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Brasil da financeirização: do consumo familiar à cooptação da assistência social

Brazil of financialization: from family consumption to the cooption of social assistance

Resumo

Enquanto face mais recente do modo de acumulação capitalista, a financeirização reverbera, por um de seus tentáculos, na necessidade de acesso ao mercado bancário-financeiro e de bens pelas famílias de baixa renda. Isso se dá, primordialmente, para que possam assegurar direitos esvaziados pelo Estado, gerando explosões de consumo e endividamento alimentadoras do circuito neoliberal – caso do Brasil, sobretudo desde os anos 1990. Ao lado, o crescimento de mecanismos socioassistenciais, cujo pano de fundo é a promoção do bem-estar e das cidadanias, deixa de servir unicamente às suas pretensões originárias para também sustentar, transversalmente, o capital financeirizado. Em tal cenário, este trabalho objetiva verificar as dinâmicas de gasto e consumo familiares vigentes num Brasil marcado pelas desigualdades e por políticas públicas socioassistenciais na era financeirizada. Perquire a inserção na ciranda bancário-financeira das populações pauperizadas e o uso do fundo público para a remuneração de bancos. Metodologicamente, parte de pesquisa bibliográfica de teóricos clássicos e contemporâneos críticos da financeirização, aliada a dados secundários de consumo e gastos das famílias brasileiras, destacadamente aquelas rastreadas e atendidas por políticas assistenciais, assim como da execução orçamentária nacional. A análise aponta para a cooptação do Estado pela financeirização e a quebra dos objetivos originários das ações assistenciais.

Palavras-chave
financeirização; baixa renda familiar; gastos públicos; consumo; políticas assistenciais

Abstract

As a more recent face of the capitalist accumulation mode, financialization results, among other consequences, in the need for access to bank loans and consumption goods by low-income families. This occurs, primarily, so that they can ensure rights emptied by the State, generating explosions of consumption and indebtedness, which feed the neoliberal circuit, as in Brazil, especially since the 1990s. On the other hand, the growth of social assistance mechanisms, whose background they are the promotion of well-being and citizenship, they cease to serve only their original claims and also sustain, across the board, financialized capital. In such a scenario, this work aims to verify the dynamics of family spending and consumption in force in a Brazil marked by inequalities and by socio-assistance public policies in the financialized era. It is included in the banking-financial circle of impoverished populations and the use of public funds for the remuneration of banks. Methodologically, it starts with bibliographic research of classic and contemporary theorists critical of financialization and, together with secondary consumption and spending data from Brazilian families, notably those tracked and attended by assistance policies, as well as national budget execution, concludes by the co-option of the State by financialization and the breaking of the objectives originating from assistance actions.

Keywords
financialization; low-income families; public expending; consumption; assistance policies

Introdução

O arcabouço histórico de formação da financeirização demonstra que suas raízes são fundadas nas políticas de desregulamentação, privatização, bancarização e liberalização que se espraiam também pelas políticas públicas no setor social. Assenta-se no neoliberalismo, forma econômica de Estado que, desde meados do século XX, se apresenta como reestruturadora e determinante do jogo de forças (ou de cooptação) entre Estado, mercado e sociedade civil (Harvey, 201417 HARVEY, David. O neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Edições Loyola, 2014.).

Nesse contexto, a pesquisa proposta tem como enfoque verificar as dinâmicas de gasto e consumo familiares vigentes num Brasil marcado pelas desigualdades sociais e por políticas públicas de fundo socioassistencial na era financeirizada. Os contornos históricos da financeirização das economias mundial e brasileira, observadas especialmente a partir da década de 1970 e até o ano de 2017, dão o tom e delimitam a abrangência do estudo.

A partir desse objetivo, perquire-se, neste trabalho, se as influências de um neoliberalismo financeirizado, que desembocaram na abertura do mercado ao sistema bancário-financeiro mundial, inclusive no Brasil, foram capazes, na ótica deste país, de inserir na sua ciranda a população da base da pirâmide social, com relevo àquela atendida por políticas assistenciais. Questiona-se, nesses passos, se a financeirização tem se utilizado do fundo público destinado às ações assistenciais como uma de suas fontes de alargamento.

Para isso, fundamental inicialmente a revisão de literatura. Metodologicamente, utiliza-se de pesquisa bibliográfica, baseada em artigos científicos e livros que tratam criticamente do assunto.

Trata-se, nas linhas que se seguirão, de realizar uma análise do capitalismo financeirizado diante de suas perspectivas históricas, conceituais e práticas na esfera global. Após, busca-se transportar a temática para a experiência vivida no contexto sociopolítico-econômico do Brasil, com a ascensão e domínio das finanças na sistemática nacional, como será visto.

Com base em literatura especializada, especificam-se aqueles que abrem discussões mais aprofundadas a respeito da gênese e desenvolvimento da financeirização, cite-se Harvey (2014)17 HARVEY, David. O neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Edições Loyola, 2014. e Chesnais (200014 CHESNAIS, François. Mundialização: o capital financeiro no comando. Outubro, ed. 5, p. 7-28, fev. 2000.; 2005)13 CHESNAIS, François. O capital portador de juros: acumulação, internacionalização, efeitos econômicos e políticos. In: CHESNAIS, François (org.). A finança mundializada: raízes sociais, configuração, consequências. São Paulo: Boitempo, 2005. cap. 1, p. 35-67.. Na análise do caso brasileiro, têm-se Bruno e Caffe (201511 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Estado e financeirização no Brasil: interdependências macroeconômicas e limites estruturais ao desenvolvimento. Economia e Sociedade, v. 26, p. 1025-1062, dez. 2017. https://doi.org/10.1590/1982-3533.2017v26n4art8
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; 2017)12 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Indicadores macroeconômicos de financeirização: metodologia de construção e aplicação ao caso brasileiro. In: BRUNO, Miguel (org.). População, espaço e sustentabilidade: contribuições para o desenvolvimento do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. cap. 2, p. 35-61. e Lavinas (201722 LAVINAS, Lena. The takeover of social policy by financialization: The brazilian paradoxy. Nova York: Palgrave-Macmillan, 2017.; 2018)23 LAVINAS, Lena; ARAÚJO, Eliane; BRUNO, Miguel. Brasil: vanguarda da financeirização entre os emergentes? Uma análise exploratória. UFRJ ie, Texto para discussão n. 32, 2017., os quais indicam os caminhos percorridos pela financeirização na situação nacional. O processo de modelagem do capital no Brasil é notado desde o impacto das políticas keynesianas durante a era Getúlio Vargas e até a política neoliberal na gestão interina Michel Elias Temer – para este trabalho, checada até o ano de 2017.

Outrossim, na busca por verificar empiricamente alguns dos impactos causados pelas políticas de financeirização no contexto brasileiro, a pesquisa observa, quantitativamente, por estatística descritiva, dados secundários a respeito do modo e perfil de consumo e gastos das famílias nas linhas de vulnerabilidade no Brasil1 1 Entenda-se, nesta acepção, as famílias cuja renda per capita não ultrapasse ½ salário-mínimo, já que este é o grande público rastreado pelas políticas públicas no setor assistencial no Brasil. entre os anos de 2012 e 2017. Essa verificação se dá com a finalidade de compreender a eventual relação e impacto das políticas financeirizantes nas estruturas familiares durante tal recorte de tempo.

São estudadas as proxies das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (PNAD), 2012 a 2015 (IBGE, 2019a18 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). IBGE, 2019a. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/rendimento-despesa-e-consumo/9171-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios-continua-mensal.html?=&t=microdados
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), e das Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios Contínuas (PNADC), 2016 e 2017 (IBGE, 2019b19 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC). IBGE, 2019b. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/rendimento-despesa-e-consumo/9171-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios-continua-mensal.html?=&t=microdados
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). Por meio delas, avaliam-se as variáveis numéricas e categóricas de posse de televisão, geladeira, máquina de lavar, telefone móvel, microcomputador, automóveis, banheiro ou sanitário e abastecimento de água, utilizadas pelo Critério de Classificação Econômica Brasil para ordenação das classes A a E2 2 Segundo o Critério de Classificação Econômica Brasil, classificam-se as famílias brasileiras de A a E conforme um sistema de pontos decorrente da posse e acesso a bens e serviços: classes D-E (1-16 pontos); C2 (17-22 pontos); C1 (23-28 pontos); B2 (29-37 pontos); B1 (38-44 pontos); e A (45-100 pontos) (ABEP, 2019). da pirâmide social (ABEP, 20191 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE PESQUISA. Critério de Classificação Econômica Brasil. Abep.org, 2019. Disponível em: https://www.abep.org/criterio-brasil
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).

