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O insólito e a física moderna: interfaces didáticas do conto fantástico

Unusual and modern physics: didactic interfaces of fantastic tales

Resumo:

O presente artigo trata da relação entre Física e Literatura, representada pelo conto fantástico, e suas possibilidades didáticas. Optamos pelo conto, por se tratar de um gênero de leitura rápida, e, selecionamos a literatura fantástica, caracterizada pela hesitação entre o estranho e o maravilhoso e que, ao criar na mente uma reversão diametral, acaba por representar possibilidades educacionais. Nosso objetivo é pensar como os contos fantásticos, podem suscitar a abordagem de conceitos e temáticas da Física. Para tanto, selecionamos três contos de escritores consagrados da literatura: Edgar Allan Poe, Jorge Luís Borges e Murilo Rubião. Como análise, realizamos um estudo literário das obras a partir da semiótica greimasiana, e, com isso, relacionamos o fantástico com a Física, em particular com as concepções contra-intuitivas proporcionadas pela Física. Esta relação nos convida a refletir sobre o próprio conceito de realidade Física, aspecto desejável, mas pouco abordado na educação em ciências.

Palavras-chave:
Física moderna e contemporânea; Literatura fantástica; Ciência e literatura; Educação científica

Abstract:

This paper approaches the relationship between Physics and Literature, represented by the fantastic tale and its didactic possibilities. We opted for short stories, because it is a fast-reading genre, and we selected fantastic literature, characterized as a meeting between the uncanny and the marvellous, that, by creating in the mind a diametric reversion could lead to possible educational sceneries. Our objective is to wonder about how the fantastic tale, could enlighten the approach to Physics themes and concepts. For that, we choose the tales from recognized fantastic writers: Poe; Jorge Luís Borges and Murilo Rubião. As an analytic framework, we performed a study based in Greimasian semiotics, and, with that, established relationships between the Fantastic and Physics, particularly, the counter-intuitive conceptions, of Physics. Such relationships invite us to consider the concept of physical reality, a desirable topic, but scarcely made room for in science classes.

Keywords:
Modern and contemporary Physics; Fantastic literature; Science and literature; Scientific education

Literatura, leitura e educação em ciências

As relações entre as ciências naturais e as artes, em especial a literatura, têm sido frequentemente consideradas sob o viés da educação em ciências. Conforme Zanetic (2006, p. 57)______. Física e literatura: construindo uma ponte entre as duas culturas. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 13, p. 55-70, out. 2006. Suplemento. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0104-59702006000500004>. Acesso em: 11 jan. 2017.
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, ao longo da história é possível encontrar exemplos de "cientistas que apresentam uma veia artística", como Kepler, que relacionava as órbitas dos planetas à música (SIMÕES, 2000SIMÕES, C. A música das esferas. Educação e Matemática, Lisboa, n. 60, p. 22-25, nov./dez. 2000. Disponível em: <http://www.portaldoastronomo.org/tema_19_4.php>. Acesso em: 9 fev. 2011.
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, p. 23), e de "artistas com veia científica", caso de H. G. Wells, que, em "A Máquina do Tempo", propôs o tempo como uma quarta dimensão (WELLS, 2001WELLS, H. G. A máquina do tempo. São Paulo: Nova Alexandria, 2001.) dez anos antes de Einstein formular a Teoria da Relatividade Especial. Esses são apenas alguns entre muitos exemplos a contradizerem um aparente distanciamento entre a arte e a ciência. Em 1959, o físico e escritor inglês C. P. Snow (SNOW, 1995SNOW, C. P. As duas culturas e uma segunda leitura. São Paulo: EDUSP, 1995.), em sua conferência "As duas culturas", defendeu a união entre as culturas humanista e científica, afirmando que "essa polarização é pura perda para todos nós" (SNOW, 1995SNOW, C. P. As duas culturas e uma segunda leitura. São Paulo: EDUSP, 1995., p. 29; 31), e criticando a postura usual de humanistas em relação à ciência e dos cientistas em relação à arte. Seguindo Snow, Zanetic (1989)ZANETIC, J. Física também é cultura. 1989. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989. trata das relações possíveis e interessantes para o ensino a partir da abordagem da Física como elemento cultural vivo, inquieto e inquietante, que trabalha também com o imaginário. Nessa linha, pode-se acrescentar a reflexão de Bronowski (1998)BRONOWSKI, J. O olho visionário: ensaios sobre arte, literatura e ciência. Brasília: UnB, 1998. de que a imaginação tem um papel na ciência na medida em que organiza nossa experiência em leis, sobre as quais baseamos nossas ações futuras, além da observação de Silva (1998)SILVA, E. T. Ciência, leitura e escola. In: ALMEIDA, M. J. P. M.; SILVA, H. C. (Org.). Linguagens, leituras e ensino da ciência. Campinas: Mercado de Letras, 1998. p. 121-130., de que imaginário e fantasia não são exclusividade da criação artística, e nem devem se restringir às aulas de literatura.

Diversos autores já refletiram sobre o papel educativo da literatura. Italo Calvino (CALVINO, 2009CALVINO, I. Assunto encerrado: discursos sobre literatura e sociedade. São Paulo: Companhia das Letras, 2009., p. 13), por exemplo, defendia que "as coisas que a literatura pode buscar e ensinar são poucas, mas insubstituíveis: a dureza, a piedade, a tristeza, a ironia, o humor e muitas outras necessárias e difíceis, mas que não são encontradas em outro lugar". Para Larrosa (2010, p. 97)LARROSA, J. Leitura e metamorfose. In: ______. Pedagogia profana: danças, piruetas e mascaradas. 5. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. p. 97-116., a leitura transforma, causa uma metamorfose no leitor, pois "aquele que abaixa a cabeça para ler um livro, não é o mesmo que levanta após a leitura". Segundo Petit (2008, p. 79)PETIT, M. Os jovens e a leitura. São Paulo: Editora 34, 2008., a literatura "abre portas tanto para novos espaços como para novos tempos" e, para Zilberman (2008, p. 23)ZILBERMAN, R. Sim, a literatura educa. In: ZILBERMAN, R.; SILVA, E. T. Literatura e pedagogia: ponto e contraponto . 2. ed. Campinas: Global, 2008. p. 17-24., o ato de ler "expande as fronteiras do conhecimento, sem que percamos nossa subjetividade" e "é uma prática socializante que estimula o diálogo". Silva (2008)SILVA, E. T. Literatura e pedagogia: reflexão com relances de depoimento. In: ZILBERMAN, R.; SILVA, E. T. Literatura e pedagogia: ponto e contraponto. 2. ed. Campinas: Global, 2008. p. 25-32., por sua vez, lhe atribui um alargamento de nossa busca e compreensão dos fenômenos da vida, em um processo que por si só é pedagógico. Há algumas pesquisas que procuram aproveitar esse potencial na educação em ciências, por exemplo, com a leitura de ficção científica (GOMES, 2011GOMES, E. F. O romance e a teoria da relatividade: a interface entre literatura e ciência no ensino de física através do discurso e da estrutura da ficção. 2011. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.; MARTIN-DIAZ et al., 1992MARTIN-DIAZ, M. J. et al. Science fiction comes into the classroom: maelstrom II. Physics Education, Bristol, v. 27, n. 1, p. 18-23, 1992.; OLIVEIRA, 2010OLIVEIRA, A. A. Física e ficção científica: desvelando mitos culturais em uma educação para a liberdade. 2010. 238 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.), cujo estudo, segundo Oliveira (2010, p. 145)OLIVEIRA, A. A. Física e ficção científica: desvelando mitos culturais em uma educação para a liberdade. 2010. 238 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. "pode levar o jovem a experimentar a existência de uma perspectiva diferente, entendendo, dentre outras percepções, de que forma a ciência atua na sociedade e a sociedade, na ciência, indo além da simples enunciação de erros e acertos da ciência". Além dessas, encontramos propostas didáticas envolvendo a leitura de diversas manifestações literárias, como as histórias em quadrinhos (BRAZ; FERNANDES, 2009BRAZ, K. M.; FERNANDES, S. A. Histórias em quadrinhos: um recurso didático para as aulas de física. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE ENSINO DE FÍSICA, 18., 2009, Vitória. Atas... Disponível em: <http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xviii/sys/resumos/T0525-1.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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; CARUSO; CARVALHO; SILVEIRA, 2002CARUSO, F.; CARVALHO, M.; SILVEIRA, M. C. Uma proposta de ensino e divulgação de ciências através dos quadrinhos. Ciência & Sociedade, Rio de Janeiro, n. 8, 2002. Disponível em: <http://www.cbpf.br/~eduhq/html/publicacoes/links_publicacoes/ciencia_sociedade_cs00802/cs00802.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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; TESTONI, 2010TESTONI, L. A. Histórias em quadrinhos nos livros didáticos de física: uma proposta de categorização. In: ENCONTRO DE PESQUISA EM ENSINO DE FÍSICA, 12., 2010, Águas de Lindóia. Atas...), ou os cordéis (SILVA FILHO; SANTOS, 2008SILVA FILHO, W. S.; SANTOS, R. P. Einstein e a literatura de cordel. In: SIMPÓSIO SULBRASILEIRO DE ENSINO DE CIÊNCIAS, 15., 2008, Canoas. Atas... Canoas: Ulbra, 2008. Disponível em: <http://www.fisica-interessante.com/files/artigo-einstein_literatura_cordel.pdf>. Acesso em: 11 jan. 2017.
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). Há propostas envolvendo poesia, como a de Moreira (2002)MOREIRA, I. C. Poesia na sala de aula de ciências?: a literatura poética e possíveis usos didáticos. A Física na Escola, São Paulo, v. 3, n. 1, p. 17-23, 2002. Disponível em: <http://www.sbfisica.org.br/fne/Vol3/Num1/a07.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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e a de Almeida e Ricon, (1993, p. 11)ALMEIDA, M. J. P. M.; RICON, A. E. Divulgação científica e texto literário: uma perspectiva cultural em aulas de física. Caderno Catarinense de Ensino de Física, Florianópolis, v. 10, n. 1, p. 7-13, 1993. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/fisica/article/view/9791>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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, para quem "a força dessa forma literária e de sua validade didática, residem na multiplicidade de significados possíveis, na grandeza de suas imagens, na capacidade de, com poucas palavras, dizer muito sobre um tema". Assim, o campo das relações entre literatura e educação científica é fértil.

