Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação do efeito da hipotermia por crioimersão corporal, nos neutrófilos e linfócitos sanguíneos de ratos submetidos ao exercício físico agudo

Evaluation of the effect of hypothermia by cold water immersion on blood neutrophils and lymphocytes of rats submitted to acute exercise

Resumos

O estresse sistêmico induzido pelo exercício libera substâncias bioativas determinantes da mobilização neutrofílica. A crioterapia diminui a reação inflamatória e atenua a elevação da perfusão sanguínea induzida pelo exercício. O objetivo deste trabalho foi analisar a influência da hipotermia decorrente da crioimersão corporal (CIC) imediata ao esforço físico agudo nas concentrações neutrofílicas e linfocíticas no sangue. Os ratos do grupo controle (AI) foram mantidos em repouso enquanto os do grupo AII foram submetidos ao protocolo de CIC a 10ºC por 10 minutos. Enquanto os animais dos grupos BI, BII, BIII e BIV realizaram o esforço físico agudo (EFA) em água a 31ºC durante 100 minutos com sobrecarga corpórea de 5% do peso corporal, os dos grupos CI, CII, CIII e CIV foram submetidos ao EFA seguido imediatamente de CIC. Nos grupos B e C, os animais foram sacrificados nos períodos de 06 (I), 12 (II), 24 (III) e 48 (IV) horas posteriores ao EFA. Através da microscopia óptica realizou-se a contagem dos neutrófilos e linfócitos. Utilizou-se do Teste T Student para análise estatística considerando-se nível de significância p < 0,05. Observou-se uma significativa neutrofilia nos grupos AII, BI, BII, BIII, BIV, CI, CII e CIII em relação a AI, diferentemente do grupo CIV, que apresentou quantidade de neutrófilos igual ao grupo controle. Os valores de linfócitos nos grupos BII, BIII, BIV, CI e CII foram significativamente menores do que AI, e nos grupos AII, BI, CIII e CIV foram iguais a AI. A neutrofilia e a linfopenia posteriores ao intenso exercício agudo são mantidas por 48 horas ou mais, porém, mediante a aplicação da crioimersão corporal imediata ao exercício, são normalizadas em 24 horas.

Exercício; neutrófilos; linfócitos; hipotermia; crioimersão corporal


Systemic stress induced by exercise increases bioactive substances in plasma which leads to neutrophilic mobilization. Cryotherapy causes a decrease in the inflammatory reaction and attenuates high blood perfusion after exercise. The objective of this work was to analyze the influence of cold water immersion (CWI) after acute exercise on neutrophil and lymphocyte mobilization. A control group of rats (AI) was kept at rest and a second group (AII) was submitted to CWI at 10º C for 10 minutes. The animals of Groups BI, BII, BIII and BIV were submitted to acute exercise which consisted in swimming in water at 31º C for 100 minutes with a load equivalent to 5% of the body weight. Groups CI, CII, CIII and CIV were submitted to CWI immediately after acute exercise. The animals were sacrificed at 6 (I), 12 (II), 24 (III) and 48 (IV) hours after the exercise and neutrophil and lymphocyte cells were counted for all groups by optic microscopy. The Student t-test was used for statistical analysis with a significance level of p< 0.05. A significant increase in the number of neutrophils was observed in Groups AII, BI, BII, BIII, BIV, CI, CII and CIII compared to AI. The neutrophil count of the CIV Group was similar to the Control Group. There was a significant drop in the number of lymphocytes in Groups BII, BIII, BIV, CI and CII when compared to Group AI. The lymphocyte count of Groups AII, BI, CIII and CIV were similar to the Control Group. The changes in neutrophil and lymphocyte counts caused by acute exercise were reverted to normal at 24 hours by cold water immersion.