Os microdados das variáveis anteriormente citadas são cruzados, por meio do software R Commander, com a variável renda, para todos os anos, e selecionadas as famílias com renda per capita de até ½ salário-mínimo, público da faixa de renda mais baixa da pesquisa. Ademais, com o uso da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2017-2018, busca-se caracterizar o acesso das pessoas e famílias na linha de renda mais baixa divulgada pela pesquisa (renda per capita até R$ 1.908,00) a bens consumo e bens salário. Cotejam-se os gastos das famílias com o mercado de consumo, utilizando-se das variáveis habitação, alimentação, vestuário, assistência à saúde, educação e diminuição do passivo (empréstimo e prestação de imóvel) (IBGE, 2019c20 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de Orçamento Familiar 2017-2018 (POF 2017-2018). IBGE, 2019c. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/rendimento-despesa-e-consumo/24786-pesquisa-de-orcamentos-familiares-2.html?edicao=25578&t=resultados
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), no intuito de inferir seu maior ou menor acesso ao sistema bancário-financeiro e consequente participação no circuito da financeirização. A seguir, são analisadas as evoluções do número de indivíduos na base do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadúnico) com relacionamento bancário e com empréstimos ativos. Para tanto, são utilizados os dados do Relatório de Economia Bancária do Banco Central do Brasil.

Encerrando o estudo sugerido, discute-se se houve evolução nos repasses financeiros envidados pelo poder público para instituições bancárias operacionalizarem o pagamento das transferências de renda do Benefício de Prestação Continuada (BPC)3 3 Regulamentado pela Lei nº 8.742/1993, é transferência de renda destinada a idosos e portadores de deficiência cuja renda familiar per capita não ultrapasse ¼ do salário-mínimo e que não possam ter a subsistência provida por si ou por terceiro. e do Programa Bolsa Família (PBF)4 4 Regulamentado pela Lei nº 10.836/2004, é transferência de renda destinada a brasileiros em situação de pobreza ou extrema pobreza, com benefício condicionado ao atendimento de requisitos nas áreas de saúde e educação. aos usuários, bem como para a operacionalização do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadúnico)5 5 Regulamentado pela Lei nº 6.135/2007, é mecanismo de identificação das famílias em situação de extrema pobreza, pobreza e baixa renda, cuja renda per capita familiar não ultrapasse meio salário-mínimo ou a renda total não ultrapasse 3 salários-mínimos. É usado para a coordenação dos programas sociais do Governo Federal. , entre 2012 e 2017, já que são elas as principais políticas socioassistenciais da atualidade. Isso se dá em razão da necessidade de enfrentamento da questão remanescente de utilização dos fundos de políticas assistenciais como um dos sustentáculos do processo de financeirização brasileiro, desnaturando os objetivos de redução de desigualdades entre classes, e de alargamento de democracia e cidadania real ao povo socorrido pelas ações previstas na Política Nacional de Assistência Social (PNAS).

Os dados secundários citados são fornecidos pelo Ministério da Economia, por meio de solicitação efetivada com uso da Lei de Acesso à Informação à Controladoria Geral da União. Os subsídios em apreço referem-se a informações da Execução Orçamentária da União entre os anos de 2012 e 2017. Foi selecionada a unidade orçamentária 711046 6 Remuneração de Agentes Financeiros – Recursos sob supervisão do Ministério da Economia. e as ações de execução orçamentária da União 00K37 7 Operacionalização das ações de transferência de renda e do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. e 000F8 8 Idem nota 7. , verificadas por estatística descritiva e qualitativamente (Brasil, 20199 BRASIL. Ministério da Economia. Execução orçamentária da União. (Informações obtidas da Controladoria Geral da União, por meio da lei de Acesso à Informação). Brasília: Ministério da Economia, 2019. Disponível em: https://esic.cgu.gov.br/sistema/site/index.aspx?ReturnUrl=%2fsistema%2fPedido%2fDetalhePedido.aspx%3fid%3dNNfFKRDpJhg%3d&id=NNfFKRDpJhg=.
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).

Frise-se que o recorte temporal dos dados firmado entre 2012 e 2017 não se dá de modo aleatório, mas em razão da necessidade de conformação das variáveis numéricas e categóricas oriundas das PNAD e PNADC que se alinharam somente nos anos referenciados. Justifica-se também pela pretensão de observar o comportamento populacional quanto ao consumo e gastos familiares em duas plataformas de governo distintas, Dilma Rousseff e Michel Elias Temer.

O capitalismo financeirizado

As políticas neoliberais que marcam o mundo desde o século XX reverberam nas economias a partir da assunção de modelos de Estado garantidores do funcionamento livre do comércio e do mercado, do regime de direito e do direito individual à propriedade privada. Ao lado disso, sob o manto do Estado mínimo e da responsabilidade individual pelas ações e bem-estar na comunidade, afirmam a ampliação desse bem-estar com o aumento da frequência e alcance do mercado (Harvey, 2014), sobretudo numa estrutura de capitalismo mundializado, a qual Chesnais (2000)14 CHESNAIS, François. Mundialização: o capital financeiro no comando. Outubro, ed. 5, p. 7-28, fev. 2000. denomina de mundialização do capital.

A mundialização do capital, caracterizada sobretudo pela liberalização monetária e financeira, desintermediação dos fluxos de capital e descompartimentalização dos mercados financeiros, como fruto das políticas neoliberais e ao lado da globalização dos fluxos de capital, ao estruturar-se como categoria desse capital e tornar-se espaço de dependência política entre os Estados e celeiro de relações de dominação, dá fruto à mais contemporânea exteriorização do capitalismo: a financeirização, forma de acumulação do capital dissociada de modo direto da produção (Chesnais, 200014 CHESNAIS, François. Mundialização: o capital financeiro no comando. Outubro, ed. 5, p. 7-28, fev. 2000.).

A literatura aponta que a financeirização decorre da sobrevalorização e investimentos em capital financeiro, em detrimento dos estímulos ao estoque de capital produtivo fixo (Bruno; Caffe, 201512 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Indicadores macroeconômicos de financeirização: metodologia de construção e aplicação ao caso brasileiro. In: BRUNO, Miguel (org.). População, espaço e sustentabilidade: contribuições para o desenvolvimento do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. cap. 2, p. 35-61.). Nesse prisma, propugna-se pela financeirização um espaço econômico no qual a esfera financeira do capital se torne preponderante, desincentivando, transversalmente, os investimentos em capital produtivo.

A conformação sistêmica da financeirização firma-se a partir do capital monetário, originado do desenvolvimento do capital industrial ou produtivo, que necessita da geração de mais-valia partida da produção e circulação de mercadorias e estruturada pela superexploração da massa trabalhadora pelo capitalista na forma de trabalho não pago. Esse capital produtivo se associa ao capital comercial, forma de capital específico que decorre do descolamento da atividade de circulação de mercadorias das mãos do capitalista industrial. Do referido descolamento, justificado pela ampliação em grandes escalas da movimentação das mercadorias, nasce o capital monetário, representado pela transposição autonomizada e técnica do dinheiro (Boschetti, 20126 BOSCHETTI, Ivanete. América Latina, política social e pobreza: “novo” modelo desenvolvimentista? In: SALVADOR, Evilásio et al. (Org.). Financeirização, fundo público e política social. São Paulo: Cortez, 2012. cap. 2, p. 31-58.).

