Acessibilidade / Reportar erro

Manifestação bucal de linfoma difuso de grandes células B

Oral manifestation of diffuse large B-cell lymphoma

Resumos

O linfoma de células B acomete cerca de 90% de todos os casos de linfoma. O aparecimento da lesão bucal deste tipo de linfoma é pouco comum e raras vezes se manifesta em região anterior de mandíbula. Neste relato de caso, o paciente de 22 anos, sexo masculino, com diagnóstico de linfoma de grandes células B em mediastino e pleura, após um ano de tratamento apresentou lesão nodular em região anterior de mandíbula, comprometendo os dentes incisivos inferiores. O diagnóstico histológico e imuno-histoquímico confirmou a forma secundária do linfoma. O paciente foi submetido a tratamento quimioterápico com regressão completa da lesão mandibular e está sob acompanhamento odontológico reabilitador.

Manifestações bucais; linfoma difuso de grandes células B; neoplasias maxilomandibulares


B-cell lymphomas account for around 90% of all cases of lymphoma. The appearance of oral lesions with this type of lymphoma is uncommon but in cases where involvement is seen, the anterior region of lower jaw is most frequently affected. Here the case of a 22-year-old male patient is reported; he was diagnosed with large B cell lymphoma in the mediastinal pleura and after 1 year of treatment he evolved with a nodular lesion in the anterior region of the lower jaw involving the incisors. Histological diagnosis and immunohistochemistry confirmed secondary lymphoma. The patient was submitt.

Oral manifestations; lymphoma; large B-cell diffuse; jaw neoplasms


RELATO DE CASO CASE REPORT

Manifestação bucal de linfoma difuso de grandes células B

Oral manifestation of diffuse large B-cell lymphoma

Paulo Sérgio S. SantosI; Eduardo S. FerreiraII; Rafael M. VidoteII; Roberto Antonio P. PaesIII; Ronaldo R. FreitasIV

ICirurgião Dentista. Assistente do Serviço de Cirurgia Bucomaxilofacial – Santa Casa de São Paulo-SP

IICirurgião Dentista. Aperfeiçoando do Serviço de Cirurgia Bucomaxilofacial – Santa Casa de São Paulo-SP

IIIMédico Patologista. Professor Adjunto da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo-SP

IVMédico. Chefe do Serviço de Cirurgia Bucomaxilofacial da Santa Casa de São Paulo-SP

Correspondência Correspondência: Paulo Sérgio S. Santos Rua Aureliano Coutinho, 278, conjunto 21 – Vila Buarque 01224-020 – São Paulo-SP – Brasil E-mail: paulosergiosilvasantos@gmail.com Doi:

RESUMO

O linfoma de células B acomete cerca de 90% de todos os casos de linfoma. O aparecimento da lesão bucal deste tipo de linfoma é pouco comum e raras vezes se manifesta em região anterior de mandíbula. Neste relato de caso, o paciente de 22 anos, sexo masculino, com diagnóstico de linfoma de grandes células B em mediastino e pleura, após um ano de tratamento apresentou lesão nodular em região anterior de mandíbula, comprometendo os dentes incisivos inferiores. O diagnóstico histológico e imuno-histoquímico confirmou a forma secundária do linfoma. O paciente foi submetido a tratamento quimioterápico com regressão completa da lesão mandibular e está sob acompanhamento odontológico reabilitador. Rev. Bras. Hematol. Hemoter.

Palavras-chave: Manifestações bucais; linfoma difuso de grandes células B; neoplasias maxilomandibulares.

ABSTRACT

B-cell lymphomas account for around 90% of all cases of lymphoma. The appearance of oral lesions with this type of lymphoma is uncommon but in cases where involvement is seen, the anterior region of lower jaw is most frequently affected. Here the case of a 22-year-old male patient is reported; he was diagnosed with large B cell lymphoma in the mediastinal pleura and after 1 year of treatment he evolved with a nodular lesion in the anterior region of the lower jaw involving the incisors. Histological diagnosis and immunohistochemistry confirmed secondary lymphoma. The patient was submitt Rev. Bras. Hematol. Hemoter.