Exercise; neutrophils; lymphocytes; hypothermia and cold water immersion


ARTIGO ARTICLE

Avaliação do efeito da hipotermia por crioimersão corporal, nos neutrófilos e linfócitos sanguíneos de ratos submetidos ao exercício físico agudo

Evaluation of the effect of hypothermia by cold water immersion on blood neutrophils and lymphocytes of rats submitted to acute exercise

José A. BachurI; Paulo R. QuemeloI; Cynthia A. K. BachurI; Julio C. DomencianoII; Carlos H. G. MartinsIII; Marcos A. StoppaIII; Turíbio L. de Barros NetoIV; Sérgio B. GarciaV

IProfessor da Unifran. Lab. de Estudos da Recuperação Orgânica e Funcional - Fisioterapia da Universidade de Franca - SP

IIProfessor de Fisioterapia da Universidade de Franca (Unifran) - Franca-SP

IIIProfessor de Biomedicina da Universidade de Franca (Unifran) - Franca-SP

IVProfessor da Unifesp. Centro de Medicina da Atividade Física e do Esporte, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) - São Paulo-SP

VProfessor da FMRP. Depto de Patologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP - SP

Correspondência Correspondência: José Alexandre Bachur Rua Phylipina Borges do Val, 4421 - Jardim Noêmia 14400-600 - Franca-SP - Brasil Email: jabachur@unifran.br

RESUMO

O estresse sistêmico induzido pelo exercício libera substâncias bioativas determinantes da mobilização neutrofílica. A crioterapia diminui a reação inflamatória e atenua a elevação da perfusão sanguínea induzida pelo exercício. O objetivo deste trabalho foi analisar a influência da hipotermia decorrente da crioimersão corporal (CIC) imediata ao esforço físico agudo nas concentrações neutrofílicas e linfocíticas no sangue. Os ratos do grupo controle (AI) foram mantidos em repouso enquanto os do grupo AII foram submetidos ao protocolo de CIC a 10ºC por 10 minutos. Enquanto os animais dos grupos BI, BII, BIII e BIV realizaram o esforço físico agudo (EFA) em água a 31ºC durante 100 minutos com sobrecarga corpórea de 5% do peso corporal, os dos grupos CI, CII, CIII e CIV foram submetidos ao EFA seguido imediatamente de CIC. Nos grupos B e C, os animais foram sacrificados nos períodos de 06 (I), 12 (II), 24 (III) e 48 (IV) horas posteriores ao EFA. Através da microscopia óptica realizou-se a contagem dos neutrófilos e linfócitos. Utilizou-se do Teste T Student para análise estatística considerando-se nível de significância p < 0,05. Observou-se uma significativa neutrofilia nos grupos AII, BI, BII, BIII, BIV, CI, CII e CIII em relação a AI, diferentemente do grupo CIV, que apresentou quantidade de neutrófilos igual ao grupo controle. Os valores de linfócitos nos grupos BII, BIII, BIV, CI e CII foram significativamente menores do que AI, e nos grupos AII, BI, CIII e CIV foram iguais a AI. A neutrofilia e a linfopenia posteriores ao intenso exercício agudo são mantidas por 48 horas ou mais, porém, mediante a aplicação da crioimersão corporal imediata ao exercício, são normalizadas em 24 horas.

Palavras-chave: Exercício; neutrófilos; linfócitos; hipotermia; crioimersão corporal.

ABSTRACT

Systemic stress induced by exercise increases bioactive substances in plasma which leads to neutrophilic mobilization. Cryotherapy causes a decrease in the inflammatory reaction and attenuates high blood perfusion after exercise. The objective of this work was to analyze the influence of cold water immersion (CWI) after acute exercise on neutrophil and lymphocyte mobilization. A control group of rats (AI) was kept at rest and a second group (AII) was submitted to CWI at 10º C for 10 minutes. The animals of Groups BI, BII, BIII and BIV were submitted to acute exercise which consisted in swimming in water at 31º C for 100 minutes with a load equivalent to 5% of the body weight. Groups CI, CII, CIII and CIV were submitted to CWI immediately after acute exercise. The animals were sacrificed at 6 (I), 12 (II), 24 (III) and 48 (IV) hours after the exercise and neutrophil and lymphocyte cells were counted for all groups by optic microscopy. The Student t-test was used for statistical analysis with a significance level of p< 0.05. A significant increase in the number of neutrophils was observed in Groups AII, BI, BII, BIII, BIV, CI, CII and CIII compared to AI. The neutrophil count of the CIV Group was similar to the Control Group. There was a significant drop in the number of lymphocytes in Groups BII, BIII, BIV, CI and CII when compared to Group AI. The lymphocyte count of Groups AII, BI, CIII and CIV were similar to the Control Group. The changes in neutrophil and lymphocyte counts caused by acute exercise were reverted to normal at 24 hours by cold water immersion.

