhoV; Luiz Eduardo Barreto de SouzaI

IPrograma de Pós-graduação em Zootecnia da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB - Itapetinga, BA

IIDEBI - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB - Itapetinga, BA

IIIEmpresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola - EBDA - Itambé, BA

IVInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais - IFNMG - Salinas, MG

VDepartamento de Produção Animal - UFBA - Salvador, BA

RESUMO

Objetivou-se estabelecer a zona de conforto térmico para ovinos da raça Santa Inês por meio da comparação das respostas fisiológicas em diferentes opções de temperatura em câmara bioclimática. O experimento teve duração de 71 dias e foi conduzido utilizando-se sete borregas da raça Santa Inês por tratamento. Os tratamentos foram as faixas de temperatura de 10, 15, 20, 25, 30, 35 e 40°C, com três repetições (dias de exposição) e cinco dias de intervalo. O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado. Os dados meteorológicos coletados foram temperatura de bulbo seco, temperatura de bulbo úmido e temperatura de globo negro e os fisiológicos, frequência respiratória, frequência cardíaca, temperatura retal, temperatura timpânica, taxa de sudação e pressão arterial. Os mecanismos fisiológicos de dissipação de calor mostraram-se eficientes em manter a homeotermia dos animais em todas as temperaturas avaliadas. A temperatura de 25°C pode ser considerada a zona de conforto térmico para borregas da raça Santa Inês em ambiente com umidade relativa de 65%.

Palavras-chave: borregas, câmara bioclimática, estresse térmico

ABSTRACT

The objective was to establish the thermal comfort zone for Santa Ines sheep by comparing the physiological responses at different options of temperatures in bioclimatic chamber. The experiment lasted 71 days and was conducted with the use of seven Santa Ines lambs per treatment. The treatments were temperature ranges of 10, 15, 20, 25, 30, 35 and 40ºC with tree replicates (exposure days) and a five-day interval. The experimental design was completely randomized. Meteorological data collected were: dry bulb temperature; wet bulb temperature and black globe temperature. Physiological data analyzed were: respiratory rate, heart rate, rectal temperature, tympanic temperature, sweating rate and blood pressure. The physiological mechanisms of heat dissipation are shown to be effective in maintaining the homeothermy of the animals studied at all temperatures. The temperature of 25ºC can be determined as the thermal comfort zone for Santa Ines lambs in an environment with relative humidity of 65%.

Key Words: bioclimatic chamber, heat stress, lambs

Introdução

Em comparação às regiões de clima temperado, as regiões tropicais apresentam baixa produtividade animal, resultado de vários efeitos do ambiente, que se encontra acima do limite ideal para ótimo desempenho do rebanho.

A criação brasileira de ovinos para produção de carne tem expandido na última década. Entre as raças criadas no País, destaca-se a Santa Inês, raça nativa, deslanada e com grande variação de pelagem (Santos, 2003).

Monty Junior et al. (1991) afirmam, que mesmo em raças oriundas de regiões de clima quente, é imprescindível a avaliação da adaptabilidade das mesmas. Segundo Baccari Júnior (1990), as avaliações de adaptabilidade dos animais aos ambientes quentes podem ser realizadas por meio de testes de adaptabilidade fisiológica e de rendimento ou produção.

De acordo com Abi Saab & Sleiman (1995), os critérios de tolerância e adaptação dos animais são determinados pelas medidas fisiológicas de respiração, batimento cardíaco e temperatura corporal. A adaptação fisiológica, determinada principalmente pelas alterações do equilíbrio térmico, e a adaptabilidade de rendimento, que descreve as modificações desse rendimento quando o animal é submetido a altas temperaturas, são para McDowell (1989), as duas classes principais de avaliação da adequação a ambientes quentes. Outro parâmetro de importância na avaliação da dissipação de calor é a temperatura superficial (Santos et al., 2006).

