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Sintomas depressivos e óbito em síndromes coronarianas isquêmicas agudas

CARTAS AOS EDITORES

Sintomas depressivos e óbito em síndromes coronarianas isquêmicas agudas

Sr. Editor,

Existem evidências do aumento da morbidade e mortalidade em síndromes isquêmicas cardiovasculares, quando transtornos depressivos encontram-se associados.1-3 Transtornos depressivos estão presentes em cerca de 30% a 50% dos pacientes que apresentam síndromes coronarianas agudas, constituindo um fator de risco independente no aumento da morbimortalidade.4 Portanto, assim como tabagismo, diabetes, hipercolesterolemia, hereditariedade e etilismo são investigados e tratados rotineiramente como fatores de risco, a depressão deve ser pesquisada e tratada precocemente em coronariopatas.

Entrevistamos 135 pacientes com diagnósticos de Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) e de Angina Instável (AI) da Unidade Coronariana e Clínica de Tratamento Intensivo do Instituto Nacional de Cardiologia Laranjeiras. Para avaliação da sintomatologia depressiva foi utilizada a Escala de Beck, validada no Brasil por Gorenstein, adotando-se os seguintes pontos de corte: escore abaixo de 10, sem sintomatologia relevante; escores de 10 a 18, sintomatologia leve; 19 a 30, moderada; superior a 30, grave.5 O óbito foi considerado como um desfecho da doença caso tenha ocorrido durante a internação motivada pelo quadro coronariano agudo, sendo que nenhuma internação teve duração superior a 30 dias.

Trinta e oito pacientes (28,1%) apresentavam sintomas depressivos leves, 14,1% sintomas moderados e 11,1% sintomas graves. As características da amostra são apresentadas na Tabela 1.

Mais da metade dos pacientes avaliados neste estudo apresentou depressão em algum grau. Somando os grupos com depressão moderada a grave e grave, encontramos 25%, número equivalente à prevalência de depressão maior encontrada em estudos anteriores.

A freqüência de óbitos nos doentes coronarianos com sintomatologia depressiva foi sete vezes maior do que entre os doentes sem sintomatologia relevante, uma associação que, embora tenha sido descrita anteriormente, surpreende pelo tamanho. Dada a natureza transversal deste estudo e a ausência de controle para outros fatores de risco de doença coronariana, não podemos afirmar que a depressão teve um efeito direto na determinação dos óbitos observados, ou se os pacientes com sintomas depressivos também apresentavam maior freqüência de outros fatores de risco (tabagismo, diabetes, hipercolesterolemia, etc). Contudo, a robustez desses achados e sua convergência com dados da literatura internacional demonstram que transtornos depressivos constituem um fator de comorbidade muito freqüente entre coronariopatas agudos, merecendo uma rotina de investigação e tratamento adequados, dado o risco aumentado de mortalidade.

Mauricio Lougon

Harvard Medical School

Coordenação Ensino e Pesquisa - Instituto Nacional de

Cardiologia Laranjeiras (INCL)

Marco Antonio de Mattos

Unidade Coronariana do Instituto Nacional de Cardiologia

>Laranjeiras (INCL)

Bernardo Rangel Tura

Divisão de Bioestatística do Instituto Nacional de

Cardiologia Laranjeiras (INCL)

Referências

1. Springer F, Fife A, Lawson W, Hull JC, Jandorf L, Cohn PF, et al. Psychosocial effects of enhanced external counterpulsation in the angina patient: a second study. Psychosomatics. 2001;42(2):124-32.

2. Sullivan MD, LaCroix AZ, Russo JE, Walker EA. Depression and self reported physical health in patients with coronary disease: mediating and moderating factors. Psychosom Med. 2001;63(2):248-56.

3. Glassman AH, O'Connor CM, Califf RM, Swedberg K, Schwartz P, Bigger JT Jr, et al.Sertraline treatment of major depression in patients with acute MI or unstable angina. JAMA. 2002;288(6):701-9. Erratum in: JAMA. 2002;288(14):1720.

4. Blumenthal JA, O'Connor C, Hinderliter A, Fath K, Hegde SB, Miller G, et al. Psychosocial factors and coronary disease. A national multicenter clinical trial - (ENRICHD) with North Carolina focus. N C Med J. 1997;58(6):440-4.

5. Gorenstein C, Andrade LHSG. Inventário de depressão de Beck - propriedades psicométricas da versão em português. In: Gorenstein C, Andrade LHSG, Zuardi AW, editors. Escalas de avaliação clínica em psiquiatria e psicofarmacologia. São Paulo: Lemos; 2000.

Financiamento: Inexistente

Conflito de interesses: Inexistente

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Jun 2005
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