Na produção e reprodução capitalista, transforma-se dinheiro em mercadoria especial, não vendida ou comprada como as demais, mas valorizada sob a forma de empréstimos e aplicações financeiras ocasionadas do excedente de capital monetário, baseado materialmente no trabalho vivo, na produção de mercadorias (Brettas, 201710 BRETTAS, Tatiana. Capitalismo dependente, neoliberalismo e financeirização das políticas sociais no Brasil. Temporalis, v. 17, n. 34, p. 53-76, jul./dez. 2017. https://doi.org/10.22422/2238-1856.2017v17n34p53-76
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). Sob esse aspecto, o capital monetário assume elevada expressão. Ao adotar a forma de juros de empréstimos, aplicações financeiras, pagamentos oriundos de posse de ações e demais lucros advindos desse frutífero ciclo, “faz dinheiro” na própria esfera das finanças e se transforma em capital portador de juros ou capital usurário (Chesnais, 200513 CHESNAIS, François. O capital portador de juros: acumulação, internacionalização, efeitos econômicos e políticos. In: CHESNAIS, François (org.). A finança mundializada: raízes sociais, configuração, consequências. São Paulo: Boitempo, 2005. cap. 1, p. 35-67.), buscando, na essência do dinheiro, fazer mais dinheiro.

O desenvolvimento do capital portador de juros amplia o circuito de especulação e permite a remessa ao futuro do pagamento dos valores adiantados a título de empréstimos e demais operações financeiras, prospectando para a frente a obtenção desse modo de remuneração. Operando junto com a especulação, na futura acumulação, desvinculada da base material, o capital usurário torna-se capital fictício, capital fetiche ou modo ilusório que os rendimentos adquirem ao fantasiar advir do capital portador de juros (Chesnais, 200014 CHESNAIS, François. Mundialização: o capital financeiro no comando. Outubro, ed. 5, p. 7-28, fev. 2000.), representando a principal forma de apresentação desse tipo de capital na economia financeirizada.

O capital, sob sua forma fictícia, viabiliza que as transações financeiras se multipliquem com capital real em quantidade idêntica (Brettas, 201710 BRETTAS, Tatiana. Capitalismo dependente, neoliberalismo e financeirização das políticas sociais no Brasil. Temporalis, v. 17, n. 34, p. 53-76, jul./dez. 2017. https://doi.org/10.22422/2238-1856.2017v17n34p53-76
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), demonstrando-se, assim, a concretização do fetichismo do capitalista usurário. Esse capital fictício, representado na esfera pública pelas compras por particulares de títulos da dívida dos Estados, uma vez convertidos em gastos correntes, indica direito ao detentor desses títulos de apropriar-se de parcela das receitas estatais oriundas de tributos. É fictício porque o que fora emprestado já se consumiu pelo Estado, aguardando-se arrecadação no futuro de valores tomados de empréstimos.

A lógica especulativa que daí se infirma incita os Estados, mormente os subdesenvolvidos, a emitirem ações e títulos da dívida ao mercado. Amplia a valorização e acumulação de capital e a inserção da esfera privada no âmbito público por meio do setor bancário ou do mercado com as figuras das instituições não financeiras, como fundos mútuos de investimentos e fundos de pensão (Batista; Moraes, 20125 BATISTA, Erika; MORAES, Lívia de C. G. A inserção do Brasil na financeirização capitalista e as articulações no mundo do trabalho: os setores bancário e industrial. Novos Rumos, v. 49, n. 1, p. 139-158, jan./jun. 2012. https://doi.org/10.36311/0102-5864.2012.v49n1.2377
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), questão muitas vezes geradora de crises especulativas, como ocorrera com a de subprime norte-americano em 2007. Nesse aspecto, Dowbor (2017, p. 78)16 DOWBOR, Ladislau. A era do capital improdutivo. São Paulo: Autonomia Literária, 2017. ressalta que se trata de “sistema que, ao mesmo tempo, provoca a instabilidade econômica geral e se dota de instrumentos políticos de controle que impedem qualquer forma séria de regulação”.

Nas palavras de Paulani, “o regime de acumulação com dominância da valorização financeira tem formação de crises, ocasionadas pela recorrente geração de bolhas de ativos, como sua característica mais marcante. Ele é por isso estruturalmente frágil” (Paulani, 200925 PAULANI, Leda Maria. A crise do regime de acumulação com dominância da valorização financeira e a situação do Brasil. Estudos Avançados, v. 23, n. 66, p. 25-39, 2009., p. 33). O capital usurário demanda da economia esforço maior do que dela pode ser extraído, consequência de sua exterioridade à produção (Chesnais, 200513 CHESNAIS, François. O capital portador de juros: acumulação, internacionalização, efeitos econômicos e políticos. In: CHESNAIS, François (org.). A finança mundializada: raízes sociais, configuração, consequências. São Paulo: Boitempo, 2005. cap. 1, p. 35-67.).

Diante dessa sistemática, o processo especulativo coordena o aumento da exploração da força de trabalho, as tributações regressivas e a busca por novos nichos de mercado, em especial de consumo, uma vez que deve advir do lucro o juro remunerador do capital usurário. Essas questões, assim, tornam-se condutoras de medidas adotadas pelos Estados no sentido de remunerar o capital portador de juros em seu aspecto fictício, e a classe rentista. As privatizações de empresas públicas, liberalização econômica, retirada de direitos sociais e desregulamentações tributárias e trabalhistas, fortemente orientadas pelo capital gerador da união entre o capital bancário-financeiro e o capital industrial, reagrupam-se sob a forma de capital fictício (Paulani, 200925 PAULANI, Leda Maria. A crise do regime de acumulação com dominância da valorização financeira e a situação do Brasil. Estudos Avançados, v. 23, n. 66, p. 25-39, 2009.).

O Estado, então, esvazia seus modos de atuação e age minimamente, reafirmando o pacto neoliberal. O regime capitalista com dominância financeira, pautado nas premissas neoliberais, requer a intervenção dos entes públicos somente como garantidores do processo de expansão do capital portador de juros na sua forma mais recorrente que é o capital fictício, responsável por convidar agentes, classes sociais e setores não financeiros a atuarem em atividades rentistas (Bruno; Caffe, 201511 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Estado e financeirização no Brasil: interdependências macroeconômicas e limites estruturais ao desenvolvimento. Economia e Sociedade, v. 26, p. 1025-1062, dez. 2017. https://doi.org/10.1590/1982-3533.2017v26n4art8
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). Rompe-se, nessas vias, inclusive, a autonomia dos Estados. Multidimensionalmente, pelos aspectos apontados, a financeirização exige condições estruturais para seu desenvolvimento e, por isso, conduz à perda de autonomia nos Estados em que se insere.

Aponta-se criticamente que as dimensões atingidas pela financeirização levam, além de restrições relativas à política econômica estatal, ao persistente e rápido endividamento decorrente de taxas de juros e pesada tributação, queda dos investimentos no setor público e esvaziamento da atuação estatal no desenvolvimento econômico da nação (Bruno; Caffe, 201511 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Estado e financeirização no Brasil: interdependências macroeconômicas e limites estruturais ao desenvolvimento. Economia e Sociedade, v. 26, p. 1025-1062, dez. 2017. https://doi.org/10.1590/1982-3533.2017v26n4art8
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). Diante disso, não consegue o Estado compatibilizar condições inseparáveis ao desenvolvimento nacional, que são coerência macroeconômica e coesão social (Bruno; Caffe, 201712 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Indicadores macroeconômicos de financeirização: metodologia de construção e aplicação ao caso brasileiro. In: BRUNO, Miguel (org.). População, espaço e sustentabilidade: contribuições para o desenvolvimento do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. cap. 2, p. 35-61.). Conforme esclarece Dowbor (2017)16 DOWBOR, Ladislau. A era do capital improdutivo. São Paulo: Autonomia Literária, 2017., os gigantes financeiros detêm recursos superiores aos que são administrados pelo sistemas públicos, dotando-se de instrumentos de controle político que “controlam também o essencial da mídia e, com isto, a opinião pública. Crescentemente, penetram nos espaços que lhes abrem o Judiciário, que deveria ser o último bastião de proteção da igualdade perante a lei” (Dowbor, 201716 DOWBOR, Ladislau. A era do capital improdutivo. São Paulo: Autonomia Literária, 2017., p. 81).