A tolerância ao calor e a adaptabilidade a ambientes tropicais são fatores muito importantes na criação e produção ovina. O aumento da temperatura ambiente e do estresse calórico eleva a secreção do hormônio cortisol (Starling et al., 2005), provocando uma série de efeitos no metabolismo do animal que alteram seu comportamento e bem-estar (Silanikove, 2000).

Quesada et al. (2001) destacaram a necessidade do conhecimento da tolerância ao calor e da capacidade de adaptação das raças como forma de embasamento técnico para a exploração ovina, para propostas de raças em uma nova região ou mesmo para nortear um programa de cruzamento, visando à obtenção de tipos ou raças mais adequadas a uma condição específica de ambiente.

Portanto, objetivou-se estimar, por meio das respostas fisiológicas, a zona de conforto térmico de borregas da raça Santa Inês submetidas às temperaturas de 10, 15, 20, 25, 30, 35 e 40°C em câmara bioclimática.

Material e Métodos

O experimento teve duração de 71 dias e foi conduzido na Câmara Climática do Centro de Estudos Bioclimáticos (CEBIO) da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Campus Juvino Oliveira, localizado no município de Itapetinga, BA, latitude 15º18'S e longitude 40º15'W, com temperatura média anual de 27 ºC e altitude média de 268 m.

Foram utilizadas sete borregas deslanadas da raça Santa Inês, de pelagem negra, oriundas do município de Itapetinga, com peso inicial, de 43,35 ± 4,9 kg e 18 meses de idade, submetidas ao seguinte manejo pré-experimental: identificação individual com brinco auricular numerado, vacinação contra clostridiose, casqueamento, vermifugação e aplicação do polivitamínico MOV da Vallée®, para reduzir os efeitos do estresse pelo transporte e manejo.

Foi empregado um período pré-experimental de 15 dias a fim de adaptar os animais às condições de manejo (baias e dieta). Os animais foram distribuídos aleatoriamente em baias individuais de piso ripado, com bebedouros e cochos individuais (fixados na parte externa das baias), sempre na mesma disposição dos animais em todos os tratamentos.

Os fatores em estudo consistiram das temperaturas de 10, 15, 20, 25, 30, 35 e 40°C. A umidade relativa do ar no ambiente climatizado foi fixada, para todos os fatores, em 65%, com desvio médio de ± 8%.

Para todos os tratamentos, adotou-se como metodologia a exposição contínua, a cada faixa de temperatura, durante oito horas consecutivas, com três repetições (dias de exposição) e cinco dias de intervalos entre cada tratamento, a fim de eliminar possíveis efeitos residuais.

Ao término do intervalo de exposição de oito horas, a câmara bioclimática era ajustada para um ambiente preconizado como de conforto, com temperatura de 25 ºC e umidade relativa de 65%, alcançado após 30 minutos. Esse manejo experimental era repetido durante três dias seguidos.

As temperaturas de bulbo seco, bulbo úmido e de globo negro foram medidas a 1,7 m do solo, com o uso de termopares. A temperatura de bulbo úmido foi obtida encapsulando a ponta do termopar em um cordão de algodão umedecido em água destilada e, para a temperatura de globo negro, inseriram-se os termopares em globos negros (Livingston Atmometer Go.). As temperaturas foram mensuradas, de forma contínua, ao longo do período experimental (com uso da Datalogger Campbell Scientific Inc. CR23X) na câmara bioclimática. Na parte externa do CEBIO, foram instalados sensores na mesma altura utilizada no interior da câmara, para coleta de dados de temperatura de bulbo seco e de bulbo úmido utilizados como referência.

O manejo experimental consistia na alocação dos animais no interior da câmara climática na tarde anterior ao início de cada tratamento, quando eram mantidos sob temperatura de 25 ºC e umidade relativa de 65%. No início da manhã de cada dia experimental, a câmara climática era ajustada para a faixa ambiental desejada.