Dessa forma, entende-se que tais propostas podem configurar uma didática de incentivo à leitura dos mais variados textos, fáceis ou difíceis, uma vez que "os desafios cognitivos são pré-requisitos básicos à formação do leitor" (SILVA, 1998SILVA, E. T. Ciência, leitura e escola. In: ALMEIDA, M. J. P. M.; SILVA, H. C. (Org.). Linguagens, leituras e ensino da ciência. Campinas: Mercado de Letras, 1998. p. 121-130., p. 125). Para Belmiro (2008, p. 126)BELMIRO, C. A. A leitura na educação de jovens e adultos. In: EVANGELISTA, A. A. M.; BRANDÃO, H. M. B.; MACHADO, M. Z. (Org.). Escolarização da leitura literária. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. p. 117-128., não temos que ceder à "fácil demagogia de exigir uma literatura acessível a todo mundo, ou seja, não é preciso 'facilitar' a leitura". É desejável possibilitar ao leitor uma experiência nova e diferente do seu cotidiano, que apresente um desafio: "não se faz favor algum ao povo se se lhe propõe uma literatura que ele possa assimilar sem esforço, passivamente, o que é preciso fazer é educá-lo" (CORTÁZAR, 1993CORTÁZAR, J. Valise de cronópio. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1993., p. 163). Assim, pode-se inclusive pensar na literatura como um direito. Para Antonio Candido (CANDIDO, 1995CANDIDO, A. O direito à literatura. In: ______. Vários escritos. 3. ed. São Paulo: Duas Cidades, 1995. p. 235-263., p. 263), "uma sociedade justa pressupõe o respeito dos direitos humanos, e a fruição da arte e da literatura em todas as modalidades, erudita ou popular, e em todos os níveis é um direito inalienável". Só em uma sociedade igualitária todos podem ter acesso à literatura, erudita ou não (CANDIDO, 1995CANDIDO, A. O direito à literatura. In: ______. Vários escritos. 3. ed. São Paulo: Duas Cidades, 1995. p. 235-263.). É pensando nisso que acreditamos ser relevante o trabalho com a literatura nas aulas de ciências, sem fechar as portas para uma literatura mais desafiadora.

O fantástico da Física e o conto fantástico

Um dos primeiros a tentar dar uma estrutura ao conto tradicional foi Edgar Allan Poe (POE, 1842______. Review of Hawthorne: twice-told tales. Graham's Magazine, Philadelphia, v. 20, n. 5, p. 298-300, May 1842. Disponível em: <http://www.eapoe.org/works/criticsm/gm542hn1.htm>. Acesso em: 8 out. 2010.
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) ao defender a unidade de efeito e o tempo de leitura, de uma ou duas horas ou de uma sentada só, para manter a totalidade do texto. É a partir da economia dos meios narrativos, e para conseguir o máximo de efeito (GOTLIB, 1990GOTLIB, N. B. Teoria do conto. 10. ed. São Paulo: Ática, 1990.) que Poe lança as bases para o conto moderno, atribuindo-o essas características. Seguindo Poe, o contista Julio Cortázar (CORTÁZAR, 1993CORTÁZAR, J. Valise de cronópio. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1993.) entende que no conto se faz necessário um estilo baseado na intensidade e na tensão, em que se eliminam todas as ideias ou situações intermediárias permitidas em um romance. Analogicamente, o conto e o romance se assemelham, respectivamente, a uma fotografia e um filme (CORTÁZAR, 1993CORTÁZAR, J. Valise de cronópio. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1993.). Assim, o conto, por se tratar de gênero de leitura rápida, mostra-se um ótimo recurso em sala de aula, como defendem tanto Reed (2010)REED, S. Short but rarely sweet: Short stories in the classroom . New York: Visualthesaurus, 2010. Disponível em: <http://www.visualthesaurus.com/cm/teachersatwork/2203/>. Acesso em: 18 jul. 2011.
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quanto Hamilton e Kratzke (1999)HAMILTON, C. L.; KRATZKE, P. Short stories in the classroom. Urbana: National Council of Teachers of English, 1999..

Especificamente, vemos um potencial interessante no chamado conto fantástico. Nossa hipótese é que, ao mostrar o espantoso absurdo da existência em que vivemos, o fantástico pode influenciar nossa forma de pensar determinados assuntos. Essa ideia está ligada à de efeito de estranhamento brechtiano (ANDREIS, 2009ANDREIS, U. A. Uma ligação possível entre a teoria da peça didática de Brecht, a pedagogia de Paulo Freire e o ensino de física. 2009. 221 f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.), onde tudo seria apresentado sob uma nova e invulgar luz, de modo que o espectador seja levado a observar criticamente mesmo aquilo que não aceitara no início. Segundo Lovecraft (1973)LOVECRAFT, H. P. Supernatural horror in literature. New York: Dover Publications, 1973., a literatura fantástica é aquela capaz de suscitar o medo do desconhecido no leitor, que participa da geração de sentido do texto (JAUSS, 1994JAUSS, H. R. A história da literatura como provocação à teoria literária. São Paulo: Ática, 1994.). Para Sá (2003)SÁ, M. C. Da literatura fantástica (teorias e contos). 2003. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003., fatos não explicáveis através da ciência, mas pertinentes ao mundo real, e a suspensão ou derrota de leis naturais, como as científicas, constituem o foco da narrativa fantástica. Já Todorov (2004)TODOROV, T. Introdução à literatura fantástica. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 2004. entende a literatura fantástica como um gênero vizinho do estranho (porém real) e do maravilhoso (explicitamente imaginário), em que de um lado nos aproximamos da realidade em que cada fato seria explicável por meio de parâmetros naturais e, de outro, de um mundo imaginário, aceito tacitamente como impossível. O fantástico para Todorov seria assim a hesitação indecidível entre esses dois polos. Rabkin (1977)RABKIN, E. The fantastic in literature. New Jersey: Princenton University, 1977., por sua vez, vê no fantástico uma qualidade de espanto que sentimos quando as regras básicas do mundo narrativo realizam uma súbita mudança de 180 graus. Nós reconhecemos essa mudança nas reações dos personagens, nas declarações do narrador, e nas implicações estruturais. Essa mudança drástica e inesperada de perspectiva, mostrando-nos possibilidades até então não percebidas, é por si só educativa, pois cria na mente uma reversão diametral abrindo mundos novos e fantásticos (RABKIN, 1977RABKIN, E. The fantastic in literature. New Jersey: Princenton University, 1977.).