Key words: Oral manifestations; lymphoma; large B-cell diffuse; jaw neoplasms.

Linfomas não Hodgkin da cavidade oral e orofaringe são definidos como neoplasias de células linfoides em que a manifestação da doença ocorre no palato, língua, assoalho da boca, gengiva, mucosa bucal, lábios, tonsilas palatinas, amígdalas linguais ou orofaringe. Estes linfomas são classificados e subdivididos pela Organização Mundial de Saúde em: Linfoma difuso de grandes células B, Linfoma de célula do manto, Linfoma folicular, Linfoma extranodal de células B da zona marginal, Linfoma de Burkitt, Linfoma de célula T.1

O linfoma de células B acomete cerca de 90% de todos os casos de linfoma. O linfoma difuso de grandes células B é a forma mais comum dos linfomas não Hodgkin e acomete principalmente adultos, mas também se manifesta em crianças. O linfoma difuso de grandes células B pode ocorrer fora dos linfonodos, sendo denominados extranodais.2,3

Na cavidade oral representam cerca de 2% de todos os linfomas não Hodgkin, não apresentam predileção por sexo, acometem em sua maioria pacientes entre a quarta e oitava décadas de vida, com idade média entre 50 e 60 anos.4 Comumente apresentam-se como tumefações em tecido mole justaósseo no vestíbulo bucal, podendo, em alguns casos, estarem intraósseos com extravasamento para tecido mole, com sintomatologia dolorosa ou parestesia da região.5 As localizações mais frequentes na cavidade oral são: gengivas, lesões intraósseas na mandíbula, palato e na maxila.6 Os sinais e sintomas apresentados pelos linfomas na cavidade oral são de curta duração e com progressão rápida da lesão. As lesões bucais estão relacionadas a doenças já disseminadas e raramente têm sua primeira manifestação na cavidade oral.3

O diagnóstico dos linfomas orais pode ser complicado pelo baixo índice de suspeita clínica. Diante desta condição, é indicada a realização de biópsia incisional, sendo a área de escolha criteriosa para que não ocorram erros diagnósticos. Atualmente, a melhor opção de análise diagnóstica é o exame imuno-histoquímico da lesão, que distingue as condições benignas das malignas, oferecendo uma rigorosa subclassificação dos tipos de linfoma.

Existem trinta ou mais subtipos de linfoma que foram categorizados em uma classificação de acordo com a velocidade de crescimento em: baixo grau (muito lento) ou alto grau, agressivo (muito rápido) e também em relação ao linfócito em T, B ou NK.2

O tratamento é realizado com esquema quimioterápico CHOP (Ciclofosfamida, doxorrubicina, vincristina e prednisona), e por vezes associado ao rituximab (R-CHOP).7

O objetivo deste trabalho é relatar um caso de linfoma difuso de grandes células B do mediastino com manifestação secundária em cavidade oral.

Relato de Caso

Paciente com 22 anos, sexo masculino, com diagnóstico em maio de 2007 de linfoma difuso de grandes células B em mediastino e pleura, tratado com esquema quimioterápico de IV CHOP + II R-CHOP, com recidiva da lesão em agosto de 2008 acometendo mandíbula, meninge, rim e estômago.

Ao exame clínico intra-oral foi constatado aumento de volume em fundo de sulco gengival vestibular mandibular em região dos dentes incisivos central e lateral do lado direito com apagamento de fundo de sulco, e coloração idêntica as mucosas adjacentes, descolamento do ligamento periodontal na região cervical, além de mobilidade avançada (Grau III) dos dentes envolvidos na lesão, segundo a classificação clínica (Lindhe, 2003) das lesões periodontais estabelecida segundo o grau de destruição horizontal de tecido periodontal entre as raízes dentárias (Figura 1).


A lesão apresentava consistência fibrosa, que se deformava à compressão e voltava à conformação normal. Os testes de percussão para investigação de vitalidade pulpar e resposta inflamatória foi negativa nos dentes associados à lesão.