No intervalo de cada tratamento, durante cinco dias consecutivos, os animais foram mantidos em temperatura ambiente, em abrigo coberto com telha de cimento amianto, com pé-direito de 3 m, sem paredes laterais, em baias coletivas com 1,5 m2.animal-1 de área disponível contendo bebedouro e cocho coletivos.

Os animais foram alimentados com capim-elefante (Pennisetum purpureum Schum.) cortado e picado diariamente, em quantidade suficiente para ocorrer sobras de 10%, e concentrado na proporção de 1% do peso vivo. Também foi fornecido suplemento mineral e água ad libitum. A oferta diária de alimento foi feita, em quantidades iguais, às 7h30min e 16h30min.

A frequência respiratória (FR) foi medida pela observação dos movimentos laterais do flanco e com auxílio do estetoscópio, durante 15 segundos, e os valores multiplicados por quatro para cálculo da FR minuto-1. A frequência cardíaca (FC) foi determinada com o auxílio de estetoscópio contando-se o número de batimentos cardíacos em 15 segundos e multiplicando-se o resultado por quatro para cálculo da FC minuto-1.

A temperatura retal foi mensurada mediante termômetro clínico digital humano, TERMOMED, fabricado pela INCOTERM®, com a variação de temperatura entre 32 e 42°C, com erro médio de 0,2°C. A temperatura timpânica foi determinada por meio de termômetro com infravermelho, ThermoScan, fabricado pela BRHUN®, resolução de 0,1°C e amplitude de 32 a 42°C, introduzido no conduto auditivo por cerca de 30 segundos. A temperatura do pelame foi determinada por meio de termômetro com infravermelho, MT-360, fabricado pela MINIPA®, com precisão de 2,0°C, erro 0,2°C, amplitude de -30 a 550°C e comprimento de onda 630 a 670 nm, em três pontos do animal (cabeça, cernelha e garupa).

A taxa de sudação foi determinada na região cervical chamada tábua do pescoço e na escápula, segundo o método desenvolvido por Berman (1957) e modificado por Schleger & Turner (1965), da seguinte maneira: as folhas de papel-filtro Whatman nº1 foram embebidas em solução de cloreto de cobalto a 10% e secas em estufa a 40°C por 2 horas. O papel seco foi, então, cortado em pequenos discos de 0,53 cm de diâmetro, que, após nova secagem, a 40°C por 30 minutos, foram rapidamente colocados sobre uma lâmina de vidro de microscopia, em número de 3, e fixados com fita adesiva transparente de 3/4 de polegada. As lâminas assim montadas foram armazenadas em dessecador contendo sílica-gel. Uma área de 50 cm2 (5 × 10 cm) no lado esquerdo do pescoço de cada animal foi depilada, lavada e seca e não foi molhada em nenhum tratamento, para não interferir na medição. A fita adesiva, depois de removida da lâmina de vidro, foi aplicada na região depilada. Cronometrou-se o tempo de mudança da cor, de azul violáceo para rosa claro, de cada um dos três discos, e calculou-se a média. Ao tempo médio de viragem, em segundos, foi aplicada a fórmula: taxa de sudação = (22 × 60) ÷ 2,06 × t, em que 22 é a quantidade, em gramas, de água necessária para fazer mudar a cor de 1 m2 do papel-filtro; 60 o número de segundos por minuto; a área de pele abrangida por um disco representa 2,06 vezes a área deste; e t é o tempo médio de mudança (em segundos); o resultado foi obtido em g m-2min-1.

A pressão arterial foi determinada por meio de aparelho eletrônico digital humano, da marca Geratherm Wristwatch®, e as observações foram realizadas no membro anterior esquerdo, próximo ao coração.