Key words: Exercise; neutrophils; lymphocytes; hypothermia and cold water immersion.

Introdução

O estresse sistêmico induzido experimentalmente pelo esforço físico repetitivo libera substâncias bioativas que determinam a mobilização neutrofílica e a capacidade funcional, podendo atingir órgãos susceptíveis a partir das lesões teciduais.1 A realização do esforço físico pode produzir trauma muscular e esquelético seguidos da reação inflamatória local, porém, com a repetição do estímulo estressor, a inflamação local pode generalizar-se na síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS).2,3 Em humanos, os sinais e sintomas indicativos da presença da Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica são: temperatura corporal excedente a 38ºC; frequência cardíaca superior a 90 batimentos por minutos; frequência respiratória superior a 20 incursões por minuto; contagem de leucócitos superior a 12.000 células/μl; neutrófilos imaturos em quantidade superior a 10%.1

O aumento no número de leucócitos no sangue comumente mediante a agressão, pode ocorrer em até duas ou três vezes a mais o valor normal, após um minuto de exercício extremamente intenso, ou após uma injeção de noradre-nalina. Aproximadamente uma hora após o esforço físico, a neutrofilia fisiológica volta ao normal, devido ao fato de que a maior parte dos leucócitos está novamente aderida à parede dos vasos, reduzindo-se a magnitude do compartimento leucocitário central ou circulante.2A aplicação de água gelada pelo período de 10 minutos mostra-se efetiva, sob uma temperatura entre 10º a 15ºC, podendo-se sustentar a redução térmica local sem comprometer a pele,4 além de estabelecer um decréscimo da reação inflamatória em situações experimentais.5 Através da comparação das imagens entre os dorsiflexores não submetidos à aplicação de bolsa de gelo com aqueles em que se aplicou tal procedimento após a realização do esforço físico de dorsiflexão, observou-se que o resfriamento atenua a elevação da perfusão induzida pelo esforço físico.6

Partindo-se do preceito de que a realização de um esforço físico exaustivo pode predispor o organismo a um quadro de neutrofilia associada a linfopenia, é provável que a imersão em água gelada imediatamente após a realização do referido esforço físico exaustivo por um determinado tempo possa interferir nas respostas neutrofílica e linfocítica. Objetivo: Analisar a influência da hipotermia decorrente da crioimersão corporal (CIC) imediata ao esforço físico agudo, nas concentrações sanguíneas de neutrófilos e de linfócitos.

Material e Método

O presente estudo foi realizado mediante asua prévia aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade de Franca, protocolada com o número 004/06 em 16/08/2006. Foram utilizados 50 ratos machos da linhagem Wistar, pesando 300 gramas em média. Os animais foram distribuídos aleatoriamente, cinco a cinco, nos grupos controle AI e AII; de exercício BI, BII, BIII e BIV; de exercício seguido de crioimersão CI, CII, CIII e CIV. Enquanto os animais do AI foram mantidos em repouso sob temperatura ambiente (TºA), os do grupo AII foram submetidos à crioimersão corporal (CIC). Os ratos do grupo B foram submetidos ao EFA e em seguida mantidos em repouso à temperatura ambiente até o momento do sacrifício para a coleta de sangue que ocorreu 06 (BI), 12 (BII), 24 (BIII) e 48 (BIV) horas após o exercício físico. Os dos grupos C foram submetidos ao EFA, seguido imediatamente da CIC e sacrificados nos diferentes períodos posteriores ao EFA, da mesma forma que os animais dos grupos B.

Crioimersão corporal (CIC): Os animais foram individualmente imersos na água até a região axilar, em um recipiente cilíndrico de plástico, com 15 cm de diâmetro por 30 cm de altura. A referida imersão ocorreu durante 10 minutos contínuos, sendo que a água utilizada foi mantida constantemente na temperatura de 10ºC.