A economia financeirizada modela a sociedade do atual século em seu grupo de determinações e, justificada nisto, remete-se à brutalidade desmedida da acumulação primitiva nos países subdesenvolvidos e à modulação de relações sociais pautadas no consumo e multiplicadas sob a “ditadura” dos mercados financeiros (Chesnais, 200513 CHESNAIS, François. O capital portador de juros: acumulação, internacionalização, efeitos econômicos e políticos. In: CHESNAIS, François (org.). A finança mundializada: raízes sociais, configuração, consequências. São Paulo: Boitempo, 2005. cap. 1, p. 35-67.), já que ainda há forte concentração da dominação financeira do centro (países de economia capitalista desenvolvida) sobre a periferia (países subdesenvolvidos). O Brasil, seguindo os rumos mundiais, em especial os experimentados pelos países da América Latina, não tem deixado de partilhar a face financeirizada da economia ao longo de sua história, destacadamente a partir dos anos 1990.

Vanguardista nos processos de inserção da América Latina nos contextos econômicos mundiais, o Brasil iniciou sua participação no processo de economia financeirizada precocemente. Tão logo se assentaram ao redor do globo as tendências, em instituições bancário-financeiras e industriais, de propugnar pelo investimento na reprodução do capital sob sua forma portadora de juros e fictícia, ao invés de propriamente reproduzir o dinheiro por meio de investimentos na produção, o país ingressou na rodada da mundialização das finanças (Lavinas et al., 201722 LAVINAS, Lena. The takeover of social policy by financialization: The brazilian paradoxy. Nova York: Palgrave-Macmillan, 2017.).

Seguindo os passos mundiais, sem escapar do tripé crédito, patrimônio e moeda, fortaleceu-se a relação entre o Estado brasileiro e o mercado no capitalismo financeirizado, como suposta forma de superação dos picos de inflação, desemprego e estagnação econômica eventualmente existentes (Braga et al., 20177 BRAGA, José Carlos de S. et al. For a political economy of financialization: theory and evidence. Economia e Sociedade, v. 26, n. especial, p. 829-856, dez. 2017. https://doi.org/10.1590/1982-3533.2017v26n4art1
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). Esse caminho fora reafirmado com muita força após os anos 1990, em especial pelo impacto causado pelo Consenso de Washington na estruturação econômica dos Estados da latitude sul do globo. Acoplado a isso, adotou o Brasil o princípio da securitização, predominando na economia títulos financeiros negociáveis sobre os quais reinam os requisitos da liquidez, cobertura de risco e mobilidade.

No país, também foram e são observadas transformações históricas, partidas da década de 1930, em uma estrutura estatal nacional-desenvolvimentista, até a captura total do Estado pela finança, vivida na economia contemporânea (Lavinas, 201823 LAVINAS, Lena; ARAÚJO, Eliane; BRUNO, Miguel. Brasil: vanguarda da financeirização entre os emergentes? Uma análise exploratória. UFRJ ie, Texto para discussão n. 32, 2017.). Didaticamente, apoiando-se em análises das transformações políticas e institucionais brasileiras e de pesquisas históricas, dividem-se em seis períodos as relações que marcam as modificações qualitativas impactantes no processo de desenvolvimento econômico nacional. O primeiro período, compreendido entre os anos de 1930 e 1954, marca uma etapa de constante afirmação do capital industrial no espaço econômico. Denota a perda de posição do capital mercantil agrário exportador e o Estado estruturado em um regime político nacional-desenvolvimentista autoritário, baseado num desenvolvimento econômico autônomo. Esse período foi marcado por intensiva ação social no âmbito do setor público, com conquistas trabalhistas e securitárias e olhar do Estado voltado para tornar o polo urbano-industrial motor do dinamismo econômico (Bruno; Caffe, 201712 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Indicadores macroeconômicos de financeirização: metodologia de construção e aplicação ao caso brasileiro. In: BRUNO, Miguel (org.). População, espaço e sustentabilidade: contribuições para o desenvolvimento do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. cap. 2, p. 35-61.).

O segundo período, observado entre os anos de 1955 e 1963, estrutura-se pela consolidação e difusão da forma de produção fordista do centro desenvolvido para a América Latina, reconfigurando as relações financeiras e comerciais centro-periferia. É a primeira fase da associação entre desenvolvimentismo e capital estrangeiro, capacitando-se o Brasil para a entrada de capital estrangeiro sob a forma de empréstimos e investimentos diretos necessários para atenderem ao Plano de Metas estipulado para os anos de 1955-1961. Nessa etapa, o setor público possuía a dupla função de produtor e regulador, ampliando sua participação na formação de capital e garantindo ambiente para produção e distribuição de empresas públicas ou privadas de capital nacional e estrangeiro no país (Bruno; Caffe, 201712 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Indicadores macroeconômicos de financeirização: metodologia de construção e aplicação ao caso brasileiro. In: BRUNO, Miguel (org.). População, espaço e sustentabilidade: contribuições para o desenvolvimento do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. cap. 2, p. 35-61.).

O terceiro período, que se estende de 1964 a 1988, determina a segunda fase do desenvolvimento nacional associado ao capital estrangeiro. Amplia-se o circuito de dependência externa do Brasil ao capitalismo internacionalizado. Implementam-se as condições estruturais macroeconômicas para a financeirização precoce da economia brasileira, diante da substituição dos setores mais atrasados da economia pelas classes burguesas industrial e financeira, apoiadoras do golpe empresarial-militar de 1964. Essa etapa é fortemente caracterizada pela flexibilização das leis trabalhistas e securitárias. Põem-se em curso reformas monetária e financeira, nos anos 1970, fundadas no modelo norte-americano para o setor bancário-financeiro. Supera-se a Lei de Usura com as buscas pelas instituições financeiras nacionais de tornar a política monetária independente (Bruno; Caffe, 201712 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Indicadores macroeconômicos de financeirização: metodologia de construção e aplicação ao caso brasileiro. In: BRUNO, Miguel (org.). População, espaço e sustentabilidade: contribuições para o desenvolvimento do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. cap. 2, p. 35-61.). Os períodos prévios ao processo de redemocratização do Estado brasileiro, portanto, são marcados por gradativa inserção do capital portador de juros no contexto nacional e a substituição, já na primeira fase de mudanças econômicas, da estrutura social-desenvolvimentista proposta na década de 1930.

O quarto período, representado pelo lapso temporal entre os anos de 1989 e 2003, indica a primeira fase de subordinação brasileira aos mercados globais, sob o modelo de inserção internacional neoliberal-dependente. É impulsionado pelo pacto firmado com os organismos financeiros internacionais (FMI e Banco Mundial) para perpetuação da abertura do país ao capital de países desenvolvidos. Busca-se a reestruturação econômica para os governos Fernando Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso (FHC). O mantra do caráter irreversível e inevitável do novo processo de internacionalização capitalista se instaura (Paulani, 200912 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Indicadores macroeconômicos de financeirização: metodologia de construção e aplicação ao caso brasileiro. In: BRUNO, Miguel (org.). População, espaço e sustentabilidade: contribuições para o desenvolvimento do Brasil. Rio de Janeiro: IBGE, 2015. cap. 2, p. 35-61.). Durante o quarto período da economia brasileira, que inaugura o século XXI, destacam-se significativas atitudes adotadas pelo governo para adequação ao Consenso de Washington, subordinando a economia nacional. Elencam-se as reformas administrativa, de ordem política, tributária, monetária (Plano Real) e no sistema de seguridade social (Bruno; Caffe, 201711 BRUNO, Miguel; CAFFE, Ricardo. Estado e financeirização no Brasil: interdependências macroeconômicas e limites estruturais ao desenvolvimento. Economia e Sociedade, v. 26, p. 1025-1062, dez. 2017. https://doi.org/10.1590/1982-3533.2017v26n4art8
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). Nesse cenário, são retirados das mãos do Estado o controle e a autonomia da gestão do mercado e de políticas essencialmente públicas. São gerados estagnação, crises financeiras e decréscimo dos níveis sociais ocorridos a partir da segunda metade dos anos 1990 (Lavinas et al., 201721 LAVINAS, Lena. The collateralization of social policy under financialized capitalism. Development and Change, The Hague, v. 49, n. 2, p. 502-517, 2018.).