Os dados de frequência respiratória, frequência cardíaca, temperatura retal, temperatura timpânica e temperatura do pelame foram analisadas em todos os animais de 6 às 7 h (medida de referência tomada no ambiente térmico de 25ºC e 65% de UR); 9 às 10 h; 13 às 14 h; e 16 às 17 h, durante três dias consecutivos. A pressão arterial foi medida, no último dia de coleta de dados de cada tratamento, nos horários de 6 às 7 h; 9 às 10 h; e 16 h às 17 h. A taxa de sudação foi observada nos dois últimos tratamentos (35 e 40ºC) no horário de 13 às 14 h.

O experimento foi conduzido em delineamento experimental inteiramente casualizado, em esquema de medidas repetidas com sete animais e três dias de exposição para cada tratamento. As comparações entre médias foram realizadas por meio de análise de regressão e pelo teste de Kruskal-Wallis e Tukey, com os níveis de significância de 1 e 5% respectivamente. Os resultados foram obtidos utilizando-se o programa Origin 6.0 (versão Professional).

Resultados e Discussão

Os dados ambientais (Tabela 1) observados ao longo do período experimental encontram-se na faixa de precisão esperada pelo equipamento de climatização. A freqüência respiratória foi inferior ao valor de 64 movimentos.minuto-1 descrito por Cezar et al. (2004) em pesquisa com fêmeas Santa Inês em temperatura ambiental média de 23,3°C (Tabela 2). Esses valores também diferem dos descritos por Starling et al. (2002), que, em ovinos Corriedale, encontraram valores de 124,9 ± 12,50 movimentos.minuto-1 a uma temperatura em câmara climática de 20°C. Essa diferença provavelmente foi ocasionada pelas variações nos genótipos e metodologias aplicadas.

Os valores médios de frequência respiratória durante a exposição experimental não diferiram estatisticamente (P>0,01) entre as temperaturas em estudo de 10, 15, 20, 25°C (Tabela 2). Os resultados observados entre as temperaturas indicam menor ritmo respiratório (em torno de 20 movimentos.minuto-1), para as temperaturas de 10, 15, 20, 25°C em relação as temperaturas de 30, 35 e 40°C, o que permite inferir que o esforço fisiológico despendido pelos animais foi mínimo para a manutenção da homeotermia.

Contudo, os resultados obtidos às temperaturas de 30, 35 e 40°C diferiram estatisticamente (P<0,01) entre si e dos observados nas demais (Tabela 2). As temperatura de 35 e 40°C merecem atenção especial, pois promoveram valores de frequência respiratória muito elevados, enquanto a 30ºC pode ser considerada adequada.

O aumento nos movimentos respiratórios após a faixa de temperatura de 35°C demonstra que a frequência respiratória pode ser a principal forma de dissipar calor nos ovinos neste estudo. Também foi observado que, em temperaturas extremas, como a de 40°C, os animais apresentaram média de 173 movimentos.minuto-1, com projeção da língua na tentativa de perder calor.

Os dados deste experimento estão em conformidade com relatos de Silanikove (2000) de que a frequência respiratória pode quantificar a severidade do estresse pelo calor, em que frequências de 40-60, 60-80 e 80-120 movimentos.minuto-1 caracterizam, respectivamente, estresse baixo, médio-alto e alto para os ruminantes. Assim, 200 movimentos.minuto-1 para ovinos pode ser um nível de estresse severo.

Swenson & Reece (1996) reportaram que a frequência respiratória média é de 16 a 34 movimentos.minuto-1 em ovinos. Em ruminantes em ambientes termoneutros, oscila entre 24 a 36 movimentos.minuto-1 e, acima da temperatura crítica superior (40°C), esses valores podem aumentar (Silva Sobrinho, 1997). Segundo Terrill & Slee (1991), os movimentos respiratórios de ovinos estressados podem chegar a 300 movimentos.minuto-1.