Esforço físico agudo: O EFA do tipo natação foi realizado em tanque apropriado com água a 31ºC com duração de 100 minutos, sob uma intensidade relativa à sobrecarga corpórea equivalente a 5% do peso corporal, de acordo com protocolo utilizado em outros estudos.7,30,31

Coleta e análise de material biológico: Ao final do período experimental foram coletadas amostras de sangue por punção cardíaca, com os animais sob efeito anestésico decorrente da associação de 0,5 ml de ketamina (Pfizer do Brasil Ltda, SP, Brasil) a 0,1 ml de xilasina (Bayer do Brasil Ltda, SP, Brasil). Para a análise das concentrações de leucócitos foi utilizada uma pipeta para separação de sangue total diluído em solução de Turk, agitando-se por três minutos. A solução era gotejada na câmara de Neubauer para a contagem de leucócitos totais, utilizando-se de um microscópio óptico. Para a contagem diferenciada dos leucócitos foram confeccionadas lâminas de esfregaço sanguíneo corado com Leishman.8

Análise Estatística: Todos os valores obtidos foram tratados estatisticamente na obtenção de médias ponderadas, com os valores de Erro Padrão da Média conhecidos, e a significância da diferença avaliada através do Test de Student, onde o nível de significância (*) considerado foi de p < 0,05.

Resultados

De acordo com os dados da Tabela 1, em relação à concentração de neutrófilos do grupo controle (AI), ocorreu um significativo aumento de neutrófilos nos animais submetidos apenas à crioimersão (AII), assim como naqueles animais submetidos ao esforço físico agudo intenso desde as seis primeiras horas (BI) até 48 horas (BIV) posteriores. Porém, o aumento de neutrófilos nos animais submetidos ao esforço físico agudo seguido de crioimersão corporal foi mantido desde as seis primeiras horas (CI) até 24 horas (CIII), normalizando-se em 48 horas (CIV), diferentemente daqueles animais não submetidos à crioimersão pósesforço físico agudo intenso, nos quais a neutrofilia é mantida por até 48 horas ou mais. Comparativamente com a concentração linfocítica dos animais do grupo controle (AI), a significativa redução desta células nos animais submetidos ao esforço físico agudo intenso (grupos B) ocorre inicialmente com 12 horas e é mantida até 48 horas após a realização do referido esforço. Nos animais submetidos ao esforço físico agudo intenso seguido de crioimersão corporal (grupos C) observa-se uma significativa redução linfocítica da 6ª hora (CI) até a 12ª hora (CII), retornando aos valores normais em 24 horas e mantendo-se dentro da normalidade.

Discussão

O exercício físico gera um desvio do estado de homeostase orgânica, levando à reorganização da resposta de diversos sistemas, dentre eles o sistema imune, sendo que esta resposta imune deverá ser proporcional à dimensão do estímulo recebido.9 Ao considerarmos a relação entre intensidade-duração-frequência, várias formas de atividade física estão associadas à elevação de alguns marcadores inflamatórios, tais como a Proteína C reativa e os níveis das células leucocitárias.10 Isto porque substâncias bioativas liberadas mediante o estresse sistêmico induzido experimentalmente pelo esforço físico repetitivo são capazes de determinar a mobilização neutrofílica.1 Os mecanismos que modulam a resposta imune ao exercício podem ser divididos em três grupos: hormonais,11,12 metabólicos13 e mecânicos.14

Dentre os fatores metabólicos e mecânicos devemos citar a glutamina, que é um aminoácido fundamental no metabolismo das células musculares e do sistema imune,13 a hipóxia, hipertermia12 e, finalmente, a lesão muscular geradora do processo inflamatório localizado.14 Dentre os principais hormônios que atuam no sistema imune durante o exercício estão as catecolaminas (epinefrina), o cortisol, hormônio do crescimento (GH) e os peptídeos opióides (endorfinas).15 Alterações nas concentrações dos hormônios catecolamínicos e do cortisol16 levam a uma redistribuição dos leucócitos, caracterizando um efeito imunossupressor.17

O esforço físico de alta intensidade é geralmente acompanhado por alguns sintomas, como: fadiga, distúrbios do sono, perda de peso, dores de cabeça,16 além de promover modificações na concentração, proporção e funções das células brancas do sangue, especialmente nos leucócitos polimorfonucleares, nas células NK e nos linfócitos.18 Portanto, o esforço físico de alta intensidade pode causar lesão tecidual associada à liberação de mediadores químicos da inflamação, elevação da produção dos hormônios do estresse, alterações na quantidade e função das várias células circulantes do sistema imunológico, como a mobilização e ativação dos leucócitos, além da elevação da produção de radicais livres, provocando o estabelecimento do estresse oxidativo.19,20 Indivíduos sedentários submetidos a três diferentes modelos de esforço físico, ambos com duração de 120 minutos sob uma intensidade relativa a 60% do consumo máximo de oxigênio (VO2máx), apresentaram leucocitose (com aumento de neutrófilos e monócitos) por três horas após esforço físico.21

