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Sobrecarga e quelação de ferro na anemia falciforme

Iron overload and iron chelation in sickle cell disease

Resumos

Pacientes cronicamente transfundidos desenvolvem sobrecarga de ferro que ocasiona lesão orgânica e morte. Nos últimos trinta anos, pacientes com sobrecarga de ferro transfusional dependem de infusões noturnas de desferroxamina para quelação de ferro. Apesar da dramática melhora da expectativa de vida na era da desferroxamina para pacientes com anemias dependentes de transfusão, 50% dos pacientes com talassemia maior morrem antes dos 30 anos de idade, predominantemente devido à insuficiência cardíaca induzida pelo ferro. A difícil natureza desse tratamento com infusão subcutânea prolongada por meio de aparelho infusor portátil motivou o desenvolvimento de formas alternativas de tratamento que facilitasse a aderência do paciente. Estratégias para reduzir a sobrecarga de ferro e suas conseqüências, através da melhora dos regimes de quelação, foram as prioridades mais importantes nos últimos anos. Nesta revisão, descrevemos os avanços mais importantes da terapia quelante de ferro. Em particular, analisamos os dois quelantes de ferro ativos por via oral: deferiprona e o novo quelante de ferro oral deferasirox.

Sobrecarga de ferro; quelação de ferro; desferroxamina; deferiprona; deferasirox


Patients who are chronically dependent on transfusions will develop iron overload that leads to organ damage and eventually to death. For nearly 30 years, patients with transfusional iron overload have been subject to overnight deferoxamine infusions for iron chelation. Despite dramatic gains in terms of life expectancy in the deferoxamine era for patients with transfusion-dependent anemias, 50% of patients with thalassemia major die before the age of 35 years, predominantly due to iron-induced heart failure. The very demanding nature of this treatment with prolonged subcutaneous infusion via portable pump infusions has been the motivation for attempts to develop alternative forms of treatment that would facilitate the patients' compliance. Strategies to reduce iron overload and its consequences by improving chelation regimens have been of the highest priority in the last years.In this review, the most important advances in iron-chelating therapy are described, particularly the analysis of the two orally active iron chelators: deferiprone and the novel oral chelator deferasirox.

Iron overload; iron chelation; deferrioxamine; deferiprone; deferasirox


ARTIGO ARTICLE

Sobrecarga e quelação de ferro na anemia falciforme

Iron overload and iron chelation in sickle cell disease

Rodolfo D. Cançado

Professor assistente da Disciplina de Hematologia e Oncologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

Correspondência Correspondência: Rodolfo Delfini Cançado Hemocentro da Santa Casa de São Paulo Rua Marquês de Itú, 579 - 3º andar 01223-001 - São Paulo-SP - Brasil Tel.: (11) 2176-7255 - E-mail: rdcan@uol.com.br

RESUMO

Pacientes cronicamente transfundidos desenvolvem sobrecarga de ferro que ocasiona lesão orgânica e morte. Nos últimos trinta anos, pacientes com sobrecarga de ferro transfusional dependem de infusões noturnas de desferroxamina para quelação de ferro. Apesar da dramática melhora da expectativa de vida na era da desferroxamina para pacientes com anemias dependentes de transfusão, 50% dos pacientes com talassemia maior morrem antes dos 30 anos de idade, predominantemente devido à insuficiência cardíaca induzida pelo ferro. A difícil natureza desse tratamento com infusão subcutânea prolongada por meio de aparelho infusor portátil motivou o desenvolvimento de formas alternativas de tratamento que facilitasse a aderência do paciente. Estratégias para reduzir a sobrecarga de ferro e suas conseqüências, através da melhora dos regimes de quelação, foram as prioridades mais importantes nos últimos anos. Nesta revisão, descrevemos os avanços mais importantes da terapia quelante de ferro. Em particular, analisamos os dois quelantes de ferro ativos por via oral: deferiprona e o novo quelante de ferro oral deferasirox.

Palavras-chave: Sobrecarga de ferro; quelação de ferro; desferroxamina; deferiprona; deferasirox.

ABSTRACT

Patients who are chronically dependent on transfusions will develop iron overload that leads to organ damage and eventually to death. For nearly 30 years, patients with transfusional iron overload have been subject to overnight deferoxamine infusions for iron chelation. Despite dramatic gains in terms of life expectancy in the deferoxamine era for patients with transfusion-dependent anemias, 50% of patients with thalassemia major die before the age of 35 years, predominantly due to iron-induced heart failure. The very demanding nature of this treatment with prolonged subcutaneous infusion via portable pump infusions has been the motivation for attempts to develop alternative forms of treatment that would facilitate the patients' compliance. Strategies to reduce iron overload and its consequences by improving chelation regimens have been of the highest priority in the last years.In this review, the most important advances in iron-chelating therapy are described, particularly the analysis of the two orally active iron chelators: deferiprone and the novel oral chelator deferasirox.

Key words: Iron overload; iron chelation; deferrioxamine; deferiprone; deferasirox.

Introdução

O íon ferro é um elemento fundamental para a vida do ser humano, sendo essencial no metabolismo energético celular e no transporte de oxigênio. Entretanto, é altamente reativo e danoso ao organismo quando encontra-se livre. Isto fez com que os organismos superiores desenvolvessem mecanismos elaborados capazes de manter o ferro ligado à proteína de transporte ou armazenado sob a forma de ferritina ou hemossiderina, com o intuito de prevenir ou limitar a participação do ferro em reações oxidativas lesivas ao organismo.1 Desta forma, a capacidade do organismo de armazenar ferro serve a duas finalidades: prover reserva interna, que possa ser mobilizada quando a necessidade de ferro exceder a oferecida pela dieta; e proteger o organismo dos efeitos tóxicos do ferro livre quando a quantidade de ferro absorvida e/ou proveniente de transfusão de hemácias exceder as quantidades perdidas e as necessárias para a síntese de compostos funcionais de ferro.1

Em adultos normais, a quantidade total de ferro é de aproximadamente 3,5 g a 4,0 g, a quantidade de ferro absorvida diariamente equivale à quantidade excretada (± 1 a 2 mg/dia), e 20 a 30 mg/dia de ferro do organismo são continuamente reciclados através de um eficiente sistema de reutilização desse metal.1,2 Fisiologicamente, o organismo humano não é capaz de aumentar a excreção de ferro, mesmo em condições de sobrecarga deste metal. Portanto, o aumento progressivo do aporte de ferro, seja por via intestinal seja por via parenteral, leva impreterivelmente à condição patológica de sobrecarga de ferro.

