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Cerâmica argilosa incorporada com resíduo oleoso proveniente do setor petrolífero

Clayey ceramic incorporated with oily waste from the petroleum industry

Resumos

A incorporação de um resíduo oleoso proveniente do setor de extração de petróleo em massa de cerâmica vermelha foi avaliada em relação às alterações produzidas nas propriedades físicas e mecânicas da cerâmica. Foram preparadas composições, com quantidades de resíduo de 0, 1, 3, 5 e 10% em peso, usadas na confecção de corpos-de-prova por prensagem uniaxial para queima na temperatura de 900ºC. As propriedades físicas e mecânicas avaliadas foram: densidade aparente, absorção de água, retração linear e tensão de ruptura à flexão medidas em ensaio de 3 pontos. A microestrutura das composições foi avaliada por microscopia eletrônica de varredura (MEV). Os resultados indicaram que a adição do resíduo à massa cerâmica contribuiu para redução da porosidade e, conseqüentemente, melhoria na qualidade da cerâmica. Isto foi atribuído ao poder calorífico do resíduo que contribuiu para efetivar as reações de sinterização.

argila; cerâmica vermelha; propriedades; resíduo oleoso


The incorporation of an oily waste from the petroleum extraction sector into a red ceramic body was evaluated with respect to the changes produced on the physical and mechanical properties of the ceramic. Compositions were prepared with amounts of the waste of 0, 1, 3, 5 and 10 wt.%, used to mold specimens by uniaxial pressure before firing at 900ºC. The evaluated physical and mechanical properties were: bulk density, water absorption, linear shrinkage and flexural rupture strength measured by the 3 points test. The fracture surface of the specimens was studied by scanning electron microscopy (SEM). The results showed that the waste addition to the clayey ceramic contributed to decrease of the porosity and, consequently, to improve the quality of the ceramic. This was attributed to the heat power of the waste that effectively contributed to the sintering reactions.

clay; red ceramic; properties; oily waste


Cerâmica argilosa incorporada com resíduo oleoso proveniente do setor petrolífero

Clayey ceramic incorporated with oily waste from the petroleum industry

C. M. F. Vieira; S. N. Monteiro

Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro - UENF. Laboratório de Materiais Avançados – LAMAV. Av. Alberto Lamego – 2000, 28013-602, Campos dos Goytacazes, Brasil. e-mail: vieira@uenf.br, sergio.neves@ig.com.br

RESUMO

A incorporação de um resíduo oleoso proveniente do setor de extração de petróleo em massa de cerâmica vermelha foi avaliada em relação às alterações produzidas nas propriedades físicas e mecânicas da cerâmica. Foram preparadas composições, com quantidades de resíduo de 0, 1, 3, 5 e 10% em peso, usadas na confecção de corpos-de-prova por prensagem uniaxial para queima na temperatura de 900ºC. As propriedades físicas e mecânicas avaliadas foram: densidade aparente, absorção de água, retração linear e tensão de ruptura à flexão medidas em ensaio de 3 pontos. A microestrutura das composições foi avaliada por microscopia eletrônica de varredura (MEV). Os resultados indicaram que a adição do resíduo à massa cerâmica contribuiu para redução da porosidade e, conseqüentemente, melhoria na qualidade da cerâmica. Isto foi atribuído ao poder calorífico do resíduo que contribuiu para efetivar as reações de sinterização.

Palavras-chaves: argila, cerâmica vermelha, propriedades, resíduo oleoso.

ABSTRACT

The incorporation of an oily waste from the petroleum extraction sector into a red ceramic body was evaluated with respect to the changes produced on the physical and mechanical properties of the ceramic. Compositions were prepared with amounts of the waste of 0, 1, 3, 5 and 10 wt.%, used to mold specimens by uniaxial pressure before firing at 900ºC. The evaluated physical and mechanical properties were: bulk density, water absorption, linear shrinkage and flexural rupture strength measured by the 3 points test. The fracture surface of the specimens was studied by scanning electron microscopy (SEM). The results showed that the waste addition to the clayey ceramic contributed to decrease of the porosity and, consequently, to improve the quality of the ceramic. This was attributed to the heat power of the waste that effectively contributed to the sintering reactions.

Keywords: clay, red ceramic, properties, oily waste.