A resposta dos neutrófilos polimorfonucleares a uma sessão única de exercício está na dependência da intensidade deste. A neutrofilia imediata ao exercício é decorrente da desmarginação provocada por alterações hemodinâmicas, como a elevação do débito cardíaco, associada à ação de catecolaminas.21,22 Estes dois aspectos movimentam os polimorfonucleares ao longo dos vasos sanguíneos, incluindo os neutrófilos, que estão geralmente marginados nos pulmões, baço e fígado.21 Várias horas após o exercício ocorre um segundo pico de neutrofilia, consequente à mobilização de células da medula óssea em resposta à elevação das concentrações plasmáticas de cortisol.22 O retorno dessas células à linha de defesa leva cerca de 24 horas, após a realização do esforço físico.21 A neutrofilia mantida por 48 horas ou mais, observada no presente trabalho, demonstranos que o esforço físico realizado, apesar de agudo, foi de uma dimensão no mínimo moderada, pois, em relação à resposta funcional ao exercício, o trabalho moderado associase a aumento de função do neutrófilo.23 O exercício de máxima intensidade está associado a diminuição funcional da maioria das atividades de neutrófilos. No entanto, a evidência de que o exercício progressivo até a exaustão aumenta a capacidade fagocítica, associada ao achado de aumento de atividade de elastase no plasma, indicando degranulação, sugere que a supressão relatada de funções neutrofílicas possa estar relacionada a um período refratário pós-exercício.24A normalização neutrofílica ocorrida anteriormente ao período de 48 horas, como foi observada junto aos animais submetidos à crioimersão corporal imediata ao esforço físico, pode ser considerada como um fator benéfico mediante a fragilidade imunológica em que se encontram os organismos submetidos à realização de esforço físico de dimensões moderadas a exaustivas.

A linfopenia decorrente do esforço físico observada neste estudo, segundo outros estudos, é causada pela alta concentração de cortisol, hormônio de crescimento e catecolamina no plasma. A concentração de linfócitos tende a normalizar-se aos níveis basais, cerca de 24 horas após a realização do esforço físico, dependendo da relação entre os parâmetros de intensidade, duração e frequência do esforço físico realizado.21 Com relação à capacidade funcional, é relatada diminuição da proliferação linfocitária após exercícios de alta intensidade, persistindo esta resposta por várias horas após uma maratona.25A inibição da proliferação linfocitária é decorrente, principalmente, da ação da epinefrina e do cortisol, como foi observado que, mediante a administração de epinefrina in vivo está associada à redução de responsividade de linfócitos a mitógenos. In vitro, a estimulação de receptores β2-adrenérgicos por epinefrina pode inibir a proliferação linfocitária,26 a secreção de IL-2 e a expressão de receptores para IL-2.27 O cortisol também parece inibir a proliferação por ação direta na célula e por inibição da produção de IL-2.28,29 Assim como se observou neste estudo em relação aos neutrófilos, a normalização linfocitária ocorrida em 24 horas nos animais submetidos à crioimersão corporal imediata ao esforço físico apresenta-se como uma importante alternativa terapêutica em busca no estado homeostásico, diferentemente do ocorrido naqueles não submetidos a este procedimento térmico, os quais apresentaram uma linfopenia permanente por 48 horas ou mais.

As evidências disponíveis demonstram que o esforço físico tem efeitos modulatórios importantes sobre a dinâmica de células do sistema imune e, possivelmente, sobre sua função. Os fatores neuroendócrinos que atuam na redistribuição de células e na liberação de citocinas em resposta ao exercício físico parecem também mediar a relação entre o sistema imunológico e o esforço físico. Porém, os mecanismos desta relação ainda não estão totalmente elucidados, incluindo-se o padrão da resposta imunológica do exercício agudo.32

Um fator a ser considerado como facilitador da desistência da prática esportiva, ou mesmo da queda no desempenho físico após exercício vigoroso, é o conjunto de alterações no sistema imune que podem ser desencadeadas por sessões agudas de exercícios.33 Embora os resultados obtidos neste estudo sejam relevantes por serem aparentemente favoráveis para a minimização do estresse orgânico causado pelo esforço físico agudo, é necessário que os mecanismos determinantes desta normalização leucocitária mediante a crioimersão corporal sejam devidamente esclarecidos em estudos posteriores.