Sobrecarga de ferro pode ser classificada como primária ou secundária. Sobrecarga de ferro primária ocorre em situações resultantes de defeito primário do processo de regulação da homeostasia do ferro no organismo. É o que se observa nos pacientes com hemocromatose hereditária (HH), os quais apresentam aumento inapropriado da absorção intestinal de ferro, na maioria das vezes associado à mutação do gene HFE.3,4,5

Sobrecarga de ferro secundária é observada em doenças congênitas ou adquiridas que cursam com anemia hemolítica e/ou eritropoese ineficaz e requerem múltiplas transfusões de hemácias. É o que se observa nos pacientes com talassemia beta maior e em outras condições como anemia falciforme, síndrome mielodisplásica, anemia de Fanconi, etc.6

O fígado é o principal sítio de armazenamento de ferro. Usualmente, acúmulo de ferro nos hepatócitos resulta do excesso de absorção de ferro por via intestinal, enquanto o acúmulo de ferro no sistema mononuclear fagocitário decorre do aumento da atividade macrofágica com retenção de hemácias (autólogas, nos casos de hemólise crônica, ou heterólogas, nos casos de transfusão de hemácias). Na ausência de tratamento adequado, o ferro em excesso deposita-se gradativamente em vários órgãos ou tecidos, principalmente no fígado, baço, miocárdio, glândulas endócrinas e medula óssea, ocasionando lesão celular e tecidual, fibrose e insuficiência funcional.7,8

O principal mecanismo de toxicidade do ferro está relacionado com o ferro livre, ou seja, não ligado à transferrina (NTBI, non-transferrin-bound iron). A partir do momento no qual a quantidade de ferro absorvido ultrapassa a capacidade ferroquelante do organismo, ou seja, de armazená-lo e "neutralizá-lo", ocorre saída de ferro dos macrófagos para a circulação e, uma vez ultrapassada a capacidade de saturação da transferrina plasmática, o ferro livre em excesso deposita-se nos hepatócitos e em outras células parenquimatosas.9,10

A liberação do íon ferroso (Fe2+) das moléculas de ferritina no citoplasma celular leva à conversão citossólica deste em íon férrico (Fe3). O ferro livre atua como catalizador de reações oxidativas e conseqüente síntese de radicais superóxidos e radicais hidroxilas. A conversão do superóxido em H2O2 pela superóxido dismutase causa peroxidação de lípides da membrana de diversas organelas citoplasmáticas, como mitocôndrias e microssomos com conseqüente dano celular, fibrose reativa e esclerose.9,10,11

Estima-se que cada unidade de concentrado de hemácias contém cerca de 200 mg-250 mg de ferro. Sem quelação de ferro, após dez a vinte transfusões podem-se observar sinais clínicos e laboratoriais decorrentes de sobrecarga de ferro (como, por exemplo, formação de colágeno e fibrose portal no fígado) e, após anos de transfusão, a quantidade total de ferro do organismo é muitas vezes superior à quantidade normalmente presente.2,5

Quanto às manifestações clínicas relacionadas à sobrecarga de ferro, os sintomas e sinais clínicos dependem do tipo de sobrecarga de ferro (primária ou secundária), sobretudo da quantidade de ferro em excesso, da velocidade de instalação do acúmulo de ferro e do tempo de exposição do organismo ao ferro livre.3,6 Os sintomas iniciais são geralmente inespecíficos, sendo que os mais comumente referidos são: fadiga, artralgia/artrite, dor abdominal, diminuição da libido ou impotência, perda de peso. Os sinais clínicos mais freqüentes ao diagnóstico são: hepatomegalia, esplenomegalia, baixa estatura e artropatia. Com o decorrer do tempo e sem a instituição de tratamento adequado, outros sintomas e sinais somam-se àqueles, tais como: fibrose portal, já observada após dois anos de transfusão; cirrose hepática e insuficiência hepática; adelgaçamento e hiperpigmentação da pele (decorrente do aumento da melanina nas camadas basais, aliado à atrofia da pele). Das manifestações endócrinas, destacam-se hipogonadismo hipogonadotrófico, diabetes mellitus (secundário ao acúmulo excessivo de ferro nas células beta-pancreáticas e ao desenvolvimento de resistência à insulina) e hipotireoidismo. As principais alterações relacionadas ao hipogonadismo hipogonadotrófico incluem: diminuição da libido, impotência, amenorréia, atrofia testicular, ginecomastia e queda de pêlos corporais. Essas alterações resultam primariamente da diminuição da síntese de gonadotropinas resultante do acúmulo excessivo de ferro na hipófise e no hipotálamo.

O comprometimento cardíaco é uma das principais complicações da sobrecarga de ferro, considerado como principal responsável pelo óbito nos pacientes portadores de talassemia beta maior (2/3 dos casos) e também de importância expressiva na morbimortalidade de pacientes com anemia falciforme e mielodisplasia.

As principais manifestações cardíacas, decorrentes do acúmulo de ferro nas células miocárdicas, especialmente naquelas localizadas na parede ventricular e no septo, nos músculos papilares e no epicárdio e geralmente observadas após oito a dez anos de transfusão nos pacientes não quelados, incluem: miocardiopatia (dilatação e hipertrofia cardíaca), arritmia (ventricular, supraventricular, taquiarritmia paroxística, flutter atrial, fibrilação atrial e bloqueio atrioventricular) e insuficiência cardíaca, que podem ser agravadas quando concomitantes a outras condições como miocardite e hipertensão pulmonar.1-3,12,13

Apesar desse panorama sombrio, é de fundamental importância a constatação de que o diagnóstico precoce da sobrecarga de ferro e, sobretudo, de que a pronta instituição da terapia ferroquelante adequada é capaz de prevenir o aparecimento de complicações orgânicas graves e, mesmo nos indivíduos com algum grau de disfunção orgânica, é capaz de reverter ou impedir a progressão da mesma.

Principais métodos para avaliação de sobrecarga de ferro

Os principais métodos utilizados para o diagnóstico de sobrecarga de ferro em pacientes que recebem transfusões de hemácias compreendem: análise da concentração hepática de ferro (CHF) de material obtido por biópsia (método direto), e determinação da ferritina sérica, ressonância nuclear magnética (RNM) do fígado e/ou coração e SQUID (Superconducting Quantum Interference Device), que são métodos indiretos. O quadro 1 apresenta as principais vantagens e desvantagens destes três métodos.