1 INTRODUÇÃO

As indústrias de cerâmica vermelha podem ter um papel relevante como receptoras de resíduos sólidos visando sua disposição final. Esta incorporação, feita de maneira criteriosa, permite dar um destino ambientalmente correto para resíduos que, de outra forma, seriam fontes de poluição.

Resíduos oleosos da indústria petrolífera, assim como outros resíduos envolvendo compostos orgânicos alifáticos e aromáticos são atualmente submetidos a processos de inertização ou encapsulamento. Em tais processos são utilizados adsorventes industriais, especialmente desenvolvidos para adsorção e encapsulamento deste tipo de resíduos de forma irreversível, tornando-os estáveis às condições de lixiviação e solubilização. Destes processos resulta o material adsorvente formalmente saturado, o qual, de acordo com os órgãos ambientais, pode ser disposto em aterros sanitários, sendo classificado como resíduo classe IIa - não perigoso não inerte [1].

Comparando-se os processos de inertização realizados pela transformação do resíduo em peças de cerâmica vermelha e pelo uso do adsorvente industrial, pode-se observar com facilidade que a adição à massa para fabricação de peças em cerâmica vermelha não gera outros resíduos, sem prejuízo para a qualidade do referido material. No entanto quando se utiliza adsorventes industriais para inertização, o resíduo é apenas reclassificado, passando de resíduo classe I, perigoso,para classe IIa, não perigoso não inerte [1], requerendo ainda espaço e cuidados para disposição correta. Em trabalho reportado na literatura [2] foi observado que a utilização de resíduo oleoso do setor petrolífero, proveniente dos separadores de água e óleo, em cerâmica argilosa acarretou incremento na geração de metano e gás carbônico. Com relação às peças incorporadas, foi observado que os ensaios de solubilização atendem às especificações técnicas. Na investigação da microestrutura de cerâmicas argilosas incorporadas com o resíduo oleoso inertizado [3-5], o mesmo utilizado neste trabalho, os resultados demonstraram que a adição deste resíduo também conhecido como borra de petróleo encapsulada, provoca alterações tanto na composição química quanto na microestrutura do material cerâmico. Outros artigos recentes [6-8] abordaram as dificuldades e vantagens da incorporação de resíduo oleoso provenientes dos separadores de água e óleo de atividade petrolífera. Alves e Holanda [8] mostraram que o teor mais adequado para incorporação de borra oleosa para fabricação de blocos cerâmicos situa-se na faixa de 10 a 20% em peso, onde as suas características encontram-se maximizadas, tais como a resistência mecânica e a absorção de água, além de apresentar estabilidade química comprovada pelos resultados das análises de lixiviação e solubilização.

Já o presente trabalho avalia o efeito da incorporação de resíduo oleoso, submetido a um processo de inertização, em até 10% em peso nas propriedades físicas e mecânicas de uma cerâmica argilosa queimada a 900ºC, temperatura usual de fabricação tijolos e telhas..

2 MATERIAIS E MÉTODOS

Para realização deste trabalho foram utilizadas como matérias-primas uma massa argilosa empregada para fabricação de cerâmica vermelha e um resíduo oleoso proveniente do setor petrolífero. A massa industrial foi proveniente de indústria localizada no município de Campos dos Goytacazes, sendo constituída de caulinita, quartzo, mica muscovita e gibsita [9]. Já o resíduo se constitui de uma borra pastosa obtida no processo de separação de água e óleo realizado na plataforma marítima após a extração do petróleo. Esta borra havia sido submetida a um processo de tratamento de inertização que consiste na adição de 20% em peso de bentonita que serve como agente encapsulante do conteúdo oleoso. O resíduo assim inertizado, isto é, borra encapsulada, é composto predominantemente por SiO2, na forma de quartzo, e SO3 e BaO, na forma de bairita composto BaSO4 forma de barita. A quantidade estimada de hidrocarbonetos na borra é de 9,3% em peso e a quantidade de água é de 4,3% em peso.

