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Síntese de Eletrocatalisadores Cerâmicos Nanométricos

Os processos e dispositivos tecnológicos necessários para a operacionalização de novas alternativas energéticas para garantir o suprimento perene e não poluente das demandas crescentes da nossa sociedade são fortemente dependentes do desenvolvimento de novos materiais 1[1] MIRANDA, P. E. V., "Materiais para uso na indústria de energia", Matéria, v.18, n.1, Rio de Janeiro, 2013.. Em especial, o uso da energia do hidrogênio requer o funcionamento adequado das pilhas a combustível, que convertem com elevada eficiência a energia química do combustível em energia elétrica e calor. Dentre os vários tipos já inventados, as pilhas a combustível de óxido sólido são particularmente atrativas, devido à elevada temperatura de operação, com farta liberação de vapor d´água superaquecido por reações eletroquímicas exotérmicas, que apresenta grande interesse de uso industrial. Uma vantagem inusitada adicional refere-se à inovação que faz com que a geração de energia elétrica torne-se um subproduto de alto valor agregado num processo em que o objetivo principal é a conversão eletroquímica do metano em hidrocarbonetos C2, tais como eteno e etano 2[2] MIRANDA, P. E. V., "Materiais para um Novo Paradigma da Indústria Química", Matéria, v.20, n.3, Rio de Janeiro, 2015.. Seja para o seu uso convencional de geração de energia elétrica e calor 3[3] MAHATO, N., BANERJEE, A., GUPTA, A., OMAR, S., BALANI, K., "Progress in Material Selection for Solid Oxide Fuel Cell Technology: A ReviewProgress in Materials Science, 2015.) ou até para atuar de forma reversível produzindo hidrogênio por eletrólise 4[4] FERRERO, D., LANZINI, A., LEONE, P., SANTARELLI, M., "Reversible operation of solid oxide cells under electrolysis and fuel cell modes: Experimental study and model validation", Chemical Engineering Journal, v.274, pp. 143-155, 2015. , seja para ser usada como um reator para a conversão eletroquímica do metano 2[2] MIRANDA, P. E. V., "Materiais para um Novo Paradigma da Indústria Química", Matéria, v.20, n.3, Rio de Janeiro, 2015. ou até mesmo para garantir a utilização direta de combustíveis carbonosos 5[5] VENÂNCIO, S. A., GURIERRES, T. F., SARRUF, B. J. M., MIRANDA, P. E. V., "Oxidação direta do etanol no anodo de PaCOS", Matéria, v. 13, n. 3, pp. 560-568, 2008.,6[6] VENÂNCIO, S. A., MIRANDA, P. E. V., "Solid oxide fuel cell anode for the direct utilization of ethanol as a fuel", Scripta Materialia, pp. 1065-1068, 2011. o processo de fabricação de pilhas a combustível de óxido sólido inovadoras inicia-se com a síntese dos eletrocatalisadores usados na confecção dos seus eletrodos, principalmente o anodo.

Os anodos de PaCOS que se destinam a objetivos simultâneos e diferenciados de atuação são apropriadamente denominados anodos multifuncionais. Os desafios nesse caso são variados e incluem, pelo menos:

  1. Em relação à Microestrutura:

  1. Serem constituídos por materiais que possuam composição química e as fases adequadas para o comportamento eletrocatalítico requerido e que se mantenham estáveis em todo o intervalo de temperaturas de utilização;

  2. Sejam processados a partir de materiais sob a forma de pós cerâmicos com tamanho de partícula nanométrico, pois isso influenciará na cinética de sinterização;

  3. Que a sua constituição estrutural seja tal que o tamanho de cristalito seja também de ordem de grandeza nanométrica para garantir uma estrutura cristalina refinada;

  4. Que seja poroso para permitir a percolação dos gases de reação, com porosidade da ordem de ou superior a cerca de 40%;

  5. Que a porosidade seja do tipo interconectada, apresentando tortuosidade, capaz de criar um caminho de passagem do gás combustível reativo através de todo o anodo e até a interface com o eletrólito;

No que se refere à Estabilidade e Compatibilidade:

  1. Que apresente estabilidade química, não liberando elementos químicos para reações que criem fases intermediárias capazes de competir com o desempenho eletrocatalítico requerido ou interferir na difusividade de íons O2-;

  2. Que apresente estabilidade morfológica durante o uso, capaz de evitar que haja modificação significativa no tipo, no tamanho e na distribuição das espécies microestruturais inicialmente existentes;

