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Deficiência de G-6-PD nos recém-nascidos de Uberaba, MG

G-6-PD deficiency in neonates in Uberaba, MG

CARTA AO EDITOR LETTER TO EDITOR

Deficiência de G-6-PD nos recém-nascidos de Uberaba, MG

G-6-PD deficiency in neonates in Uberaba, MG

Lízia M. F. R. CamposI; Francisca L. DiasII; Marcel MendesIII

IPós-graduanda, mestrado em Patologia Clinica, UFTM

IIProfessora, Disciplina de Genética, UFTM

IIIProfessor, Disciplina de Hematologia, Faculdade de Biomedicina, Uniube

Correspondência para Correspondência para: Lízia Maria F. R. Campos. Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM – Disciplina de Genética. Praça Manoel Terra, 330, Centro 38100-000 – Uberaba-MG Tel.: (34) 3318-5434. E-mail: lizia.maria@terra.com.b.

ABSTRACT

Glucose 6-Phosphate desidrogenase (G-6-PD) is a cytoplasmic enzyme present in all cells whose main function, in erythrocytes, is to protect against oxygen free radicals, through the production of NADPH. G-6-PD deficiency is the most common enzymopathy in human beings, affecting about 2 to 3% of the population worldwide. The necessity of neonatal screening of G-6-PD has been discussed in Brazil because of this high frequency. We used the Intercientífica test, which utilizes G-6-PD and in the presence of NAD, catalyzes the oxidation of G-6-P to 6-fosfogluconato. The NADPH produced is kinetically measured at 340 nm, correcting the enzymatic activity according to the concentration of the Hb at 405 nm. As controls, lyophilized erythrocytes were used. The samples were collected from the umbilical cord in EDTA. Of the 506 samples that were analyzed, 44 presented activity of the G-6-PD of more than 17.1 U/gHb (91.5%) were compatible with normal enzymatic activity; 33 (females) and 01 (male) with activity between 5.7 and 17.1 U/gHb (6.5%) were compatible with partial deficiency and 10 (male) with less than 5.7 U/gHb enzymatic activity (1.9%), compatible with total deficiency. With these results we concluded that partial and total deficiency of G-6-PD in the city of Uberaba is 8.4%.

Key words: Glucose-6-Phosphate desidrogenase deficiency; G-6-PD; screening neonatal.

Sr. Editor:

A glicose-6-fosfato desidrogenase (G-6-PD) é uma enzima presente em todas as células, que catalisa o primeiro passo metabólico da hexose monofosfato, na via de shunt ou Desvio das Pentoses, produzindo NADPH; sua deficiência provoca alterações principalmente nos eritrócitos.1,2,3

De acordo com estudos moleculares, as variantes de G-6-PD mais freqüentemente caracterizadas no Brasil são a africana e a mediterrânea.4,5 A síntese de G-6-PD é regulada por um gene situado no cromossomo X, sendo sua deficiência, portanto, mais freqüente no sexo masculino.6,7

A deficiência de G-6-PD pode estar associada à hiper­bilirrubinemia dos recém-nascidos, especialmente nos casos mais graves, que atingem os grupos asiáticos e mediterrâneos.8 A icterícia neonatal que ocorre nos recém-nascidos com esta deficiência parece ser uma acentuação da icterícia fisiológica. Esta icterícia neonatal aparece no 2º e o 5º dia de vida, aumenta de intensidade e pode provocar, nos casos mais graves, alterações neurológicas.1,2,3

A deficiência de G-6-PD pode também provocar crises hemolíticas quando os portadores são expostos a drogas de poder oxidativo.3

Apesar de todas as desvantagens que a deficiência em G-6-PD causa, estudos mostram que houve evolução da espécie humana, conferindo proteção contra a malária, na África, há milhares de anos, motivo pelo quais deficientes em G-6-PD não contraem malária, devido a uma mutação genética.7,9,10

A presente comunicação verifica a incidência da deficiência em G-6-PD, em amostra de recém-nascidos da cidade de Uberaba-MG, com análise através de método cinético enzimático, semi-automatizado, para a determinação quantitativa da atividade G-6-PD.

Os testes foram realizados no Laboratório de Análises Clínicas da Faculdade de Biomedicina, da Universidade de Uberaba, sendo as amostras de sangue coletadas de cordão umbilical de recém-nascidos dos Hospitais de Uberaba, em tubo com EDTA, em volume de 5 mL. A conservação se dá à 4ºC por até 48 horas. As populações de recém-nascidos são pertencentes a diferentes grupos populacionais.

O teste utilizado, Ensaio G-6-PD-Intercientífica, é um método enzimático colorimétrico, para a determinação quantitativa direta da atividade da G-6-PD em amostras de sangue total. Foram utilizados três controles: normal, intermediário e total, sendo o ensaio realizado em duplicatas. Os controles são hemácias liofilizadas, que possuem valores conhecidos de atividade enzimática, diferenciando os portadores (parcialmente deficientes) e doente (total deficiência) dos pacientes normais.11

A normalização da hemoglobina se faz com apenas uma leitura do ensaio no comprimento de onda 405nm, para simular o efeito de uma eluição incompleta na análise da atividade enzimática. Os valores de referência são expressos em U/gHb: Deficiente Total <5.7 U/gHb; Deficiente Parcial >5.7 e <17.1 U/gHb; Normal >17.1 U/gHb.11 Após a realização do teste, foram analisadas 506 amostras de recém-nascidos, nas quais 316 eram do sexo feminino e 190 do sexo masculino (62,45% e 37,55% respectivamente); 462 amostras de recém-nascidos foram normais (91,5%) e 44 tiveram algum grau de deficiência na atividade da G-6-PD (8.7%).