As matérias-primas, tanto a argila quanto o resíduo, foram secas em estufa a 110ºC, desagregadas com pilão manual e peneiradas em 20 mesh (840 mm) para preparação das composições. Foram preparadas cinco composições com os seguintes percentuais de resíduo oleoso: 0, 1, 3, 5 e 10% em peso. Corpos-de-prova retangulares (11,43x 2,54x 10,0 cm) foram obtidos por prensagem uniaxial em matriz de aço a 20 MPa com umidade de 8% sendo em seguida, secos em estufa a 110ºC até peso constante. A queima foi realizada em forno de laboratório tipo mufla na temperatura de 900ºC. Utilizou-se uma taxa de aquecimento de 3ºC/min e 120 minutos de tempo de permanência nas temperaturas de patamar. O resfriamento foi obtido por convecção natural, desligando-se o forno.Propriedades físicas e mecânicas relacionadas com densidade aparente a seco e de queima, absorção de água, retração linear e tensão de ruptura à flexão (3 pontos) foram determinadas através de ensaios padronizados [10,11]. As análises de MEV foram realizadas na superfície de fratura das peças queimadas em microscópio Jeol, modelo JSM 6460 LV, da COPPE/UFRJ.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A Figura 1 apresenta a densidade aparente, tanto a seco quanto de queima, da massa argilosa em função do teor de resíduo incorporado. É possível observar que a densidade aparente a seco de todas as formulações é superior à densidade aparente de queima. Este comportamento está relacionado com a perda de massa que ocorre durante a queima, acarretando porosidade. Como a temperatura utilizada, 900ºC, não propicia uma significativa formação de fase líquida numa massa argilosa caulinítica, como a utilizada neste trabalho, o fechamento da porosidade em conseqüência das reações de sinterização, não compensou a porosidade originada da perda de massa. Esta perda de massa está associada à combustão de matéria orgânica e hidrocarbonetos, eliminação de água de constituição da caulinita e desidratação de hidróxidos. A Figura 1 mostra ainda que a incorporação da borra oleosa aumentou levemente tanto a densidade aparente a seco quanto a densidade aparente de queima da massa cerâmica. No caso da densidade aparente a seco, o resíduo oleoso atuou como lubrificante entre as partículas, possibilitando assim um melhor empacotamento. O incremento da densidade aparente de queima da massa argilosa com teores mais elevados do resíduo é conseqüência do poder calorífico adicional do resíduo, devido ao teor de hidrocarbonetos, o que facilita as reações de sinterização.


A Figura 2 apresenta a absorção de água da massa cerâmica em função da quantidade de resíduo oleoso incorporado. Observa-se no gráfico desta figura que ocorre uma redução da absorção de água com o incremento do teor de resíduo. Esta redução foi de aproximadamente de 15% para 10% de resíduo incorporado. Como a absorção de água está relacionada com a porosidade aberta do material, a redução da porosidade indica uma redução da porosidade aberta que ocorreu em conseqüência da maior eficiência das reações de sinterização com o incremento de resíduo incorporado.


A Figura 3 apresenta a retração linear da massa cerâmica em função da quantidade de resíduo oleoso incorporado. Observa-se que ocorre um incremento deste parâmetro a partir de 3% de resíduo incorporado. O efeito do resíduo oleoso na retração linear da cerâmica é também atribuído à melhoria propiciada, com sua incorporação na massa argilosa, nas reações de sinterização, difusão no estado sólido e formação de fase líquida, que promovem uma aproximação das partículas.


A Figura 4 apresenta a tensão de ruptura à flexão das composições estudadas através dos diagramas de Weibull. Observa-se nestes diagramas que o resíduo oleoso proporcionou um incremento significativo da resistência mecânica da massa argilosa. Por exemplo, para a incorporação de 10% de resíduo, o incremento na resistência característica, so, foi de 56%. O baixo valor do módulo de Weibull, m, associado a uma distribuição multimodal, indicam uma sensível heterogeneidade nos resultados de ruptura. Esta característica de pouca homogeneidade é, entretanto, típica de cerâmica argilosa utilizada para fabricação de tijolos e telhas.