  3. Que apresente estabilidade termo-mecânica durante o uso, resultado do fato do anodo possuir coeficiente de expansão térmica com valor próximo ao dos outros componentes do conjugado eletrólito-eletrodos;

  4. Que apresente resistência à presença de contaminantes existentes no combustível, principalmente ao enxofre;

  5. Na eventualidade do uso de combustíveis carbonosos, que apresente resistência à coqueificação, fenômeno capaz de entupir, desativar e fissurar o anodo;

  1. Em relação à Condutividade:

  1. Que, preferivelmente, o anodo apresente condutividade mista, simultaneamente iônica e eletrônica, para aumentar o tamanho dos contornos de tripla fase, onde as reações eletroquímicas de interesse acontecem, além da região de interface anodo-eletrólito;

  1. Em relação à Atividade Eletrocatalítica:

  1. Que tenha cinética satisfatória na temperatura de uso para promover a oxidação do combustível e a liberação do vapor d'água produzido;

  2. Que tenha cinética satisfatória na temperatura de uso para promover a conversão eletroquímica do combustível e a liberação do vapor d'água produzido;

  3. Que apresente, eventualmente, multifuncionalidade para promover simultaneamente a oxidação do combustível com consequente produção de elétrons e a sua conversão eletroquímica em compostos químicos de interesse;

  4. Que o comprimento total de contornos de tripla fase, onde as reações eletroquímicas de interesse se manifestam seja extenso e mantenha-se íntegro e ativo durante a utilização.

Para que as condições acima possam ser atingidas, é necessário que a síntese do pó cerâmico utilizado como elemento eletrocatalítico no anodo seja realizada de forma muito controlada, referente à superfície específica e ao tamanho de partícula. A Tabela 1 apresenta tais resultados para o aluminato de cério, utilizado como anodo em PaCOS destinada à operação com a utilização direta de etanol 6[6] VENÂNCIO, S. A., MIRANDA, P. E. V., "Solid oxide fuel cell anode for the direct utilization of ethanol as a fuel", Scripta Materialia, pp. 1065-1068, 2011. , visando a produção eficiente de eletricidade sem coqueificação. A Figura 1apresenta valores de condutividade total para material de anodo multifuncional composto de aluminato de lantânio capaz de simultaneamente promover a oxidação do metano e a sua conversão eletroquímica em hidrocarbonetos do tipo C2 8[8] SILVA, C. A., MIRANDA, P. E. V., "Synthesis of LaAlO3 based materials for potential use as methane-fueled solid oxide fuel cell anodes", International Journal of Hydrogen Energy, v. 40, pp. 10002 - 10015, 2015..

Tabela 1:
Área superficial, tamanho de partícula e tamanho de cristalito do pó cerâmico eletrocatalisador para anodo de PaCOS que opera com a utilização direta de etanol 7[7] VENÂNCIO, S. A., MIRANDA, P. E. V., "Synthesis of CeAlO3/CeO2-Al2O3 for use as solid oxide fuel cell functional anode material", Ceramics International, v. 37, pp. 3139-3152, 2011. A nomenclatura de amostras refere-se a aluminato de cério calcinado ao ar a: CeAl3: 300oC; CeAl4: 400oC; CeAl6: 600oC; CeAl8: 800oC; CeAl9: 900oC e CeAl9RH: reduzido sob hidrogênio a 900oC.

Figura 1:
Variação da condutividade total em função da temperatura para amostras densificadas de pós cerâmicos para anodos multifuncionais 8[8] SILVA, C. A., MIRANDA, P. E. V., "Synthesis of LaAlO3 based materials for potential use as methane-fueled solid oxide fuel cell anodes", International Journal of Hydrogen Energy, v. 40, pp. 10002 - 10015, 2015.). A nomenclatura de amostras refere-se a aluminato de lantânio: LAMO: dopado com manganês; LSAMO: dopado com manganês e estrôncio; LSAO: dopado com estrôncio; LAO: intrínseco. A área hachurada refere-se ao nível a partir do qual a condutividade total atinge interesse prático.

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    SILVA, C. A., MIRANDA, P. E. V., "Synthesis of LaAlO3 based materials for potential use as methane-fueled solid oxide fuel cell anodes", International Journal of Hydrogen Energy, v. 40, pp. 10002 - 10015, 2015.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015
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