Aproximadamente 90% do excesso do ferro deposita-se no fígado. A análise do ferro não-hemínico tecidual pode ser realizada de maneira qualitativa por método histoquímico através da coloração do ferro não-hemínico com o azul da Prússia (Reação de Perls), que permite avaliar, de modo grosseiro, a quantidade dos depósitos de ferro no fígado, através da graduação arbitrária de 0 (ausente) a IV (ou ++++) sendo os graus 0 e I (+) considerados normais, enquanto os graus II (++) a IV (++++) indicam aumento dos depósitos de ferro; ou de maneira quantitativa através da determinação direta da CHF utilizando-se método de espectroscopia de absorção atômica, ensaio colorimétrico ou espectometria de massa.

A quantificação da CHF por grama de tecido hepático é o método direto mais específico e sensível, reflete de maneira bastante fidedigna a quantidade total de ferro do organismo. Entretanto, trata-se de método com custo elevado e disponibilidade restrita a alguns centros de pesquisa.

A biópsia hepática, além de avaliar o grau de sobrecarga de ferro, permite: caracterizar o padrão de acúmulo do ferro no fígado; identificar, quando presente, a intensidade e extensão do processo inflamatório hepático, e determinar presença ou ausência de cirrose, que tem relação direta com o prognóstico do paciente. Entretanto, é um procedimento invasivo, não isento de complicações; a CHF pode apresentar ampla variabilidade, o que dificulta a interpretação de seu resultado. Essa variabilidade pode ser explicada por fatores como: tamanho inadequado da amostra e distribuição heterogênea do ferro no parênquima hepático, sobretudo em pacientes com fibrose ou cirrose hepática.14-16

A dosagem da ferritina sérica é o teste diagnóstico mais usado na prática clínica para avaliação de sobrecarga de ferro. Trata-se de método quantitativo, reprodutível, sensível e de fácil realização. Verificou-se que a ferritina sérica apresenta correlação linear com a quantidade de ferro do organismo, ou seja, 1 ng/ml de ferritina equivale a cerca de 8 a 10 mg de ferro de depósito.

A única razão para valores baixos da ferritina sérica é diminuição ou ausência de ferro nos locais de depósito. No entanto, tem sido demonstrada a existência de indivíduos com ausência de ferro na medula óssea, porém com concentrações de ferritina sérica normais ou aumentadas.

A explicação desse achado deve-se ao fato da ferritina, em determinadas situações, poder estar elevada, porém sem nenhuma relação com aumento do depósito de ferro. Isto pode ser observado numa série de eventualidades, como: estado febril, doença inflamatória aguda ou crônica (inclui crises vaso-oclusivas em pacientes com doença falciforme), infecção, necrose hepatocelular (devido à infecção viral ou induzida pela ingesta excessiva de álcool), doença hepática crônica, consumo excessivo de álcool (devido à necrose hepatocelular e aumento da síntese de ferritina), neoplasia e, mais raramente, devido à desregulação da síntese da L-ferritina (síndrome catarata-hiperferritinemia hereditária).1,3,5

Nos pacientes com talassemia beta intermédia, pode acontecer do valor de ferritina ser baixo em relação ao excesso de ferro hepático, pois o aumento da CHF dá-se principalmente por absorção intestinal desse elemento. Assim, para esses pacientes, o resultado da ferritina não deve ser analisado isoladamente, mas interpretado em conjunto com o quadro clínico e laboratorial de cada paciente.

Devido à variabilidade de seus resultados, uma única dosagem de ferritina tem valor limitado tanto para o diagnóstico de sobrecarga de ferro quanto para a avaliação da eficácia de um determinado agente quelante de ferro. Entretanto, dosagens seriadas de ferritina refletem de modo mais fidedigno alterações da CHF e devem ser sempre valorizadas e interpretadas no contexto da presença ou ausência de condições que possam estar relacionadas à sobrecarga de ferro, sobretudo da história clínica e dos antecedentes transfusionais, ou seja, do número de concentrado de hemácias transfundidas.14-16

Especificamente na anemia falciforme, que se caracteriza por doença inflamatória crônica com episódios de agudização, a ferritina sérica pode aumentar na vigência de situações como infecção e crise vaso-oclusiva, sendo que esse aumento não reflete piora do acúmulo de ferro. Geralmente, observa-se que a queda dos valores de ferritina após episódio agudo é gradual e pode levar algumas semanas para retornar aos valores basais de um determinado paciente.19

Desta forma, para o correto monitoramento da sobrecarga de ferro nos pacientes com doença falciforme, a interpretação dos valores de ferritina sérica deve ser sempre individualizada, levando-se em consideração possíveis intercorrências clínicas como: hemólise, infecção, e vaso-oclusão.

Apesar de todas as limitações descritas anteriormente, a ferritina sérica é um dos parâmetros mais importantes na avaliação e monitoramento dos depósitos de ferro do organismo, e considerada como importante fator independente, conferindo, ao paciente com aumento persistente de seus valores, prognóstico desfavorável.

Olivieri et al.,13 estudando pacientes com beta talassemia maior, demonstraram que, para um mesmo paciente, quanto mais tempo a ferritina for menor que 2.500 ng/ml, menor a chance de doença cardíaca e maior a sobrevida deste paciente. Assim, a determinação periódica (bimensal ou trimestral) da ferritina sérica é indispensável para o seguimento de pacientes em transfusão regular de hemácias.

Diante do exposto anteriormente, nos últimos cinco anos, grandes esforços foram dispensados no sentido de se obter, por meio de métodos não-invasivos, porém mais fidedignos possíveis, o diagnóstico de sobrecarga de ferro. Diferentes métodos utilizando-se técnica de ressonância nuclear magnética (RNM) e susceptometria magnética (SQUID) foram desenvolvidos e vêm sendo aperfeiçoados e padronizados para a avaliação da concentração de ferro em diversos tecidos ou órgãos, sobretudo fígado e coração; e têm proporcionado a possibilidade de uma terapia quelante de ferro mais racional.14-18

A susceptometria magnética (SQUID) é um método bastante sensível na determinação da CHF e apresenta excelente correlação com o conteúdo total de ferro corpóreo. Entretanto, a existência de apenas quatro aparelhos, dois nos EUA e dois na Europa, atualmente disponíveis para uso clínico, limitam o uso deste método em larga escala.