Para explorar a relação entre o fantástico e a interpretação científica, serão analisados três contos que apresentam manifestações distintas do fantástico, além de permitirem, conforme será argumentado, diferentes interfaces em relação à Física: Edgar Allan Poe (poe, 2001POE, E. A. A milésima segunda estória de Xerazade. In: ______. Ficção completa, poesia e ensaios. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2001. p. 580-594.), a partir do conto "A milésima segunda estória de Xerazade", apresentando como a ciência e a tecnologia podem ser estranhas; Jorge Luis Borges (BORGES, 2007BORGES, J. L. Ficções. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.), com o conto "O jardim de veredas que se bifurcam", questionando as bases sobre o entendimento do espaço-tempo; e Murilo Rubião (RUBIÃO, 2010RUBIÃO, M. O pirotécnico Zacarias. In: ______. Murilo Rubião: obra completa. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 14-20.), com a história "O Pirotécnico Zacarias", mostrando que alguns fenômenos, por mais absurdos que sejam, podem ser encarados com naturalidade. Entende-se que as rupturas de expectativas propostas pelos contos fantásticos teriam um particular interesse quando se lidasse com as concepções pouco intuitivas trazidas pela Física Moderna e Contemporânea (FMC), que apresenta questões filosóficas e conceituais interessantes de serem levadas a um contexto educativo, tais como o princípio da incerteza de Heisenberg, o paradoxo do gato de Schrödinger, a interpretação dos multiuniversos, as distorções espaço-temporais, entre outros. A FMC apresenta uma peculiar relação com a maneira de conceber o mundo e suas relações, devido à probabilística e relativística quebra de paradigma em relação à Física clássica, determinística. De forma análoga ao conto fantástico, a FMC convida a questionar as bases intuitivas da nossa compreensão do mundo. É importante ressaltar que a Física clássica também apresentou mudanças que nos convidaram a questionar o mundo, como o paradigma do movimento da Terra e as visões heliocêntrica e geocêntrica do universo. Mudanças e teorias que levavam a noções contraintuitivas, como o caso da queda dos corpos. No entanto, na FMC, novas visões de mundo acabaram trazendo novas visões que iam além do esperado classicamente.

Como instrumento de análise dos contos fantásticos empregam-se elementos de desdobramentos da semiótica de A. J. Greimas realizados por diversos autores (BARROS, 2005BARROS, D. L. P. Estudos do discurso. In: FIORIN, J. L. Introdução à linguística II: princípios de análise. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2005. p. 187-228.; FIORIN, 2006FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.; PIETROFORTE, 2009PIETROFORTE, A. V. S. Análise textual da história em quadrinhos: uma abordagem semiótica da obra de Luiz Gê. São Paulo: Annablume: Fapesp, 2009.). A semiótica tem como objetivo a exploração do sentido, a partir da análise dos mecanismos sintáticos e semânticos do texto. Com isso, a fim de identificar o sentido do texto, a semiótica utiliza um percurso gerativo que conta com o estudo de três etapas: o nível fundamental (ou profundo), narrativo e discursivo. Serão apresentadas as características de cada etapa, a seguir, junto aos contos.

Edgar Allan Poe e as conquistas científicas

Edgar Allan Poe (1809-1849) foi escritor, poeta, contista, pai da ficção de detetive (THOMAS, 1999THOMAS, R. R. Detective fiction and the rise of forensic science. Cambridge: Cambridge University Press, 1999.). Conhecido principalmente por seus contos de terror, grotescos e macabros, também é considerado um dos precursores da ficção científica (TRESCH, 2002TRESCH, J. Extra! Extra! Poe invents science fiction! In: HAYES, K. J. The Cambrige companion to Edgar Allan Poe. Cambridge: Cambridge University Press, 2002. p. 113-132.). Dentre suas publicações, destacam-se "Contos de imaginação e Mistério" (POE, 2012aPOE, E. A. Contos de imaginação e mistério. São Paulo: Tordesilhas, 2012a.), "O Corvo" (POE, 2012b______. O corvo e suas traduções. São Paulo: Leya, 2012b.), "Filosofia da Composição" (POE, 1999______. Filosofia da composição. In: ______. Poemas e ensaios. 3. ed. São Paulo: Globo, 1999. p. 101-115.) e "Eureka" (POE, 1986______. Eureka. São Paulo: Max Limonad, 1986.), obra na qual fica evidente seu conhecimento científico ao apresentar questões ligadas à ciência vistas pelo olhar do poeta (CORTÁZAR, 1993CORTÁZAR, J. Valise de cronópio. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 1993.; PERIZZOLO, 2006PERIZZOLO, G. B. Ciência e tecnologia na obra literária de Edgar Allan Poe e Machado de Assis. 2006. Dissertação (Mestrado em Literatura Comparada) - Instituto de Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10183/7724>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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). Nessas obras, os temas mais recorrentes são a morte da mulher amada, o isolamento, a musicalidade no verso, o fascínio pelas ciências e pelo desconhecido, entre outros. Poe utilizava temas científicos abertamente em sua obra, seja na sua relação com o chiste, o cômico ou o sobrenatural. Muito disso se deve à época de fervor científico e tecnológico em que Poe viveu (PERIZZOLO, 2006PERIZZOLO, G. B. Ciência e tecnologia na obra literária de Edgar Allan Poe e Machado de Assis. 2006. Dissertação (Mestrado em Literatura Comparada) - Instituto de Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006. Disponível em: <http://hdl.handle.net/10183/7724>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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). É importante ressaltar que a ciência na obra de Poe não apresenta fins didáticos, mas cumpre funções estilísticas e estéticas para obter os efeitos desejados, particularmente, nas vertentes do fantástico em narrativas curtas e intensas.

No conto "A milésima segunda estória de Xerazade", Poe (2001)POE, E. A. A milésima segunda estória de Xerazade. In: ______. Ficção completa, poesia e ensaios. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2001. p. 580-594. criou diversas instâncias de enunciação interpostas para contar a história das Mil e uma noites. Sua história se inicia com um narrador contando sobre a existência de um livro que conteria a verdadeira história das mil e uma noites, produzindo a sensação de estarmos em um tempo atual, em um espaço real e dialogando com um narrador que é uma pessoa normal, de nosso tempo. Em seguida, somos levados para a narração de Xerazade, em seu espaço e tempo da antiga Arábia. Ela, por sua vez, ao narrar a história de Simbá, instaura-a como outro narrador, em outro espaço e tempo, de um mundo maravilhoso que não é o seu, mas, como se verá, refere-se ao mundo científico e técnico contemporâneo à obra, mas vistos por um narrador que as apresenta como elementos fantásticos. Há, porém, ainda mais uma instância de enunciação representada por notas de rodapé explicativas sobre as referências apontadas como maravilhosas por esse último narrador, mas agora explicitadas em termos técnicos científicos objetivos. Tem-se, portanto, um discurso configurado em vários níveis de enunciação (FIORIN, 2006FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.). A observação dos elementos pessoa, espaço e tempo estabelecem o denominado nível discursivo da semiótica, revestidas por personagens distintos (actorialização), colocadas em espaços e tempos diferentes (espacialização e temporalização). O espaço-temporalização se materializa inicialmente nos Estados Unidos do século 19, depois no quarto de Xerazade e do sultão na antiga Arábia e, finalmente, em um mundo maravilhoso onde Simbá vive sua aventura. Nas notas, o espaço-tempo pressuposto é um simulacro de um aqui-agora documental do leitor.