Conclusão

A crioimersão corporal em água a 10ºC por 10 minutos imediatamente após o esforço físico agudo com intensidade alta pode vir a ser uma importante conduta terapêutica, pois provoca uma normalização neutrofílica e linfocítica no período em torno de 24 horas.

Recebido: 06/03/2008

Aceito após modificações: 08/10/2008

Avaliação: Editor e dois revisores externos

Conflito de interesse: não declarado

Faculdade de Fisioterapia da Universidade de Franca, Cemafe - Franca-SP. Centro de Medicina da Atividade Física e do Esporte, Depto. de Patologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP-SP.

  • 1. Suzuki K, Totsuka M, Nakaji S, Yamada M, Kudoh S, Liu Q et al. Endurance exercise causes interaction among stress hormones, cytokines, neutrophil dynamics, and muscle damage. J Appl Physiol. 1999;87(4):1360-7.
  • 2. Natale VM, Brenner IK, Moldoveanu AI, Vasiliou P, Shek P, Shephard RJ. Effects of three different types of exercise on blood leukocyte count during and following exercise. Sao Paulo Med J. 2003;121 (1):9-14.
  • 3. Howatson G, Van Someren KA. Ice massage. Effects on exercise-induced muscle damage. J Sports Med Phys Fitness. 2003;43 (4):500-5.
  • 4. Mac Auley DC. Ice therapy: how good is the evidence? Int J Sports Med. 2001;22(5):379-84.
  • 5. Marshall JC. The gut as a potential trigger of exercise-induced inflammatory responses. Can J Physiol Pharmacol. 1998;76(5): 479-84.
  • 6. Douglas CR. Patofisiologia Geral: Mecanismo da Doença. 1Şed. 2000.
  • 7. Bachur JA, Garcia SB, Vannucchi H, Jordao AA, Chiarello PG, Zucoloto S. Anti-oxidative systems in rat skeletal muscle after acute physical exercise. Appl Physiol Nutr Metab. 2007; 32(2): 190-6.
  • 8. Pedersen BK, Ostrowski K, Rohde T, Bruunsgaard H. The cytokine response to strenuous exercise. Can J Physiol Pharmacol. 1998; 76(5):505-11.
  • 9. Shephard RJ, Shek PN. Potential impact of physical activity and sport on the immune system--a brief review. Br J Sports Med. 1994;28(4):247-55.
  • 10. King DE, Carek P, Mainous AG 3rd, Pearson WS. Inflammatory markers and exercise: differences related to exercise type. Med Sci Sports Exerc. 2003;35(4):575-81.
  • 11. Jonsdottir IH, Hoffmann P, Thorèn P. Physical exercise, endogenous opioids and immune function. Acta Physiol Scand Suppl. 1997;640:47-50.
  • 12. Pedersen KB, Klokker M, Kappel M. Possible role of hyperthermia and hypoxia in exercise-induced immunomodulation. In: Pedersen KB, editor. Exercise immunology. New York: Chapman & Hall, 1997:61-73.
  • 13. Curi R, Newsholme P, Pithon-Curi TC, Pires-de-Melo M, Garcia C, Homem-de-Bittencourt Júnior PI et al Metabolic fate of glutamine in lymphocytes, macrophages and neutrophils. Braz J Med Biol Res. 1999;32(1):15-21.
  • 14. Evans WJ, Cannon JG. The metabolic effects of exercise-induced muscle damage. Exerc Sport Sci Rev. 1991;19:99-125.
  • 15. Costa Rosa LFPB, Vaisberg MW. Influência do Exercício na Resposta Imune. Rev. Bras. Medicina do Esporte. 2002;8(4):167
  • 16.Werineck J. Treinamento ideal: instruções técnicas sobre o desempenho fisiológico, incluindo considerações específicas de treinamento infantil e juvenil. 9Ş ed. São Paulo: Manole, 1999.
  • 17. Nieman DC. Immunity in athletes: current issues. Sports Science Exchange 1998;2:1-11.
  • 18. Eichner ER. Contagious infections in competitive sports. Sports Science Exchange 1995;3:1-4.