A RNM provavelmente tornar-se-á o exame de escolha para o diagnóstico e seguimento de pacientes com sobrecarga de ferro. Para isso, estão sendo realizados ensaios clínicos cujo objetivo é analisar a correlação entre as concentrações hepática e cardíaca de ferro, obtidas por biópsia, e os valores determinados por RNM.

Embora a determinação da CHF hepática por biópsia ou por RNM seja o método de avaliação de sobrecarga de ferro mais utilizado, é no músculo cardíaco que o ferro exerce seu papel mais importante, ou seja, a doença cardíaca é a principal causa de morte em pacientes com sobrecarga de ferro. A sobrevida de pacientes com talassemia beta maior a partir do aparecimento de qualquer sintoma relacionado à insuficiência cardíaca é de 48% em cinco anos. Pior que esse resultado, pacientes com distúrbios de condução não sobrevivem mais que dois anos e, no grupo com taquicardia ventricular sustentada, a taxa de óbito é de 100% em seis meses.

Estudos utilizando-se a técnica do T2* têm mostrado que se trata de método promissor para o diagnóstico precoce de sobrecarga de ferro no miocárdio e demonstrado como melhor método preditivo de disfunção cardíaca quando comparado com à CHF ou ferritina sérica.14-16

Estratificação dos pacientes de acordo com o grau de sobrecarga de ferro

A experiência obtida no tratamento e acompanhamento de pacientes com talassemia beta maior possibilitou a estratificação dos pacientes dependentes de transfusão de hemácias em grupos de risco de acordo com o grau de sobrecarga de ferro (Quadro 2).


Desta forma, considerando a CHF normal até 2 mg/g, os pacientes são estratificados em: risco leve de complicações, quando apresentam CHF entre 2 mg e 7 mg/g (corresponde à faixa de valores desejáveis para os pacientes em terapia quelante); risco moderado de complicações como fibrose e cirrose hepáticas, diabetes mellitus e miocardiopatia, quando CHF entre 7 mg e 15 mg/g; e risco elevado de complicações cardíacas e morte precoce para valores de CHF acima de 15 mg/g.13,20

Paciente com talassemia beta maior em transfusão crônica sem quelação de ferro normalmente ultrapassa o valor de 15 mg/g de CHF antes dos 5 anos de idade. Esse valor também pode ser alcançado nos pacientes com hemocromatose hereditária e talassemia intermédia, porém a partir da segunda ou terceira década de vida.

Terapia Quelante de Ferro

Quelação de ferro é indispensável para a sobrevida de pacientes dependentes de transfusão de hemácias, considerando que quanto maior o acúmulo de ferro maiores os riscos de morbidade e mortalidade, enquanto observa-se nítida correlação favorável entre quelação adequada de ferro, qualidade de vida e sobrevida.

Objetivos da quelação de ferro

Os principais objetivos da quelação de ferro são: 1) prevenir o acúmulo patológico de ferro no organismo, iniciando, preferencialmente, a quelação antes de instalada sobrecarga excessiva de ferro e procurando manter balanço negativo de ferro, ou seja, quantidade de ferro quelada e excretada maior que a quantidade de ferro proveniente das transfusões de hemácias; 2) prevenir danos teciduais resultantes do acúmulo de ferro por meio da utilização de quelante de ferro capaz de oferecer maior tempo possível de cobertura ferroquelante durante o dia e menor tempo de exposição do organismo ao ferro livre (ferro não ligado à transferrina), sobretudo no miocárdio.

É importante salientar que o início precoce da quelação de ferro permite, com mais facilidade, a utilização de doses terapêuticas menores do agente quelante minimizando seus possíveis efeitos adversos, que são mais freqüentemente observados quando utilizado em doses mais elevadas.2

Quando iniciar a terapia quelante de ferro?

Os principais parâmetros utilizados para considerar o início da quelação de ferro são: CHF superior a 7 mg/g de tecido seco hepático e/ou valores de ferritina, em pelo menos duas determinações consecutivas, superior a 1000 ng/ml e/ou pacientes que tenham recebido mais de 20 unidades de concentrado de hemácias (equivalente a 100 ml/kg ou mais).

Qual agente quelante de ferro utilizar?

Até o final de década de 90, somente a desferroxamina (DFO) estava disponível para o tratamento de sobrecarga de ferro. Transfusão regular de hemácias e uso de DFO subcutânea permitiram, aos pacientes com talassemia beta maior, a possibilidade

de viver mais e melhor. Entretanto, esse resultado depende da adesão estrita à administração subcutânea de DFO por 8 a 12 horas diárias, pelo menos cinco dias por semana. Para garantir menor risco de complicações da sobrecarga de ferro e, portanto, maior sobrevida (taxa de sobrevida global de 95% aos 40 anos) são necessárias 225 ou mais aplicações subcutâneas por ano. 20,21 Entretanto, muitos pacientes, algumas casuísticas relatam mais de 60%, não conseguem realizar o tratamento com DFO de forma adequada. A falta de adesão ao tratamento com DFO (associado à baixa disponibilidade de DFO e/ou do aparelho infusor em alguns países), é a principal causa de insucesso dessa terapia.17,18,20,21

A realidade descrita anteriormente motivou a procura e o desenvolvimento de novos agentes quelantes de ferro que apresentassem eficácia e segurança semelhantes à DFO, porém de administração oral, sem o inconveniente da necessidade de infusões subcutâneas por tempo prolongado. Entre centenas de quelantes estudados, a deferiprona e, mais recentemente, o deferasirox passaram a fazer parte do arsenal terapêutico disponível para o tratamento de pacientes com sobrecarga de ferro.22

As principais propriedades dos três quelantes de ferro disponíveis no Brasil estão apresentadas no quadro 3.


Desferroxamina (DFO, Desferal)

A DFO, introduzida no início da década de 70, continua sendo, até o momento, o agente quelante de ferro mais utilizado como tratamento padrão em pacientes com sobrecarga de ferro transfusional, sobretudo em pacientes com talassemia beta maior. Nesse grupo de pacientes, o uso adequado de DFO associado às transfusões regulares de concentrado de hemácias proporcionaram redução das complicações hepáticas e endócrinas, normalização do crescimento, prevenção da doença cardíaca, além de melhora da qualidade de vida e da sobrevida destes pacientes. 2,7,12,13,20,21

A DFO tem elevado peso molecular e é composta de uma molécula hexavalente, que fixa ferro em uma proporção de 1:1. Quanto às propriedades farmacocinéticas, a DFO apresenta absorção gastrintestinal mínima quando administrada por via oral, devendo ser administrada por via subcutânea através de aparelho infusor ou intravenosa. A excreção do complexo DFO:ferro é predominantemente renal.2,7

A eficácia quelante da DFO depende de vários fatores, tais como: dose, via e duração de administração, grau de sobrecarga corpórea de ferro e concentração de vitamina C.