Essas instâncias acabam por representar figuras e temas nas diferentes narrativas. A figura é o termo que remete a algo existente no mundo natural, e o tema é composto por categorias que organizam, categorizam e ordenam o mundo natural (FIORIN, 2006FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.). No conto, Xerazade é actorializada como esperta, sábia, democrática, bonita, enquanto o sultão é desajeitado, ignorante, violento, feio e gordo. Pode-se interpretar Xerazade como uma figura (necessariamente fantasiosa) associada à ciência e à tecnologia, enquanto o sultão, representando o lado da tradição, não acredita no que está ouvindo. Assim, em Xerazade, a ciência é figurativizada como sábia, democrática e bela. E o sultão figurativiza a tradição, em ignorância, autoritarismo e feiura. É possível pensar, ainda, a contrariedade entre ciência e tradição, como uma relação onde o saber científico, presente na palavra de Xerazade, é uma cura, enquanto a ignorância figurativiza uma doença, como propõe trabalho de Adélia Meneses (MENESES, 1988MENESES, A. B. Do poder da palavra. Folha de São Paulo, São Paulo, 29 jan. 1988. Folhetim. Disponível em: <http://acervo.folha.com.br/fsp/1988/01/29/348/>. Acesso em: 14 nov. 2010.
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) sobre as Mil e Uma Noites, associando-o à psicanálise freudiana: a boa narrativa de Xerazade cura o rei. Mas Poe quebra com essa ideia, já que em seu conto Xerazade não salva o sultão, mas o condena. Outros temas e figuras também estão presentes no conto, já que os conceitos científicos são apresentados de maneira figurada na história e explicitados nas notas de rodapé. Como exemplo, há a descrição de um trem feita por Simbá:

Entre os mágicos eram domesticados muitos animais de singularíssimas espécies. Havia, por exemplo, um imenso cavalo cujos ossos eram de ferro e cujo sangue era água fervente. Em lugar de milho tinha como comida habitual pedras pretas; e, contudo, a despeito de tão dura dieta, era tão forte e ligeiro que podia arrastar uma carga mais pesada do que o maior templo desta cidade, a uma velocidade que ultrapassa a do voo da maior parte dos pássaros. (POE, 2001POE, E. A. A milésima segunda estória de Xerazade. In: ______. Ficção completa, poesia e ensaios. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2001. p. 580-594., p. 591).

Assim, pode-se observar que a temática da ciência e dos cientistas é revestida pela figura da magia e do mágico, respectivamente. Na figura do trem como um monstro, seu sangue era água fervente - referência à máquina a vapor -, que se alimenta de pedras pretas - referência ao carvão - e que podia arrastar templos, explicando a capacidade de carga dos trens. A partir da descrição, vê-se que o cavalo de ossos de ferro e sangue de água surge como um elemento contrafactual que, na lógica de seu narrador, permanece sem explicação. Assim, para o Sultão que ouve a história, esse animal é completamente fantasioso, fantástico e sem explicação. Mas o leitor, que tem acesso às notas de rodapé, inverte o sentido da narrativa e toma consciência de que se trata de uma figurativização. É possível aqui ver uma identificação com o fantástico proposto por Rabkin, não só pela presença dessa inversão, mas também nas reações do Sultão. Levando em conta a definição de Todorov, observa-se a presença de uma hesitação por parte do Sultão, mas para nós, leitores, essa hesitação é quebrada com a explicação na nota de rodapé, que acaba aproximando o conto de uma ficção científica.

Outro exemplo, que se refere às correntes galvânicas, aparece quando Simbá fala de um povoado de mágicos, que na verdade nada mais são que cientistas figurativizados. Por volta de 1780, Luigi Galvani observou um fenômeno curioso que denominou "eletricidade animal" (ROCHA, 2002ROCHA, J. F. M. Origem e evolução do eletromagnetismo. In: ______. (Org.). Origens e evolução das ideias da física. Salvador: EDUFBA, 2002. p. 185-374.): a corrente elétrica gerava contrações nos músculos de rãs mortas. Essa observação acidental possibilitou a Alessandro Volta, em 1793, criar a chamada "pilha de Volta" (ROCHA, 2002ROCHA, J. F. M. Origem e evolução do eletromagnetismo. In: ______. (Org.). Origens e evolução das ideias da física. Salvador: EDUFBA, 2002. p. 185-374.), a primeira fonte constante de corrente elétrica produzida, o que só foi possível, porque, ao contrário de Galvani, Volta percebeu que o efeito descrito "eletricidade animal" era puramente inorgânico. Mas Simbá descreve o fenômeno da seguinte forma: "Outro daqueles mágicos, por meio dum fluido que ninguém jamais vira, podia fazer com que os cadáveres de seus amigos agitassem os braços, dessem pontapés, lutassem, ou mesmo se levantassem e dançassem à vontade" (POE, 2001POE, E. A. A milésima segunda estória de Xerazade. In: ______. Ficção completa, poesia e ensaios. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2001. p. 580-594., p. 592). Na correspondente nota de rodapé, encontra-se a breve explicação: "a pilha voltaica". Essa passagem mostra também um exemplo de como Poe se apropria do conhecimento científico. Em outra passagem, ainda sobre esse povoado de mágicos, há uma referência à astronomia, relacionando a distância entre as estrelas e a velocidade da luz:

Mas toda a nação é, na verdade, de tão surpreendente habilidade nigromântica que nem mesmo suas crianças nem seus mais comuns gatos e cachorros têm qualquer dificuldade em ver objetos que não existem absolutamente, ou que durante vinte milhões de anos antes do nascimento da própria nação tinham sido riscados da face da criação. (POE, 2001POE, E. A. A milésima segunda estória de Xerazade. In: ______. Ficção completa, poesia e ensaios. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2001. p. 580-594., p. 593).

E, na nota de rodapé, vê-se a seguinte explicação:

Embora a luz viaje 167.000 milhas por segundo, a distância da sessenta e um do Cisne (a única estrela cuja distância está verificada) é tão inconcebivelmente grande que seus raios precisariam mais de dez anos para alcançar-nos. Para estrelas além destas, vinte ou mesmo mil anos seriam uma estimativa moderada. Além disso, se tivessem sido destruídas há vinte ou mil anos passados, nós ainda poderíamos hoje vê-las, pela luz que partiu de suas superfícies, há vinte ou mil anos. (POE, 2001POE, E. A. A milésima segunda estória de Xerazade. In: ______. Ficção completa, poesia e ensaios. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2001. p. 580-594., p. 593).

Mesmo utilizando dados desatualizados, como o valor dado à velocidade da luz, Poe realiza uma análise muito pertinente da ideia de a luz levar um tempo considerável para percorrer as distâncias astronômicas. Ele ainda vai mais além, ao admitir a velocidade da luz como uma constante, fato que não era tão claro para os cientistas da época. É interessante relacionar, vista essa aproximação proposta entre ciência e magia em diferentes momentos do conto, a conhecida terceira lei proposta pelo escritor de ficção científica Arthur C. Clarke: "qualquer tecnologia suficientemente avançada é indistinguível da mágica" (REID, 1997REID, R. A. Arthur C. Clarke: a critical companion. Westport: Greenwood, 1997., p. 40).