Starling et al. (2002), em ovinos Corriedale submetidos a temperatura de 40°C em câmara climática, encontraram valores de 182,1 ± 10,90 movimentos.minuto-1, contudo Neiva et al. (2004) e Cezar et al. (2004) observaram, em ovinos Santa Inês mantidos ao sol no turno vespertino, em temperatura ambiente de 32 e 33,2°C valores de 91 e 115,4 movimentos.minuto-1, respectivamente, que indicam que a exposição direta à radiação solar impõe ao animal maior esforço fisiológico para manutenção da homeotermia.

Altas frequências respiratórias não significam necessariamente que o animal está em estresse térmico, ou seja, se a frequência respiratória estiver alta mas o animal foi eficiente em eliminar calor, mantendo a homeotermia, pode não ocorrer estresse calórico. Isso é variável de ambiente para ambiente, dependendo da eficácia dos mecanismos de calor sensível (condução, convecção e radiação), pois, se estes não são eficazes, o organismo animal utiliza mecanismos de dissipação de calor insensível, como a sudorese e/ou frequência respiratória, para manter a homeotermia.

Todavia, McDowell (1989) relata que a respiração acelerada e contínua por várias horas pode interferir na ingestão de alimentos e ruminação, podendo afetar o desempenho do animal.

A frequência cardíaca sofreu efeito linear significativo (P<0,01) da temperatura ambiental (Figura 1). A leve diminuição da frequência cardíaca a 25°C pode ser justificada pela ausência de variação na temperatura ambiental, uma vez que a temperatura adotada como conforto e a do tratamento aplicado eram as mesmas, possibilitando aos animais o ajuste térmico de seu organismo ao ambiente experimental.


Contudo, essa diminuição é seguida de novos aumentos da frequência cardíaca a 30 e 35°C, culminando em decréscimo a 40°C. A diminuição da frequência cardíaca no tratamento a 40°C pode ser decorrente de uma maior fluidez do sangue nas artérias para atingir as camadas mais distais da epiderme na tentativa de aumentar a dissipação de calor para o ambiente, ocasionando mudança na pressão arterial e consequente diminuição do ritmo cardíaco (Figura 1).

Nas temperaturas de 10 e 15°C, houve aumentos no número de batimentos cardíacos, provavelmente uma reação do organismo dos animais ao estresse por frio, na tentativa de manter a homeotermia (Figura 1). O aumento da frequência cardíaca em situações de baixas temperaturas ocorre devido à vasoconstrição periférica e ao maior fluxo sanguíneo nos órgãos e na região central dos animais, tornando necessário o aumento do ritmo cardíaco, devido à elevação da pressão arterial.

Segundo Johnson et al. (1991) e Elvinger et al. (1992), o estresse térmico pode causar diluição, concentração ou não ter nenhum efeito sobre o volume do plasma sanguíneo. Todavia, a frequência cardíaca reduzida é mais típica em animais sob estresse térmico e está associada à taxa reduzida de produção de calor em resposta a temperaturas ambientais elevadas (Kadzere et al., 2002).

Cezar et al. (2004) registraram em ovinos Santa Inês sob temperaturas médias de 23 e 33°C frequências cardíacas de 105,67 e 115,3 movimentos cardíacos.minuto-1 respectiva-mente, valores bem acima dos descritos neste trabalho (Tabela 2), o que pode ser explicado pelo efeito do turno.

Observou-se variação significativa (P<0,01) na temperatura retal, em função da temperatura ambiental (Figura 2). A partir da temperatura ambiental de 25ºC, verificou-se aumento nos valores da temperatura retal, confirmando afirmações (Cezar, 2004; Neiva, 2004; Quesada, 2001) de que os ovinos possuem dificuldade em dissipar calor quando submetidos a temperaturas elevadas.


