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Suicídio: estudos fundamentais

LIVROS

Suicídio: estudos fundamentais

Décio Gilberto Natrielli Filho

Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo

Alexandrina M. A. da Silva Meleiro, Chei Tung Teng, Yuan Pang Wang.

Suicídio: estudos fundamentais. São Paulo: Segmento Farma, 2004. 220 páginas. ISBN 85-98353-20-5

A constatação de que "aproximadamente metade dos psiquiatras e 20% dos psicólogos perdem algum paciente, em tratamento, por suicídio" exige que todos os profissionais da área de saúde mental tenham em mãos um instrumento de atualização na área da suicidologia. A informação acima, descrita no início do capítulo "Manejo das situações ligadas ao suicídio", do livro "Suicídio: estudos fundamentais", alerta-nos para a relevância dos temas abordados nesta obra.

Sob a coordenação de Alexandrina Meleiro, Chei Tung Teng e Yuan Pang Wang, o livro consta de 12 capítulos, divididos e escolhidos didaticamente, sendo que a leitura integral e atenta dos mesmos evidencia a preocupação dos autores em revisar o assunto, fornecer comentários e propostas para a prática clínica e, acima de tudo, demonstrar organização e integração por meio do respeito aos limites de cada capítulo.

Ao utilizarem referências de autores brasileiros, com textos escritos num português claro, não se evidenciando parágrafos com traduções literais de textos estrangeiros, a valorização da obra faz-se inquestionável, trazendo ao leitor a sensação de uma leitura fluente e enriquecedora.

No capítulo "O comportamento suicida", os autores descrevem fatos e circunstâncias envolvendo as condutas daqueles que se aventuram numa tentativa de auto-aniquilação, preocupando-se com as limitações e impasses das nomenclaturas e classificações vigentes, e reprovando qualquer "reducionismo que de modo algum reflete a complexidade multidimensional do ato de tirar a própria vida". Segue-se com os "Aspectos históricos do suicídio no ocidente" e "Religião e comportamento suicida – a cultura da morte", o primeiro permitindo valiosa reflexão quanto à evolução das leis, concepções e abolição de preconceitos envolvendo o suicídio e o segundo estudando as referências disponíveis na literatura sobre os possíveis mecanismos que levam a religiosidade a exercer uma considerável influência sobre a prevenção do suicídio.

Particularidades e limites das teorias sociais de Durkheim e a evolução destes conceitos através de autores pós-durkheimnianos encontram-se no capítulo "Suicídio e a teoria social". Em "Aspectos psicológicos do suicídio", salienta-se a reflexão fenomenológica de Ramadam, caracterizando o suicídio através do campo existencial em "estreitamento", "ampliação" e "contradição". A exploração do conceito de "autópsia psicológica", como método investigativo, pode auxiliar o profissional a "identificar como o sujeito planejou, preparou e objetivou sua própria morte".

Os capítulos "Epidemiologia do suicídio" e "Fatores de risco de suicídio" igualam-se aos demais na qualidade de organização, sendo que podemos constatar uma crítica à escassez de qualidade na estruturação de bancos de dados nacionais. Nos comentários finais de "Neurobiologia do suicídio", o parágrafo: "Atualmente, pode-se afirmar com segurança que os aspectos biológicos do suicídio são um dos principais elementos contribuintes para a determinação do comportamento suicida, e que os progressos realizados nos estudos deste campo do conhecimento podem trazer em breve estratégias potenciais de abordagem preventiva eficaz do suicídio", traça uma ponte ainda sem possibilidade de aplicação prática, entre neurotransmissores e o comportamento humano (apenas como exemplo da complexidade), ainda que as evidências agregadas ao modelo de estresse-diátese para o suicídio pareçam favoráveis.

Para todos aqueles que praticam a psiquiatria clínica, principalmente em ambientes de emergência, o texto "Abordagem médica da tentativa de suicídio" torna-se um referencial, principalmente na técnica, para a abordagem dos pacientes e, no "Manejo das situações ligadas ao suicídio", além de erradicar idéias equivocadas relacionadas aos comportamentos autodestrutivos, trabalhando com a contratransferência, estuda as reações de familiares e profissionais após o contato com pacientes de risco e até mesmo o luto por suicídio. Em "O suicídio e a sua prevenção", com todas as informações do autor com experiência internacional, consagra-se o papel das crenças e rituais, ou a participação em grupos religiosos, no potencial de prevenção do comportamento suicida, evidência também citada em outros capítulos do livro.

A finalização do livro com "Suicídio assistido, eutanásia e cuidados paliativos", alerta-nos para os riscos da legalização de práticas que não valorizem devidamente os conceitos de religiosidade, autonomia/heteronomia, opções e capacidade de escolha, citando as práticas genocidas na Alemanha hitlerista, médicos holandeses a favor do suicídio assistido para pacientes "cansados da vida" e a morte sem consentimento de 145 pessoas, em 1990, na Holanda, sob a alegação médica de que "discutir o tema com os pacientes faria mais mal do que bem".

Através de citações como: "Nenhuma forma de tratamento é efetiva com um paciente morto"; "(...) atualmente, no mundo como um todo, há muito mais mortes devidas ao suicídio que a todas as guerras juntas"; "As evidências sugerem uma associação provável entre colesterol abaixo de 160 mg/dL ou 4,78 mmol/L e suicídio e, principalmente, tentativas de suicídio"; "O suicídio pode ser visto como um assassinato em 180 graus"; "Um suicídio não seria suicídio se ninguém soubesse que foi suicídio"; "Segundo Jean-Paul Sartre, a pessoa que está mais bem aparelhada para compreender a morte é a pessoa que está morta", o leitor poderá desfrutar de uma fonte com informações elaboradas e consistentes, escrita por autores experientes, servindo como uma sólida referência nacional para o estudo do suicídio.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Set 2005
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