Jorge Luis Borges e os multiuniversos

O argentino Jorge Francisco Isidoro Luis Borges (1899-1986) foi um dos grandes escritores do século 20, escrevendo ensaios, poemas e contos. Segundo Williamson (2011, p. 11WILLIAMSON, E. Borges: uma vida. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.), a razão do prestígio de Borges se deve ao fato de que seus contos foram percebidos como antecipações de alguns dos temas principais da teoria crítica moderna. Borges criou uma obra muito intelectualizada (CALVINO, 2007______. Jorge Luis Borges. In: ______. Por que ler os clássicos. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. p. 246-254.), com escritos inovadores e aberta para o fantástico (ARRIGUCCI JR., 1999ARRIGUCCI JR., D. Outros achados e perdidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.) e paralelismos geométricos, em que são constantes as imagens de labirintos e espelhos. Muito de sua obra literária consiste em inferências e significações que confundem o real e o fictício, construindo, assim, uma miríade de citações, verdadeiras e falsas, que confundem o leitor sobre a própria autenticidade ou, mesmo, o próprio caráter fictício da obra em um mesmo espaço (MODRO, 2007MODRO, M. V. A prática literária e a análise discursiva no processo de ensino/aprendizagem de línguas. In: COLÓQUIO DE ESTUDOS LINGUÍSTICOS E LITERÁRIOS, 3., 2007, Maringá. Anais... Maringá: UEM, 2009. p. 664-672. Disponível em: <http://www.ple.uem.br/3celli_anais/trabalhos/estudos_literarios/pdf_literario/070.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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). Sua relação com a ciência surge de um viés filosófico e epistemológico. Segundo Corry (2003)CORRY, L. Algunas ideas científicas en la obra de Borges y su contexto histórico. In: SOLOTOREVSKY, M.; FINE, R. (Ed.). Borges en Jerusalén. Frankfurt: Vervuert; Madrid: Iberoamericana, 2003. p. 49-74., temas como a geometria não euclidiana, a quarta dimensão, a relatividade, a fita de Moebius, os paradoxos de Zenão, entre outros, atraíram a atenção de Borges. No entanto, Corry (2003, p. 3, tradução nossa)CORRY, L. Algunas ideas científicas en la obra de Borges y su contexto histórico. In: SOLOTOREVSKY, M.; FINE, R. (Ed.). Borges en Jerusalén. Frankfurt: Vervuert; Madrid: Iberoamericana, 2003. p. 49-74. observou que "as alusões a ideias científicas na obra de Borges não são mais que 'matéria poeticamente intuída' que serviu de ponto de partida para a composição de contos brilhantes". Em "O jardim de veredas que se bifurcam", aparentemente nenhum elemento fantástico se faz presente, e se tem uma história de detetive, nos moldes de um romance policial. No entanto, seguindo a linha proposta por Jean-Paul Sartre para o fantástico no cotidiano (SÁ, 2003SÁ, M. C. Da literatura fantástica (teorias e contos). 2003. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.), mas ao mesmo tempo se opondo à sua definição, o fantástico surge a partir de reflexões filosóficas propostas pelo estudioso inglês Stephen Albert, personagem do conto sobre o livro/labirinto que termina reconfigurando o mundo narrativo, antes linear e absoluto e agora ramificado e com múltiplas possibilidades. A hesitação oriunda disso se pauta exatamente nessa questão de como se configura o tempo. Mas qual o enredo da história? Qual a relação e o papel dos personagens no conto?

É possível responder a essas questões a partir do estudo do nível narrativo da semiótica em que se tem o chamado percurso de um sujeito em busca de um objeto de valor (GREIMAS; COURTÉS, 2008GREIMAS, A. J.; COURTÉS, J. Dicionário de semiótica. São Paulo: Cultrix, 2008.), em nosso caso, o espião chinês Yu Tsun, que orienta a narrativa em busca de um objeto de valor, que é a transmissão da informação com o nome do lugar exato do novo parque de artilharia britânico no Ancre (França), aos seus superiores (BORGES, 2007BORGES, J. L. Ficções. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.). Opondo-se a ele, há a figura do antissujeito (GREIMAS; COURTÉS, 2008GREIMAS, A. J.; COURTÉS, J. Dicionário de semiótica. São Paulo: Cultrix, 2008.), no caso, o investigador Richard Madden, que, ao tentar capturar Yu, quer dar um fim às suas ações. De modo geral, o nível narrativo é estruturado em quatro etapas: a manipulação, a competência, a performance e a sanção, que, embora nem sempre explicitadas e ordenadas dessa forma (FIORIN, 2006FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.), são virtualmente pressupostas. Na manipulação, um destinador-manipulador age sobre o sujeito para levá-lo a querer e/ou dever fazer alguma coisa (FIORIN, 2006, p. 29). Na história, os oficiais em Berlim assumem esse papel ao dar ao espião a missão de descobrir o nome da cidade a ser atacada e informar seus superiores. Na fase de competência, o sujeito é dotado de um saber e/ou poder-fazer que permitirá que ele complete sua missão. Na história, há o papel do estudioso Stephen Albert como destinador da competência: ao apresentar a possibilidade do universo como um labirinto que se desdobra em diversas veredas, o que criaria multiuniversos, em analogia ao livro do jardim de veredas que se bifurcam escrito por um antepassado de Yu Tsun (Ts'ui Pên), ele fornece ao espião o saber o que possibilitará a junção de Yu Tsun a seu objeto de valor. Esse saber consiste em aceitar a possibilidade de que, se de fato existem multiuniversos, se morremos em um, podemos continuar vivos em outro. Na performance, ocorre uma transformação de estado, a disjunção do sujeito ao objeto de valor se converte em conjunção, ou seja, o sujeito atinge (ou não, em caso de falha) seu objetivo, que ocorre quando Yu Tsun mata Stephen Albert, provocando a prisão dele, na expectativa de que isso resulte na divulgação desejada do local. Finalmente, na sanção, ocorrem as descobertas e revelações, e a constatação de que a performance se realizou e, por conseguinte, o reconhecimento do sujeito que operou a transformação (FIORIN, 2006FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.). No caso, vê-se que a missão foi completa, uma vez que a mensagem chega a Berlim e assim está sancionada a conjunção do sujeito com o seu objeto de valor.

Mas onde está a ciência nessa história policial? Borges realizou algumas leituras sobre ciência que influenciaram seus contos, no entanto, como aponta Andréia Ângelo (ÂNGELO, 2007ÂNGELO, A. L. P. P. Borges e o conto policial metafísico: "El jardín de senderos que se bifurcan". Fragmentos, Florianópolis, v. 33, p. 39-50, 2007. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/fragmentos/article/view/8404/7896>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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), ao postular a existência de "tempos que se bifurcam" ou de "tempos circulares", obviamente Borges não tem a intenção de fazer ciência. Ele usa o "tempo" como matéria de ficção. Mesmo assim, enxerga-se uma relação possível com a teoria dos muitos mundos, da mecânica quântica. Essa teoria tem suas origens do artigo publicado por Everett III (1957)EVERETT III, H. "Relative state" formulation of quantum mechanics. Reviews of Modern Physics, College Park, v. 29, n. 3, p. 454, 1957. Disponível em: <https://doi.org/10.1103/RevModPhys.29.454>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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e foi popularizada por Bryce DeWitt (1970)DEWITT, B. S. Quantum mechanics and reality: could the solution to the dilemma of indeterminism be a universe in which all possible outcomes of an experiment actually occur? Physics Today, Melville, v. 23, n. 9, p. 30-40, 1970. Disponível em: <https://doi.org/10.1063/1.3022331>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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como "a interpretação dos muitos mundos da mecânica quântica". Em linhas gerais, Everett (apud ROJO, 2011ROJO, A. Borges e a mecânica quântica. Campinas: Unicamp, 2011., p. 22) propõe que "[...] a "trajetória" de configurações da memória de um observador que realiza uma série de medições não é uma sequência linear de configurações da memória, mas sim como um galho de árvore ramificado, com todos os resultados possíveis que existem simultaneamente".

Everett estava preocupado em explicar a mecânica quântica completa, sem apelar para o postulado da projeção, garantindo que não haja colapso da função de onda obtida a partir da equação de Schrödinger. Chama-se projeção a redução do número de estados quando da passagem de um estado para outro, visto que um estado quântico é entendido como a superposição de infinitos estados. Como exemplo, o spin de um elétron, que pode estar direcionado para cima ou para baixo. Segundo a interpretação quântica, se é possível o elétron estar com um spin para cima ou para baixo, é possível estar com os dois ao mesmo tempo. Isso acontece até que ocorra uma medição. Essa interferência externa causa a redução do estado, que é matematicamente pensada pelo postulado da projeção.