  • 19. Murakami T, Shimomura Y, Fujitsuka N, Sokabe M, Okamura K, Sakamoto S. Enlargement glycogen store in rat liver and muscle by fructose-diet intake and exercise training. J Appl Physiol. 1997;82(3):772-5.
  • 20. Kudelska G, Górski J, Swiatecka J, Górska M. Effect of exercise on glycogen metabolism in muscles of triiodothyronine-treated rats. Eur J Appl Physiol Occup Physiol. 1996;72(5-6):496
  • 21. Oliveira CAM, Rogatto GP, Luciano E. Efeitos do treinamento físico de alta intensidade sobre os leucócitos de ratos diabéticos. Rev Bras Med Esporte. 2002;8(6):219-224.
  • 22. Mackinnon LT. Immunity in athletes. Int J Sports Med. 1997;18 Suppl 1:S62-8.
  • 23. Smith JA, Telford RD, Mason IB, Weidemann MJ. Exercise, training and neutrophil microbicidal activity. Int J Sports Med. 1990;11(3):179-87.
  • 24. Dufaux B, Order U. Plasma elastase-alpha 1-antitrypsin, neopterin, tumor necrosis factor, and soluble interleukin-2 receptor after prolonged exercise. Int J Sports Med. 1989;10(6):434-8.
  • 25. Nehlsen-Cannarella SL, Nieman DC, Jessen J, Chang L, Gusewitch G, Blix GG et al. The effects of acute moderate exercise on lymphocyte function and serum immunoglobulin levels. Int J Sports Med. 1991;12(4):391-8.
  • 26. Rosa LF. Effect of adrenaline on lymphocyte metabolism and function. A mechanism involving cAMP and hydrogen peroxide. Cell Biochem Funct. 1997;15(2):103-12.
  • 27. Van Tits LJ, Michel MC, Grosse-Wilde H, Happel M, Eigler FW, Soliman A et al Catecholamines increase lymphocyte beta 2adrenergic receptors via a beta 2-adrenergic, spleen-dependent process. Am J Physiol. 1990;258(1 Pt 1):E191-202.
  • 28. Newsholme P, Costa Rosa LF, Newsholme EA, Curi R. The importance of fuel metabolism to macrophage function. Cell Biochem Funct. 1996;14(1):1-10.
  • 29. Azevedo RB, Costa Rosa LFBP, Lacava ZGM, Curi R. Effects of sexual steroidal hormones on lymphocytes and macrophages metabolism. Cell Biochem Funct 1997;15:293-8.
  • 30. Ferreira CKO, Prestes J, Donato FF, Vieira WHB, Palanch AC, Cavaglieri CR. Efeitos agudos do exercício de curta duração sobre a capacidade fagocitária de macrófagos peritoneais em ratos sedentários. Rev. Bras. Fisioter. São Carlos. 2007;11(3):191-7.
  • 31. Silveira SEM, Rodrigues MF, Vianna DR, Almeida BS, Rossato JS, Krause M et al O Exercício aeróbico agudo (natação) estimula a funcionalidade imunológica e inflamatória de monócitos circulantes. FESBE, Anais do Congresso, 2006.
  • 32. Leandro C, Nascimento E, Manhães CR, Duarte JA, Castro CMMB. Exercício físico e sistema imunológico. Rev. Port. de Cienc. do Desporto. 2002;2(5):80-90.
  • 33. Dias R, Frollini AB, Prestes J, Ferreira CKO, Donatto FF, Verlengia R et al Efeito do exercício agudo de curta duração em leucócitos circulantes e linfócitos teciduais de ratos. Rev. Bra. Educ. Fis. Esp., 2007;21(3):229-43.
  • Correspondência:
    José Alexandre Bachur
    Rua Phylipina Borges do Val, 4421 - Jardim Noêmia
    14400-600 - Franca-SP - Brasil
    Email:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jan 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008

    Histórico

    • Aceito
      08 Out 2008
    • Recebido
      06 Mar 2008
    Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia e Terapia Celular R. Dr. Diogo de Faria, 775 cj 114, 04037-002 São Paulo/SP/Brasil, Tel. (55 11) 2369-7767/2338-6764 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: secretaria@rbhh.org