Os dados desta pesquisa encontram-se abaixo dos obtidos por Neiva et al. (2004) e Santos et al. (2006), que trabalharam com ovinos Santa Inês no período da manhã a uma temperatura ambiente média de 26,9°C. Esses autores registraram temperaturas retais médias de 38,9 e 39,21°C, respectivamente, provavelmente porque os animais apresentaram dificuldade em retornar à sua temperatura após o período de exposição ao sol. Esses registros estão de acordo com os encontrados por Quesada et al. (2001), que relataram o limite superior de temperatura retal para ovinos Santa Inês normotérmicos de 38,99°C, e Veríssimo et al. (2009), que observaram em ovinos Santa Inês temperatura retal média de 38,4 e 38,7 ± 0,09°C, respectiva-mente. Estes resultados também não diferiram dos registrados por Starling et al. (2002) em ovinos Corriedale em câmara climática a 40°C, cujo valor de temperatura retal média foi de 40,1 ± 0,10°C.

De acordo com Mcdowell et al. (1976), a elevação da temperatura retal em 1°C é suficiente para reduzir o desempenho na maioria das espécies de animais domésticos. Como neste experimento não se constatou essa variação, confirma-se, com base na temperatura retal, a rusticidade e a adaptabilidade dos ovinos da raça Santa Inês em situações climáticas adversas.

Houve efeito linear significativo (P<0,01) do aumento da temperatura ambiental sobre a temperatura timpânica (Figura 3), que apresentou aumentos gradativos, comprovando forte influência da temperatura ambiente sobre essa variável.


Os resultados obtidos para temperatura retal neste estudo (Tabela 2) contrariam relatos de Maloney et al. (2001) de que, quanto maior a temperatura retal, maior a diferença desta variável em relação à temperatura timpânica em ovinos. A temperatura retal pouco variou entre as faixas de temperatura ambiental avaliadas, porém a temperatura timpânica variou de 23 a 35ºC, comprovando que o calor armazenado afetou a região cerebral.

A temperatura timpânica parece ser influenciada pela temperatura cerebral e pode ser usada como parâmetro sobre a condição térmica central dos animais (Cherbuin & Brinkman, 2007).

Em ovelhas deslanadas, a perda de calor pode ser mais acentuada e confere temperaturas baixas na região cerebral e nos tímpanos. A conjunção de mecanismos que aumentam a temperatura retal e de mecanismos que resfriam o cérebro e, por conseguinte, a temperatura timpânica pode conferir diferenças acentuadas entre a região timpânica e outras regiões do corpo.

O pelame representa a fronteira entre o ambiente climático e o corpo dos animais, podendo, desta forma, influenciar o balanço térmico. Portanto, o papel termorregulador do pelame pode ser dividido em dois componentes: proteção contra o excesso de absorção da radiação solar e dissipação do calor da superfície do animal (Silva, 2000).

A temperatura ambiente teve efeito linear significativo (P<0,01) sobre a temperatura do pelame (Figura 4), a qual sofre forte influência da temperatura ambiental. Isso ocorre provavelmente devido aos processos fisiológicos, como a vasodilatação e a sudorese, que são ativados para dissipação do calor corpóreo.


O aumento mais acentuado da temperatura do pelame ocorreu a partir da exposição à temperatura ambiental de 30ºC (Figura 2). Sabe-se que, sob estresse severo, ocorre aumento do fluxo sanguíneo do núcleo central para superfície do animal e, consequentemente, elevação da taxa de fluxo de calor, resultando em altas temperaturas superficiais. À medida que as perdas evaporativas se tornam maiores, grande quantidade de calor é removida da pele por vaporização, de forma que o sangue que circula pelas superfícies corporais torna-se mais refrigerado (Baêta & Souza, 1997).

Foram observadas variações significativas (P<0,01) na pressão arterial sistólica (Figura 5) e na pressão arterial diastólica de ovinos da raça Santa Inês (Figura 6). Os animais apresentaram leve queda na pressão sistólica com o aumento da temperatura ambiental (Figura 5). Essa diminuição da pressão arterial sistólica deve-se principal-mente aos processos fisiológicos como a vasodilatação periférica (Cingolani, 2004).