A solução encontrada por Everett foi tratar o fenômeno como relativo a cada observador. Ou seja, "cada observador em cada ramo da função de onda terá percebido como se o sistema que estava inicialmente em uma superposição tivesse colapsado para aquele estado daquele ramo da função de onda total" (FREITAS; FREIRE JR., 2008FREITAS, F.; FREIRE JR., O. A formulação dos "estados relativos" da teoria quântica. Revista Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 30, n. 2, p. 2307, 2008. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S1806-11172008000200008>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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, p. 8). No entanto, o sistema continua em uma superposição de todos os autoestados. Baseado nessa teoria, DeWitt (1970)DEWITT, B. S. Quantum mechanics and reality: could the solution to the dilemma of indeterminism be a universe in which all possible outcomes of an experiment actually occur? Physics Today, Melville, v. 23, n. 9, p. 30-40, 1970. Disponível em: <https://doi.org/10.1063/1.3022331>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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, procurando explicar a quantização na cosmologia, propôs que todo o universo se divide quando uma interação de medição acontece. No entanto, dois observadores pertencentes a ramos distintos não podem entrar em contato um com o outro, e qualquer medida que efetuem não evidenciará a existência de outros mundos (FREITAS; FREIRE JR., 2008FREITAS, F.; FREIRE JR., O. A formulação dos "estados relativos" da teoria quântica. Revista Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 30, n. 2, p. 2307, 2008. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S1806-11172008000200008>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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). Assim, partindo da teoria de Everett III, surge a chamada interpretação dos muitos-mundos, na qual se encontra uma proposta semelhante no conto de Borges (2007, p. 89)BORGES, J. L. Ficções. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.: "Em todas as ficções, cada vez que um homem se defronta com diversas alternativas, opta por uma e elimina as demais; na do quase inextricável Ts'ui Pên, opta, simultaneamente, por todas. Cria, assim, diversos futuros, diversos tempos, que também proliferam e se bifurcam".

Segundo o personagem Stephen Albert, o livro dos jardins de veredas que se bifurcam representa todas as possibilidades de nossas escolhas juntas, criando, assim, um labirinto. Em analogia à teoria dos muitos-mundos, é como se o livro apresentado no conto fosse uma função de onda que não se colapsa e termina por permitir que todas as possibilidades ocorram. O estranho dessa implicação é que a história narrada no livro perde seu sentido, pois, ora o protagonista é jovem e ora ele é adulto, ou as duas possibilidades ao mesmo tempo. E, no fim, o que causa estranhamento no conto é possível de existir dada a interpretação de Everett III para o curioso universo quântico. O que pode, inclusive, nos levar a refletir sobre quais os limites entre o fantástico e a própria ciência?

Murilo Rubião e os estado quânticos

O escritor brasileiro Murilo Eugênio Rubião (1916-1991) é um dos precursores da literatura fantástica no Brasil, uma vez que, mesmo com textos como Memórias póstumas de Brás Cubas, de Joaquim Maria Machado de Assis, não havia uma tradição sólida do gênero (ALEIXO, 2008ALEIXO, S. E. O universo fantástico de Murilo Rubião. Revista Trama, Marechal Cândido Rondon, v. 4, n. 8, p. 187-198, 2008. Disponível em: <http://e-revista.unioeste.br/index.php/trama/issue/view/284/showToc>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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; ARRIGUCCI JR., 1999ARRIGUCCI JR., D. Outros achados e perdidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.). Em Rubião, o fantástico, utilizado para criticar a sociedade e seus sufocantes costumes, como as convenções sociais, o exercício da psiquiatria e a burocracia (SCHWARTZ, 2006______. Posfácio: Murilo Rubião: um clássico do conto fantástico. In: RUBIÃO, M. O pirotécnico Zacarias, e outros contos. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. p. 101-110.), surge a partir de situações cotidianas ao homem (SCHWARTZ, 1974SCHWARTZ, J. O fantástico em Murilo Rubião. Revista Planeta, São Paulo, n. 25, set. 1974. Disponível em: <http://www.murilorubiao.com.br/criticas.aspx?id=8>. Acesso em: 16 mar. 2011.
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) e é tratado como algo real, natural (ANDRADE, 1943 apud SCHWARTZ, 1982______. Murilo Rubião: seleção de textos, notas, estudos biográfico, histórico e crítico e exercícios. São Paulo: Abril Educação, 1982., p. 99). Os temas mais frequentes em sua obra são: a inversão de causalidade espaço-temporal, a tendência ao infinito, o desaparecimento de personagens, a contaminação sonho/realidade, a metamorfose/zoomorfismo e a contaminação homem/objeto (SCHWARTZ, 1981______. Murilo Rubião: a poética do uroboro. São Paulo: Ática, 1981.). Junto a isso, o fantástico em Rubião apresenta singularidades, como o uso de epígrafes bíblicas e reescrituras (ALEIXO, 2008ALEIXO, S. E. O universo fantástico de Murilo Rubião. Revista Trama, Marechal Cândido Rondon, v. 4, n. 8, p. 187-198, 2008. Disponível em: <http://e-revista.unioeste.br/index.php/trama/issue/view/284/showToc>. Acesso em: 10 jan. 2017.
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). As epígrafes servem como fragmentos antecipadores das temáticas dos contos e para reafirmar que, embora fantásticos, os temas tratados por Rubião são tão antigos e atuais como a própria Bíblia (SCHWARTZ, 2006______. Posfácio: Murilo Rubião: um clássico do conto fantástico. In: RUBIÃO, M. O pirotécnico Zacarias, e outros contos. São Paulo: Companhia das Letras, 2006. p. 101-110.).

Na história de "O Pirotécnico Zacarias", conhecemos esse personagem que, após um acidente, não sabe se está vivo ou morto. Assim, o próprio enredo do conto já sugere uma história fantástica, por abordar o tema da morte, um dos mais evidentes na literatura fantástica. No entanto, diferente das histórias clássicas sobre morte, esse conto, por mais macabro que pareça, não apresenta um lado sobrenatural, pois está bastante pautado no cotidiano, como sugerido por Jean-Paul Sartre (SÁ, 2003SÁ, M. C. Da literatura fantástica (teorias e contos). 2003. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.). Entretanto, mais do que isso, a história apresenta uma gama de oposição entre valores que permeiam toda a narrativa. Essas oposições são observadas com o auxílio do nível fundamental da semiótica (FIORIN, 2006FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.), o mais abstrato e caracterizado pelas categorias de sentido que se determinam nas oposições semânticas entre dois termos contrários (PIETROFORTE, 2009PIETROFORTE, A. V. S. Análise textual da história em quadrinhos: uma abordagem semiótica da obra de Luiz Gê. São Paulo: Annablume: Fapesp, 2009.), tais como: /natureza/ e /cultura/; /quente/ e /frio/; /vida/ e /morte/. A relação entre as dicotomias se dá pela operação de negação e asserção. Assim, a negação de /vivo/ é /não vivo/; que não possui o mesmo valor semântico que /morto/, ou seja, não vivo não implica morto. Nesse nível também se realiza uma classificação para as categorias do nível fundamental em /eufórica/ e /disfórica/, em que a primeira é considerada um valor positivo, enquanto a segunda um negativo. É importante notar que cada texto terá sua classificação para as dicotomias (FIORIN, 2006FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.). Pode-se ainda fazer uma associação entre diferentes dicotomias. Um texto, por exemplo, que opõe /ciência/ e /mito/, e /ignorância/ e /conhecimento/ pode associar /ciência/ a /conhecimento/, ou até outras possiblidades, permitindo identificar posicionamentos implícitos.