As Figuras 5 e 6 apresentam as micrografiasda superfície de fratura das cerâmicas sem resíduo e com incorporação de 10% queimadas a 900°C. É possível observar que a microestrutura da cerâmica com resíduo incorporado apresenta regiões altamente porosas. Estas regiões estão possivelmente associadas às partículas do resíduo oleoso, ricas em hidrocarbonetos e de sulfato de bário hidratado. A cerâmica argilosa pura, Figura 5, não apresenta estas regiões. Embora a cerâmica incorporada com resíduo oleoso apresente regiões porosas, estas não acarretaram decréscimo da resistência mecânica da cerâmica argilosa, conforme observado na Figura 4. A interconectividade de poros, comum neste tipo de cerâmica queimada em baixas temperaturas, possivelmente é o principal fator para a ruptura das cerâmicas, independente da existência de resíduo oleoso incorporado.



4 CONCLUSÕES

Neste trabalho de investigação da influência da incorporação de um resíduo oleoso do setor petrolífero nas propriedades físicas e mecânicas de uma massa argilosa queimada a 900ºC, foi observado que o resíduo possibilitou uma melhoria na performance técnica da cerâmica, com incremento na densidade aparente a seco e de queima, redução da absorção de água e incremento da resistência mecânica. A densidade a aparente a seco da cerâmica foi melhorada devido à ação lubrificante do conteúdo oleoso do resíduo entre as partículas acarretando um melhor empacotamento. No caso das propriedades de queima, os resultados obtidos são atribuídos à melhoria das reações de sinterização com a incorporação de resíduo oleoso devido ao seu poder calorífico, também decorrente do seu conteúdo de hidrocarbonetos.

5 AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao CNPq, FAPERJ e FENORTE/TECNORTE.

6 REFERÊNCIAS

  • [1] ANÔNIMO, NBR 10004: Resíduos Sólidos Rio de Janeiro, ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas, 2004.
  • [2] SILVA, F.A.N., Caracterizaçăo Microestrutural e Avaliaçăo Ambiental de Cerâmicas Argilosas Incorporadas com Resíduo Oleoso Inertizado, Dissertaçăo de M.Sc., Laboratório de Materiais Avançados, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Campos dos Goytacazes, Brasil, 2000.
  • [3] MONTEIRO, S.N., VIEIRA, C.M.F., "Effect of Oily Waste Addition to Clay Ceramic", Ceramics International, v. 31, n. 2, pp. 353-358, 2005.
  • [4] MONTEIRO, S.N., SILVA, F.A.N., VIEIRA, C.M.F., "Microstructural Evaluation of a Clay Ceramic Incorporated with Petroleum Waste", Applied Clay Science, v. 33, pp. 171-180, 2006.
  • [5] SILVA, F.A.N., MONTEIRO, S.N., VIEIRA, C.M.F., "Influęncia do Sulfato de Bário nas Características de Cerâmica Vermelha Incorporada com Resíduo Oleoso Inertizado", Cerâmica, v. 52, n. 321, pp. 15-21, 2006.
  • [6] SOUZA, G.P., SANTOS, R.S., HOLANDA, J.N.F., "Recycling of a Petroleum Waste in Ceramic Bodies", Materials Science Forum, v. 418, pp.743-747, 2003.
  • [7] SOUZA, G.P., HOLANDA, J.N.F., "Densification Behaviour of Petroleum Waste Bearing clay-based Ceramic Bodies", Ceramics International, v. 30, n. 1, pp. 99-104, 2004.
  • [8] ALVES, M.R.F., HOLANDA, F.S.R., "Reciclagem de Borra Oleosa através da Incorporaçăo em Blocos Cerâmicos de Vedaçăo", Cerâmica Industrial, v. 10, n. 3, pp. 41-46, 2005.
  • [9] MONTEIRO, S.N., VIEIRA, C.M.F., "Characterization of Clays from Campos dos Goytacazes, north Rio de Janeiro State", Tile & Brick Int, v. 18, n. 3, pp. 152-157, 2002.
  • [10] AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS – ASTM, Water Absorption, Bulk Density, Apparent Porosity, and Apparent Specific Gravity of Fired Whiteware Products, C 373-72, 1972.
  • [11] AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS –ASTM, Flexural Properties of Ceramic Whiteware Materials, C 674-77, 1977.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Mar 2007
  • Data do Fascículo
    Set 2006
Laboratório de Hidrogênio, Coppe - Universidade Federal do Rio de Janeiro, em cooperação com a Associação Brasileira do Hidrogênio, ABH2 Av. Moniz Aragão, 207, 21941-594, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel: +55 (21) 3938-8791 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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