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EDITORIAL

Iniciamos mais um ano e é com satisfação que entregamos aos nossos leitores um novo número de Sociologias. Acreditamos sempre na importância da construção de saberes sociológicos, teoricamente densos, capazes de alimentar o diálogo democrático e de fornecer um conjunto de cenários possíveis para a ação histórica, em tempos imprecisos e complexos.

O presente número de Sociologias testemunha um renovado interesse, nos dias atuais, pela Sociologia Jurídica, cujas origens se confundem com as da própria Sociologia. O dossiê Sociedade e Direito organizado, com competência, por Raúl Enrique Rojo e Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo aborda a temática das relações entre sociedade, direito e justiça. A vitalidade atual da área é demonstrada, tanto pelo caráter internacional dos colaboradores do dossiê, que reúne trabalhos provenientes de Portugal, Suíça, Espanha e Brasil, quanto pela diversidade dos temas abordados.

Na seção Artigos o tema do dossiê é retomado com o trabalho de Fabiana Luci de Oliveira e Virgínia Ferreira da Silva, que discutem, a partir da experiência de pesquisa das autoras com processos criminais e constitucionais, a utilização de processos judiciais como fonte de dados, focalizando em duas implicações metodológicas principais: a questão do poder e a questão da interpretação. Ao abordar os processos judiciais como narrativas, as autoras demonstram como é possível discorrer sobre a construção do discurso empreendido por determinados grupos sociais envolvidos nesses processos.

O artigo de Wivian Weller retoma a contribuição de Karl Mannheim na construção de um método interpretativo de pesquisa. A autora discute as reflexões metodológicas e o desenvolvimento de um método de análise das visões de mundo, denominado método documentário de interpretação. Segundo Weller, o método documentário, como teoria e prática da interpretação sociológica, pode ser visto como um instrumento que permite a inserção do(a) pesquisador(a) nos contextos sociais alheios, a compreensão e conceituação das visões de mundo ou orientações coletivas de um grupo, suas ações e formas de representação. Nesse sentido, o método documentário de interpretação transcende o nível da análise intuitiva ou dedutiva e instiga a construção de instrumentos analíticos capazes de mapear e dar forma às experiências cotidianas, que carecem de reflexão teórica. Ricardo Luiz de Souza debate a obra de Alberto Torres, enfatizando seus eixos principais: autoritarismo e nacionalismo. O texto ressalta o caráter inovador desta obra, ao questionar as teorias raciais então vigentes na cultura brasileira e ao enfatizar a necessidade de tomar como ponto de partida o estudo empírico da realidade brasileira.

Na seção de Interface, Adroaldo Gaya analisa a transformação do corpo humano natural em direção ao corpo biônico, pleno de artificialidades. O autor examina, por um lado, a dança de Isadora Duncan como expressão do corpo natural em que se explicita a filosofia de Rousseau. Linguagem gestual de adequação do movimento a um projeto artístico e político. A estética dos pés descalços, roupas soltas, movimentos ondulatórios. A liberação dos códigos convencionais que aprisionam o corpo numa sociedade datada da segunda metade do século XIX. Por outro lado, o projeto Primus Posthuman é trazido como protótipo de corpo do futuro. Corpo completamente manejável pela tecnociência. Desenhado para superar todos os defeitos do corpo biológico.Um corpo biônico.Uma máquina para a qual, em breve, serão transportados os conteúdos da mente. Sociedade do século XXI. A despedida do corpo biológico. Gaya indaga: no mundo da tecnociência "Será o corpo humano obsoleto?"

Na Resenha desse número, Luiz Antônio Bogo Chies apresenta a obra "Cemitério dos vivos: análise sociológica de uma prisão de mulheres" de Julita Lemgruber. Chies aponta o livro como veículo de importantes reflexões sobre as dinâmicas e processos sociais que se viabilizam no interior de um sistema absorvente e de privações. Segundo o autor, o texto, resultado de uma intensa pesquisa teórica e de campo é permanentemente atual no contexto da questão penitenciária; e agrega, de forma exemplar, toda uma trajetória de vida profissional, que se pauta na busca comprometida e confiante de que o sofrimento humano possa ser minorado e a pena privativa de liberdade ser abolida.

A essa nova aventura sociológica, pelos caminhos das relações (conflituosas, harmoniosas?) entre Sociedade, Direito, Justiça, pelas alamedas do método e pelos espaços do corpo e das interações nesse século que se inicia, convidamos mais uma vez nossos leitores.

José Vicente Tavares dos Santos

Maíra Baumgarten

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Abr 2005
  • Data do Fascículo
    Jun 2005
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