Em adultos, a dose recomendada é de 40 mg/kg, variando entre 20 e 60 mg/kg, de acordo com os valores séricos de ferritina e do requerimento transfusional. Para melhor ajuste da dose terapêutica ideal para cada paciente, recomenda-se o cálculo do índice de Porter (dose diária média de DFO em mg/kg (que corresponde à dose real recebida em cada ocasião versus número de doses por semana) dividida pelo valor da ferritina sérica (ng/mL). Esse índice tem por objetivo otimizar a dose terapêutica e minimizar os riscos de toxicidade associada à DFO e, para isso, deve ser inferior a 0,025. 2,7

A administração subcutânea de DFO é realizada através de aparelho infusor durante 8 a 12 horas, cinco a sete vezes por semana. Em caso de sobrecarga excessiva de ferro (conteúdo hepático de ferro superior a 15 mg/g de tecido seco ou valores séricos de ferritina acima de 2.500 ng/mL) ou de doença cardíaca com arritmia ou insuficiência cardíaca, recomenda-se administração de doses mais elevadas (50 a 100 mg/kg/dia) de DFO em infusão contínua por via intravenosa.2,7,12,13,21

Uso concomitante de vitamina C aumenta a excreção de ferro à medida que eleva a disponibilidade de ferro susceptível à quelação. Contudo, devido à sua possível toxicidade quando em excesso, recomenda-se dose máxima diária de 2 a 3 mg/kg de vitamina C no momento da infusão de DFO.

Nos pacientes pediátricos com sobrecarga de ferro, durante a etapa anterior ao final do crescimento, a dose máxima indicada de desferroxamina é de 40 mg/kg. Entretanto, se iniciada antes dos 3 anos de idade ou empregada em dose acima deste valor, a administração de DFO nesses pacientes é um fator de maior risco de retardo de crescimento.

Os principais eventos adversos relacionados à DFO são: reação inflamatória no local de aplicação, infecção (principalmente pela Yersinia spp), alterações oculares e auditivas, e retardo de crescimento. É importante salientar que a ocorrência destas três últimas alterações está, na maioria das vezes, relacionada ao excesso de medicamento. 2,7,12,13,21

Deferiprona (Ferriprox)

Deferiprona (1,2-dimetil-3-hidroxi-4-piridona) é um quelante sintético disponível para uso clínico desde 1987 e comercializado a partir de 1995. Trata-se de molécula bivalente, razão pela qual três moléculas deste fármaco ligam-se a uma molécula de ferro (Fe3+), formando o complexo deferiprona: ferro numa proporção de 3:1.18

Quanto às propriedades farmacocinéticas, deferiprona administrada por via oral é absorvida rapidamente pelo trato gastrintestinal, alcançando concentrações plasmáticas máxima entre 45 e 60 minutos, e mínima entre cinco e seis horas após sua administração. Ingestão concomitante de alimentos reduz sua velocidade de absorção, mas não a quantidade de medicamento absorvido.23,24

Aproximadamente 85% da dose de deferiprona ingerida é metabolizada em conjugado glucoronídeo inativo, que é excretado na urina juntamente com os complexos deferiprona:ferro. A excreção fecal de ferro corresponde, em média, a 20% do total eliminado e a excreção urinária de deferiprona não é influenciada pela administração de vitamina C.

A quantidade de ferro excretada é diretamente proporcional à dose de deferiprona utilizada e ao grau de sobrecarga de ferro do paciente. Estudos metabólicos de balanço de ferro mostraram que dose média de 75 mg/kg/dia (variando entre 50 e 100 mg/kg/dia), promove excreção de ferro semelhante à excreção obtida com a dose de 40 mg/kg/dia de DFO. Deferiprona é comercializada em comprimidos sólidos de 500 mg e, como apresenta meia vida plasmática curta, a dose terapêutica recomendada é de 25 mg/kg, três vezes ao dia.18,23,24

Diversos estudos que avaliaram a eficácia ferroquelante da deferiprona demonstraram que esse medicamento é capaz de promover aumento da excreção de ferro, diminuição dos valores séricos de ferritina e redução da quantidade de ferro no fígado e no coração. Entretanto, a maioria destes ensaios clínicos estudou somente pacientes com talassemia beta maior, uma vez que esse medicamento não foi aprovado para uso em outras doenças como doença falciforme e síndrome mielodisplásica, entre outras.20,24,31

Evidenciou-se maior eficácia da deferiprona em pacientes com valores de ferritina superiores a 4.000 ng/ml. Pacientes com menor sobrecarga de ferro (ferritina sérica menor que 2.000 ng/ml) apresentam estabilização ou tendência de aumento dos valores de ferritina.25

Com relação à eficácia da deferiprona como quelante de ferro cardíaco, Maggio et al.26 avaliaram a concentração cardíaca de ferro de 145 pacientes tratados com deferiprona ou DFO utilizando-se RNM. Após um ano de estudo, ambos os quelantes promoveram redução semelhante do ferro cardíaco. Outro estudo randomizado, que avaliou pacientes com talassemia maior tratados com deferiprona ou DFO por um período médio de acompanhamento de 22 meses, mostrou melhora significativa no tempo de relaxamento T2, compatível com a redução do ferro cardíaco, com a deferiprona, o que não foi observado nos pacientes tratados com DFO.26

Pennell et al.,27 comparando uso de deferiprona versus DFO subcutânea em 61 pacientes com talassemia maior sem insuficiência cardíaca, demonstraram aumento do índice T2* e da fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) significantemente maior para o grupo com deferiprona (dose média de 92 mg/kg/dia) que para o grupo com DFO (dose média de 43 mg/kg/dia).