No conto, examinou-se que a oposição de sentido no qual se constrói a continuidade de sentido do texto é caracterizado por contrariedades como /vida/ versus /morte/, /união/ versus /isolamento/, /lógica/ versus /absurdo/, /felicidade/ versus /infelicidade/, /aceitação/ versus /rejeição/, /resolução/ versus /impasse/. Na primeira delas, o personagem Zacarias parte de um estado de vida para um estado de suposta morte que, no entanto, é uma indeterminação, uma síntese entre não morte e não vida. Na lógica interna do narrador, o valor /morte/ tem um valor eufórico, uma vez que, segundo Zacarias, a vida dele agora é melhor do que antes. O segundo ponto representa um estado de união de Zacarias com seus amigos, antes do acidente, e um estado de isolamento, após o mesmo. Ou seja, Zacarias se encontra isolado por não haver ninguém para o seu convívio. Nesse sentido, o valor /isolamento/ carrega um valor disfórico. A oposição entre a felicidade e infelicidade está, em parte, relacionada com esse isolamento que Zacarias passa a sofrer (infelicidade), mas, ao mesmo tempo, também está ligada à sua morte, pois, Zacarias faz tudo o que fazia antes e com mais agrado do que anteriormente (felicidade) (RUBIÃO, 2010RUBIÃO, M. O pirotécnico Zacarias. In: ______. Murilo Rubião: obra completa. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 14-20., p. 14). Na oposição entre /lógica/ e /absurdo/, têm-se representadas as tentativas de explicação para a situação de Zacarias. Incialmente, tentam-se explicações lógicas, como o de outra pessoa ter morrido em seu lugar. No entanto, como o próprio Zacarias afirma, abraçando o absurdo, "em verdade morri, o que vem ao encontro da versão dos que creem na minha morte. Por outro lado, também não estou morto" (RUBIÃO, 2010RUBIÃO, M. O pirotécnico Zacarias. In: ______. Murilo Rubião: obra completa. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 14-20., p. 14). Nesse sentido, o conto parece garantir um valor eufórico ao absurdo. Outra forma de observar isso é em uma das afirmações finais em que Zacarias confessa: "Não fosse o ceticismo dos homens, recusando-se aceitar-me vivo ou morto, eu poderia abrigar a ambição de construir uma nova existência" (RUBIÃO, 2010RUBIÃO, M. O pirotécnico Zacarias. In: ______. Murilo Rubião: obra completa. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 14-20., p. 20). É importante notar que Jorginho, um jovem que desmaia ao ver o pirotécnico morto-vivo, não aceita o absurdo que está presenciando, ele trava perante o absurdo lógico. A relação entre /aceitação/ e /rejeição/ surge tanto da reação das pessoas, quanto do próprio Zacarias, que aceita sua situação. No geral, pela reação das pessoas, há um percurso que parte da aceitação e termina na rejeição. Por último, a oposição entre /resolução/ e /impasse/ se dá, assim como a oposição entre lógica e absurdo, a partir da tentativa de explicação da situação de Zacarias. Antes de seu acidente, não há dúvida de que Zacarias está vivo. Após o acidente, instaura-se o impasse que não é resolvido.

De maneira geral, essas oposições ressaltam a relação entre /ignorância/ e /sabedoria/. Para o conto, a sabedoria está ligada a aceitar o absurdo. Assim, aceitando-se o absurdo, por exemplo, não haveria impasse, não haveria rejeição e não haveria morte. Mas, ao mesmo tempo, só os sábios são capazes de aceitar e conviver com o absurdo, os demais vivem na ignorância. Dessa forma, Rubião, por meio do fantástico, critica aqueles que vivem na ignorância sem se dar conta do mundo absurdo que vivem. Zacarias, consciente disto, comenta ao final do conto:

Só um pensamento me oprime: que acontecimentos o destino reservará a um morto se os vivos respiram uma vida agonizante? E a minha angústia cresce ao sentir, na sua plenitude, que a minha capacidade de amar, discernir as coisas, é bem superior à dos seres que por mim passam assustados. (RUBIÃO, 2010RUBIÃO, M. O pirotécnico Zacarias. In: ______. Murilo Rubião: obra completa. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. p. 14-20., p. 20).

No âmbito da ciência, há, novamente, a Física Quântica, que começou por impor novas formas de pensar o mundo físico, ligadas à substituição do determinismo da mecânica clássica pelo indeterminismo presente nas mais diversas interpretações da mecânica quântica. A questão central da indeterminação quântica levou a várias formulações de aparentes situações paradoxais que visavam evidenciar contradições lógicas em uma ou outra interpretação da teoria. Uma das mais famosas, ligadas ao problema da medição na mecânica quântica, é o experimento-de-pensamento proposto pelo físico teórico austríaco Erwin Schrödinger (1887-1961), conhecido como o gato de Schrödinger. De acordo com a interpretação de Copenhague, determinados fenômenos são essencialmente probabilísticos. Um exemplo é a radioatividade. Um dado material radioativo, por exemplo, tem certa probabilidade de decair. Diga-se que seja de 50% em uma hora. Assim, considerando um dado átomo deste material, em um compartimento fechado, há 50% de chance de ele ter decaído ao final de uma hora. Só se pode saber o resultado, no entanto, se observar. A interpretação de Copenhague, a mais comum da Mecânica Quântica, proposta por Niels Bohr e Werner Heisenberg, pode ser resumida nas teses: (i) Um sistema é completamente descrito pela função de onda ψ; (ii) A descrição da natureza é essencialmente probabilística; (iii) Não é possível saber o valor de todas as propriedades de um sistema ao mesmo tempo; (iv) A Física é a ciência dos resultados de processos de medida. Portanto, não faz sentido especular para além daquilo que pode ser medido. Dessa forma, na interpretação de Copenhague, enquanto não se observar o resultado o átomo, não estará nem no estado "decaído" nem no estado "não decaído", mas em uma estranha combinação dos dois estados conhecida como superposição. O princípio de superposição afirma que uma combinação linear de vetores de estado é um vetor de estado. Portanto, se |Ψa> é um estado possível e | Ψb> também o é, então o estado |Ψc>=|Ψa> +|Ψb> também é possível.

Schrödinger (1935)SCHRÖDINGER, E. Die gegenwärtige situation in der quantenmechanik. Naturwissenschaften, Heidelberg, v. 23, n. 48, p. 807-812, 1935. Disponível em: <https://www.mathematik.uni-muenchen.de/~schlenga/SS16/Material/SchroedingerDE.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2017.
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queria mostrar o absurdo da proposição e montou a experiência-de-pensamento do gato. Colocou-se o animal no compartimento fechado, juntamente com um vidro contendo gás venenoso que pode ser aberto pelo decaimento radioativo, matando o gato. Então, se não há como observar o interior do compartimento, pode-se afirmar, de acordo com a interpretação de Copenhague, que o gato está em um estado de superposição que combina "vivo" e "morto". Não um estado do tipo "moribundo", mas uma simples combinação que mantém as propriedades de estar vivo e estar morto. Nesse caso, tem-se o estado: |gato na caixa> = |vivo> + |morto>. O problema epistemológico está na condição indeterminada do gato, morto ou vivo. Esta, por sua vez, é gerada pela indeterminação do estado de um núcleo atômico radioativo, que, ao emitir uma partícula, acionaria um dispositivo venenoso que o mataria. Schrödinger está procurando mostrar uma inconsistência teórica da Física quântica empregando um raciocínio de redução ao absurdo, e para isso se vale de humor e ironia salientando o absurdo. Portanto, faz-se presente uma metáfora epistemológica (ECO, 2005ECO, U. Obra aberta: forma e indeterminação nas poéticas contemporâneas. São Paulo: Perspectiva, 2005.) que surge com a leitura do conto de Murilo Rubião em relação à questão do gato de Schrödinger. Por analogia, a indeterminação do estado de Zacarias, morto ou vivo, assemelha-se a aspectos da Física quântica, como a chamada dualidade onda-partícula e a superposição, no entanto, com uma diferença essencial, uma vez que se observa Zacarias, embora, ao fim do conto, as pessoas não se aproximam para definir qual o estado do pirotécnico. Assim, Rubião nos faz viver esse absurdo como se fosse algo palpável, também se valendo do humor e da ironia, como faz Schrödinger. No entanto, no conto, há a redução do absurdo à normalidade, uma das principais características da literatura fantástica.