Das 44 amostras com deficiência enzimática, 34 apresentaram deficiência parcial ou intermediária (6,7% dos casos) enquanto dez apresentaram deficiência total (2,1% dos casos) (Tabela 1). Das 34 amostras com deficiência parcial ou intermediária, 33 são do sexo feminino e apenas uma do sexo masculino; as dez amostras de recém-nascidos com deficiência total são do sexo masculino, lembrando que a mutação ocorre em gene situado no cromossomo X, possuindo a doença um caráter recessivo ligado ao sexo (Tabela 2). A única amostra deficiente parcial masculina foi devido à perda da atividade enzimática devido à amostra ter sido recebida após uma semana de colheita. Os dados apresentados mostram que a incidência de deficientes de G-6-PD, nesta amostra da população de recém-nascidos de Uberaba, é alta, se comparada com as médias de detecção no Brasil.

A incidência na amostra da população de recém-nascidos de Uberaba foi de 8,4% para as duas formas combinadas da deficiência, como mostra a tabela 2. Destes, 1,9% possuem atividade enzimática completamente comprometida, pelo fato de serem deficientes do sexo masculino; 6,5% possuem a atividade enzimática parcialmente funcionante, isto é, a atividade enzimática destas portadoras oscila durante a sua vida. Porém, é importante considerar que as duas formas de deficiências de G-6-PD devem receber os cuidados de tratamento preventivo.

A necessidade de realizar a triagem da Deficiência de G-6-PD em neonatos, no Brasil, é motivo de discussão em Congressos de Triagem Neonatal, devido aos resultados que estão sendo divulgados pelas pesquisas recentes, pois outras doenças que já fazem parte desta triagem possuem incidência bem menor que a Deficiência de G-6-PD, como Fenil­cetonúria 1:12500, Hipotireoidismo Congênito 1:3500.

Agradecimentos

A Empresa Intercientífica, em São José dos Campos, SP, através do Dr. Cláudio Sampaio Filho e do PhD George Reclos, RD Diagnostics, em Athenas, Grécia, cedeu-nos gentilmente o aparelho de leitura (leitor automático de microplacas – Awaereneff/STAT-FAX 2100), os reagentes utilizados, impressora e um software para normalização da hemoglobina e o cálculo das dosagens de G-6-PD nas amostras-teste e nos controles.

Referências Bibliográficas

1. Harrison TR et al. Medicina interna. V. 1, 14. ed. Rio de Janeiro: Mac Graw Hill 1998; p.707-9.

2. Murahovschi J. Pediatria; diagnóstico + tratamento. 5ª ed. São Paulo: Savier, 1998; p. 52.

3. Naoum P C. Hemoglobinopatias e talassemias. São Paulo: Savier, 1997; p. 11-5.

4. Compri MB et al. Investigação genético-epidemiológica e molecular da deficiência de G-6-PD em uma comunidade brasileira. Cad. Saúde Pública 2000. Rio de Janeiro, 16(2)335-342.

5. Saad ST et al. Molecular characterization of glucose-6-phosphate desidrogenase deficiency in Brazil. Hum Hered 1997;47:17-21.

6. Marks PA et al. Erythrocyte glucose-6-phosphate dehydrogenase of normal and mutant human subjects: Properties of the purified enzyme. J Biol Chem 1961;236:10-17.

7. Katsuragawa TH et al. Avaliação da incidência da deficiência de glicose-6-Fosfato desidrogenase (G-6-PD) e perfil hematológico em indivíduos de uma região de Rondônia. Rev Bras Hematol Hemoter 2004;26(4):268-273.

8. Kaplan M et al. Enzymatic activity in glucose-6-phosphate dehydrogenase-normal and-deficient neonates measured with a commercial kit. Clinical Chemistry 1995;41(11).

9. Tishkoff SA et al. Haplotype diversity and linkage disequilibrium at human G-6-PD: recent origin of alleles that confer malarial resistance. Science 2001;293:455-462.

10. Carter R, Mendis KN. Evolutionary and historical aspects of the burden of malaria. Clinical Microbiology Reviews 2002;564-594.

11. Reclos GJ et al. G-6-PD diagnosis: modification of the standard method eliminates the need for an additional hemoglobin determination. Pharmakeftiki 1999;12(1):25-31.

Recebido: 28/08/2005

Aceito após modificações: 06/09/2005

Avaliação: Editor e dois revisores externos.

  • Correspondência para:

    Lízia Maria F. R. Campos.
    Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM – Disciplina de Genética.
    Praça Manoel Terra, 330, Centro
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Abr 2006
    • Data do Fascículo
      Set 2005
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