Borgna-Pinatti et al.28 publicaram estudo retrospectivo analisando a ocorrência de evento cardíaco em pacientes com talassemia maior tratados com DFO (n=359) e em pacientes que haviam descontinuado o uso de DFO e passaram a ser tratados com deferiprona (n=157). Observaram-se 52 eventos cardíacos, incluindo dez mortes, no grupo de pacientes tratado com DFO e nenhum evento no grupo com deferiprona durante o período de estudo. A análise e correta interpretação destes resultados deve ser cautelosa em decorrência do caráter retrospectivo deste estudo bem como pelo fato de que os grupos estudados não foram pareados previamente.

As principais críticas à hipótese de que a deferiprona atuaria melhor no coração do que a DFO baseiam-se em diversos fatores, tais como: número reduzido de estudos prospectivos e randomizados; vários estudos não reproduziram os mesmos resultados em favor da deferiprona; estudos clínicos publicados utilizaram protocolos distintos de RNM e compararam deferiprona oral versus DFO administrada por via subcutânea e não por infusão intravenosa contínua, que é a via de administração recomendada e o tratamento mais aceito no manejo de pacientes com doença cardíaca secundária à sobrecarga de ferro. Entretanto, os resultados obtidos com o uso da deferiprona não devem ser ignorados e, obviamente, precisam ser confirmados através de ulteriores estudos prospectivos, randomizados e controlados.

Os eventos adversos mais freqüentemente associados ao uso de deferiprona são: gastrintestinal (náusea, vômito e dor abdominal em geral nas primeiras semanas de tratamento, de intensidade leve a moderada e, na maioria das vezes, desaparecem em poucos dias sem necessidade de descontinuação da deferiprona ou redução de dose (3% a 24%); sintomas articulares, principalmente artralgia e artrite leve a grave (4% a 13%); neutropenia (4% a 5%); alterações dermatológicas e deficiência de zinco (1% a 7%).

Agranulocitose (contagem de leucócitos menor que 0,5 x 109/l) é o evento adverso mais grave associado ao uso da deferiprona e cuja ocorrência tem sido relatada em aproximadamente 1% dos pacientes. Devido ao risco desta complicação e sobretudo pela ocorrência de casos fatais relacionados à agranulocitose, recomenda-se realização de hemograma semanal no primeiro ano de tratamento, podendo-se, talvez, espaçá-los após este período, na medida em que a maioria dos casos ocorre no primeiro ano de tratamento.23-27

Apesar da possibilidade de que alguns fatores possam interferir no desenvolvimento de neutropenia em pacientes com talassemia maior (por exemplo, hiperesplenismo e infecção), a reintrodução da deferiprona em pacientes que desenvolveram agranulocitose não é recomendada e, nos pacientes que desenvolveram neutropenia leve, esta medida deve ser considerada com cautela.

Embora os relatos sobre terapia combinada (20 a 60 mg/kg/dia de DFO administrada via subcutânea, dois a seis dias por semana, e deferiprona 75 mg/kg/dia, dividida em três tomadas diárias) ainda sejam escassos na literatura e com pequeno número de pacientes estudados, essa estratégia, até o aparecimento do deferasirox, vinha sendo considerada como a forma mais racional de terapia quelante, sobretudo para os pacientes que não conseguiram obter balanço negativo de ferro com o uso isolado de DFO.29,30

Especula-se se a terapia combinada levaria a um efeito aditivo ou sinérgico entre os quelantes, denominado "efeito shuttle". A deferiprona, sendo uma molécula lipofílica de baixo peso molecular, seria capaz de penetrar no interior da célula e mobilizar o excesso de ferro intracelular de modo mais eficiente, enquanto, no espaço extracelular, esse ferro tecidual deslocado é transferido para a DFO, cuja afinidade pelo ferro é maior que o da deferiprona. Esta hipótese de sinergia não foi comprovada em ensaios clínicos; por outro lado, observou-se a ocorrência de efeito aditivo entre as duas drogas.29-33

A dificuldade de adesão ao tratamento com DFO e à própria indisponibilidade desse medicamento e/ou de aparelho infusor em muitos países, e a conseqüente constatação do elevado número de pacientes que foram a óbito por complicações diretamente relacionadas à sobrecarga de ferro, foram determinantes para a procura e desenvolvimento de um novo agente quelante de ferro que proporcionasse tratamento mais factível. Com a descoberta da deferiprona e a constatação da sua eficácia como agente quelante por via oral, esse medicamento passou a ser utilizado em muitos países antes mesmo da comprovação, respeitando as várias fases de estudo de determinado medicamento, de sua real eficácia e sobretudo de sua segurança. Desta forma, o desenvolvimento da deferiprona foi complexo, pois os ensaios clínicos necessários à investigação e confirmação de sua eficácia e segurança foram realizados após sua comercialização.

Os fatos descritos anteriormente justificaram a não aprovação da deferiprona nos EUA e, na Europa, a agência regulatória européia - EMEA (European Medicines Agency) aprovou o uso da deferiprona como tratamento de segunda linha somente para pacientes com talassemia beta maior que não toleraram o uso de DFO e, na maioria dos protocolos, tem sido recomendado deferiprona em combinação com DFO, com o propósito de aumentar a efetividade da quelação de ferro.

Aqui no Brasil, a decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) foi semelhante à decisão da EMEA. Portanto, é importante salientar que a Anvisa aprovou a deferiprona como tratamento de segunda-linha somente para pacientes com talassemia beta maior que não toleraram o uso de DFO, não aprovando o uso deste medicamento como tratamento ferroquelante para pacientes com doença falciforme, síndrome mielodisplásica e outras doenças congênitas ou adquiridas com sobrecarga de ferro.

Deferasirox (Exjade)

Deferasirox é uma molécula trivalente, o que significa que contém três sítios de interação polar no domínio de união com o ferro sendo necessárias duas moléculas de deferasirox para fixar uma molécula de ferro; apresenta elevada afinidade e especifidade pelo ferro, que, após quelado, é excretado predominantemente através das fezes (<10% de excreção urinária), e sua eficácia ferroquelante é proporcional à dose administrada.34

O tempo mediano para concentração plasmática máxima após administração oral é de aproximadamente 1,5 a 4 horas e a maior vantagem do deferasirox em relação aos outros quelantes de ferro é que este apresenta meia-vida plasmática prolongada, entre 8 e 16 horas, sendo capaz de prover quelação eficaz por 24 horas, mesmo com dose baixa (10 mg/kg/dia). Esta propriedade farmacocinética permite que esse quelante possa ser administrado por via oral apenas uma vez ao dia. O deferasirox está disponível como comprimidos dispersíveis (de 125, 250 e 500 mg) para suspensão oral.35