Aos exames de imagem a lesão mostrava-se radiolúcida envolvendo os dentes incisivo central e o incisivo lateral inferiores do lado direito, apresentando-se com limites mal definidos (Figura 2).


Os achados clínicos e radiográficos sugeriram hipóteses diagnósticas de lesões císticas ósseas bucais, neoplasias benignas de tecidos duros ou de origem odontogênica, e, diante do diagnóstico do linfoma em outros órgãos, à suspeita de linfoma bucal.

Diante dos achados foi planejada uma biópsia incisional de lesão em mucosa bucal mandibular. O local eleito para se realizar a biópsia apresentava-se com a mucosa desinserida e os dentes associados com mobilidade de grau III; foi removido um fragmento com coloração idêntica às mucosas adjacentes de aspecto fibroso e sangrante. Optou-se pela extração dos dentes envolvidos por apresentarem comprometimento periodontal.

O fragmento removido foi enviado para exame anatomopatológico e imuno-histoquímico. O aspecto macroscópico do fragmento era irregular, medindo 0,4 cm, constituído por tecido firme e esbranquiçado. Ao exame microscópico, fragmento de mucosa revestida por epitélio plano estratificado que apresenta no córion infiltrado predominantemente linfócitos com núcleos ligeiramente irregulares, entremeados por raros plasmócitos e neutrófilos. Em certa área há um acúmulo de fibrina e piócitos, além de infiltração linfocitária em mucosa (Figura 3). Imuno-histoquimicamente foram pesquisados antígenos CD15, CD30, CD45, CD3 e CD20. Ao exame microscópico a pesquisa revelou imunoexpressão de: CD15 negativo, CD30 negativo, CD45 positivo, CD3 negativo e CD20 positivo (Figura 4), sendo diagnosticado como compatível com linfoma difuso de grandes células B.



No momento, o paciente está sob tratamento onco-hematológico com dexametasona e rituximab, em remissão completa da lesão bucal.

Discussão

O linfoma difuso de grandes células B ocorre fora dos linfonodos, denominados extranodais, e o diagnóstico dos linfomas orais pode ser complicado pelo baixo índice de suspeita clínica e por apresentar como diagnósticos diferenciais o linfoma de Burkitt,9 a hipercalcemia (tumor marrom da paratireoide) e lesão central de células gigantes, portanto, a relevância da descrição deste caso. Outro ponto importante é o momento do aparecimento da manifestação bucal, que, em sua maioria, ocorre de forma secundária à manifestação inicial. Neste relato de caso encontramos uma manifestação secundária da doença em cavidade oral, que é a forma de apresentação mais comum, diferente do caso descrito por Jham et al,2 que observaram manifestação bucal primária do linfoma.

Kolokotroniset al,10 em seu artigo sobre linfomas com acometimento bucal, tiveram como achado histológico mais encontrado as células grandes difusas, compatível com os achados neste relato, o qual foi compatível também com o histopatológico do linfoma principal de mediastino. Histologicamente, o caso apresentado está de acordo com a frequência de fenótipos apresentada pela literatura,11 que mostra que linfomas de células B, como no caso apresentado, são mais frequentes que linfomas de outras células do sistema linforreticular.

Os aspectos clínicos no acometimento de pacientes com linfoma difuso de grandes células B geralmente estão presentes em indivíduos do gênero masculino, idade adulta, com presença de tumefação firme e difusa no local da lesão;3,12-16 estes achados são compatíveis com este relato de caso. Entretanto, a localização da lesão em região anterior de mandíbula diverge da maioria dos casos da literatura, segundo Epstein et al13 e Goteri et al,14 o acometimento na cavidade oral ocorre com maior frequência no anel de Waldeyer, tonsilas e palato, sendo raro o acometimento da mucosa vestibular de mandíbula, como ocorre no caso em questão.

Conclusão

Os linfomas são lesões malignas agressivas, entretanto, quando identificadas precocemente, apresentam um alto potencial de cura através de quimioterapia associada ou não à radioterapia. Cabe ao cirurgião dentista diagnosticar a manifestação bucal e maxilofacial do linfoma bem como seus diagnósticos diferenciais, contribuindo assim para o tratamento médico efetivo da doença onco-hematológica.