A quinta fase é marcada, nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e primeiro governo Dilma Rousseff, pela conciliação de interesses contraditórios. De um lado, implementar políticas redistributivas, sociais e de inclusão; de outro, garantir a acumulação rentista-financeira e a exportação de commodities. Fundamentais, nesse ínterim, os programas de transferência de renda e a abertura do mercado à população de baixa renda, responsáveis por permitir a reprodução do capital usurário e do capital fictício por meio do endividamento não só público interno, mas também – e especialmente – privado (Lavinas, 201823 LAVINAS, Lena; ARAÚJO, Eliane; BRUNO, Miguel. Brasil: vanguarda da financeirização entre os emergentes? Uma análise exploratória. UFRJ ie, Texto para discussão n. 32, 2017.). A financeirização, no Brasil, espalha-se para o varejo e para as classes mais pobres por meio das políticas sociais. Há ampliação da vulnerabilidade social, compreendida a partir da esfera econômica, e o endividamento das famílias pelo elevado custo dos financiamentos e empréstimos adquiridos (Lavinas, 201722 LAVINAS, Lena. The takeover of social policy by financialization: The brazilian paradoxy. Nova York: Palgrave-Macmillan, 2017.).

O sexto e último período, didaticamente apresentado na economia brasileira, é compreendido a partir de 2015 e intensificado nos anos de 2016 e 2017 pela assunção ao governo do presidente interino Michel Elias Temer, em razão do impeachment da então presidenta Dilma Rousseff. Essa fase, caracterizada pela cooptação completa do Estado pela alta finança neoliberal e pelo controle do mercado bancário-financeiro brasileiro pela iniciativa privada – com instituições não financeiras e bancos de vultosas influências agindo na formatação e definição do orçamento e política econômicos – insere o país, em definitivo, na ciranda da financeirização (Lavinas et al., 201722 LAVINAS, Lena. The takeover of social policy by financialization: The brazilian paradoxy. Nova York: Palgrave-Macmillan, 2017.).

Esse mecanismo de entrega do Estado ao capital financeirizado é multilateralmente observado no âmbito legislativo. Há o congelamento dos gastos públicos primários através do então Projeto de Emenda Constitucional nº 55/2016 (Convertido na Emenda Constitucional nº 95/2016). Ademais, também a baixa nos direitos sociais e consequente mercadorização da seguridade social se expressam pelo Projeto de Emenda Constitucional nº 287/2016, proposto como primeira Reforma da Previdência, algoz da redução de direitos dos filiados e dependentes do sistema de seguridade brasileiro, além da Reforma Trabalhista levada a cabo no período (Brettas, 201710 BRETTAS, Tatiana. Capitalismo dependente, neoliberalismo e financeirização das políticas sociais no Brasil. Temporalis, v. 17, n. 34, p. 53-76, jul./dez. 2017. https://doi.org/10.22422/2238-1856.2017v17n34p53-76
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). O sexto período denota persistentes indicativos da dissolução de direitos sociais conquistados e contrassenso entre as disposições constitucionais e a atuação estatal.

Torna-se inquestionável, assim, que o Estado brasileiro atua como unidade organizadora do espaço propício à acumulação bancário-financeira e/ou rentista-patrimonial e fomenta fatores diretamente relacionados à forma mais atual de neoliberalismo, esvaziando garantias sociais. Isso é o que aparelha o apoio e a dinâmica estatais para que a finança prospere, seja por meio de diferentes ativos e produtos financeiros e o consumo de massa conquistados a sangue e suor pela classe trabalhadora e pobre, seja pela remuneração que diretamente presta o Estado ao aparelho bancário para operacionalizar os benefícios sociais, gerando ciclo de ganho duplo pelas instituições financeiras.

Financeirização, consumo e gastos das famílias de baixa renda no Brasil

Caracteristicamente, a ampliação do relacionamento bancário, do acesso e concessão de créditos e empréstimos, oriundos do processo de financeirização, reflete-se no modo e perfil de consumo da população (Lavinas, 201722 LAVINAS, Lena. The takeover of social policy by financialization: The brazilian paradoxy. Nova York: Palgrave-Macmillan, 2017.). O Banco Central do Brasil (BCB) aponta ter havido um salto de R$ 34 milhões nas concessões de crédito observadas entre dezembro de 2012 e dezembro de 2017. De igual sorte, elevou-se em 56 milhões o número de contas-correntes e poupança abertas e em 4 milhões o número de cartões de crédito ativos no mesmo lapso temporal (BCB, 2018c4 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Séries Temporais (SGS). Brasília: BCB, 2018c. Disponível em: https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries
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).

Não à toa, os impactos causados no orçamento familiar pela maior aquisição de bens consumo e bens salário, em razão do crédito, traduz-se em endividamento, comprometimento de renda e inadimplência, sobretudo da população nas baixas faixas de renda (Cunha, 201815 CUNHA, Márcia P. Silencioso e penetrante: o processo de financeirização a partir das instituições promotoras de inclusão social. Contemporânea, v. 8, n. 2, p. 585-606, jul./dez. 2018.). Em dezembro de 2017, 25,2% dos tomadores de crédito com renda de até 1 salário-mínimo encontravam-se com os fundos comprometidos para pagamento de juros e amortização de dívidas. De igual sorte, na mesma competência, 51,78% dos tomadores de crédito encontravam-se endividados, muito disso justificado nos créditos para o consumo, como aqueles oriundos de cartão de crédito e crédito habitacional (BCB, 2018a2 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de cidadania financeira 2018. Brasília: BCB, 2018a. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira
https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinancei...
).

Nesse sentido, por meio das explosões de consumo, facilitadas pelo crédito, denotam-se os avanços da finança e os nós de desigualdade e contrassenso gerados em uma parcela populacional de poucas rendas. Ao mesmo passo em que a população se torna possuidora de produtos, ela ingressa no circuito de dependência das instituições financeiras em detrimento da renda familiar, característica do processo de financeirização. Essa renda é exaurida pela urgência em arcar com taxas juros e amortização de dívidas oriundas das fictícias inclusão e cidadania financeiras, indispensáveis a custear necessidades básicas não prestadas pelo Estado, como educação e saúde. Ainda, são oriundas da necessidade de usufruir de bens inseridos no mercado como supostamente fundamentais, em razão dos efeitos paradoxais causados pelo processo de globalização que busca homogeneizar, no circuito do consumo, públicos cuja heterogeneidade é patente no aspecto socioeconômico (Lavinas, 201823 LAVINAS, Lena; ARAÚJO, Eliane; BRUNO, Miguel. Brasil: vanguarda da financeirização entre os emergentes? Uma análise exploratória. UFRJ ie, Texto para discussão n. 32, 2017.).

Assim, como um dos vetores do processo de financeirização crescente no Brasil, o consumo é variável expressiva na observância da maior ou menor incidência da finança na vida das famílias (Cunha, 201815 CUNHA, Márcia P. Silencioso e penetrante: o processo de financeirização a partir das instituições promotoras de inclusão social. Contemporânea, v. 8, n. 2, p. 585-606, jul./dez. 2018.), em especial daquelas com renda per capita até ½ salário-mínimo, público abarcado pelas políticas assistenciais no Brasil. Utilizando-se de alguns dos itens de consumo e serviço observados no Critério de Classificação Econômica Brasil para as classes A a E (ABEP, 20191 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE PESQUISA. Critério de Classificação Econômica Brasil. Abep.org, 2019. Disponível em: https://www.abep.org/criterio-brasil
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) e encontrados nas PNAD e PNADC para os anos de 2012 a 2017, percebe-se ter havido um crescimento no acesso a esses produtos nas famílias de renda mais baixa, como demonstra a Tabela 1.