Ensaios clínicos de fase I, II e III conduzidos com este fármaco incluíram mais de mil pacientes, crianças com mais de 2 anos de idade, adolescentes e adultos, com diagnóstico de anemia hereditária ou adquirida dependentes de transfusão de hemácias, sobretudo talassemia beta maior, doença falciforme e síndrome mielodisplásica. Estes estudos demonstraram que este fármaco é bem tolerado em todas as faixas etárias e eficaz em manter ou reduzir a concentração de ferro não somente do tecido hepático, mas também do miocárdio. 34-36

Demonstrou-se que uma dose única diária de deferasirox promove 24 horas de cobertura ferroquelante e produz redução progressiva da concentração do ferro livre plasmático (ferro não ligado à transferrina) após múltiplas doses. Em estudo experimental, Glickstein et al.37 demonstraram a rápida capacidade de acesso do deferasirox no interior de cardiomiócitos e conseqüente eficácia ferroquelante, enquanto Wood et al.38 demonstraram efeito cardioprotetor do deferasirox tanto em pacientes com talassemia beta maior quanto em pacientes com doença falciforme que apresentavam sobrecarga de ferro transfusional.

Cappellini et al.39 publicaram estudo fase III, randômico e controlado, que comparou deferasirox versus desferroxamina. Este estudo envolveu cerca de seiscentos pacientes (metade destes pacientes tinha idade igual ou inferior a 16 anos) com talassemia beta maior em regime de transfusão regular de hemácias, e tinha como objetivo primário demonstrar a não inferioridade do deferasirox em relação à DFO através da determinação da CHF por biópsia hepática antes do início do tratamento e 12 meses após.

As características demográficas, clínicas e laboratoriais de ambos os grupos de tratamento eram semelhantes e as doses de deferasirox (entre 5 e 30 mg/kg/dia) e de DFO (entre 20 e 60 mg/kg/dia) administradas levaram em consideração a CHF inicial de cada paciente.

Quanto ao objetivo primário, este estudo demonstrou a não inferioridade de deferasirox em comparação com DFO, quando administrado em doses de 20 a 30 mg/kg/dia, que se correlacionaram com estabilização e redução da CHF, enquanto doses de 5 e 10 mg/kg/dia não foram suficientes para reduzir a CHF nos pacientes estudados. Em todos os grupos de tratamento, as variações nos valores séricos de ferritina foram dependentes da dose.

Este estudo demonstrou que DFO e deferasirox reduziram a CHF de forma semelhante. Em pacientes com menos de 7 mg/g de ferro hepático, as taxas de redução da CHF não foram significativas, registrando-se, inclusive, aumento da CHF no grupo tratado com deferasirox. Este achado deveu-se ao fato desses pacientes terem recebido doses menores, 5 e 10 mg/kg/dia, que eram doses muito baixas nesse grupo de pacientes que recebiam transfusões regularmente. Contudo, no subgrupo de pacientes que receberam 20 a 30 mg/kg/dia de deferasirox, por apresentarem CHF significativamente mais elevada, a taxa de redução da CHF foi maior para o grupo com deferasirox.39

Com base nestes estudos, o FDA (Food and Drug Administration) norte-americano e a Swissmedic aprovaram, em novembro de 2005, o uso do deferasirox no tratamento de pacientes (a partir de 2 anos de idade) com sobrecarga de ferro transfusional e diagnóstico de anemia hereditária ou adquirida dependentes de transfusão de hemácias, e, em 2006, decisão semelhante foi tomada nos países da União Européia através do Emea, em vários países da América Latina e também aqui no Brasil pela Anvisa.

Doses iniciais recomendadas de Deferasirox

A dose diária de deferasirox varia entre 10 e 30 mg/kg de peso corporal. Assim, preconiza-se que a dosagem de deferasirox seja individualizada levando-se em consideração o requerimento transfusional mensal e o acúmulo de ferro já presente. A dose diária inicial recomendada de deferasirox é de 20 mg/kg de peso corporal. Pode-se considerar dose de 30 mg/kg/dia para pacientes que recebem mais de quatro unidades de concentrado de hemácias por mês (ou seja, >14 ml/kg/mês) e para pacientes com necessidade de redução da sobrecarga de ferro. Pode-se considerar doses menores, ou seja, de 10 mg/kg/dia para pacientes que recebem menos de duas unidades de concentrado de hemácias por mês (ou seja, < 7 mL/kg/mês) e para aqueles em que se pretenda manter a concentração corporal de ferro dentro de limites aceitáveis.

A dosagem de ferritina sérica deve ser realizada uma vez por mês, com o intuito de avaliar o sucesso do tratamento. Se for necessário, a dose de deferasirox pode ser ajustada em etapas de 5 a 10 mg/kg/dia, de acordo com a resposta do paciente e dos objetivos terapêuticos.

Para pacientes em uso de DFO e que desejarem ser tratados com deferasirox, pode-se considerar dose inicial deste medicamento correspondente à metade da dose utilizada de DFO, ou seja, paciente recebendo 40 mg/kg/dia de DFO durante cinco dias por semana poderá passar a receber dose diária de 20 mg/kg/dia de deferasirox.

Dose diária de manutenção

A dose de manutenção diária de deferasirox deve ser ajustada, se necessário, a cada três a seis meses, baseando-se na tendência da ferritina sérica. Ajustes de doses podem ser feitos por etapas de 5 a 10 mg/k. Dependendo do requerimento transfusional de cada paciente, o tratamento com deferasirox deve ser interrompido se a ferritina sérica cair consistentemente abaixo de 500 ng/ml, nos pacientes que recebem menos de duas unidades de concentrado de hemácias por mês ou transfusões esporádicas, ou a dose diária diminuída nos pacientes que recebem duas ou mais unidades de concentrado de hemácias por mês. Neste último caso, recomenda-se que o monitoramento da ferritina sérica seja mensal ou bimensal.

Segurança e tolerabilidade com o uso de deferasirox

Quanto à segurança, deferasirox foi bem tolerado em todas as faixas etárias, com apenas 3% de abandono por eventos adversos. Os eventos adversos mais freqüentemente relatados foram: distúrbio gastrintestinal (náusea, vômito, diarréia, dor abdominal) que, na maioria das vezes, é de intensidade leve e transitória (5% a 10% dos pacientes), erupção cutânea (8%), elevação da creatinina sérica e aumento das transaminases. Não se registrou nenhum caso de agranulocitose, artropatia, retardo de crescimento ou alterações ósseas.