Recebido: 12/02/2009

Aceito após modificações: 24/03/2009

Santa Casa de Misericórdia de São Paulo – São Paulo-SP.

Avaliação: Editor e dois revisores externos

Conflito de interesse: sem conflito de interesse

  • 1. Barnes L, Eveson JW, Teichart P, Sidransky D. Pahology & Genetics - Head and Neck Tumours(WHO). Lyon: IARCPress 2005:201.
  • 2. Jham BC, Duarte ECB, Fernandes AM, Johann ACBR, Agular MCF, Gomez RS, et al Primary diffuse large B-cell lymphoma of the oral cavity. J Bras Patol Med Lab. 2007; 43(5):369-72.
  • 3. Neville BW, Damm DD, Allen CM, Bouquot JE. Patologia Oral e Maxilofacial. 2 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2004.
  • 4. Freeman C, Berg JW, Cutler SJ. Occurrence and prognosis of extranodal lymphomas. Cancer. 1972;29(1):252-60.
  • 5. Fukuda Y, Ishida T, Fujimoto M, Ueda T, Aozasa K. Malignant lymphoma of the oral cavity: clinicopathologic analysis of 20 cases. J Oral Pathol. 1987;16(1):8-12.
  • 6. Howell RE, Handlers JP, Abrams AM, Melrose RJ. Extranodal oral lymphoma. Part II. Relationships between clinical features and the Lukes-Collins classification of 34 cases. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1987;64(5):597-602.
  • 7. Chiattone CS. In: Lopes CA. Tratado de Clínica Médica. 1Ş edição, São Paulo: Ed. Roca, 2006.
  • 8. Lindhe J, Karring T, Lang N. Clinical Periodontology and Implant Dentistry. 4Ş edição, Londres, Blackwell Munksgaard, 2003.
  • 9. Ardekian L, Rachmiel A, Rosen D, Abu-el-Naaj I, Peled M, Laufer D. Burkitt's lymphoma of the oral cavity in Israel. J Craniomaxillofac Surg. 1999;27(5):294-7.
  • 10. Kolokotronis A, Konstantinou N, Christakis I, Papadimitriou P, Matiakis A, Zaraboukas T, et al. Localized B-cell non-Hodgkin's lymphoma of oral cavity and maxillofacial region: a clinical study. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2005; 99 (3):303-10.
  • 11. Kozakiewicz M, Karolewski M, Kobos JW, Stolecka Z. Malignant lymphoma of the jaw bone. Med Sci Monit. 2003;9(12):CS110-4.
  • 12. Diaz MLP, Haro MLL, Flores AMA. Linfoma no Hodgkin intraóseo reconstruccíon mandibular secundaria: reporte de caso clínico. Revista Odontológica Mexicana. 2005;9(4):197-202.
  • 13. Epstein JB, Epstein JD, Le ND, Gorsky M. Characteristics of oral and paraoral malignant lymphoma: a population-based review of 361 cases. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2001;92(5):519-25.
  • 14. Goteri G, Ascani G, Filosa A, Rubini C, Olay S, Balercia P. Linfoma malt primario de la lengua. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2004;9 (5):461-3; 459-61.
  • 15. Regezi JA, Sciubba JJ. Patologia Bucal: correlações clinicopatologicos. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2000.
  • 16. Romeo JA, Fillat ES, Bouthelier TU, Ullrich JMG, Lázaro MTT. Linfoma no Hodgkin primario de mandíbula. Rev Esp Patol. 2006; 39(1):45-8.
  • Correspondência:

    Paulo Sérgio S. Santos
    Rua Aureliano Coutinho, 278, conjunto 21 – Vila Buarque
    01224-020 – São Paulo-SP – Brasil
    E-mail:
    Doi:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Out 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      24 Mar 2009
    • Recebido
      12 Fev 2009
    Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia e Terapia Celular R. Dr. Diogo de Faria, 775 cj 114, 04037-002 São Paulo/SP/Brasil, Tel. (55 11) 2369-7767/2338-6764 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: secretaria@rbhh.org