Considerações finais

Após a análise e estudo dos temas de Física dos contos, foi possível observar que, para determinados conceitos e temas, a Física se aproxima do fantástico e da ficção, criando uma hesitação entre o real e o sobrenatural. Ou seja, utilizando a Física como parâmetro de realidade, o fantástico ficcional pode vir a fazer parte da realidade, por mais estranho que ele possa parecer. Para exemplificar essa afirmação, tome-se o exemplo do pirotécnico Zacarias. No conto, a temática da superposição é abordada de forma um tanto casual, por mais absurda que seja. No entanto, está-se no domínio da ficção, logo, não é impossível pensar em seres que possam ser "mortos-vivos". No caso da mecânica quântica, também foi encontrado o fenômeno da superposição. Nesse caso, a superposição tem origem nos postulados matemáticos da quântica, os quais se acreditam ser modelos possíveis de descrever a realidade, de maneira que o paradoxo proposto por Schrödinger surge justamente para indicar a impossibilidade de imaginar na realidade um estado de superposição. Assim, o que se quer pontuar é que o absurdo da superposição, presente no conto e na Física, eventualmente pode ser encontrado na realidade. Há, assim, uma analogia que aproxima a situação descrita pela Física e pela literatura. Algo semelhante acontece em Borges, uma vez que a ideia de múltiplos universos também se faz presente em uma interpretação da mecânica quântica, e em Poe, cujas descrições metafóricas e ficcionais da tecnologia e ciência dos meados do século 19 já explicitam essa relação do fantástico com o real. Portanto, somos levados a concluir, parafraseando Arthur Clarke (apud REID, 1997REID, R. A. Arthur C. Clarke: a critical companion. Westport: Greenwood, 1997., p. 40), que determinadas interpretações e criações da Física não são distinguíveis do fantástico e da ficção. E isso não se limita apenas à ciência, posto que o papel do fantástico é justamente chamar a atenção de que o mundo em que vivemos é fantástico e estranho.

Além do conteúdo científico, os três contos também abordam temas que não se restringem a esses conteúdos, de forma que outras dimensões são abordadas, como a crítica feita por Poe à forma como a ciência é apresentada à sociedade, mostrando que ciência e tecnologia podem ser inverossímeis em certos contextos ou como a sociedade encara o diferente, ignorando o absurdo em que se vive, na visão de Rubião. Dessa maneira, são discussões mais abrangentes que englobam, inclusive, reflexões sobre o papel da ciência na sociedade. No conto de Poe, por exemplo, a ciência ainda é tida como algo bom. Algo que, embora muitas pessoas possam não compreender, como o Sultão, ela ainda pode nos servir para o bem. Por outro lado, para Borges e Rubião, a visão de ciência difere desta. Para Borges, ela é algo que pode ser utilizado como justificativa para matar, enquanto em Rubião ela é incapaz de resolver as angústias humanas. Essa diferença de visão vem justamente do contexto em que os contos foram escritos, visto que, após a Segunda Guerra, a ciência passa a ser vista com descrença, fato que é acentuado por Adorno e Horkheimer em sua Dialética do esclarecimento (1985). Segundo os autores, "o que os homens querem aprender da natureza é como empregá-la para dominar completamente a ela e aos homens" (ADORNO; HORKHEIMER, 1985ADORNO, T. W.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1985., p. 5). O que se deseja indicar é que essas questões que permeiam e são apresentadas pelos contos vão além da simples enunciação de conceitos científicos apresentados de forma poética e literária.

Dessa forma, a aproximação entre a Física e o fantástico vai além da simples aprendizagem de conceitos científicos, pois permite associar diferentes saberes que podem levar a uma formação cognitiva mais profunda e a uma visão crítica do papel da ciência. O que se chama de formação cognitiva profunda está atrelada à aprendizagem devido ao contato com conhecimentos não triviais, mas que possibilitam um desafio cognitivo, pois, como defendido ao longo do artigo, não se deve limitar a apenas textos de fácil compreensão, mas textos que possibilitem um desafio cognitivo ao leitor (SILVA, 1998SILVA, E. T. Ciência, leitura e escola. In: ALMEIDA, M. J. P. M.; SILVA, H. C. (Org.). Linguagens, leituras e ensino da ciência. Campinas: Mercado de Letras, 1998. p. 121-130.).

Quanto à utilização dos contos em atividades didáticas, o que se propõe é que estes sejam abordados em encontros pontuais caracterizados como "atividade extra". Pontuais, pois, como visto, por serem curtos, os contos permitem a elaboração de sequências didáticas curtas, de até, no máximo, duas aulas - totalizando uma hora aproximadamente - para a sua aplicação; e extra, para que a participação dos alunos seja voluntária. A importância da participação voluntária reside no fato de que a atividade com a leitura do conto não seja algo obrigatório que irá servir como uma avaliação, posto que a leitura obrigatória, por si só, já é desmotivante para os estudantes, como aponta Gabriela Oliveira (2013)OLIVEIRA, G. R. As práticas de leitura literária de adolescentes e a escola: tensões e influências. 2013. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. em um estudo sobre o jovem e a leitura. Dessa forma, seja no horário normal de aula ou no contraturno, é importante que o estudante não seja obrigado a participar. Evidente que, normalmente, são poucos os que terão iniciativa ou interesse, mas cabe ao professor agir como mediador e motivador da atividade e da leitura. Isso envolve não apenas motivar, mas também auxiliar aos alunos a enxergar as aproximações entre o fantástico e a Física. Ao mesmo tempo entender que os estudantes podem realizar outras interpretações, igualmente interessantes. Dessa forma, a atividade com a leitura prevê um espaço dialógico entre educador e educando. Nesse sentido, é possível amarrar a leitura dos contos com outras atividades como filmes, experimentos, jogos, produção textual, entre outras. Quanto ao nível escolar, acredita-se que os temas abordados pelos contos podem ser discutidos em todos os anos do ensino médio e, em casos especiais, até nos anos finais do ensino fundamental. A finalidade da atividade, nesses casos, mais do que ensinar os conceitos de Física, é permitir o contato do aluno com uma leitura e uma abordagem não usuais da Física.

Portanto, é a partir dessas propostas e visões que a literatura fantástica pode ser utilizada nas aulas de Física para abordar conceitos e temáticas desta matéria. Ou seja, utilizando o fantástico como elemento problematizador da realidade, do imaginário, e da Física. Problematizador no sentido de que, ao apresentar o absurdo, ou seja, aquilo que às vezes pode fugir à razão, o fantástico fornece um novo olhar sobre o mundo. Essa possibilidade de fornecer novos olhares é importante tanto para a Física em si, quanto para a educação, por almejar novas possibilidades. Nossas experiências têm mostrado que também é possível trabalhar com os contos na formação de futuros professores de Física (RAMOS; GOMES; PIASSI, 2015RAMOS, J. E. F.; GOMES, E. F.; PIASSI, L. P. O conto de literatura na sala de aula e no ensino de história da física: a visão do professor em formação. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE ENSINO DE FÍSICA, 21., 2015, Uberlândia. Atas... Disponível em: <http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xxi/sys/resumos/T0905-2.pdf>. Acesso em: 11 jan. 2017.
http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/...
). Nesse caso, o conto de Poe serviu para ilustrar a ciência do século 19 em uma disciplina de história da ciência. Em outras atividades, ainda não publicadas, trabalhou-se com esses contos na disciplina de Prática de Ensino, em que os alunos deveriam propor aplicações para sala de aula. Esses dois exemplos apontam para a importância de promover discussões sobre literatura e Física já na formação inicial dos professores. Como desdobramento do estudo aqui desenvolvido, tem sido feita a implementação de um projeto de clube de leitura científica, em que esses contos e outros textos são trabalhados. O clube de leitura, como proposto, vem sendo realizado com a participação de alunos voluntários do ensino fundamental, e se vê que é possível trabalhar ciência a partir de textos, independentemente do seu nível. Espera-se, com este desdobramento, aprofundar o estudo da leitura e sua relação com a Física, fato que ainda está longe de ser efetivamente resolvido.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    13 Nov 2015
  • Aceito
    31 Jul 2016
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