A pressão diastólica apresentou redução sob baixas e altas temperaturas do ar (Figura 6), o que pode ser atribuído à eliminação de fluidos pelos animais, como aumento na excreção de urina sob baixas temperaturas, e à sudorese associada ao ofego sob temperaturas elevadas. Os valores de pressão encontraram-se próximos dos limites estabelecidos por Swenson (1996), de 120 e 80 mmHg, para as pressões sistólica e diastólica, respectivamente.

A taxa de sudação de borregas da raça Santa Inês submetidas às temperaturas de 35 e 40°C (Tabela 2) apresentam coeficientes de variação de 78,7 e 63,9% pelo teste de Tukey (P<0,05) nas regiões do pescoço e da escápula, respectivamente. Independentemente da temperatura de observação, a região do pescoço apresentou maior sudorese. A alta variabilidade dos resultados indica necessidade da adoção de metodologias que apresentem maior confiabilidade e precisão para a medida da sudorese. As taxas de sudorese à temperatura de 40°C, tanto na escápula como no pescoço, foram inferiores aos valores encontrados à temperatura de 35°C (Tabela 2). Era esperado aumento na taxa de sudorese com o aumento da temperatura ambiental. Entretanto, o aumento da frequência respiratória e a diminuição da frequência cardíaca podem ter influenciado na taxa de sudação ocorrida a 40°C.

As médias de sudorese encontradas neste trabalho foram inferiores às obtidas por Silva et al. (1990), que observaram animais da raça Ideal sob temperaturas entre 25 e 46°C e determinaram a taxa de sudação de 90,5 ± 5,5 g.m-2h-1, valores que podem ter sido determinados pela genética dos animais. Contudo, o aspecto que deve ser destacado é que a sudação tem sido estudada há bastante tempo em ovinos em ambientes quentes. Em raças de origem europeia, têm sido observadas taxas de sudação bastante variáveis: 35 a 265 g.m-2h-1 na raça Suffolk (Nogueira et al., 1987), 90,6 ± 5,5 g.m-2h-1 na raça Ideal (Silva et al., 1990), 145,2 ± 6,1 a 270,7 ± 45,1 g.m-2h-1 na raça Rambouillet (Rai et al., 1979).

Entretanto, em ovinos lanados, a epiderme é muito permeável à água e ao vapor, sendo quantitativamente muito importante a perspiração insensível, de modo que as taxas de evaporação cutânea geralmente correspondem a um volume de água maior que o secretado pelas glândulas sudoríparas isoladamente. Os métodos empregados na determinação da taxa de sudação não permitem a separação desta e da perspiração insensível (Silva & Starling, 2003).

Segundo Silva & Starling (2003), em animais com velo menos espesso, como os ovinos Santa Inês, a evaporação cutânea permanece praticamente inalterada à medida que a temperatura ambiente eleva até 45°C, ao mesmo tempo em que a evaporação respiratória sobe mais rápido nas temperaturas mais altas. De qualquer forma, os resultados obtidos neste trabalho não evidenciam a importância da evaporação cutânea para ovinos da raça Santa Inês aclimatados a ambientes quentes.

Conclusões

Pela análise do conjunto de informações disponíveis, as temperaturas de 10, 15, 20 e 25°C foram as que forneceram maior conforto térmico para os animais. A temperatura de 25°C pode ser considerada zona de conforto térmico para borregas da raça Santa Inês em ambiente com umidade relativa de 65%.

Agradecimentos

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia - FAPESB, pela concessão de bolsa.

Recebido em 11/11/2009 e aprovado em 10/11/2010.

Correspondências devem ser enviadas para: eustaquiofilho.a@zootecnista.com.br

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  • Zona de conforto térmico de ovinos da raça Santa Inês com base nas respostas fisiológicas

    Thermal comfort zone of Santa Ines sheep based on physiological responses
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Ago 2011

    Histórico

    • Aceito
      10 Nov 2010
    • Recebido
      11 Nov 2009
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