Quanto à elevação da creatinina sérica com deferasirox, observou-se que 36% (237/652) dos pacientes apresentaram aumento > 33% do valor basal em duas ocasiões consecutivas, porém em 97% dos casos esse aumento encontrava-se abaixo do limite superior de normalidade. O aumento da creatinina foi não-progressivo e dose-dependente (40% normalizaram com redução da dose), mais comum em pacientes com doses maiores de deferasirox e menor sobrecarga de ferro. Em 10% (68/652) dos casos houve necessidade de redução da dose por aumento persistente da creatinina e não constatou-se nenhum caso de insuficiência renal.36-39

Monitorando o tratamento com deferasirox

Diante da constatação de eventos adversos descritos anteriormente, recomenda-se o monitoramento do paciente em uso de deferasirox conforme apresentado no quadro 4.


Transfusão de hemácias, sobrecarga e quelação de ferro em pacientes com doença falciforme (DF)

Em relação à transfusão de hemácias, sobrecarga e quelação de ferro em pacientes com DF, é importante refletirmos sobre os seguintes questionamentos: quais os benefícios da transfusão de hemácias no curso clínico dos pacientes com DF, e quais as principais implicações e complicações relacionadas à sobrecarga de ferro nestes pacientes?

Os resultados obtidos com os estudos clínicos (STOP I e II) mostraram tendência crescente do número de pacientes com DF candidatos à transfusão regular de hemácias, observando-se não apenas redução do risco de evento isquêmico cerebral, mas também significativa melhora do curso clínico da doença com diversos benefícios, tais como: redução do número e intensidade de crises vaso-oclusivas (crises dolorosas), síndrome torácica aguda e hospitalização, com conseqüente melhora da qualidade de vida dos pacientes com DF em transfusão de hemácias.41-42

Entretanto, pacientes com DF que requerem transfusões regulares ou intermitentes de hemácias desenvolvem, inexoravelmente, sobrecarga de ferro com aumento da CHF e da ferritina sérica.2 Harmatz et al.,43 estudando vinte pacientes com anemia falciforme em transfusão crônica de hemácias, demonstraram que repetidas transfusões levam à sobrecarga de ferro, que é um fator determinante de maior risco de morbidade e mortalidade nestes pacientes. Balas et al.,19 analisando o efeito da sobrecarga de ferro no curso clínico de pacientes com DF, compararam pacientes sem sobrecarga de ferro (ferritina <100 ng/mL e saturação transferrina <50%) versus com sobrecarga de ferro (ferritina >1.500 ng/mL e saturação transferrina >50%). Os autores observaram que os pacientes com sobrecarga de ferro apresentaram maior número de complicações comparado aos pacientes sem sobrecarga de ferro, ou seja, maior número de crises vaso-oclusivas (38% versus 64%, respectivamente), maior ocorrência de insuficiência orgânica (19% versus 71%, respectivamente) e maior mortalidade (5% versus 64%, respectivamente).

Assim, porcentagem significativa de pacientes com DF tem indicação de tratamento ferroquelante e a quelação de ferro é capaz de reduzir tanto a morbidade quanto a mortalidade neste grupo de pacientes.44,45

Recentemente, Vichinsky et al.40 publicaram estudo fase II, randômico e controlado, que comparou deferasirox versus desferroxamina em 195 pacientes com doença falciforme (adultos e crianças > 2 anos de idade) e sobrecarga de ferro (> 20 unidades de concentrado de hemácias e ferritina sérica > 1000 mg/L). Este estudo tinha como objetivo primário avaliar a segurança e tolerabilidade do deferasirox (n=132) versus DFO (n=63), e como objetivo secundário a avaliação da alteração da CHF por biosusceptometria.

Observou-se boa tolerância (9,1% de eventos adversos com deferasirox versus 8,6% com DFO) e redução significante da CHF e ferritina sérica com a administração de doses entre 10 mg a 30 mg/kg em 12 meses de acompanhamento.

Os principais eventos adversos relatados com deferasirox foram: distúrbio gastrintestinal, elevação da creatinina e rash cutâneo de intensidade leve à moderada, dose-dependente, resolução espontânea na maioria dos casos. Nenhum efeito adverso em relação ao crescimento e desenvolvimento nos pacientes com mais de 2 anos de idade em 48 semanas de acompanhamento.40

Conclusões

• Transfusão de hemácias é um recurso terapêutico importante nos pacientes com talassemia beta maior, doença falciforme e síndrome mielodisplásica;

• Sobrecarga de ferro é um importante fator prognóstico desfavorável;

• Diagnóstico precoce e pronta instituição da terapia quelante é capaz de prevenir o aparecimento de complicações orgânicas graves, e, mesmo nos indivíduos com algum grau de disfunção orgânica, é capaz de reverter ou impedir a progressão da mesma;

• Deferiprona é um quelante oral efetivo, porém com restrições quanto a sua aprovação, indicação e eventos adversos. Até o momento presente, deve-se considerar a administração de deferiprona associada à DFO no tratamento de pacientes com talassemia beta maior e doença cardíaca sintomática secundária ao acúmulo de ferro;

• Deferasirox é um novo quelante oral, promove quelação por 24 horas com dose única diária oral, doses de 20 mg a 30 mg/kg/dia promovem balanço negativo e equivalente à obtida com 40 mg a 60 mg/kg/dia de DFO, reduzindo significativamente a CHF e a ferritina sérica em adultos, adolescentes e em crianças, a partir dos 2 anos de idade;

• A aprovação do deferasirox é um marco na história do tratamento da sobrecarga de ferro, possibilitando maior adesão ao tratamento, melhor controle da quantidade de ferro do organismo, e com enorme chance de constatarmos, em pouco tempo, melhor qualidade de vida, menor ocorrência de doença cardíaca e melhora da sobrevida de pacientes dependentes de transfusão de hemácias.

Recebido: 03/07/2007

Aceito: 15/08/2007

O tema apresentado e o convite ao autor constam da pauta elaborada pelo co-editor, prof. Rodolfo Delfini Cançado.

Avaliação: Co-editor e um revisor externo.

Publicado após revisão e concordância do editor.

Conflito de interesse: não declarado.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jan 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2007

    Histórico

    • Recebido
      03 Jul 2007
    • Aceito
      15 Ago 2007
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