Tabela 1
Distribuição de domicílios, por faixa de renda per capita, possuidores de geladeira, máquina de lavar, celular e água canalizada, em %, Brasil, 2012-2017

Apesar da queda no acesso, observada em 2016 para quase todos os itens de consumo e serviço das PNAD e PNADC 2012-2017,9 9 A recessão econômica no país, a instabilidade política decorrente do impeachment da então presidenta Dilma Rousseff, assim como os cortes orçamentários no PBF, além de elevarem os preços dos produtos, reduziram a capacidade de compra dos indivíduos, fatores que inevitavelmente impactaram na variável consumo, mas não inviabilizaram a existência deste (Leite, 2019). dentre aqueles indicados na Tabela 1, vê-se que houve aumento na variação percentual para todos eles. A posse de geladeiras, que chega ao patamar de 94,4% em 2017, apresenta crescimento de 2,83%, maior do que aquele observado pelas faixas de renda mais altas (renda per capita acima de 3 salários-mínimos), o qual cresce 0,4%, fechando 2017 com 99,8% dos domicílios.

De igual sorte, amplia-se a aquisição de máquinas de lavar pelo público de renda per capita até ½ salário-mínimo no período 2012-2017, com salto de 27,2% para 30,7%, representando um aumento de 12,86% (Tabela 1), maior que os 7,21% experimentados pela classe de renda per capita maior que 3 salários-mínimos (IBGE, 2019a; 2019b). Também, o acesso a água canalizada se eleva nos domicílios de menor renda das PNAD e PNADC, fechando 87,2% das famílias abarcadas pela pesquisa em 2017 (Tabela 1).

Assim como os demais apresentados, o item posse de celular demonstra que a população de baixa renda tem adquirido cada vez mais esse artigo de consumo. A Tabela 1 indica que houve crescimento no acesso a telefone móvel de 4,37% no lapso 2012-2017 para a população com renda per capita até ½ salário-mínimo, fechando 2017 com 86,9% das famílias na faixa de renda das políticas assistenciais possuidoras desse artigo, ampliação maior que a ocorrida na faixa de renda mais alta que foi de 2,16% no mesmo recorte de tempo (IBGE, 2019a; 2019b).

É importante frisar que o maior acesso a telefone móvel viabiliza também a aproximação do consumidor do mercado financeiro, nomeadamente encurta os caminhos para o acesso ao crédito e demais produtos ofertados pelo sistema bancário, incentivando a financeirização e o comprometimento de renda das famílias. O BCB demonstra que a quantidade de transações10 10 Foram considerados pelo relatório os produtos bloqueto de cobrança, consulta/extrato, depósitos, empréstimos e financiamento, ordens de transferência de crédito, saques, outras transações financeiras, outras transações não financeiras (BCB, 2018a). nos canais de acesso via telefone celular e palmtop ampliaram-se de 10,8 bilhões para 24,5 bilhões entre 2015 e 2017, uma elevação de 129,62% em somente dois anos (BCB, 2018a2 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de cidadania financeira 2018. Brasília: BCB, 2018a. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira
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).

Quanto à posse de televisão, microcomputador e banheiro e/ou sanitário nos domicílios pesquisados, encerra-se o ciclo de 2017 com percentuais respectivos de posse de 94,3%, 16,3% e 88,1% dos itens indicados (IBGE, 2019a18 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). IBGE, 2019a. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/rendimento-despesa-e-consumo/9171-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios-continua-mensal.html?=&t=microdados
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/soc...
; 2019b)19 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC). IBGE, 2019b. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/rendimento-despesa-e-consumo/9171-pesquisa-nacional-por-amostra-de-domicilios-continua-mensal.html?=&t=microdados
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. Apesar de se tratar do menor percentual observado no trabalho, é significativo entender que mais de 16% dos indivíduos na pesquisa amostral do IBGE, aí incluídos aqueles com renda zero, possuíam microcomputador, equipamento recorrentemente utilizado para a efetivação de transações no sistema bancário-financeiro e que representou, em 2017, 20,6 bilhões das transações, mais de 1/3 do total geral daquelas efetivadas neste canal de acesso anotado entre os anos de 2015 e 2017 (BCB, 2018a2 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de cidadania financeira 2018. Brasília: BCB, 2018a. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira
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).

Apesar das variáveis de consumo indicadas anteriormente, a que merece maior relevância é a posse de automóvel (carro e/ou motocicleta) pelos ocupantes dos domicílios pesquisados. Isso se justifica por seu elevado e contínuo crescimento no lapso 2012-2017, registrado pelas PNAD e PNADC nas classes de renda per capita até ½ salário-mínimo, sem sequer haver registrado os impactos da instabilidade política e econômica dos anos de 2016 e 2017 vistos nos demais itens, é o que se observa da Figura 1.

Figura 1
Distribuição de domicílios, por faixa de renda per capita, possuidores de automóvel (carro e/ou motocicleta), Brasil, 2012-2017

Da Figura 1, observa-se que, em todas as classes de renda, há crescimento no acesso a automóveis, entretanto, é na de menor rendimento que esse alargamento se dá de maneira mais curiosa. Dados de 2012 apontam que, nesse ano, 31,3% dos domicílios possuíam carro e/ou motocicleta, enquanto, em 2017, esse número sobe para 47,1%, um incremento de 50,47% no número de domicílios com renda per capita até ½ salário-mínimo possuidores de automóvel. Esse crescimento não é experimentado em igual medida pelos domicílios na faixa de renda maior que ½ salário-mínimo até 3 salários-mínimos (cresce em 27,27%) e mais de 3 salários-mínimos (cresce em 6,98%) (Figura 1).

De um lado, tal ampliação na aquisição de automotores pela população de baixa renda significa maior independência e inserção desse público em um circuito de consumo que, até então, apresentava limitação pelo seu alto custo, frente ao limite da renda das famílias. De outro, sinaliza o maior acesso dessas famílias ao crédito destinado à aquisição de carros e motocicletas, inserindo-as ainda mais na ciranda da financeirização por meio do consumo, sobretudo aquelas que se encontram na faixa de rendimentos mais baixa e que são porventura atendidas por programas socioassistenciais, especialmente os de transferências de renda, e rastreadas pelo Cadúnico – ações públicas que sinalizam a maior vulnerabilidade social das famílias.

O BCB (2018a)2 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de cidadania financeira 2018. Brasília: BCB, 2018a. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira
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aponta que a composição da carteira ativa de crédito para aquisição de veículos automotores representou 12% para os inscritos no Cadúnico e beneficiários do PBF, em 2017, e 10,7% para os inseridos no Cadastro e não beneficiários do programa governamental em tela. Esses percentuais superaram o indicado para o público não inserido no Cadúnico, o qual, em 2017, obteve percentual de 9,1% na mesma espécie da composição de carteira ativa de crédito.

Isso significa que os indivíduos com poder aquisitivo menor e, portanto, mais propensos ao comprometimento da renda, inadimplência e endividamento, têm adquirido mais crédito para a aquisição de veículos do que aqueles na faixa de renda maior. Não se deve deixar de lado, nessa toada, a concepção de que o número de indivíduos inseridos no Cadúnico com relacionamento bancário em 2017 é mais de quatro vezes menor que aqueles na mesma situação e sem inscrição no Cadúnico (27 milhões contra 118 milhões de inscritos) (BCB, 2018a2 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de cidadania financeira 2018. Brasília: BCB, 2018a. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira
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).

Ainda, importa salientar que, em dezembro de 2017, o crédito para aquisição de veículo, o 7º no ranking dos créditos mais tomados junto ao sistema financeiro, fechou o ciclo anual com taxa de juros ao ano de 22,23%. Além disso, acompanhando o crescimento na inadimplência verificada nas classes de renda mais baixa, registrou-se para este tipo de crédito o 6º lugar no ranking dos maiores créditos com saldo de inadimplência em 2017, totalizando o importe de R$ 6 bilhões neste ano, 9,8% do saldo de inadimplência total no sistema bancário (BCB, 2018a). É a ratificação de que o consumo, propiciado destacadamente pelas políticas assistenciais, tem forçado as pessoas e famílias à desigualdade decorrente dos mecanismos de mercado e do contínuo processo de financeirização.

