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Apresentação

Apresentação

Um suplemento de atualização em transtorno obsessivo-compulsivo

O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) vem receben do muita atenção dos pesquisadores nos últimos anos, possivelmente pela conjunção de dois fatores: estudos epidemiológicos mostrando que é um transtorno comum em praticamente todas as culturas, atingindo em média 2% da população (vide artigo sobre epidemiologia e aspectos transculturais), e os avanços terapêuticos mais recentes. Na verdade, até os anos 80 era considerado um quadro raro e praticamente intratável que, em geral, despertava muita impotência e pouco interesse nos profissionais de saúde mental.

Trata-se, sem dúvida, de um transtorno instigante e potencialmente gerador de grande sofrimento, em função de suas características clínicas: a crítica, em geral preservada, associa-se com freqüência à vergonha e à ocultação dos sintomas pelo paciente, que tenta sozinho resolver um conflito que se renova permanentemente. Até os familiares podem desconhecer a existência do problema ou questionar o caráter patológico das manifestações, exigindo do portador um controle que foge ao seu alcance, amplificando o desgaste inerente ao quadro (vide artigos sobre quadro clínico e relação família-paciente).

Nem sempre de fácil diagnóstico, o TOC é talvez o protótipo do transtorno que desafia as tentativas de categorização em normal e patológico, neurótico e psicótico, orgânico e psicogênico e mesmo as fronteiras com outros transtornos psiquiátricos (vide artigos sobre diagnóstico diferencial e comorbidade). Além disso, não há consenso sobre sua manifestação psicopatológica fundamental: envolveria, em sua essência, alteração de humor – ansioso ou depressivo? –, volição/pragmatismo, memória, pensamento/juízo?

Apesar do número crescente de trabalhos científicos, o TOC continua em grande parte um enigma para os pesquisadores. Sua etiopatogenia e questões sobre diversidade de sintomas, curso clínico e prognóstico continuam sem resposta (vide artigos sobre TOC na infância, quadro e curso clínicos). Apesar de novas abordagens terapêuticas mais eficazes terem surgido, muitos pacientes não respondem aos tratamentos atuais (vide artigo sobre tratamento do TOC refratário). Na busca dessas respostas, estudos utilizando diferentes métodos de pesquisa têm demonstrado, cada vez mais, que o TOC é um transtorno heterogêneo, englobando conjuntos de pacientes com características peculiares a cada subgrupo. Essa diversidade tem levado à necessidade de identificar subtipos mais homogêneos de pacientes e de buscar fatores preditivos de resposta ao tratamento (vide artigo sobre possíveis subtipos do TOC). Acredita-se que só assim será possível determinar fatores importantes na patogênese e desenvolver intervenções terapêuticas mais precisas e eficazes.

Na Figura abaixo apresenta-se um modelo que enfatiza a interação entre diversos fatores na etiopatogenia do TOC.1 Resumindo, presume-se que genes de vulnerabilidade interagindo com fatores ambientais têm um papel crucial na formação e/ou no funcionamento de circuitos neuronais específicos. Estes, por sua vez, constituem os substratos neurobiológicos para a expressão de fenótipos específicos. Artigos sobre aspectos genéticos, neuroimunológicos, neuroquímicos, neurorradiológicos, neuropsicológicos e cognitivos discutem as diferentes teorias, integrando esses diversos fatores na etiologia do TOC.


Os novos avanços nas abordagens terapêuticas farmacológicas e psicológicas do TOC (vide artigos sobre tratamento farmacológico, terapia comportamental e cognitiva) têm sido tão significativos que vêm aumentando de modo considerável a esperança de pacientes e familiares e a gratificação dos profissionais que os assistem. O controle sintomatológico, agora muito mais atingível, permite uma mudança substancial e de valor inestimável na qualidade de vida da maioria dos portadores. Nos casos em que medicações são indicadas por um longo período, conta-se atualmente com estratégias eficazes para o alívio dos sintomas colaterais (vide artigo sobre manejo dos efeitos colaterais das drogas antiobsessivas).

Foram esses os motivos que nos levaram a elaborar o presente suplemento. Apesar do tema, certamente não estará perfeito. Mas, trata-se de um volume de atualização abrangente, que aborda diversos aspectos do TOC de forma objetiva e clara, pretendendo ser uma referência prática e útil para psiquiatras e residentes de psiquiatria de todo o Brasil, além de outros profissionais de saúde mental, na compreensão e no manejo desses casos. Temos consciência de que a atualização profissional constante é cada vez mais necessária e, contudo, mais difícil, dada à enorme quantidade de pesquisas e publicações disponíveis. Selecionar informações de forma crítica e útil foi, portanto, um de nossos principais objetivos.

Todos os artigos deste volume contêm, entre seus autores, profissionais experientes que já desenvolveram estudos sistemáticos sobre o TOC. Acredita-se, assim, cumprir o objetivo de divulgar informações científicas atualizadas que, espera-se, revertam na melhoria da qualidade da assistência prestada aos pacientes e, como decorrência, no alívio do sofrimento causado pelos sintomas obsessivo-compulsivos.

Agradecimentos

Este trabalho teve o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp – Processo nº 99/08560-6) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq – Processo nº 521369/96-7) para Miguel EC.

Albina R Torres

Departamento de Neurologia e Psiquiatria da Faculdade de Medicina de Botucatu – Unesp

Eurípedes C Miguel

Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Referências

1. Leckman JF, Peterson BS, Pauls DL, Cohen DJ. Tic Disorders. Psychiatric Clin North Am 1997;20(4):839-62.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2001
  • Data do Fascículo
    Out 2001
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