Em outro prisma, a partir da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2017-2018, ao serem analisados de modo comparativo os gastos efetivados pelas famílias de renda até R$ 1.908,00 e por aquelas com renda superior a R$ 23.850,00, percebe-se que os maiores custos dos grupos familiares de menores rendimentos estão concentrados em itens cuja tributação incide pesadamente. Isso alimenta o sistema regressivo de tributação observado na economia brasileira e amplia a desigualdade e a concentração de renda existentes no país, aliviando o ônus fiscal dos mais ricos em detrimento do agravamento dele para os mais pobres (Salvador, 201227 SALVADOR, Evilásio. Financiamento tributário da política social no pós-Real. In: SALVADOR, Evilásio. et al. (Org.). Financeirização, fundo público e política social. São Paulo: Cortez, 2012. cap. 5, p. 123-152.).

Os maiores montantes da arrecadação tributária provêm de tributos cuja base de incidência é o consumo de bens e serviços que, agregado aos tributos advindos da renda dos trabalhadores, revela que são as classes de menor poder aquisitivo que financiam o Estado brasileiro, com o uso das políticas assistenciais como colateral, e não as de mais alta renda, já que há baixa tributação sobre renda e patrimônio (Salvador, 2012). A Tabela 2 sintetiza os gastos mais significativos das famílias de mais baixa e mais alta classes de renda recortadas pela POF 2017-2018 nas variáveis eleitas para este estudo.

Tabela 2
Distribuição das despesas dos domicílios, por faixa de renda per capita familiar, em %, Brasil, 2017-2018

A Tabela 2 evidencia que, enquanto nas famílias de renda per capita até R$ 1.908,00, as despesas de consumo alcançam 92,5% da renda, nas famílias de renda superior a R$ 23.850,00, essas mesmas despesas alcançam 65,9% do orçamento. Vistas de modo pormenorizado para a menor faixa de rendimentos, essas despesas de consumo concentram-se majoritariamente nos gastos com habitação e alimentação, seguidas de assistência à saúde e vestuário, necessidades básicas de qualquer indivíduo. Habitação, alimentação e assistência à saúde, aliás, previstas como direitos sociais no artigo 6º da Constituição Federal (Brasil, 19888 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília: Presidência da República, 1988.) e normas, cujo dever de implementação cabe ao Estado que, ao negligenciar a cobertura social, conduz a população à busca do direito na esfera do privado (Boschetti, 2012), daí a significância dos cadastros sociais e das políticas de transferência de renda na rota da financeirização.

É de se observar que, nessas quatro variáveis, os gastos realizados pelas famílias nas menores faixas de renda são superiores àqueles das faixas de maiores rendas. Para habitação, 39% contra 22,7%. Para a alimentação, 22% contra 7,6%. Para assistência à saúde, 5,9% contra 5,6%. Para vestuário, 4,2% contra 2,4%. Destaca-se o comprometimento do orçamento das famílias de baixa renda com alimentação, que é 2,9 vezes maior que o das de renda mais elevada (Tabela 2).

Quando cotejados os gastos com habitação, aliados à diminuição do passivo familiar (prestação de imóvel) para os grupos rastreados por políticas assistenciais, o BCB (2018a) aponta que a composição da carteira ativa de crédito para financiamento habitacional é conformada para indivíduos inscritos no Cadúnico e beneficiários de Bolsa Família em 25%, e em 23,3% para inscritos no Cadúnico e não participantes do PBF. Novamente reafirma-se que a maior aproximação da transferência de renda gera também a maior aproximação dos produtos e serviços bancários das classes de parcos recursos financeiros.

Outrossim, esse maior acesso ao sistema bancário-financeiro para financiamento imobiliário tem causado efeitos deletérios para os tomadores de crédito, dentre eles o público inscrito no Cadúnico com relacionamento bancário. Em 2017, o saldo de inadimplência para o crédito destinado a financiamento habitacional ocupou o 5º lugar no ranking entre os créditos mais acessados. Ademais, representou o importe de R$ 6,7 bilhões, 11% do saldo total de inadimplência no sistema financeiro. No mesmo ano, as famílias com renda de até 1 salário-mínimo marcaram o comprometimento de 9,85% da renda com dívida imobiliária (BCB, 2018a2 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de cidadania financeira 2018. Brasília: BCB, 2018a. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira
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).

Um dos pontos para o comprometimento dos rendimentos familiares da parcela populacional de baixa renda e o elevado saldo de inadimplência dos créditos para financiamento habitacional é a taxa de juros aplicada ao ano pelo mercado – em 2017, de 89,12% (BCB, 2018b3 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de economia bancária 2017. Brasília: BCB, 2018b.) – característica do capital usurário. Outro deles é o desconhecimento da taxa de juros aplicada e o escasso planejamento financeiro por uma parcela populacional que sequer é atendida em suas necessidades básicas e que usa do crédito para supri-las. Segundo o BCB (2018a)2 BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório de cidadania financeira 2018. Brasília: BCB, 2018a. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/cidadaniafinanceira
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, em um plano amostral de 104 entrevistados em 2017, 26,3% deles não faziam verificação das taxas de juros para financiamento, 39% já ficaram com o nome sujo, e 22,9% não fazem controle de gastos.

Nesse cenário de elevação do consumo e aquisição de bens de primeira necessidade pelas famílias de baixa renda, consequência de ampliação da conquista de crédito junto ao sistema bancário-financeiro, o mercado captura as políticas socioassistenciais, sobretudo o Cadastro Único e as transferências de renda, como Bolsa Família, para seu fortalecimento. Isso alimenta o ciclo de subjugação das famílias mais pobres ao sistema capitalista-rentista com o esteio do Estado, deixando de promover a igualdade e a cidadania social.

A ampliação acentuada, entre 2012 e 2017, da quantidade de indivíduos no Cadúnico com acesso a crédito e empréstimos ativos é comprovada pelo Relatório de Economia Bancária 2017 do Banco Central, o qual realiza o cruzamento específico das bases de dados do Sistema de Informações de Crédito (SCR) com o Cadúnico (BCB, 2018b). Esses dados são apresentados nas Figuras 2 e 3.

Figura 2
Número de indivíduos na base do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) com acesso a crédito, responsabilidade total superior a R$ 1 mil, mil pessoas, Brasil, 2012-2017
Figura 3
Número de indivíduos na base do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) com empréstimos ativos, responsabilidade total superior a R$ 1 mil, mil pessoas, Brasil, 2012-2017

Ao serem analisadas as bases de dados que inter-relacionam Cadúnico e crédito, há elevação da penetração das finanças na vida da população de baixa renda. Nesse sentido, entre 2012 e 2017, incrementa-se o acesso ao crédito dos indivíduos inscritos não beneficiários do Bolsa Família de 16,3 milhões para 22,4 milhões, um aumento de 37,3%. Quanto aos indivíduos inscritos e participantes do Bolsa Família, a elevação é de 7,7 milhões para 16,1 milhões, crescimento de 109% (Figura 2).

Igualmente, analisando-se a tendência ao crescimento dos volumes de empréstimos ativos, crédito cujo recurso é livre, observa-se que os participantes do Bolsa Família passaram de 2 milhões para 4,4 milhões, um crescimento 119%, entre 2012-2017 (Figura 3). Nesse aspecto, torna-se patente o interesse do sistema bancário-financeiro nas políticas públicas assistenciais, sobretudo naquelas que se personificam em transferências de renda, caso do PBF, destinadas ao mercado de consumo. Com isso, verifica-se uma desuniversalização da estrutura de proteção social que havia sido instituída pela Constituição Federal de 1988. Transforma-se o cidadão portador de direitos em cidadão consumidor de serviços. O Cadúnico e o PBF/BPC passam a servir como garantias ao sistema bancário-financeiro e a atuar como espécies de colaterais, esteio, segurança às engrenagens do mercado.

Não só indiretamente, por meio de seus assistidos, o Estado alimenta a roda da financeirização, mas também de modo direto, quando remunera os agentes financeiros para, por exemplo, operacionalizarem os programas e ações na área de assistência social. Em dados colhidos junto ao Ministério da Economia (Brasil, 20199 BRASIL. Ministério da Economia. Execução orçamentária da União. (Informações obtidas da Controladoria Geral da União, por meio da lei de Acesso à Informação). Brasília: Ministério da Economia, 2019. Disponível em: https://esic.cgu.gov.br/sistema/site/index.aspx?ReturnUrl=%2fsistema%2fPedido%2fDetalhePedido.aspx%3fid%3dNNfFKRDpJhg%3d&id=NNfFKRDpJhg=.
https://esic.cgu.gov.br/sistema/site/ind...
) a respeito da evolução dos valores repassados aos bancos entre 2012 e 2017 como remuneração pelos serviços de operacionalização das ações de transferência de renda e do Cadúnico, extraiu-se que, ano a ano, quantias milionárias são entregues aos agentes financeiros.

A unidade orçamentária 71104 e suas ações do orçamento 00K3 e 000F sinalizam ter havido, entre 2012 e 2017, variação percentual positiva respectiva de 9,67% e 10,64%11 11 Os valores correntes de cada ano foram atualizados para preços de 2017 pelo índice IPCA-IBGE. nas rubricas dos valores do orçamento “Empenhado (Liquidado)” e “Pago” (Brasil, 20199 BRASIL. Ministério da Economia. Execução orçamentária da União. (Informações obtidas da Controladoria Geral da União, por meio da lei de Acesso à Informação). Brasília: Ministério da Economia, 2019. Disponível em: https://esic.cgu.gov.br/sistema/site/index.aspx?ReturnUrl=%2fsistema%2fPedido%2fDetalhePedido.aspx%3fid%3dNNfFKRDpJhg%3d&id=NNfFKRDpJhg=.
https://esic.cgu.gov.br/sistema/site/ind...
). Chama atenção que, em 2016, os valores das rubricas acima indicadas tenham superado em muito as médias anuais respectivas de R$ 392,3 milhões e R$ 307,6 milhões, “Empenhado (Liquidado)” e “Pago”, e alcançado R$ 998,5 milhões e R$ 914,9 milhões,12 12 Idem nota 11. respectivamente (Brasil, 20199 BRASIL. Ministério da Economia. Execução orçamentária da União. (Informações obtidas da Controladoria Geral da União, por meio da lei de Acesso à Informação). Brasília: Ministério da Economia, 2019. Disponível em: https://esic.cgu.gov.br/sistema/site/index.aspx?ReturnUrl=%2fsistema%2fPedido%2fDetalhePedido.aspx%3fid%3dNNfFKRDpJhg%3d&id=NNfFKRDpJhg=.
https://esic.cgu.gov.br/sistema/site/ind...
). Esses repasses não encontram justificativa nos dados coletados por esta pesquisa.

De toda sorte, é patente que a financeirização no Brasil ganha força e nutre o capital usurário, não só pelo consumo e acesso a crédito e empréstimo pelas famílias mais pobres, mas também pela remuneração fornecida aos bancos diretamente para operarem essas políticas, em um circuito de ganho exacerbado, seja por meio do fundo público ou pelos serviços que oferta à população, a exemplo dos cartões de crédito e empréstimo aos beneficiários de programas governamentais.

Considerações finais

Indiscutivelmente, o processo de financeirização é crescente no Brasil e no mundo. Ao lado dele, o enraizamento da bancarização dos mais pobres, privatização de prestações públicas e o sucateamento de direitos sociais, como saúde, educação, alimentação e moradia, condicionam as famílias à busca no mercado do atendimento a suas necessidades básicas. O consumo de massa, viabilizado pelo crédito acessível, leva à bancarrota as famílias subjugadas à pesada carga tributária incidente sobre bens de primeira necessidade e às altas taxas de juros sobre os créditos que fortalecem o mercado. É o que ocorre em especial com os grupos familiares mais pobres e atendidos por políticas de transferência de renda.

Ademais, destacado o sistema bancário e a relação firmada com as políticas socioassistenciais, ele se fortifica duplamente: de modo indireto, quando os programas e mecanismos assistenciais são usados como pano de fundo pelos beneficiários para a aquisição de créditos e empréstimos, haja vista o crescimento de 119% do crédito concedido aos beneficiários do Bolsa Família; e de modo direto, pela remuneração milionária que lhes é paga todos os anos pelo Estado para operacionalizarem as transferências de renda e o Cadúnico.

Não se olvide a relevância que as políticas sociais têm enquanto modelos que possibilitam a transformação da realidade dolorosa experimentada pelas famílias de parcas rendas. Não devem elas e seus usuários, no entanto, servir de instrumentos de sustentação de um sistema financeiro já tão bem assistido, contrariando as orientações constitucionais de garantia dos mínimos necessários aos indivíduos.

O Estado tem sido completamente cooptado pela finança, e, junto com isso, as políticas socioassistenciais, em lugar de viabilizarem a igualdade material pretendida, têm sido usadas como estruturas financeiras promotoras de desigualdade, por meio do endividamento e comprometimento de renda dos mais pobres frente aos gastos e consumos a que são conduzidos, seja para sustentar suas necessidades básicas ou a ilusória cidadania outorgada pelos bens consumo adquiridos, por exemplo, com as verbas do BPC ou do PBF.

  • 1
    Entenda-se, nesta acepção, as famílias cuja renda per capita não ultrapasse ½ salário-mínimo, já que este é o grande público rastreado pelas políticas públicas no setor assistencial no Brasil.
  • 2
    Segundo o Critério de Classificação Econômica Brasil, classificam-se as famílias brasileiras de A a E conforme um sistema de pontos decorrente da posse e acesso a bens e serviços: classes D-E (1-16 pontos); C2 (17-22 pontos); C1 (23-28 pontos); B2 (29-37 pontos); B1 (38-44 pontos); e A (45-100 pontos) (ABEP, 2019).
  • 3
    Regulamentado pela Lei nº 8.742/1993, é transferência de renda destinada a idosos e portadores de deficiência cuja renda familiar per capita não ultrapasse ¼ do salário-mínimo e que não possam ter a subsistência provida por si ou por terceiro.
  • 4
    Regulamentado pela Lei nº 10.836/2004, é transferência de renda destinada a brasileiros em situação de pobreza ou extrema pobreza, com benefício condicionado ao atendimento de requisitos nas áreas de saúde e educação.
  • 5
    Regulamentado pela Lei nº 6.135/2007, é mecanismo de identificação das famílias em situação de extrema pobreza, pobreza e baixa renda, cuja renda per capita familiar não ultrapasse meio salário-mínimo ou a renda total não ultrapasse 3 salários-mínimos. É usado para a coordenação dos programas sociais do Governo Federal.
  • 6
    Remuneração de Agentes Financeiros – Recursos sob supervisão do Ministério da Economia.
  • 7
    Operacionalização das ações de transferência de renda e do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
  • 8
    Idem nota 7.
  • 9
    A recessão econômica no país, a instabilidade política decorrente do impeachment da então presidenta Dilma Rousseff, assim como os cortes orçamentários no PBF, além de elevarem os preços dos produtos, reduziram a capacidade de compra dos indivíduos, fatores que inevitavelmente impactaram na variável consumo, mas não inviabilizaram a existência deste (Leite, 201924 LEITE, Rosângela F. “República de Consumidores” e os consumidores da República: apontamentos historiográficos e caminhos de pesquisa. História Unisinos, v. 23, n. 1, p. 110-116, jan./abr. 2019.).
  • 10
    Foram considerados pelo relatório os produtos bloqueto de cobrança, consulta/extrato, depósitos, empréstimos e financiamento, ordens de transferência de crédito, saques, outras transações financeiras, outras transações não financeiras (BCB, 2018a).
  • 11
    Os valores correntes de cada ano foram atualizados para preços de 2017 pelo índice IPCA-IBGE.
  • 12
    Idem nota 11.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Set 2021
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2021

Histórico

  • Recebido
    25 Mar 2020
  • Aceito
    27 Ago 2020
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